Acórdão nº 629/23.9T8LRA.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2024-02-06

Data de Julgamento06 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão629/23.9T8LRA.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO LOCAL CÍVEL DE LEIRIA)
Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra

Proc.º n.º 629/23.9T8LRA.C1

1.- Relatório

1.1. - AA, casado, contribuinte nº ...23, residente em Rua ..., ..., ..., ... ..., Vem instaurar e fazer seguir contra:

1 - A..., S.A., pessoa coletiva Nº ...87, com sede em Rua ... ... e estabelecimento comercial em Rua ... ...,

2 – B..., LDA, sociedade comercial por quotas, pessoa coletiva nº ...09, com sede em Edifício ..., Zona Industrial ..., ... ..., ...;

3 – C..., LDA, sociedade comercial por quotas, pessoa coletiva nº ...31, com sede em ... – ..., ..., ... ..., ...; pedindo solidariamente condenação das RR., em:

1 – Pagarem-lhe a quantia de € 3.050,00 (três mil e cinquenta euros) a título de danos patrimoniais sofridos pelo mesmo, referidos nos artigos 6º e 8º desta petição, acrescido de juros legais vincendos a partir da citação. E,

2 – Pagarem-lhe o custo de reparação do motor da viatura marca ..., modelo ... e com matrícula ..-OZ-.., no montante mínimo de € 8.000,00 (oito mil euros), ou em alternativa o custo de um motor reparado e garantido, do mesmo valor de € 8.000,00 (oito mil euros), acrescido de juros legais vincendos a partir da citação.

3 – No pagamento das custas do processo, e no mais que for devido, sempre com todas as legais consequências.

Para o efeito, e em síntese, o autor alega que, no exercício da sua atividade de comércio automóvel, no dia 14/05/2021, adquiriu à 1ª ré (A..., S.A.) a viatura suprarreferida, pagando pela mesma o preço de € 13.500,00; em 23/06/2021, vendeu essa viatura a BB, por € 15.000,00; em 12/05/2022 tomou conhecimento da causa das avarias cujo custo suportou, no valor global de € 3.050,00, que se traduz na adulteração da quilometragem, que se verificava já quando, no dia 14/05/2021, adquiriu a viatura à 1.ª ré, e que implica ainda a reparação ou substituição do motor, no montante de € 8.000,00; em 01/07/2022 e 19/09/2022 apresentou reclamação à 1.ª ré, que nada respondeu; o que a impeliu a instaurar a presente ação, em 10/02/2023, contra a 1.ª ré, que vendeu a viatura ao autor; a 2.ª ré, que terá adulterado a informação sobre a quilometragem do veículo, e a 3.ª ré enquanto transmitente de tal veículo adulterado.

***

1.2. – Citadas contestaram as RR.

- As rés C... Ld.ª, e B..., Ld.ª invocaram a exceção da respetiva ilegitimidade processual passiva; e

- As rés A..., S.A. e C... Ld.ª invocaram a exceção perentória da caducidade da ação, alegando a primeira que o defeito não foi denunciado no prazo de seis meses após a entrega da coisa (até novembro de 2021), nos termos do artigo 916.º do Código Civil, e a segunda que os defeitos já existiam em 12/05/2021, tendo a ação sido instaurada para além do prazo de seis meses para instaurar a presente ação, previsto no artigo 917.º do mesmo diploma legal.

***

1.3. - O autor pronunciou-se quanto a ambas as exceções.

- Quanto à exceção de ilegitimidade afirma não se verificar essa exceção, por todas as rés terem interesse direto na presente causa, uma vez que foi alegada, além da responsabilidade contratual, a responsabilidade civil extracontratual pela prática de factos ilícitos, e

- Quanto à exceção perentória da caducidade da ação refere não se verificar, ter invocado, além da responsabilidade contratual, também a responsabilidade extracontratual, e que só em 12/05/2022 se apercebeu do defeito que, de imediato comunicou à ré A..., S.A..

***

1.4. – Em 9/7/2023 proferiu decisão, onde previamente refere:

- Atendendo ao valor da ação e ao estado dos autos, dar-se-á cumprimento ao disposto no artigo 597.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil.

- Fixa o valor da causa em € 11.050,00 (onze mil e cinquenta euros) (cf. artigos 296.º, 297.º, n.º 1 e 306.º, n.os 1 e 2, do Código de Processo Civil), mais refere:

Ser o Tribunal absolutamente competente, o processo o próprio e não ocorrem nulidades que invalidem todo o processado. As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias.

Após proferiu decisão, onde julgou verificada a exceção perentória da caducidade, relativamente à 1.ª ré, e não resultando da causa de pedir alegada pelo autor factos constitutivos suscetíveis de constituir fundamento de responsabilização das 2.ª e/ou 3.ª rés, absolvem-se todas as rés do pedido.

Custas processuais pelo autor, enquanto parte vencida na ação (artigo 527.º, n.os 1 e 2 do Código do Processo Civil).

Registe e notifique.

***

1.5. - Inconformado com tal decisão dela recorreu o A. - AA – terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:

1 – Mostra-se inadmissível, por infundado, o despacho constante dos autos, proferido pelo Meritíssimo Juiz “ a quo “ , onde decidiu que :

Atendendo ao valor da causa e do estado dos autos, dar-se-á cumprimento ao disposto no artº 597 nº 1 alínea c) do C.P.C.

