Acórdão nº 7218/22.3T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2024-04-04

Ano2024
Número Acordão7218/22.3T8BRG.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

Comissão de Trabalhadores da EMP01..., S.A., com os demais sinais nos autos, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra EMP01..., S.A., também nos autos melhor identificada, pedindo que o Tribunal:

- declare que o gozo de dias de férias e feriados pelos trabalhadores abrange o período das 0 h às 24 h de cada um desses dias;
- condene a ré a reconhecer que o gozo de dias de férias e feriados, pelos trabalhadores do 5.º turno, abrange o período das 0 h às 24 h de cada um desses dias;
- condene a ré a reconhecer a Sexta-Feira Santa como dia feriado obrigatório a gozar pelos trabalhadores do 5.º turno;
- condene a ré a reconhecer que o trabalho prestado e a prestar pelos trabalhadores do 5.º turno, no período das 0 h às 6 h dos dias de férias e dias feriados, bem como na Sexta-Feira Santa, constitui trabalho suplementar, com direito a descanso compensatório e à retribuição especial prevista na lei laboral.

Alega para tanto, e conforme síntese na decisão recorrida, que a ré exerce a sua indústria no regime de laboração por turnos de trabalhadores, previsto nos arts. 220.º e ss. do Cód. Trabalho, i.e., mediante a organização do trabalho em equipa, em que os trabalhadores ocupam sucessivamente os mesmos postos de trabalho, a um determinado ritmo, sempre no mesmo horário de trabalho ou em horários de trabalho que se alteram periodicamente.
Um desses turnos é o denominado “5.º Turno” ou “5.º Turno Parcial”, cujo horário de trabalho abrange os períodos descritos em 9.º da petição.
Nas negociações prévias à elaboração do mapa de férias para 2022, a A. e a R. não alcançaram acordo, a A. recebeu a 12.01.2022 da R. uma comunicação escrita a informar da elaboração do mapa de férias do referido turno, que remeteu para efeitos de consulta, após o que a A. se pronunciou, ao abrigo do n.º 2 do art. 241.º do Código do Trabalho, em sentido desfavorável, mantendo a ré aquele sem atender às razões apresentadas.
No mapa de férias elaborado pela ré, verifica-se que existem férias marcadas para os dias 30 de Julho e 24 de Dezembro, em que os trabalhadores prestam serviço desde o dia de véspera até às 6 horas desses dias, pelo que esses dias não podem ser contabilizados como férias, já que por “dia de férias” entende-se o período inteiro entre as 0 horas e as 24 horas de um dia.
Com efeito, se forem considerados como férias, os trabalhadores, em vez de gozarem 24 horas de descanso, gozarão apenas 18 horas por dia, ou seja, perderão 6 horas de férias em cada um dos referidos dias. Só se os trabalhadores iniciarem o gozo de férias às 0 horas dos dias 30 de Julho e 24 de Dezembro, e não às 6 horas dos mesmos dias, é que se poderá considerar gozado um dia de férias.
No mapa elaborado pela ré constata-se que a Sexta-Feira Santa, dia 15 de Abril, não surge contemplada. A ré fixou a segunda-feira após a Páscoa, dia 18 de Abril, como feriado substitutivo daquele, contudo, esta possibilidade depende do acordo dos trabalhadores, o que não ocorreu, tanto mais que para os trabalhadores que professam o Catolicismo (larga maioria dos trabalhadores da ré), a Sexta-Feira Santa é o mais importante dia da Páscoa a seguir ao Domingo de Páscoa.
Também no mapa de ferias elaborado pela ré os dias 17 de Abril (Domingo de Páscoa), 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 24 de Junho (feriado municipal de S. João), os trabalhadores do 5.º turno parcial, porque o seu horário se inicia na noite de um dia e se prolonga pela madrugada do dia seguinte, são forçados a desempenhar a sua actividade durante as primeiras seis horas dos feriados apontados.
E nos dias 16 de Junho (Corpo de Deus), 1 e 8 de Dezembro, os trabalhadores são obrigados a exercer a sua actividade das 23 h às 24 h desses feriados.
Ora, nos dias de feriado deve entender-se que os trabalhadores estão legalmente dispensados de prestar serviço entre as 0 horas e as 24 horas desses dias, já que o exercício da actividade laboral, ainda que por algumas horas de um dia feriado, acaba por frustrar o gozo de um feriado inteiro.
Considerando que nos dias de férias e nos dias feriados os trabalhadores não estão obrigados a prestar serviço, a actividade por eles desempenhada nesses dias, por ordem da ré, no período das 0 h às 6 h e na Sexta-Feira Santa, constitui trabalho suplementar, o que lhes confere direito a descanso compensatório, previsto no art. 229.º do Cód. Trabalho, e à remuneração específica dos arts. 268.º e 269.º do mesmo código.

Tendo-se realizado audiência de partes, malogrou-se a conciliação.

