Acórdão nº 7736/22.3T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 05-02-2024
Data de Julgamento | 05 Fevereiro 2024 |
Ano | 2024 |
Número Acordão | 7736/22.3T8VNG.P1 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Sumário do acórdão proferido no processo nº 7736/22.3T8VNG.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
1. Relatório[1]
Em 30 de setembro de 2022, com referência ao Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia, Comarca do Porto, A..., Lda. instaurou a presente ação de condenação sob a forma de processo comum, contra B..., Unipessoal, Lda. pedindo que a ré seja condenada a:
“1. Proceder à emissão das seguintes notas de crédito, no sentido de anular as faturas anterior e indevidamente emitidas com liquidação de imposto, assim discriminadas:
a. Emitir nota de crédito no valor total de 7.999,45 € referente à fatura n.º …, de 26.07.2019;
b. Emitir nota de crédito no valor total de 1.173,00 € referente à fatura n.º …, de 09.08.2019;
c. Emitir nota de crédito no valor total de 3.197,00 € referente à fatura n.º …, de 03.02.2020;
d. Emitir nota de crédito no valor total de 15.998,89 € referente à fatura n.º …, de 22.02.2020;
e. Emitir nota de crédito no valor total de 3.450,00 € referente à fatura n.º …, de 24.02.2020;
2. Em consequência, proceder à substituição das declarações periódicas anteriormente entregues através da correção/diminuição dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 – Campos 3 e 4) e inscrever o valor da nova fatura no Campo 8, do Quadro 6 (“Isentas ou Não Tributadas”);
3. Pagar à Autora a diferença dos valores das notas de crédito a emitir e o das novas faturas, no total de 31.818,34 € (trinta e um mil oitocentos e dezoito euros e trinta e quatro cêntimos);
4. Pagar à Autora o valor que resulta da diferença da nota de crédito n.º ... já emitida e da nova fatura emitida pela Ré, no valor de 28.871,30 € (vinte e oito mil oitocentos e setenta e um euros e trinta cêntimos);
5. Pagar à Autora a quantia de 10.934,11 € (dez mil novecentos e trinta e quatro euros e onze cêntimos) a título de juros de mora calculados sobre a totalidade da quantia em dívida (60.689,64 €), à taxa legal supletiva de 8% nos termos do § 5.º do artigo 102.º do Código Comercial e do Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio;
6. Pagar à Autora os juros de mora vincendos à taxa legal até efetivo e integral pagamento;
7. Por referência à obrigação legal de proceder à emissão das notas de crédito e das novas faturas e à obrigação legal de proceder à substituição das declarações periódicas anteriormente entregues através da correção/diminuição dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 – Campos 3 e 4) e inscrever o valor da nova fatura no Campo 8, do Quadro 6 (“Isentas ou Não Tributadas”), deverá a Ré ser condenada numa sanção pecuniária compulsória, em face do preenchimento dos requisitos plasmados no artigo 829.º-A do Código Civil, em montante não inferior a 50,00 € (cinquenta euros) por cada dia de atraso no cumprimento das obrigações melhor discriminadas supra nos pontos 1 e 2 do pedido.”
Para fundamentar as suas pretensões a autora alegou, em síntese, que no exercício da sua atividade contratou a ré para proceder ao fornecimento e montagem de caixilharia, alumínio e vidro duplo, colocação de perfis no edifício que estava a construir, denominado “...”, fornecimentos e montagens que a ré fez, tendo procedido à emissão das respetivas faturas, que a autora liquidou; alertada pelos serviços de contabilidade, em junho de 2020, a autora avisou a ré de que era necessário proceder à correção das faturas nº … de 26 de julho de 2019, no valor de € 42.779,65, nº … de 09 de agosto de 2019, no valor de € 6.273,00, nº … de 03 de fevereiro de 2000, no valor de € 17.097,00, nº … de 22 de fevereiro de 2020, no valor de € 18.450,00 e nº … de 30 de maio de 2020, no valor de € 154.398,70; que as mesmas foram incorretamente emitidas pela ré com menção do IVA à taxa de 23%; que devia emitir novas faturas com a menção da autoliquidação do IVA em função da verificação dos requisitos legais para a inversão do sujeito passivo; que a ré não procedeu à correção requerida; que a autora solicitou a intervenção da Autoridade Tributária junto da ré tendo em vista a retificação das faturas emitidas mediante emissão das notas de crédito e novas faturas em regime de autoliquidação; que, na sequência de Relatório da Autoridade Tributária, que descreve, que foi dado a conhecer à ré, veio a mesma informar que apenas se propunha corrigir a fatura nº …, de 30 de maio de 2020, no valor total de 154.398,70 €, procedendo à emissão de nova fatura n.º … em regime de autoliquidação e emitindo a nota de crédito nº ...; que a ré incumpriu a obrigação de regularização das faturas por si incorretamente emitidas; que a ré tem conhecimento dessa obrigatoriedade desde junho de 2020; que em face de tal incumprimento a autora não beneficiou do direito à dedução do imposto indevidamente liquidado e ficou numa situação de pagamento em duplicado do imposto sobre a mesma prestação de serviços.
Citada, a ré contestou sustentando a total improcedência da ação e a sua consequente absolvição dos pedidos, impugnando parte dos factos alegados, alegando que foi a autora que no dia da emissão da primeira fatura deu indicações à ré que o seu regime de IVA era misto e que para esta obra os serviços a fornecer pela ré estariam sujeitos a IVA; que no orçamento previamente emitido pela ré era feita expressa referência a que ao valor acrescia IVA; que a autora procedeu a pagamento das faturas emitidas, tendo o IVA sido liquidado à taxa de 23%; que apenas em julho de 2021 a autora pediu a alteração em causa; que o contabilista da ré emitiu parecer desfavorável; que as partes celebraram entre si um documento particular que designaram por “Acordo”, com reconhecimento das respetivas assinaturas, através do qual quiseram estipular prazo final de conclusão da empreitada da ré na obra da autora “Edifício ...”, fixando as respetivas condições de pagamento, incluindo o regime do IVA à taxa de 23%, liquidado pela autora à ré, e que esta, por sua vez, fez a respetiva entrega à Autoridade Tributária; mais alegou que a autora quer enquadrar nesse regime excecional de IVA a 6% as obras particulares realizadas nas casas do colaborador AA e da ex-mulher do gerente da autora; por fim, refere que procedeu à regularização da fatura 4 51/63, de 2020-05-30, no valor de € 154 398,70 e que todos os valores entregues pela autora e relativos às faturas em causa nos autos foram entregues aos cofres do Estado.
A autora foi notificada para, querendo, responder à matéria de exceção alegada na contestação e esclarecer se desencadeou diretamente algum procedimento com vista à obtenção da devolução de IVA pago em excesso junto da Autoridade Tributária.
A autora respondeu à contestação, reiterando a posição assumida na petição inicial.
Realizou-se audiência prévia, marcada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 591º, nº 1, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil, no âmbito da qual as partes outorgaram um acordo parcial, reduzindo a autora o seu pedido aos pontos 1, 2, 3, 5, 6 e 7 do seu petitório, obrigando-se a ré a proceder ao pagamento integral do pedido formulado no ponto 4 do mesmo petitório, no prazo de dez dias, acordo parcial que foi homologado por sentença; de seguida, após terem sido informadas que o tribunal tencionava conhecer do mérito da causa, foi facultada às partes a discussão de facto e de direito tendo sido expostos sumariamente os fundamentos para tal decisão, nomeadamente, por o direito de que a autora se arroga estar dependente da prática de ato de terceiro (a Autoridade Tributária), de a ré não ter em seu poder as quantias peticionadas e, por último, por a retificação exigida à ré ser facultativa.
Em 12 de maio de 2023 foi proferida sentença[2] que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo a ré dos pedidos formulados contra a mesma.
Em 20 de junho de 2023, inconformada com a decisão da sentença, A..., Lda. interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
“A. O presente recurso vem interposto da Sentença proferida pelo Tribunal a quo a 12.05.2023 que julgou improcedente a ação instaurada pela Recorrente e absolveu a Recorrida dos pedidos formulados contra ela.
B. O presente recurso tem por objeto a matéria de facto e a matéria de Direito.
C. Quanto à matéria de facto, o Tribunal a quo andou mal ao: (i) fixar como provado o facto de a Recorrente não ter desencadeado junto da Autoridade Tributária procedimentos com vista à obtenção da devolução do IVA indevidamente liquidado nas faturas relativas aos serviços de construção civil e pago, em excesso, à Recorrida; e (ii) ao julgar não alegado e não demonstrado um facto não controvertido e absolutamente irrelevante para os autos, a saber, a não dedução do valor de imposto pago pela Recorrente, à Ré, aqui Recorrida, nas declarações de IVA apresentadas após a emissão de faturas pelos serviços de construção civil.
D. Em primeiro lugar, entende a Recorrente encontrar-se perfeitamente demonstrado que, não obstante não ter legitimidade para desencadear procedimentos junto da Autoridade Tributária para recuperar o IVA indevidamente liquidado nas faturas e por si pago (e não deduzido) – pois que tal procedimento teria necessariamente de ser desencadeado pela própria Ré, ora Recorrida, mediante (i) retificação das faturas emitidas, (ii) recurso aos meios legais ao dispor dos contribuintes para correção das declarações periódicas entregues para os períodos a que correspondem as faturas inicialmente emitidas e (iii) pedido de reembolso do crédito de IVA originado –, desencadeou junto da Autoridade Tributária procedimentos com vista à obtenção da devolução do...
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