Acórdão nº 816/15.3T8AVR.P2 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-09-12

Data de Julgamento12 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão816/15.3T8AVR.P2
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 816/15.3T8AVR.P2
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Aveiro – Juízo Central Cível, Juiz 3
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2º Adjunto Des. Pedro Damião e Cunha
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SUMÁRIO
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I- RELATÓRIO

AA instaurou a presente ação declarativa com processo comum contra Companhia de Seguros X..., S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe:
. A quantia de 200.000€ a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;
. As importâncias que se vierem a liquidar em execução de sentença pelos danos futuros previsíveis emergentes dos tratamentos e intervenções cirúrgicas a que ainda tiver de ser submetido, medicação, consultas, despesas com os mesmos e consequências definitivas;
. Juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Para substanciar tais pretensões, alegou, em síntese, que:
. No dia 19 de março de 2012, ocorreu um acidente de viação, no Largo ..., em Vagos, no qual interveio o veículo pesado de mercadorias com matrícula ..-EQ-.., conduzido por BB, segurado na ré, e o velocípede sem motor pertencente ao autor;
. O autor conduzia o seu velocípede no sentido .../..., via que entronca na Estrada Nacional ..., e parou junto ao sinal vertical STOP ali existente;
. O veículo pesado de mercadorias circulava atrás do autor e imobilizou-se no dito sinal de STOP, paralelamente ao velocípede;
. Quando retomou a marcha, o veículo pesado principiou a descrever a curva para a direita, sendo que nessa altura, ao manobrar de forma inapropriada o veículo pesado, colidiu com a parte lateral direita do seu veículo na roda traseira do velocípede que foi arrastado pelo par de rodas traseiras, tendo sido o autor arrastado para debaixo do pesado;
. Como consequência do acidente, cuja culpa se deveu em exclusivo ao condutor do EQ, sofreu diversos danos não patrimoniais e patrimoniais cujo ressarcimento a demandada deve efetuar, em virtude de se encontrar para si transferida a responsabilidade civil por danos ocasionados a terceiros pela circulação desse veículo.
A ré deduziu contestação, impugnando, de forma motivada a factualidade alegada pelo autor, quer no que diz respeito à dinâmica do acidente - sinistro cuja responsabilidade atribui ao demandante -, quer no que se reporta aos danos daí decorrentes.
Paralelamente, para a eventualidade de vir a exercer direito de regresso relativamente ao condutor do veículo segurado, atento o facto de aquele conduzir com uma TAS de 0,89g/l, deduziu incidente de intervenção acessória provocada, requerendo que fosse chamado a intervir nos autos BB.
Deferido o pedido de intervenção, procedeu-se à citação do chamado, o qual contestou, impugnando, também de forma motivada, a factualidade alegada pelo autor e arguindo as exceções dilatórias de falta, insuficiência ou irregularidade do mandato, incapacidade e ilegitimidade ativa, a par de uma exceção de carácter inominado.
Em resposta, o autor pronunciou-se no sentido da improcedência das arguidas exceções.
Procedeu-se ao saneamento dos autos, sendo proferido despacho que julgou improcedentes as exceções dilatórias invocadas pelo chamado; identificou-se o objeto do litígio e fixaram-se os temas da prova.
Realizou-se audiência final, vindo a ser proferida sentença na qual se decidiu «julgar parcialmente procedente por provada a presente ação condenando a ré a pagar ao autor:
1 - A quantia de 184 344,00 € (cento e oitenta e quatro mil, trezentos e quarenta e quatro euros) por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, quantia a que acrescerá os juros de 4% contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
2 - No montante que se vier a liquidar em execução de sentença e relativo a tratamentos médicos, ajudas técnicas e medicamentosas que tenham como causa as lesões decorrentes do acidente de viação sofrido pelo autor».
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Não se conformando com a aludida sentença veio a ré interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
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Notificado o autor apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO MÉRITO DO RECURSO
1. Definição do objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. determinar se o tribunal a quo incorreu num error in iudicando, por deficiente avaliação ou apreciação das provas e assim na decisão da matéria de facto;
. decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual, mormente da adequação do montante fixado a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;
. data do início de contagem dos juros de mora.
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2. Recurso da matéria de facto
2.1. Factualidade considerada provada na sentença

O tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1 - O Autor nasceu em .../.../2001.
2 - A 19 de Março de 2012, pelas 16.00 horas deu-se um acidente de viação em que foram intervenientes:
- O veículo pesado de mercadorias ..-EQ-.., conduzido por BB
- Velocípede sem motor pertencente ao aqui Autor.
3 – No local a estrada é plana, tem pavimento asfaltado, em bom estado de conservação, com sete metros de largura, dispõe de duas hemi-faixas de rodagem, dois sentidos de marcha e dispõe de passeios de cerca de um metro de largura e elevados a 30 cm do nível da estrada.
4 - Estava um dia ensolarado e de bom tempo.
5 - O acidente ocorreu no Largo ... em Vagos.
6 - Nas circunstâncias de tempo e lugar referidos seguiam o Autor a bordo de um velocípede sem motor e o condutor ..-EQ-.., BB, a tripular um pesado de mercadorias, na estrada de ..., ambos no sentido ... - ....
7 - Este circulava por conta ordem e direção da proprietária do veículo, a sociedade comercial O... Unipessoal, Lda, ao abrigo de um contrato de trabalho entre ambos celebrado.
8 – A via, por onde circulavam ambos os veículos, entronca na Estada Nacional ....
9 - O Autor circulava pelo seu lado direito da via, considerando o sentido em que seguiam e o mais possível junto ao passeio.
10 – O veículo pesado de mercadorias circulava atrás do Autor
11 – Tanto o autor como o veículo pesado de mercadorias conduzido pelo BB, quando chegaram ao dito entroncamento, pararam junto ao sinal vertical STOP ali existente, ficando imobilizados e paralelos um ao outro
12 - Quando o veículo pesado retomou a marcha no sentido ..., principiou a descrever curva para a direita, atento o seu sentido, tendo consumido com o rodado todo o espaço do seu lado direito, colidindo com a parte lateral direita do seu veículo no velocípede do Autor.
13 - O velocípede foi então arrastado pelo par de rodas traseiras tendo sido o Autor arrastado para debaixo do pesado, tendo, posteriormente, o primeiro rodado direito galgado e transposto a perna esquerda do Autor.
14 - Uma pessoa que se encontrava naquele local a acerca de 10 metros e que presenciou o acidente, vendo o Autor a ser colhido pelo veículo pesado, correu para lá gritando a viva voz e batendo na cabina do pesado para que o seu tripulante parasse e imobilizasse de imediato o pesado.
15 - O condutor do EQ imobilizou o veículo tendo nessa altura a perna esquerda do Autor, ficado debaixo de um dos pneus traseiros do reboque.
16 - A aludida testemunha deu então indicações gestuais ao condutor do pesado para que recuasse cerca de quatro dedos para que a perna do Autor pudesse ficar desimpedida e liberta do rodado do pneu, o que o condutor do EQ fez.
17 - Na altura do acidente, o condutor do EQ era portador de uma taxa de alcoolemia de 0,89 gramas por litro.
18 - Por contrato de seguro titulado pela apólice ..., a responsabilidade civil por dano causados a terceiros emergentes da circulação do veículo ..-EQ-.. encontrava-se, à data do acidente, transferido para a Ré.
19 - Como consequência directa e necessária da conduta do condutor do QZ acidente o autor sofreu fratura exposta e esmagamento e esfacelo dos ossos e perna esquerda.
20 - Para tratamento destas lesões foi conduzido ao Hospital ... em Aveiro, onde lhe efetuaram limpeza e desinfeção das feridas, o medicaram com antibióticos e anti-inflamatório e lhe fizeram-lhe várias análises laboratoriais.
21 - Estabilizaram a fratura com encavilhamento elástico e procederam à limpeza cirúrgica e correção dos tecidos moles com encerramento de tecidos, havendo informação de inviabilidade do M. tibial anterior e extensor do hallux.
22 - O Autor foi transferido para o hospital pediátrico de ... a 9.04.2012 tendo realizado vários desbridamentos cirúrgicos e aplicação de penso com sistema de vácuo.
23 - Fez vários pensos sob anestesia para limpezas de anestesias posteriores, tendo necessitado de várias transfusões de sangue.
24 - No dia 23.04.2012 foi feito novo desbridamento cirúrgico a cobertura de área de exposição óssea da perna esquerda e dorso do pé esquerdo com retalhos livres de latissimus dorsi e serratus anterior esquerdos (anastomose terminoterminal da artéria e veia toracodorsais e artéria e veia tibial anterior).
25 - No dia 01.05.2012 foi feita a cobertura retalho muscular com excerto livre de pele.
26 - Fez mais dois pensos sob anestesia para controlo local dos excertos.
27 - Esteve imobilizado com tala gessada posterior poplieteo-podálica, durante todo o internamento.
28 - Passou a usar ortótese/tala
...

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