Acórdão nº 70186/21.2YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2022-04-28

Ano2022
Número Acordão70186/21.2YIPRT.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

Hugo Rodrigues Unipessoal, Lda. apresentou requerimento de injunção contra Algarvelux, S.A. para dela haver a quantia global de 64.933,20€.
Invocou, em síntese, que: celebrou com a requerida diversos contratos de empreitada (a requerente refere como data do contrato 20.9.10), por via dos quais efectuou vários trabalhos de construção civil; conforme acordado entre ambas, em cada factura apresentada pela requerente (entre 29.9.10 e 5.5.14), a requerida retinha uma parte a título de caução; a requerente tinha/tem direito a haver os valores retidos – no total de 49.842,90€ - 5 anos após a entrega das obras; não obstante ter solicitado por diversas vezes o pagamento, a requerida nada pagou; os juros de mora montam a 14.437,30€.
A requerida deduziu oposição, dizendo, em resumo, que: o requerimento é inepto, porquanto a requerente não alegou os factos essenciais constitutivos do seu direito, assim faltando a causa de pedir; pretendendo a requerente a restituição de quantias retidas a título de caução – e não o pagamento de serviços ou de bens – o procedimento de injunção não é o meio próprio para tal; e não é o meio adequado, dado que a problemática subjacente é complexa, prendendo-se com a não finalização dos trabalhos ou com a existência de defeitos. Caso não fosse absolvida da instância, a requerida invocou: terem sido celebrados entre as partes contratos de empreitada em 2010 e 2011; ter sido combinado que a retenção de 5% do valor de cada pagamento mensal se destinava a garantir o pontual cumprimento dos contratos até à recepção definitiva das obras; em Junho de 2013, a requerida comunicou à requerente os trabalhos ainda por concluir e os defeitos a corrigir; a requerente abandonou a obra e nada mais disse ou fez; a obrigação de devolver as quantias retidas não se venceu, pelo que há lugar à absolvição do pedido.
O tribunal julgou verificada a excepção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção, absolvendo a ré da instância.

A autora interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
1.ª Decorre do disposto no artigo 2º, nº 1, do Dec.-Lei nº 62/2013, que o procedimento de injunção se aplica “a todos os pagamentos efectuados como remuneração de transacções comerciais”;
2.ª A al. b) do art. 3º do citado diploma legal define “transacção comercial” como sendo a transacção entre empresas destinada ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração;
3.ª No caso vertente, a A. peticionou o pagamento do remanescente das facturas que identificou e que emitiu na sequência de serviços/trabalhos que prestou à R. no âmbito de contratos de empreitada que com ela celebrou;
4.ª A R. bem entendeu o que lhe era pedido e identificou mesmo os contratos de empreitada em causa;
5.ª A. e R. são sociedades comerciais;
6.ª Assim, ao contrário do decidido, em violação dos anteditos ditames legais, estão reunidas as condições legais para a utilização do procedimento de injunção, tal como fez a recorrente;
7.ª Sendo certo que a alegada (e não demonstrada) complexidade da causa não pode obstar à utilização do procedimento de injunção, por tal interpretação do regime legal carecer de fundamento;
8.ª Sendo certo, por último, que tais questões alegadamente impeditivas da utilização do procedimento de injunção, estão ultrapassadas, uma vez que foi proferido despacho a transmutar o procedimento de injunção em processo comum;
9.ª O procedimento de injunção utilizado pela recorrente conforma-se com as disposições do artigo 7º do regime anexo do Decreto-Lei nº 269/98 e artigos 2º e 10º, nº 1, do Decreto-Lei nº 62/2013, ajustando-se os fundamentos substantivos da sua pretensão a tal procedimento de injunção;
10.ª Tudo razões para julgar procedente o presente recurso de apelação e em consequência revogar-se a decisão recorrida,
prosseguindo os autos os seus ulteriores termos.

A ré apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:
a) A Recorrente impugna a Douta Sentença que julgou procedente a exceção inominada de uso indevido do procedimento de injunção e absolveu a Ré, aqui Recorrida, da instância, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 676.º do CPC;
b) Sem razão, uma vez que a Sentença fez uma aplicação criteriosa do Direito, não merecendo qualquer censura, motivo pelo qual deve ser confirmada por este Venerado Tribunal;
c) Com efeito, a Recorrente alega que em cada fatura a Recorrida efetuava uma retenção do valor total a titulo de caução, tendo direito à sua libertação ao fim de cinco (5) anos a contar da data da entrega das obras;
d) Logo, a Recorrente não veio pedir ao Tribunal a quo o pagamento do preço devido pelos serviços prestados no âmbito das empreitadas de construção civil, mas sim a libertação de uma caução destinada a garantir, nomeadamente, a reparação de defeitos dessa obra que pudessem vir a ser detetados durante o período de garantia;
e) É essa a causa de pedir trazida pela Recorrente no requerimento de injunção, consistindo o objeto do litigio em determinar se há defeitos nas obras realizadas pela Recorrente, e se, em função da factualidade que se provar sobre essa matéria, a Recorrente tem direito a receber a quantia peticionada de € 64.933,20;
f) Tal objeto do litigio não se enquadra na noção de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, que legitima o recurso ao procedimento de injunção nos termos Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio;
g) Acresce que, como é referido, e bem, na Sentença impugnada pela Recorrente, o procedimento de injunção é caracterizado pela sua simplicidade e celeridade, estando, por isso, vocacionado para a cobrança simples de dívidas;
h) É certo que, atento o valor da ação, a tramitação subsequente será a do processo declarativo comum, porém, a fase dos articulados já terminou e foi moldada à luz das normas que regulam o procedimento de injunção, manifestamente diferentes daquelas que regulam o processo declarativo comum e prescritas visando a referida simplicidade pressuposta pelo legislador;
i) Nestas circunstâncias, é inadmissível que possa prosseguir uma ação que nasceu “coxa”, por não ser adequada a discutir e decidir os defeitos das empreitadas e a eventual obrigação de restituir a caução, só porque a Recorrente quis “fintar” as regras processuais que lhe impunham o recurso ao processo declarativo comum, e apostar num procedimento que lhe poderia, em certas condições, garantir um titulo executivo rapidamente;
j) Afigura-se, assim, manifesto que o procedimento de Injunção não constitui o meio adequado para peticionar e discutir os defeitos e a obrigação de libertação da caução;
k) Ao contrário do que é alegado pela Recorrente, o facto
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