Acórdão nº 7604/20.3T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-06-05

Ano2023
Número Acordão7604/20.3T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 7604/20.3T8PRT.P1
4ª Secção
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto – Juiz 3

Relatora: Teresa Sá Lopes
1º Adjunto: Desembargador António Luís Carvalhão
1ª Adjunta: Desembargadora Paula Leal de Carvalho



Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1.Relatório (aproveitando o relatório efetuado na sentença):
AA intentou a presente ação declarativa de processo comum contra A... ao Domicílio, Lda. ‘formulando o seguinte pedindo:
a) Deve ser declarado que o contrato de trabalho celebrado entre autora e ré em 4/10/2019 se considera sem termo por inexistência de qualquer motivo justificativo;
b) Deve ser declarada a ilicitude de cada uma e de todas as comunicações de cessação do contrato de trabalho enviadas à trabalhadora e por essa via a ilicitude do despedimento da autora promovido pela ré, com efeitos a partir de 26/03/2020;
c) Deve a ré ser condenada na reintegração da trabalhadora no posto e funções para que foi contratada, sem prejuízo da sua categoria, antiguidade e remunerações, incluindo salários de tramitação; ou, caso a autora venha a optar,
d) Deve a ré ser condenada no pagamento de uma indemnização no valor correspondente a 3 meses de retribuição, pelo montante global de 1.537,20€;
e) Deve a ré ser condenada no pagamento de créditos e diferenças salariais relativas a:
a. Consultas de especialidade no valor de 358,50€;
b. Trabalho suplementar no valor de 193,20€;
c. Diferencial de subsídio de férias, no valor de 48,30€;
d. Diferencial de subsídio de natal, no valor de 48,30€;
e. Diferencial de férias não gozadas, no valor de 48,30€;
f) Deve a ré ser condenada a pagar à autora os juros de mora calculados à taxa legal sobre o capital em dívida desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
Para tanto, alega que, em 4/10/19, celebrou com a ré um contrato de trabalho por 6 meses, para mediante retribuição exercer as funções de veterinária, contrato que, porque não contém o motivo justificativo do termo, deve ser considerado um contrato de trabalho sem termo.
Acontece que na segunda quinzena de março de 2020, a autora recebeu 3 comunicações de cessação do contrato, entendendo que todas são ilícitas, tendo sido impedida de prestar trabalho desde 26/03/20, entendendo ter sido despedida de forma ilícita.
Noutra ordem de considerações, reclama a autora o pagamento de 32 consultas de especialidade - cujo valor unitário acordado entre as partes foi de 30€ - que não lhe foram pagas na totalidade; 120 horas de trabalho suplementar prestado nos meses de outubro, novembro, fevereiro e março e a diferença entre o valor pago a título de subsídio de férias, subsídio de Natal e férias não gozadas (630€) e o que deveria ter sido pago a esse título (774,90€), considerando que a autora cumpriu, com carácter de regularidade um horário superior em 23% ao convencionado o que deve ser considerado para efeitos de subsídio de férias, subsídio de Natal e férias.
Citada, a ré contestou, aceitando a celebração do contrato com a autora nos moldes alegados, com exceção do valor acordado das consultas de especialidade que alega ter sido 30€, mas deduzido do IVA, ou seja, 23,90€.
Alegando que a autora nunca questionou a validade do termo aposto no contrato, aceita a ré que remeteu à autora as comunicações por esta invocadas, alegando, porém, que a carta remetida no dia 30/03 foi entregue em mão à autora naquela data, antes ainda desta ter recebido a carta remetida no dia 27/03, entendendo, assim, que o contrato cessou de forma válida no período experimental.
Relativamente aos créditos laborais reclamados, impugna a ré as horas de trabalho invocadas pela autora, alegando, ainda, que foi acordado um regime de flexibilidade, tendo sido compensadas as horas que a autora trabalhou a mais com os meses em que trabalhou menos, tendo sido paga à autora todo o trabalho prestado a mais.
Foi elaborado despacho saneador, no qual foi dispensada a elaboração do objeto do litígio e dos temas de prova e foi realizada audiência de julgamento.’

A Mm.ª Juiz a quo proferiu sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a ação e, consequentemente:
a) declaro que o contrato de trabalho celebrado entre autora e ré em 4/10/2019 se considera sem termo por inexistência de qualquer motivo justificativo;
b) declarado ilícito o despedimento da autora operado pela ré através da comunicação de 27/03/2020, com efeitos a partir de 28/03/2020;
c) Condeno a ré a pagar à autora as seguintes quantias:
- a indemnização a que alude o artigo 391.º do C. Trabalho correspondente a trinta dias de retribuição base (420€) por cada ano de antiguidade ou fracção de ano, contados desde 28/03/2020 até ao trânsito em julgado desta decisão, no mínimo legal de 1.260€, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data da citação da ré até efectivo e integral pagamento; e
- as retribuições mensais que deixou de auferir desde 8/04/20 até à data do trânsito em julgado desta decisão, no valor mensal de 420€, deduzidas dos valores de subsídio de desemprego atribuído à autora naquele período, que deverão ser entregues, pela ré à Segurança Social, a que acrescem juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde data do vencimento de cada uma das retribuições até efectivo e integral pagamento (artigo 559.°, 804.°, 805.° e 806.° do Código Civil);
d) no mais, absolvo a ré do pedido.
Custas a cargo da autora e ré, em proporção do decaimento.
Notifique.”

Inconformada com esta decisão, a Ré apresentou recurso, defendendo a revogação da sentença, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões:
“a) O presente recurso restringe-se ao segmento da decisão que declarou a ilicitude do despedimento da recorrida, por incumprimento, por parte da recorrente, do procedimento previsto para o despedimento por extinção do posto de trabalho, bem como das consequências daí resultantes, nomeadamente, o pagamento da indemnização correspondente e das retribuições intercalares.
b) Entende a recorrente, com todo o respeito, que no decurso do julgamento não se verificou a aplicação devida das seguintes normas: Artigo 21° do CPT; Artigo 48° n°s. 2 e 3 do CPT Artigos 98°-B e seguintes do CPT; Artigos 27° do CPT e 6° do CPC; Artigo 186°, n° 1, alínea c) do CPC e Artigo 615°, n° 1, alíneas d) e e) do CPC.
c) A meritíssima juíza a quo, no âmbito dos seus poderes de gestão processual - artigo 27° do CPC -, deveria ter analisado os pedidos e as causas de pedir constantes da petição inicial e determinar que, à luz dos artigos 21°, 48° e 98°- B do CPT havia erro na forma de processo, considerando inepta a petição inicial, nos termos da alínea c), do n° 2, do artigo 186° do CPC, absolvendo a recorrente da instância e não o fez.
d) Não o tendo feito, todo o processo deverá ser considerado nulo, nos termos do n° 1, do artigo 186° do CPC.
e) Em resultado da indevida aplicação nas normas legais referidas, apesar de a ação ter seguido desde o seu início a forma do processo declarativo comum, a douta decisão tomada determinou a ilicitude do despedimento da recorrida por incumprimento do procedimento legalmente previsto para o despedimento por extinção do posto de trabalho, a qual só poderia ser determinada no decurso da tramitação da ação sob a forma de processo especial - Artigo 98°-B e seguintes do CPT, privando a recorrente de apresentar na sua contestação todos os elementos que seriam necessários no âmbito de uma ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento - Artigo 98°-I, n° 4, alínea a) e 98°-J do CPT.
f) Por outro lado, ao decidir desta forma, a douta decisão da meritíssima juíza a quo, trouxe um elemento de novidade à ação que permite à recorrente juntar documentos em sede de recurso - artigo 651°, n° 1, parte final -, de modo a que existam as condições necessárias à justa composição do litígio.
g) A recorrida escolheu a forma de processo declarativo comum porque sabia, tendo conhecimento direto dos factos, que a carta que recebera a comunicar a cessação do contrato por extinção do posto de trabalho, datada de 27 de março de 2020, fora a última que recebera, em termos cronológicos, pelo que a que lhe fora entregue em mão, datada de dia 30 de março de 2020 e entregue no próprio dia, enquanto declaração recetícia, fora eficaz, produzindo os efeitos que lhe foram comunicados, tornando irrelevante a carta que apesar de datada de 27 de março só rececionou no dia 31 de março de 2021, conforme demonstrado pelo documento que se junta sob o n° 1 ao abrigo do previsto na parte final do n° 1, do artigo 651° do CPC.
h) Ao decidir como decidiu, a meritíssima juíza a quo conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, o que constitui um caso de nulidade da sentença, nos termos da parte final da alínea d), do n° 1, do artigo 615° do CPC.
i) Para além disso, a recorrente entende, com todo o respeito que a meritíssima juíza condenou a recorrente em objeto diverso do pedido, o que também constitui uma nulidade da sentença, nos termos da alínea e), do n° 1, do artigo 615° do CPC.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., que expressamente se invoca, deverá:
1. Ser considerado nulo todo o processo, por ineptidão da petição inicial e absolvida a recorrente da instância;
2. Quando assim se não entenda, o que apenas por dever de patrocínio se admite, deverá ser considerada nula a sentença por ter conhecido questões de que não podia tomar conhecimento, bem como, por ter condenado a recorrente em objeto diverso do pedido;
3. Quando assim se não entenda, o que apenas por dever de patrocínio se admite, deverá: i) considerar-se que ao decidir pela ilicitude do despedimento por incumprimento do procedimento legal para a extinção do posto de trabalho, a meritíssima juíza a quo introduziu um novo elemento no processo que tornou necessária a junção do
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