Acórdão nº 65/18.9 BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 17-11-2022

Data de Julgamento17 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão65/18.9 BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Recursos jurisdicionais em ações administrativas

I. Relatório

O A., R..., instaurou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, uma ação administrativa urgente, emergente de acidente em serviço, ao abrigo do disposto no art. 48.º do Decreto-Lei nº 503/99, de 20.11, contra o Estado Português, contra o Ministério da Defesa Nacional- Marinha Portuguesa e contra a Caixa Geral de Aposentações, peticionando, a final, a título principal: i) integrar profissionalmente o A., nos termos do disposto no art.° 23°, n° 3, do DL 503/99, de 20.11; ii) pagar ao A. uma indemnização, por danos patrimoniais, no valor global de 1.089.418,20 €, acrescidos de juros de mora à taxa legal; iii) pagar ao A. indemnização correspondente a ajudas de terceira de pessoa, no montante de 341.040,00 €, acrescidos de juros de mora à taxa legal; iv) pagar ao A. indemnização a título de danos morais não inferior a 250.000,00 €, acrescidos de juros de mora à taxa legal; v) suportar todas as despesas com medicamentos, tratamentos, internamentos, cirurgias, terapia, reabilitação, fisioterapia e deslocações relacionados com os danos descritos; e, a título subsidiário: i) pagar ao A.:As prestações de natureza médica, cirúrgica, de enfermagem, hospitalar, medicamentosa e quaisquer outras, incluindo fisioterapia, adequadas ao restabelecimento físico e mental do A., nos termos da al. a) do n° 3 do art.° 4° e 11° do DL 503/99, de 20.11; ii) Transporte e estada, nos termos da al. b) do n° 3 do art.° 4° e art.° 14° do DL 503/99, de 20.11; iii) Subsídio por assistência de terceira pessoa, nos termos dos arts. 16° e 17° do DL 503/99, de 20.11; iv) Pensão, por incapacidade permanente, prevista no regime geral, nos termos do disposto no art.° 34°, n° 1, do DL 503/99, de 20.11.

Por decisão de 21.04.2020, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa convolou a ação em ação administrativa para efetivação de responsabilidade civil extracontratual, na sequência do que, se declarou territorialmente incompetente, atribuindo a referida competência ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, ao abrigo do n.º 1 do art. 18.º do CPTA, atento o local onde ocorreu o acidente - cfr. mapa anexo ao Decreto-Lei n.º 325/2003, 29.12, aduzindo, para o efeito, o seguinte: «(…) não obstante na p.i. se dizer que a presente ação vem proposta nos termos do disposto no art.° 48° do Decreto-Lei n° 503/99, de 20.11, tal afirmação não corresponde àquilo que é pedido a título principal, ou seja, a reparação de danos patrimoniais e não patrimoniais com fundamento na falta de condições de segurança em que decorreu o treino com queda do A.. De resto, o valor da ação indicado na p.i., a quantia de €1.680.458,62 € (um milhão seiscentos e oitenta mil quatrocentos e cinquenta e oito euros e sessenta e dois cêntimos) correspondente à soma dos pedidos: i) indemnizatório por danos patrimoniais (€1.089.418,20); ii) indemnizatório por necessidade de ajuda de terceira de pessoa (€341.040,00); e iii) indemnizatório por danos não patrimoniais (€250.000,00). De resto, o A. no requerimento apresentado em 13.9.2019, a fls 767 do processo virtual, afirma o seguinte: “ 1.Sem necessidade de se repetir os pedidos formulados na p.i., que os réus contestaram, mostrando bem ter compreendido as causas de pedir em que os mesmos assentam, dir-se- á, muito resumidamente, que o pedido indemnizatório principal (a título de danos patrimoniais e morais) assenta na responsabilidade civil do Estado por violação das regras de segurança de que resultou acidente em serviço. 2. Daí que, nos termos elencados na p.i., havendo culpa do empregador, o pedido não se subsume àqueles limites que estão previstos na legislação laboral, antes sendo enquadrado nos termos gerais, precisamente pelo facto de se entender existir uma violação das regras de segurança. (...)”. E, assim sendo, importa corrigir a espécie da presente ação, dando-se baixa na espécie em que foi distribuída, carregando-se na 1.a Espécie - Ação Administrativa.

E importa também, apreciar em primeiro lugar a exceção de incompetência territorial suscitada pelo 2.° R. na sua contestação, pois que sendo de ordem pública a matéria da competência do tribunal, cujo conhecimento precede o de qualquer outra matéria (art.° 13.° do CPTA), importa aferir se a presente acção foi proposta no tribunal territorialmente competente, tendo em conta a residência do A., conforme resulta do disposto no n.° 1 do art.° 18.° do CPTA que se transcreve: “As pretensões em matéria de responsabilidade civil extracontratual, incluindo ações de regresso, são deduzidas no tribunal do lugar em que se deu o facto constitutivo da responsabilidade.” No caso em apreço, o facto gerador da responsabilidade ocorreu na Escola de Fuzileiros de Vale de Zebro, situada no Barreiro. De acordo com a regra prevista no no n.° 1 do art.° 18.° do CPTA, o tribunal administrativo competente para o julgamento da causa é o TAF de Almada, cfr. mapa anexo ao Dec.-Lei n.° 325/2003. Assim, nos termos previstos no n.° 1 do art.° 14.° do CPTA, deve o processo ser oficiosamente remetido ao TAF de Almada.

Em face do que antecede, declara-se: i) a incompetência deste tribunal, em razão do território para conhecer da causa; ii) ser territorialmente competente o TAF de Almada; ordena-se a remessa do processo ao TAF de Almada (art.° 577.°, al. a) e n.° 2 do art.° 576.°, ambos do CPC, além do referido n.° 1 do art.° 14 do CPTA). (…).»

O A. reclamou desta decisão para o Presidente deste TCA Sul, ao abrigo do n.º 4, do art. 105.º, do CPC, alegando, em suma, como se segue - cfr. fls. 847 e ss., do SITAF

«(…) Como se extrai da petição inicial, nos presentes autos é formulado um pedido de condenação dos 1º e 2º RR, no pagamento de uma indemnização ao A., calculada nos termos gerais, mas com fundamento em acidente em serviço decorrente de violação das regras de segurança pela entidade patronal.
O pedido principal é, pois, formulado ao abrigo do disposto no art.º 48º do DL nº 503/99, de 20.11 (Regime Jurídico dos Acidentes em Serviço), mas seguindo o regime de responsabilidade agravada, previsto pelo art.º 18º, nº 4, da LAT, por força da remissão operada pelos arts. 7º e 34º, nº 1, do referido DL nº 503/99, de 20.11.
(…)
É inquestionável que tratando-se de um pedido assente nos danos resultantes de um acidente em serviço e na responsabilidade agravada por violação das regras de segurança pelo empregador, o meio próprio para a efetivação de tal direito é o da ação emergente de acidente em serviço e não, como se pretende na sentença de que se reclama, a ação com base na responsabilidade extra contratual do Estado.
(…)
De facto, do conjunto de normas citadas do RJAS o que se extrai é que (…) o meio idóneo para o lesado exercer o seu direito à indemnização com base na responsabilidade agravada do empregador é, precisamente, o da ação emergente de acidente de trabalho.
(…)
Motivo pelo qual a competência territorial se afere pela regra geral do domicílio do autor, estatuída pelo art.º 16º do CPTA.
(…)
Concluindo que, “Caso, por hipótese, se entenda que a ação emergente de acidente em serviço deve ser interposta no tribunal do local onde ocorreu o acidente, seguindo o regime do art.º 18º do CPTA, deverão os autos ser remetidos ao tribunal territorialmente competente, mas deverá em qualquer caso a sentença ser retificada no que à qualificação da espécie de ação diz respeito, no sentido de se manter a mesma como ação emergente de acidente em serviço, com natureza urgente, nos termos do disposto no art.º 48º, nº 1, do RJAS. (…)»

Por decisão sumária de 13.05.2020, o Presidente do TCA Sul decidiu não tomar conhecimento da reclamação, em virtude de, e em síntese - cfr. fls. 858 e ss., do SITAF:

«(…) a convolação” efectuada pela Senhora Juíza “a quo” – da forma processual utilizada pelo autor na forma de processo que considerou correcta –, teve como consequência a imediata alteração do factor decisivo de conexão, que deixou de ser o lugar do domicílio do autor, para passar a ser o do lugar onde se deu o facto gerador da responsabilidade e, necessariamente, o efeito do deslocamento geográfico do processo para outro tribunal situado em diferente circunscrição territorial. (…) da leitura atenta do articulado que nos vem dirigido, ressalta à evidência que aquilo com que o reclamante não se conforma é com o juízo efectuado pela Srª Juíza “a quo”, de transmutar a forma processual por si escolhida – acção de reconhecimento proposta ao abrigo do estatuído no nº 1 do artigo 48º do CPTA –, numa acção administrativa para efectivação de responsabilidade civil. (…) Porém a sindicância desse julgamento não está compreendida na previsão do artigo 105º, nº 4 do CPCivil, o qual apenas confere ao Juiz Presidente do Tribunal de 2ª instância o poder de emitir um juízo definitivo sobre a questão da competência do tribunal em razão do território, tendo presente a configuração da relação material controvertida tal como esta é apresentada em juízo pelo autor, resultante da conjugação de dois elementos: a circunscrição territorial correspondente ao Tribunal e o facto decisivo de conexão. Os elementos de conexão encontram-se fixados nos artigos 16º a 21º do CPTA, sendo que a regra geral em matéria de competência territorial se encontra prevista no nº 1 do artigo 16º do CPTA – o foro do domicílio ou da sede do autor –, regra esta que cede quando haja disposição especial em contrário, estabelecida nos artigos 17º a 21º do CPTA. E, quando não seja possível aplicar qualquer das regras dos artigos anteriores, intervém a regra da competência residual vertida no artigo 22º do mesmo diploma. (…)»
Concluindo que «(…) sem prejuízo de repetirmos o já afirmado, que a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 105º, nº 4 do CPCivil não é o meio idóneo de reagir contra a decisão entendeu que a forma processual dos presentes autos não é a adequada, não estando, no...

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