Acórdão nº 6783/22.0T8SNT.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-09-15

Data de Julgamento15 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão6783/22.0T8SNT.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 6.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I-RELATÓRIO
Construções … S.A. intentou o presente procedimento cautelar comum, sem audiência dos requeridos, contra:
P.. e Outros, todos melhor identificados nos autos, pedindo que, sem audiência prévia dos requeridos, se determine que estes se abstenham de praticar actos que visem a alienação do imóvel objecto de contrato promessa celebrado.
Alega, para tanto, em síntese, o seguinte:
A Requerente celebrou com os Requeridos, em 3 de Julho de 2019, um contrato promessa de compra e venda de uma parcela de terreno, com a área aproximada de 15 665,31 m2, a destacar do prédio …..com a perspectiva de vir a construir na mesma um supermercado com a área de 2500 m2. Ficou estipulado que a escritura de compra e venda se realizaria, no prazo de 30 dias após a recepção do ofício camarário a autorizar o pagamento das taxas para emissão da licença de construção do supermercado ou dentro do prazo máximo de 2 anos contados a partir da data da assinatura do contrato ou ainda 6 meses após a publicação em DR do PDM de Sintra.
Ficou ainda estipulado que “o presente contrato considerar-se-á imediata e automaticamente revogado quando esgotados todos os prazos previstos no n.º 1, cláusula 4.ª” ou “independentemente de qualquer prazo, logo que seja recepcionada qualquer comunicação camarária que, com carácter definitivo, informe a inviabilidade de aprovação da construção do pretendido supermercado”.;
Sucede que até ao momento da propositura da providência, não foi recepcionado qualquer ofício a autorizar o pagamento das taxas para emissão da licença, pelo que não se considera que o mencionado prazo de 30 dias se encontre ultrapassado.
De igual forma não foi recepcionada qualquer comunicação com carácter expresso e definitivo que informe da inviabilidade de construção.
Porém, em Janeiro de 2022, os requeridos enviaram à requerente uma carta em que alegam encontrarem-se esgotados todos os prazos constantes do contrato promessa, sem que tenha sido alcançada a condição a que ficou sujeito o negócio que viabilizaria a celebração da escritura, missiva essa à qual a requerente respondeu, por carta de 19 de Janeiro de 2022 (Doc.7).
Nessa carta a Requerente tenta demonstrar que o contrato promessa celebrado entre as partes, encontra-se em vigor, estando disponível para celebrar a escritura de compra e venda o que só não é possível porque a mesma está dependente do destaque que, por sua vez, está dependente do processo de licenciamento e ainda da regularização das áreas do prédio, uma vez que as áreas registadas na conservatória e na matriz têm diferenças substanciais resultantes de diversas expropriações que nunca foram comunicadas e actualizadas pelos Requeridos.
Ainda nessa carta, a Requerente propôs aos Requeridos o pagamento integral do preço em data a acordar, sendo que contra este pagamento, os Requeridos deveriam emitir a favor da Requerente, uma procuração irrevogável que lhe permitisse: a)tratar do processo de licenciamento; b) tratar do processo de destaque; c)outorgar a escritura pública de compra e venda referente à parcela destacada.
Os Requeridos não aceitaram a proposta efectuada pela Requerente na carta de 19 de Janeiro de 2022. Contudo, mencionaram poder ponderar outras alternativas de negócio (Doc.8)
A requerida agendou data para a celebração da escritura de compra e venda para o dia 1 de Abril de 2022, a qual não se realizou pelos motivos constantes do instrumento avulso de fls. 41v e ss. que aqui se dá por reproduzido.
Alega que existe a fundado receio de que os requeridos vendam a referida parcela, causando lesão grave ou dificilmente reparável à requerente com o incumprimento que resultará, do comportamento dos requeridos, nas obrigações que a Requerente entretanto assumiu para com o Lidl.
Foi ordenado o registo da presente acção e designada data para inquirição das testemunhas, bem como prestação de declarações de parte pelo legal representante da Requerente.
Seguidamente foi proferida sentença que julgou improcedente a requerida providência cautelar.
Inconformada com tal decisão, a Requerente veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
A douta Sentença, de 04 de julho de 2022, veio julgar improcedente, por não indiciariamente provado, o procedimento cautelar comum.
2. Dispõe o n.º 1 do art. 662.º do Código de Processo Civil que A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
3. Foi considerado como, ainda que indiciariamente, não provado, o facto que os Recorridos tenham efetuado várias diligências tendo em vista a venda do prédio.
4. Bem como resultou como não provado para o Tribunal a quo, que os Recorridos tenham intenção de vender o prédio muito em breve.
5. No entanto, ficou demonstrado pela prova documental junta aos autos que a Recorrente, demonstrando o seu manifesto interesse no cumprimento do contrato prometido, realizou junto dos Recorridos diversas propostas posteriores.
6. Nomeadamente, o aumento do preço de aquisição do imóvel, realizando todos os atos necessários à retificação das áreas, munida de uma procuração irrevogável emitida pelos Recorridos.
