Acórdão nº 6817/20.2T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Ano2022
Número Acordão6817/20.2T8VNF.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

1. Relatório

H. C. intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra X – Indústria de Pneus, S.A., pedindo que:

a) seja declarada a ilegalidade e ilicitude da actuação da ré ao alterar as funções e tarefas que o autor desempenhava até 23 de Julho de 2020;
b) seja a ré condenada a recolocar o autor no posto de trabalho e no mesmo departamento e sector que vinha mantendo desde 2000 até 23 de Julho de 2020, com as inerentes tarefas e funções que aí desempenhava, como técnico de produção I, com as tarefas específicas de rectificador de fieiras;
c) seja a ré condenada a abster-se de ordenar ao autor a execução de tarefas não compatíveis e não ligadas funcionalmente àquelas funções;
d) seja a ré condenada a pagar ao autor as quantias devidas a título de subsídio de turno e prémio de produtividade, no valor mensal de 543,44 €, o que perfaz o montante vencido de 1.630,32 € correspondente aos meses de Setembro, Outubro e Novembro, bem como as que, a tais títulos, se vencerem na pendência dos autos.

Para tanto, alega que foi admitido pela ré em 1/11/2000 para exercer as funções de técnico de produção ou técnico de manutenção de tooling, com as tarefas específicas de rectificador de fieiras, funções que vem exercendo mediante a retribuição base de 1.460,00 €, a que acresce subsídio de turno e de flexibilidade, tendo auferido, a esse título, no ano de 2019, o valor mensal de 543,44 €.
Acontece que, depois de ter estado de baixa médica, o autor foi colocado pela ré, contra a sua vontade, a exercer outras funções, diferentes das que vinha desempenhando, inferiores em termos hierárquicos e com diminuição de rendimentos, já que a ré deixou de lhe pagar o subsídio de turno e prémio de produtividade/flexibilidade.
A ré contestou, aceitando o contrato celebrado, mas alegando que o autor foi contratado para exercer as funções inerentes à categoria de semi-especializado, exercendo, desde 1/11/2000, as funções de serralheiro de 3.ª; em 2002, desempenhou funções de apoio técnico à produção, que asseguram por meio da sua intervenção nos processos e ferramentas específicas da indústria de pneus – “toolling” que as máquinas se mantêm em boas condições de funcionamento e produção; e apenas desde 2002 a 2020 exerceu as funções de rectificador de fieiras, cinco dias por semana, podendo ser integrado em regime de turnos rotativos, manutenção preventiva ou fim de semana.
Sucede que o autor manifestou vontade de deixar de trabalhar com a sua chefia e no horário geral e até noutro Departamento, tendo a ré proposto ao autor que passasse a desempenhar as funções de técnico de tooling, em regime geral, sem turnos, o que o autor embora sem dar o seu acordo passou a desempenhar.
Relativamente ao subsídio de turno, alega a ré que o autor deixou de prestar trabalho em turnos, daí não receber tal valor, sendo que a ré propôs ao autor exercer aquelas funções em regime de dois turnos rotativos, ao que o autor não acedeu.
Quanto ao prémio de produção, invoca a ré que o mesmo apenas é pago aos trabalhadores que desempenham funções consideradas internamente como incorporando valor no processo produtivo, o que acontecia quando o autor desempenhava funções de “rectificados de fieiras”, mas não é devido para quem desempenha funções de “técnico de tooling”.

Foi proferido despacho saneador e foi realizada audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, que termina com o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, julgo procedente a ação e, consequentemente:
a) Declaro ilegal e ilícita a actuação da ré em alterar as funções e tarefas que o autor desempenhava até 26 de Julho de 2020;
b) Condeno a ré a recolocar o autor no posto de trabalho e no mesmo departamento que vinha mantendo desde 2002 até 26/07/2020, com as inerentes tarefas e funções que aí desempenhava como técnico de produção I, com as tarefas específicas de rectificador de fieiras;
c) Condeno a ré a abster-se de ordenar ao autor a execução de tarefas não compatíveis e não ligadas funcionalmente àquelas funções; e
d) Condeno a ré a pagar ao autor a média mensal de subsídio de turno e prémio de produção no valor de 543,44€, desde Setembro de 2020 até à recolocação referida em b).
Custas pela ré.»