2 – Nos termos do artº 593 nº 3 do C.P.C, e apesar do constante do artº 597, do mesmo diploma legal a audiência prévia só é dispensável, quando o processo haja de prosseguir e se destina a fixar despacho (alínea e) e f) artº 591 C.P.C).

3 – O recorrente não pôde efectivar o necessário debate sobre as excepções invocadas, e nem sobre a invocada falta de causa de pedir em relação às 2ª e 3ª Rés.

4 – Se se tivesse efectuado a audiência prévia, teria o recorrente tido a possibilidade de explicitar melhor a data do conhecimento da adulteração da quilometragem da viatura, e explicitar também melhor os factos e completá-los, tendente a demonstrar acção concertada e até dolosa das Rés.

5 - O conhecimento do facto da adulteração da quilometragem, é facto posterior à compra e venda da viatura, tendo sido de imediato 23/05/2022, dado conhecimento do mesmo à Ré A... . (Doc. Nº 8 junto à petição inicial)

6 – O Tribunal nenhum relevo deu a tal acto.

7 – O A. recorrente, teria tido sempre a possibilidade de ampliar o pedido, pedindo a anulação do contrato de compra e venda da viatura, nos termos do previsto no artº 905 do C.C, o que se viu impedido de fazer, face à referida situação – surpresa, e à não marcação da necessária audiência prévia.

8 – A acção é tempestiva, face ao reconhecimento do direito do A. , até tácito, por parte da Ré A... S.A.

9 – Assim, nos termos do disposto no artº 195 nº 1 do C.P.C, deve sempre ser declarada a nulidade do processado após a apresentação das contestações das Rés, e revogado assim o presente saneador-sentença, com todas as legais consequências, nomeadamente o da marcação da necessária audiência prévia.

10 – Não pode existir decisão sobre uma excepção peremptória, sem a existência da referida audiência prévia, além do mais para a efectivação do necessário contraditório.

11 – Todas as Rés, bem entenderam a fundamentação do pedido do A. e os contra-factos, alegados não se mostram discutidos nem se mostram provados.

12 – Nesta medida mostra-se estar vedado ao Tribunal ultrapassar a própria visão das partes, devendo assim prosseguirem os autos.

13 – Donde a intempestividade da denúncia da caducidade do direito da acção por parte da Ré A..., no artº 23 da sua contestação, é matéria a provar e não do conhecimento imediato do tribunal.

14 – Haverá sempre factos instrumentais deste, que podem constituir outros dados adquiridos, que na relação contratual, demonstrem a inexistência de caducidade, tudo nos termos do disposto nos artº 331 do C.C.

15 – O tribunal “ a quo “ proferiu decisão surpresa, ao concluir inesperadamente inexistirem factos – causa de pedir – que pudessem fazer responsabilizar extracontratualmente as 2ª e 3ª Rés , tal constitui apreciação de questão de que o Tribunal, não tinha de conhecer, sendo assim a sentença nula e como tal deve ser declarada nos precisos termos do artº 615 nº 1 alínea d) do C.P.C, e substituída por outra que marque audiência prévia, e mande prosseguir os autos, para melhor conhecimento dos factos alegados.

16 – Não pode aceitar-se que sem a devida discussão e prova, tenha o Meritíssimo Juiz assentado que em 23-06-2021 o A. teve conhecimento da existência dos defeitos, quando tal conclusão, para efeitos do pedido dos autos, não pode ser desassociada do facto de só em 12-05-2022, ter percebido da adulteração da quilometragem, facto que nesta data e de imediato deu conhecimento à mesma Ré A..., conforme Doc. Nº 8 junto à petição inicial.

17 - É que, mesmo em relação à A... S.A, não pode tal caducidade ser declarada, pois com a comunicação de 12/05/2023, recebida a 23/05/2022 ( Doc. Nº 8 junto à petição inicial), foi aquela mesma Ré tempestivamente interpelada, não se opondo ao reclamado tendo assim a mesma sido aceite, em conformidade com o disposto no artº 331 do C.C.

18 – Para além do que, também se mostra inaceitável, poder o Meritíssimo Juiz sem indagação e investigação dos factos, considerar ser aplicável apenas em relação à Ré A... S.A, a responsabilidade civil contratual, afirmando a caducidade do direito de acção, o que não aceitamos, até porque não se ignoram os deveres resultantes também do disposto no artº 6 nº 2 do C.P.C

19 – O A. existisse audiência prévia, sempre estaria em tempo de ampliar e alterar o pedido, desenvolvendo a factualidade inerente à história dos autos, no sentido de provar que a conhecida adulteração da quilometragem da viatura, se tratou de ma acção dolosa e concertada e bem conhecida das Rés.

20 - É assim prematura a declaração por parte do Tribunal da existência da caducidade do direito de Acção, por se tratar ainda de um facto a indagar e a provar.

21 – Bem como o accionamento das Rés por via da responsabilidade civil extracontratual se mostra, legal, face aos factos já alegados, e aos que melhor poderão ser explicitados, constituindo verdadeira causa de pedir, contrariamente ao entendimento do Meritíssimo Juiz “ a quo” .

22 – Deve assim sempre a sentença ser revogada e substituída por outra que mande prosseguir os autos, marcando-se para todos os efeitos a necessária audiência prévia.

23 - De...

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