A ré apresentou a sua contestação alegando, em suma, que na sua área de produção vigora um sistema de turnos encadeados, por forma a garantir a continuidade da laboração, os quais se encontram organizados da seguinte forma: 1.º turno fixo (das 06h00 às 14h30, de 2ª a 6ª); 2.º turno fixo (das 14h30 às 23h00, de 2ª a 6ª); 3.º turno fixo (das 22h30 às 7h00, de 2ª a Sábado); 3.º turno parcial (das 23h00 às 6h00, de 2ª a 5ª, e das 23h00 às 08h30 à 6ª); 4.º turno parcial (das 23h00 às 6h00, de 2ª a 4ª e das 06h00 às 15h30 no Sábado e Domingo); 5.º turno parcial (5ª e 6ª das 23h00 às 6h00 e Sábado e Domingo das 19h30 às 06h00); 9.º turno parcial (2º, 3ª e Domingo das 22h30 às 07h00 e sábado das 22h30 às 08h00); laboração contínua (4 turnos sujeitos a uma escala rotativa nas 52 semanas do ano).
Para além dos horários/turnos acima referidos (atribuídos aos chamados “trabalhadores directos”), vigora ainda para os “trabalhadores indirectos” (administrativos), os chamados internamente “horário de escritório” (das 08h30 às 17h30), “horário normal” (das 07h30 às 16h30) e o “horário flexível” (das 07h00 às 20h00, com presença obrigatória entre as 09h00 e as 11h30).
Relativamente aos trabalhadores a tempo parcial (como é o caso dos trabalhadores do 5º turno parcial), alegou que, salvaguardados os respectivos dias de descanso semanal (no caso, 3ª e 4ª feira) - nos quais não pode ter início o período de férias - e o acordo/limites da marcação de férias interpoladas, as férias podem ser marcadas em qualquer um dos restantes dias, ainda que alguns desses dias sejam “dias de não trabalho” (como sucede, no caso dos trabalhadores do 5º turno parcial, com a segunda-feira).
Com efeito, a contagem do período de férias dos trabalhadores a tempo parcial deve ser feita por colagem ao calendário, ou seja, mesmo que o trabalhador só trabalhe 5ª, 6ª, sábado e domingo (como é o caso dos trabalhadores do 5º turno parcial), do seu período de férias descontam-se apenas os dias de descanso semanal (3ª e 4ª feira), e já não o “dia de não trabalho” (2ª feira), que integra o referido período.
Em segundo lugar, no caso concreto dos trabalhadores do 5º turno parcial, a jornada de trabalho/período normal de trabalho diário de 5.ª feira tem início às 23h00 e termina às 06h00 do dia seguinte (sexta); e a jornada de trabalho/período normal de trabalho diário de 6ª feira tem início às 23h00 e termina às 06h00 do dia seguinte (sábado); a jornada de trabalho/período normal de trabalho diário de sábado tem início às 19h30 e termina às 06h00 do dia seguinte (domingo); a jornada de trabalho /período normal de trabalho diário de domingo tem início às 19h30 e termina às 06h00 do dia seguinte (segunda). Se a jornada de trabalho de sábado começa às 19h30 e termina às 06h00 do dia seguinte, o correspondente dia de férias tem de abranger esse mesmo período, pelo que o dia de férias 30.07.2022 e 24.12.2022 (sábados) inicia-se às 19h30 de sábado e termina às 06h00 do dia seguinte (domingo), independentemente de este ser ou não dia de trabalho, ou seja, apesar de o dia de férias ser o sábado o trabalhador também não trabalha das 00h00 às 06h00 de Domingo.
E assim é, pelas mesmas razões, quanto aos feriados de 17.04.2022 (Domingo de Páscoa); 25.04.2022 (Segunda-feira – Dia da Liberdade); 01.05.2022 (Domingo – Dia do trabalhador); 10.06.2022 (Sexta-feira – Dia de Portugal); de 16.06.2022 (Quinta-feira - Corpo de Deus); 24.06.2022 (Sexta-feira – S. João); 01.12.2022 (Quinta-feira – Dia da Restauração) e 08.12.2022 (Quinta-feira – Dia da Imaculada Conceição).
Se considerássemos (como pretende a autora) que os trabalhadores devem gozar o feriado das 0h às 24h de domingo, isso implicaria que a jornada de trabalho dos sábados que antecede esses feriados (de 14.04.2022 e 30.04.2022), e que se inicia às 19h30, ficaria reduzida a 4h (das 19h30 às 24h00), uma vez que os trabalhadores a partir da 00h00 de domingo (feriado) já não trabalhariam.
Sendo que, se assim se entendesse, também teria de se entender que:
- nos feriados às 5ª feiras, cuja jornada se inicia às 23h e termina às 06h de sexta, o feriado do trabalhador resumir-se- ia a 1 hora (das 23h00 às 24h00) e teria de vir trabalhar das 00h00 às 06h00 de sexta (visto já não ser feriado);
- nos feriados às 6ª feiras, cuja jornada se inicia às 23h e termina às 06h de sábado, o feriado do trabalhador resumir-se- ia a 1 hora (das 23h00 às 24h00) e teria de vir trabalhar das 00h00 às 06h00 de sábado (visto já não ser feriado);
- nos feriados aos sábados, cuja jornada se inicia às 19h30 e termina às 06h de domingo, o feriado do trabalhador resumir-se-ia a 4,5 hora (das 19h30 às 24h00) e teria de vir trabalhar das 00h00 às 06h00 de domingo (visto já não ser feriado).
Nos feriados de junho e dezembro ocorridos às 5ª e 6ª feiras – em que a jornada inicia às 23h00 e termina às 06h00 (de 6ª e sábado, respectivamente) – se a regra fosse a pretendida (gozo do feriado das 0h às 24h), tal implicaria que nesses dias o trabalhador só estaria dispensado de trabalhar uma hora da jornada (das 23h00 às 24h00), e teria de trabalhar as restantes horas (das 0h às 6h do dia seguinte).
Quanto à substituição do feriado obrigatório “Sexta-feira Santa” (15/04/2022) pelo dia 18/04/2022 (Segunda-feira após o Domingo de Páscoa), a...

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