Acórdão nº 801/08.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2024-01-11

Ano2024
Número Acordão801/08.1BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO

Vem a Autoridade Tributária e Aduaneira, interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por G..... – C......., S.A., (actualmente G........, S.A) com referência à liquidação de IRC do ano de 2005 no montante de € 16.041,47.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida por G..... – C......., S.A., e em consequência, anulou a liquidação de IRC do exercício de 2005 n.º ..........04 de 27/12/2007, com excepção dos montantes referentes ao adiantamento das remunerações das trabalhadoras em licença de maternidade.

B. Conforme decorre dos autos, a AT em sede de ação inspetiva procedeu a uma correção à matéria tributável da Recorrida, no valor de €44.734,91, efetuada nos termos do artigo 17.º do EBF, conjugado com o n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC (cf. facto 1 do probatório – ver ainda os pontos III.1.1.3 e III.2.5 – criação de Emprego para Jovens do Relatório da Inspeção).

C. Da sentença resulta a pronúncia do Tribunal quanto às matérias:
a. Pagamento do prémio ao trabalhador no ano de 2005 com referencial ao ano de 2004;
b. Pagamento do subsídio de alimentação;
c. Pagamento de outros encargos – indemnização relativa a férias não gozadas e aquisições de viaturas pelo trabalhador;
d. Pagamento do proporcional do vencimento do trabalhador.

D. Sucede que, quanto às matérias descritas nas alíneas a), c) e d), do ponto anterior, as mesmas não foram objeto de análise no Relatório da Inspeção. Assim, o presente recurso versará, exclusivamente, sobre essas matérias.

E. Tendo presente a fundamentação aduzida pelo Tribunal a quo na Sentença agora parcialmente recorrida, entende a Recorrente deixar desde já bem claro que não pode, minimamente, concordar, com a decisão em apreço (na parte objeto do presente recurso), pois entende que nos termos do artigo 125º, nº 1 do CPPT, “Constituem causas de nulidade da sentença (…) a pronúncia sobre questões que não deva conhecer” e que de igual modo dispõe o artigo 615º, nº1, al. d) do CPC, segundo o qual “ É nula a sentença quando o juiz (…) conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

F. Esta nulidade está conexionada com a segunda parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, em que se estabelece que o juiz não pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

G. Com efeito, e atendendo à fundamentação apresentada no RIT, na parte objeto do presente recurso [cfr. facto 1) do probatório, onde consta a reprodução do RIT], retira-se que os SIT colocam no âmbito da análise realizada, a tónica nos encargos referentes ao subsídio de alimentação e no adiantamento da remuneração das trabalhadoras que se encontravam em licença de maternidade e nada mais. H. Porém da leitura da P.I., vem a Recorrida referir-se aos encargos referentes:
a. Pagamento do prémio ao trabalhador no ano de 2005 com referencial ao ano de 2004;
b. Pagamento do subsídio de alimentação;
c. Pagamento de outros encargos – indemnização relativa a férias não gozadas e aquisições de viaturas pelo trabalhador;
d. Pagamento do proporcional do vencimento do trabalhador.

I. Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 608.º, nº.2, CPC, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, excetuadas aquelas cujas decisões esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente).

J. Ora, como se infere do que já deixámos expresso através da reprodução do RIT [ponto 9 das presentes alegações e ponto 1) do probatório], o Tribunal a quo, pronuncia-se sobre um conjunto de matérias que não foram objeto de análise no RIT.

K. O excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de "ultra petita", a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).

L. Ora, salvo melhor opinião, não se vislumbrando que tais questões sejam de conhecimento oficioso, considera a Recorrente que excedeu o douto Tribunal a quo os seus poderes de cognição, e nesta medida a sentença recorrida só pode ser considerada nula.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao recurso e consequentemente, revogada a douta sentença na parte recorrida, como é de Direito e Justiça.”.