A ré veio interpor recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:

«a) A sentença deve ser revogada, e, em consequência a ação ser julgada totalmente improcedente.
b) A prova produzida – testemunhal e documental, e a sua correta apreciação, deveriam ter levado o Tribunal a dar como provados fatos que decorreram da discussão, e da prova produzida e com interesse para a decisão da causa, e que o não foram, e foram dados como provados fatos que se não se provaram, pelo que a decisão da matéria de facto deve ser alterada.
c) A decisão de direito, e mesmo que não seja alterada a decisão de fato, limitada à parte em que condenou os Recorrentes, fez inexata apreciação dos fatos, e deles não retirou as ilações que deles resultam, e errada interpretação e aplicação da lei, violando nomeadamente o disposto nos artºs 72 do CPT, e os artºs 115, 118, nºs 1, 2 e 3, 120 e 212 do Código do Trabalho, bem como da cláusula 9 do contrato individual de trabalho, e, clausula 28, nº 6 do CCT para a indústria química (2007).
d) alteração de funções do autor determinada pela ré::
- ocorreu num quadro de divergência do Autor com a chefia direta, acerca da sua avaliação – J. V.;
- para execução de tarefas e funções no mesmo departamento – DAPT – Departamento Técnico de Apoio à Produção, e sob supervisão do mesmo Chefe de Departamento – B. F., embora de seção diferente;
- para execução de funções e tarefas, na mesma área de especialização técnica do autor – serralharia e mecânica;
- para execução de tarefas de mesmo nível hierárquico, no citado Departamento;
- sem redução de remuneração base, embora para função sem prémio de produção;
- com atribuição de diferente horário de trabalho, determinado em função das necessidades de serviço e de acordo com a lei, com a contratação coletiva aplicável, e com o contrato individual de trabalho;
pelo que a atuação da ré foi lícita.
e) Mesmo que se entenda, o que não se concede, que o autor não pode ter na ré outra função ou tarefa que não seja a de “técnico de fieiras”, sempre tem a ré o direito de por razões de organização, alterar o horário do trabalhadores, colocando-os no designado horário geral – das 08h às 16h (menos penoso para os trabalhadores), e por isso deixar de lhes pagar o correspondente subsidio de turno, pelo que sempre a condenação no pagamento ao autor do subsídio de turno, tendo este sido colocado a trablhador no horário geral, é manifestamente violadora da lei, da regulamentação coletiva aplicável, e do contrato individual do trabalho.
f) A prova produzida – testemunhal, e a sua correta apreciação, deveriam ter levado o Tribunal a dar como provados fatos que decorreram da discussão, e da prova produzida e com interesse para a decisão da causa, e que o não foram, e foram dados como provados fatos que se não se provaram, pelo que a decisão da matéria de fato deve ser alterada e aditada.
g) De acordo com a prova testemunhal produzida, entende-se que deve ser aditado ao facto provado F):
- “…A avaliação, após junho de 2010, foi feita pela chefia do Autor – Engº R. P., que disse que o Autor nunca foi um elemento que se destacasse, mas teve sempre aproveitamento e sempre esteve apto para a função, existindo outros retificadores com desempenho superior”.
h) No que respeita aos factos provados relativos às função de “retificador de fieiras” e de “técnico de tooling”, e, por isso, era necessário conhecer a natureza das funções de retificador de fieiras e de técnico de tooling, sendo que atenta a prova produzida, devem ser aditados novos fatos provados, ao abrigo do artº 72 do CPT, que respeitam aos conhecimentos técnicos e habilitações de base dos trabalhadores que exercem essas funções retificador de fieiras e do técnico de tooling, da natureza da função na organização da ré, bem como da repercussão de cada umas dessas atividades nos produtos produzidos, que resultaram da prova produzida e foram objeto de discussão;
i) O facto provado R) deve ser alterado pois é pouco claro e preciso, e não é verdade, e por isso não pode dar-se como provado que o autor fizesse programação ou computação, entendida esta como criação de programa informático para operar a máquina, e não é inteligível, o que se quer dizer com computação de máquinas de CNC, pelo que não pode tal dar-se como provado, sendo inequívoco que o autor, não tinha quaisquer conhecimentos de informática, para além de noções básicas de excel (como referiu), e não tinha conhecimentos de programação e ou computação, como muito poucos tinham na ré.
j) Na verdade, o autor utilizava e operava a máquina CNC, não necessitando de ter conhecimentos de computação ou programação, que aliás não tinha, antes tendo que saber utilizar a máquina, através do seu teclado onde escolhe as diversas operações a realizar, de acordo com o programa existente na máquina.
k) Isto é, utilizando a máquina como se utiliza normalmente um computador, de acordo com o programa que se está a utilizar, mas não introduzindo programas, ou alterando programas, nem efetuando computação.
l) Essencialmente, quer a função de técnico de tooling, quer a função de retificador de fieiras, requerem de base conhecimentos de mecânica e metalomecânica, e estão integradas no departamento de apoio técnico à produção – em geral, fazendo manutenção e reparação de peças para as máquinas: incluindo a manutenção preventiva e a intervenção em caso de avaria das máquinas de construção de pneus, mas incluindo também a preparação das fieiras, e retificação das fieiras que permite fazer os pisos (e que necessitam de ter fieiras abertas, e depois de verem as fieiras ser retificadas quando surgem problema na produção).
m)...

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