7. Perante a recusa reiterada e infundamentada dos Recorridos, a Recorrente propôs ainda adquirir todo o terreno pelo preço global de € 3.000.000,00 (três milhões de euros).
8. Proposta esta, igualmente recusada pelos Recorridos.
9. Ora, tais recusas, completamente infundamentadas e sem quaisquer motivos aparentes para tal, demonstram uma clara falta de interesse por parte dos Recorridos em venderem à Recorrente o imóvel, não obstante todos os esforços por esta aplicados para que o negócio se concretizasse, conforme acordado.
10.E, bem assim, não deixa de indiciariamente demonstrar que, ao não aceitarem as diversas propostas da Recorrente, sem qualquer flexibilidade, se encontram os Recorridos a diligenciar por outras propostas junto de terceiros, uma vez que é aqui inequívoco que os Recorridos mantêm a vontade e o interesse em vender o terreno de que são proprietários, apenas não estão disponíveis para o fazer pelos valores contratualmente acordados com a Recorrente no contrato promessa.
11. Adicionalmente, em face do testemunho de (..), Engenheiro que acompanhou o processo (cfr. 15m50s a 07m15s do ficheiro de gravação 20220701110212_4599698_2871276), ficou demonstrado que o prédio se encontra numa boa localização e que tráfego diário pedonal é atrativo para estabelecimentos comerciais.
12. Pelo que, não poderá deixar de se considerar que os Recorridos tenham todo o interesse em vender o imóvel e num futuro breve, uma vez que recusaram todas e quaisquer propostas por parte da Recorrente em ser a mesma a adquirir, mas que certamente não dispensam propostas apresentadas por outros.
13. E, no limite, poderá ainda ser considerado também provado, indiciariamente, que os Recorridos até já tenham propostas mais elevadas de outras insígnias concorrentes, motivo pelo qual recusam todas as apresentadas pela Recorrente.
14. Devem, assim, os factos dados como não provados, passar a constar dos factos provados como n.ºs 26 e 27 da Sentença Recorrida, por se manifestarem indiciariamente suscetíveis na sua concretização.
15. Para além dos factos que a Recorrente considera terem sido erradamente considerados como não provados, consoante o caso, na Sentença Recorrida, outros factos há que, embora com relevo para a boa decisão da causa, tampouco foram considerados ― provados ou não provados ― pelo Tribunal a quo na decisão, sendo a Sentença Recorrida totalmente omissa quanto aos mesmos.
16. Nomeadamente, os factos alegados nos artigos 19.º, 20.º, 25.º, 26.º, 46.º, 47.º, 48.º, 49.º e 50.º do Requerimento Inicial, a respeito de não ter sido comunicada pela Câmara Municipal de Sintra ou por qualquer outra entidade, a não aprovação e inviabilidade da operação urbanística; de os Recorridos terem pleno conhecimento de todo o processo de licenciamento; bem como, ainda, do motivo para a rejeição liminar dos pedidos de licenciamento anteriores, que se prende com o facto de o prédio se encontrar desconforme, tanto predialmente como na matriz, por causa exclusivamente imputável aos Recorridos e ainda; a respeito dos prazos estipulados no contrato.
17. A não atribuição da devida relevância aos factos indicados – e a sua consequente omissão no rol de factos provados –, obsta, naturalmente, à boa decisão da causa e à descoberta da verdade material, uma vez que são determinantes para aquilatar da vontade e da postura das partes no âmbito do contrato promessa de compra e venda em apreço nos presentes autos.
18. Neste sentido, terá de se atender à prova testemunhal reproduzida, de…, Arquiteto mandatado pelos Recorridos para diligenciar pelo processo de licenciamento na Câmara Municipal de Sintra (cfr. 03m42s a 05m16s do ficheiro de gravação 20220701104515_4599698_2871276; cfr. 08m10s a 10m30s do ficheiro de gravação 20220701104515_4599698_2871276 e cfr. 14m15s a 16m29s do ficheiro de gravação 20220701104515_4599698_2871276).
19. Bem como, no mesmo sentido dos factos elencados nos artigos 19.º, 20.º, 25.º, 26.º 46.º, 47.º, 48.º, 49.º e 50.º do Requerimento Inicial, a testemunha …, Engenheiro (cfr. 02m18s a 07m15s do ficheiro de gravação 20220701110212_4599698_2871276; cfr. 07m50s a 09m40s do ficheiro de gravação 20220701110212_4599698_2871276 e cfr. 10m22s a 15m15s do ficheiro de gravação 20220701110212_4599698_2871276).
20. Tendo tais factos sendo ainda confirmados pela Testemunha …Arquiteto que efetuou várias diligências com a Recorrente (cfr. 02m20s a 06m10s do ficheiro de gravação 20220701112315_4599698_2871276 e cfr. 07m35s a 09m25s do ficheiro de gravação 20220701112315_4599698_2871276).
21. Após a apreciação crítica de toda a prova
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