* *
A Recorrida apresentou contra-alegações tendo formulado as seguintes conclusões:

“1.ª A G..... – C......., S.A. (NIPC ..........11) foi incorporada por fusão pela COMPANHIA DE SEGUROS A.........., S.A. (NIPC ..........48), que alterou a sua firma para A.......... SEGUROS, S.A., e que posteriormente foi incorporada por fusão na COMPANHIA DE SEGUROS T.........., S.A. (NIPC …….31), a qual, por sua vez, alterou a sua firma para SEGURADORAS U……., S.A. e mais tarde para G........, S.A., pelo que se afigura que é esta última que tem legitimidade como Recorrida (cf. artigo 112.º do CSC; acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 13.10.2017, proc. n.º 09525/16);

2.ª A douta sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de IRC n.º ..........04, de 27.12.2007, na nota de compensação n.º ……26, de 04.01.2008 e na nota de cobrança n.º ……17, relativo ao exercício de 2005;

3.ª O Tribunal a quo julgou a impugnação judicial procedente quanto às questões suscitas pela ora Recorrida de (i) pagamento do prémio ao trabalhador no ano de 2005 com referência ao ano de 2004; (ii) pagamento de outros encargos – indemnização relativa a férias não gozadas e à aquisição de viaturas pelo trabalhador e (iii) pagamento do proporcional do vencimento do trabalhador, e improcedente quanto à correção do (iv) pagamento do subsídio de alimentação;

4.ª A Recorrente deduz o presente recurso arguindo que o Tribunal a quo incorre em excesso de pronúncia por se ter pronunciado sobre os pontos (i), (ii) e (iii) do artigo anterior, os quais não foram objeto de pronúncia no relatório de inspeção tributária, pelo que a sentença padece de nulidade, ex vi artigos 125.º, n.º 1 do CPPT e 608.º, n.º 2 do CPC;

5.ª Salvo o devido respeito, a tese sufragada pela Recorrente não pode prosseguir porquanto a mesma assenta na errada interpretação da matéria de facto e de Direito;

6.ª Decorre dos artigos 125.º, n.º 1 do CPPT e 608.º, n.º 2 e 615.º do CPC que o juiz se deve pronunciar sobre as questões que as partes suscitem nos autos e abster-se de se pronunciar sobre as questões que as mesmas não levem ao seu conhecimento, salvo se estas forem de conhecimento oficioso (cf. neste sentido vide os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 02.03.2017 (proc. n.º 00302/10.8BEPRT) e do Supremo Tribunal Administrativo, de 09.06.2010 (proc. n.º 0618/09));

7.ª A própria administração tributária, na informação junta à douta contestação da Fazenda Pública, elaborada pela Divisão de Justiça Contenciosa da Direção de Finanças de Lisboa se pronunciou sobre os encargos com as indemnizações concedidas pelas férias não gozadas e aquisição de viatura pelo trabalhador abaixo do valor de mercado e com o pagamento do proporcional do vencimento do trabalhador (cf. artigos 20.º, 23.º, 24.º, 26.º e 27.º da informação anexa à contestação da ora Recorrida a fls. dos autos);

8.ª Não se verifica excesso de pronúncia por parte do Tribunal a quo uma vez que as questões pelo mesmo apreciadas foram suscitadas pela ora Recorrida e foram abordadas pela administração tributária, na informação constante da contestação deduzida nos autos de impugnação judicial;

9.ª Não sendo imputados outros vícios à sentença, senão o da nulidade por excesso de pronúncia, o qual não se verifica, deverá a sentença recorrida manter-se porquanto é legal e, por conseguinte, ser negado provimento ao recurso da Recorrente.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, e, nessa medida, manter-se a sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”.
* *
O Exmº. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer defendendo seja negado provimento ao recurso.
* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se a sentença enferma de nulidade por excesso de pronúncia.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Para conhecimento do presente litígio torna-se necessário fixar a seguinte matéria de facto:
1. A liquidação em apreço ocorreu na sequência de uma inspecção tributária, sendo que, do Relatório de Inspecção da mencionada inspecção consta designadamente o seguinte:


(…)




( cfr. documento nº1 junto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT