Acórdão nº 636/22.9T8VCD-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-09-12

Ano2022
Número Acordão636/22.9T8VCD-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 636/22.9T8VCD-A.P1
(Procedimento cautelar especificado)
Comarca do Porto
Juízo de Família e Menores de Vila do Conde (Juiz 2)

Acordam na 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

IRelatório
Em 22 de Abril de 2022, AA, representado pela curadora ad litem que lhe foi nomeada, BB, veio, por apenso à acção de alimentos que corre termos pelo referido Juízo, intentar contra a sua esposa CC procedimento cautelar especificado para fixação de pensão de alimentos provisórios, alegando, em síntese, o seguinte[1]:
Requerente e Requerida são casados entre si no regime (imperativo) de separação de bens.
Ambos estão alojados em lar de idosos, embora em estabelecimentos diferentes.
O seu alojamento no lar é muito dispendioso, pois além da quantia mensal fixa de € 1.550,00, tem de suportar outras despesas (com medicamentos, consultas médicas, artigos de higiene, despesas bancárias, notário, serviços de geriatria), o que faz com que as suas despesas mensais rondem, habitualmente, o montante de € 1.900,00.
Acontece que o único rendimento de que dispõe é a sua pensão de reforma no valor de € 1.326,98, pelo que o seu déficit mensal ronda os € 600,00.
Além disso, há que considerar despesas futuras, nomeadamente eventuais cirurgias ou outros tratamentos ou intervenções, bem como as despesas com o seu funeral.
É um seu irmão quem o tem ajudado, emprestando-lhe dinheiro para cobrir esse défice.
No entanto, é sobre a requerida que, em primeira linha, recai o dever de acudir às suas necessidades e para tanto tem capacidade.
Na verdade, a requerida vendeu, recentemente, pelo preço de € 130.000,00, o imóvel que, sendo um bem próprio dela, foi o lar conjugal do casal.
Porque não consentiu em tal venda, o negócio é nulo, mas antevê demora na declaração dessa nulidade em ação que pretende intentar para o efeito.
Por outro lado, «porque o dinheiro não fala, a Requerida terá mais que tempo de ocultá-lo ou dissipá-lo, deixando o Requerente impossibilitado de lhe exigir a prestação de alimentos, nos termos do art. 2009.º do C. Civil, na medida das suas carências».
Termina pedindo:
- a nomeação de BB como curadora ad litem do Requerente, no mínimo, como curadora provisória;
- a designação de dia para o julgamento, seguindo-se os demais termos.
Correspondendo ao convite que lhe foi dirigido (despacho de 03.05.2022), o requerente aperfeiçoou o seu requerimento, acrescentando o seguinte pedido:
- a fixação dos alimentos provisórios em € 600,00 mensais.
Foi designada data para a audiência de julgamento, na qual se frustrou a tentativa de conciliação para obter a fixação de alimentos por acordo.
A requerida apresentou contestação em que impugna todos os factos alegados pelo requerente, que diz serem falsos.
Alega que a pensão mensal de reforma do requerente é do montante de € 1 350,00, «uma miragem e sonho para a grande maioria dos cidadãos portugueses.»
Já ela, requerida, recebe uma pensão de reforma mensal de € 300,00 e por isso, apesar da venda do imóvel, porque tem de pagar dívidas assumidas ao longo dos anos para suportar os custos com o lar, não tem capacidade económica para prestar alimentos ao Requerente, sendo que a família deste já o faz e dispõe de capacidade económica para tal.
O requerente não tem «necessidade objectiva» de alimentos e, em todo o caso, pode mudar para um lar mais em conta.
Produzida a prova, com data de 30.06.2022, foi proferida decisão com o seguinte dispositivo:
«Por tudo quanto ficou exposto, julgo a presente providência parcialmente procedente, na medida do provado e, consequentemente, condeno a requerida CC a pagar, mensalmente, ao requerente seu marido, AA, a título de alimentos provisórios, a quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros).»

Inconformado com a decisão, o requerente dela interpôs recurso de apelação, com os fundamentos explanados na respectiva alegação, que condensou nas seguintes conclusões:
………………………………………
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Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido (com subida nos próprios autos do procedimento cautelar e efeito meramente devolutivo).
Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.

Objecto do recurso
São as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação, onde sintetiza os fundamentos do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) e, portanto, definem o âmbito objectivo do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso. Isto, naturalmente, sem prejuízo da apreciação de outras questões de conhecimento oficioso (uma vez cumprido o disposto no artigo 3.º, n.º 3 do mesmo compêndio normativo).
Como se vê pelas conclusões reproduzidas, o recorrente não põe em causa a factualidade considerada indiciariamente provada.
No entanto, no “corpo” da alegação, o recorrente argumenta:
«Quanto aos factos não provados, lê-se na decisão que:
“Com relevância para a decisão a proferir, não ficaram por provar quaisquer factos.”
Ou seja: desta última afirmação conclui-se que o tribunal considerou irrelevantes para a decisão da causa factos alegados pelo requerente como sejam:
- Que está a ocorrer um processo inflacionista que já se vinha agravando e continuará a agravar os custos da satisfação das necessidades do requerente – o que se alegou no art. 15º do requerimento inicial.
- Que, como é evidente, o requerente tem necessariamente mais despesas além daquilo que paga ao lar onde se encontra, como se alegou nos arts. 9º e 10º.
Sobre a inflação
Atente-se que o fenómeno inflacionista se espelha expressivamente na própria matéria dada como provada sob o nº 8 pela qual se vê que, depois dos meses de Novembro e
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