Acórdão nº 720/21.6T8OAZ-F.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-03-07

Data de Julgamento07 Março 2022
Ano2022
Número Acordão720/21.6T8OAZ-F.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 720/21.6.TOAZ-F.P1. - Apelação
Juízo de Comércio de Oliveira de Azeméis – Juiz 2.
Relator: Des. Jorge Seabra
1º Juiz Adjunto: Desembargador Pedro Damião e Cunha
2º Juiz Adjunto: Desembargadora Maria de Fátima Andrade
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Sumário:
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Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO:
1. Nos autos de insolvência por apresentação (pessoa singulares) – AA e BB - foi oportunamente nomeado como Administrador de Insolvência o Sr. Dr. CC.
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2. No decurso dos autos e no que ora releva, veio a credora “ C..., SA “, mediante articulado sob a referência n.º 40376862, requerer, ao abrigo do preceituado no artigo 56º, do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (adiante designado por CIRE), a destituição com justa causa do Sr. Administrador nomeado, invocando, para efeitos de acolhimento daquela sua pretensão, em síntese, que o Sr. Administrador procedeu a errónea avaliação das verbas/imóveis (2) apreendidos em favor da massa insolvente, que o mesmo tem actuado no decurso do processo em conluio com os próprios insolventes, que não procedeu à apreensão em favor da massa insolvente de rendimentos obtidos pelos insolventes a partir do seu património imobiliário apreendido nos autos (rendas), que não procedeu também à apreensão a favor da massa de três fornos e duas arcas frigoríficas pertencentes aos insolventes, bem como, ainda, apesar de instado por várias vezes, não procedeu também à resolução em favor da massa insolvente do negócio de venda do veículo automóvel (melhor descrito nos autos) pertencente aos insolventes e efectuada pelos mesmos em favor da sua filha, à resolução da venda também levada cabo pelos mesmos de um dos seus imóveis em favor do seu filho e nora e, ainda, à resolução da partilha efectuada por óbito dos pais da insolvente mulher, actuando, assim, em prejuízo e detrimento da satisfação dos interesses dos credores da insolvência e revelando não estar, face à sua aludida conduta, em condições de continuar a desempenhar o dito cargo no presente processo de insolvência.
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3. Cumprido o contraditório, veio o Sr. Administrador responder pugnando pela improcedência da pretensão da credora/requerente, posição esta que veio a ser secundada no processo pelo Digno Magistrado do Ministério Público e, ainda, pelos próprios insolventes.
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4. Nesta sequência, veio então a ser proferido despacho a 29.11.2021, com a referência n.º 118942197, em que decretou o Tribunal a destituição do Sr. Administrador acima referido com justa causa e procedeu, em sua substituição, à nomeação de novo Administrador de Insolvência.
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5. Inconformado com tal decisão, veio o Sr. Administrador interpor recurso de apelação, que foi admitido, deduzindo alegações e apresentando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES
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Nestes termos e nos mais de Direito, requer-se a V. Exas. que:
Seja concedido provimento ao presente recurso, nos termos e pelos fundamentos supra descritos, e em consequência: - que seja revogado o douto Despacho proferido pelo Tribunal a quo, revogando-se a destituição do Apelante das funções de Administrador da Insolvência.
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6. De acordo com os elementos consultados, não foram apresentadas contra-alegações ao recurso.
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7. Foram observados os vistos legais.
Cumpre decidir.
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II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não sendo lícito a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas se mostrem de conhecimento oficioso – artigos 635º, n.º 4, 637º, n.º 2, 1ª parte e 639º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013 de 26.06 [doravante designado apenas por CPC].
Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes em 1ª instância e ali apreciadas, sendo que a instância recursiva, ao nível do recurso de apelação não se destina ao conhecimento de novas questões e à prolação de novas decisões mas ao reexame ou à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias, em função das questões ali convocadas pelas partes. [1]
Neste enquadramento jurídico e no seguimento de tais princípios, em função das conclusões recursivas do recorrente e que delimitam, como se disse, o objecto do recurso, a única questão a dirimir é apenas a de saber se ocorrem os pressupostos erigidos por lei para a decretada destituição com justa causa do Sr. Administrador de Insolvência.
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III. FUNDAMENTOS de FACTO:
Para efeitos decisórios relevam as circunstâncias constantes do relatório que antecede e, ainda, outros elementos de facto extraídos dos autos (requerimentos deduzidos nos autos, seja nos autos principais de insolvência, seja nos demais apensos e a que tivemos acesso por consulta electrónica dos mesmos, assim como documentos que constam dos autos), elementos estes a que se fará expressa menção na fundamentação da decisão a proferir nesta instância, sendo certo que os mesmos deveriam ter sido feitos constar pelo Tribunal de 1ª instância na decisão ora recorrida, em obediência ao preceituado no artigo 607º, n.º 4, do CPC.
Com efeito, é de dizer, em termos elementares, que em qualquer despacho judicial deve o juiz do processo dele fazer constar o elenco dos factos provados a que posteriormente aplica o quadro legal tido por pertinente à solução do litígio, pois que, como é consabido, a total ausência de tal quadro factual no acto decisório, importa na sua nulidade por falta de fundamentação de facto.
Aliás, este quadro factual é relevante não apenas para a parte no processo, nomeadamente para a sua compreensão/aceitação do mérito da decisão proferida ou, para, se o for o caso, dela recorrer de forma séria e sustentada, assim como para o próprio tribunal hierarquicamente superior, em caso de recurso, aferir do mérito ou bondade adjectiva/substantiva da decisão proferida e, em particular, para reapreciar do bom fundamento da subsunção jurídica levada a cabo pelo Tribunal de 1ª instância, sendo certo que, regra geral, o quadro factual determina em boa parte a solução jurídica do litígio.
No caso dos autos, com o devido respeito, é o que se verifica na decisão recorrida (que omite totalmente qualquer quadro factual), ainda que tal vício não se mostre invocado pelo recorrente no âmbito do presente recurso, nos termos e para efeitos do preceituado no artigo 615º, n.º 1, alínea b), do CPC.
De todo o modo, apesar da nulidade por falta de fundamentação de facto não ter sido invocada (o que afasta a possibilidade do seu conhecimento por este Tribunal, pois que a mesma não é conhecimento oficioso e deve ser invocada pelo recorrente nos termos previstos no artigo 615º, n.º 4, do CPC), atento o princípio que subjaz à regra da substituição do tribunal recorrido prevista no artigo 665º, n.º 1, do CPC, proceder-se-á à menção dos factos que relevam à decisão da questão de direito suscitada no recurso e à medida que os mesmos se nos mostrem pertinentes para confirmar ou infirmar a fundamentação jurídica expendida no despacho recorrido e colocada em crise pelo recorrente
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IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Conforme resulta dos termos do recurso, definidos quanto ao seu objecto pelas respectivas conclusões, a questão essencial a dirimir consiste na reapreciação do mérito da decisão que decretou a destituição com justa causa do Sr. Administrador nomeado, sendo que, segundo este último, este fundamento não se verifica.
Nesta sede, releva, em primeiro lugar, circunscrever a exacta questão que se mostra colocada no recurso interposto, pois que, para além do fundamento que veio a ser acolhido no despacho recorrido para efeitos de dar por verificada a justa causa de destituição do Sr. Administrador, outros fundamentos foram também invocados pelo credor “ C..., SA “ para aquele efeito e estes foram já afastados, em termos definitivos, pelo despacho recorrido.
Com efeito, como evidencia o requerimento deduzido nos autos pelo credor para efeitos de destituição do Sr. Administrador oportunamente nomeado, o mesmo credor invocou, além da omissão da resolução em favor da massa dos negócios jurídicos realizados pelos insolventes e que atinam com a alienação de vários bens dos insolventes (móveis e imóveis) e com a outorga por parte da insolvente mulher na partilha do bens (imóveis) deixados por óbito de seus pais (artigos 120º e 121º, do CIRE), a incorrecta avaliação de verbas apreendidas para a massa, a realização e apresentação nos autos principais e seus apensos de relatórios “ falseados “ e, ainda, ausência de apreensão para a massa de rendimentos prediais auferidos pelos insolventes e, ainda, de outros bens móveis aos mesmos pertencentes, em concreto três fornos e duas arcas frigoríficas.
Sucede, no entanto, que todos os ditos fundamentos
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