Acórdão nº 6212/17.0T8CBR-E.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-03-28

Data de Julgamento28 Março 2023
Ano2023
Número Acordão6212/17.0T8CBR-E.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE COIMBRA)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

***

I – Relatório

AA, com os sinais dos autos,

na qualidade de mãe dos menores BB e CC, também com os sinais dos autos,

Requerida em autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais quanto a tais menores, em que é Requerente DD (pai dos menores), este também com os sinais dos autos,

veio, por apenso, intentar «procedimento cautelar», ao abrigo do disposto no art.º 28.º do RGPTC,

pedindo, com vista a «impedir que o pai concretize os seus intentos e retire os menores à mãe», e com «dispensa de audição prévia do pai/requerido», a «determinação imediata das medidas provisórias cautelares, por se afigurarem adequadas e necessárias à salvaguarda do superior interesse dos menores BB e CC, continuando estes à guarda da mãe e a residir com esta».

Alegou, para tanto:

- terem as responsabilidades parentais quanto aos menores sido reguladas por sentença, datada de 24/10/2023, proferida no processo principal, ficando tais menores entregues à mãe e a residir com esta, em Espanha;

- em 10/11/2023, a mãe, na sequência, deslocou-se a Portugal, dirigiu-se à escola, recolheu os menores e levou-os consigo para Espanha, onde os três (mãe e filhos) se encontram, desde então, a residir;

- os menores frequentam, desde então, a escola espanhola, encontrando-se já integrados;

- todavia, a mãe tem recebido ameaças do pai, no sentido de este ir recolher os filhos a Espanha e trazê-los para Portugal, apesar de a sentença os ter entregue à mãe, encontrando-se sob recurso interposto pelo pai dos menores;

- até que se fixe efeito ao recurso, nos termos do art.º 642.º do NCPCiv., o efeito é o devolutivo, pelo que a sentença é exequível de imediato, permitindo a imediata produção de efeitos jurídicos, de acordo com o disposto no art.º 704.º, n.º 1, do mesmo Cód.;

- o superior interesse dos menores impõe que estes aguardem em Espanha o resultado do interposto recurso da sentença de regulação do exercício das responsabilidades parentais.

O processo foi com vista ao M.º P.º, que promoveu o indeferimento liminar, por a sentença dos autos principais estar sob recurso, ao qual ainda não havia sido fixado efeito, nada havendo, por isso, a decidir, tanto mais que existe regime provisório estabelecido, que dá resposta à situação dos menores até ao trânsito em julgado da decisão sobre a regulação do exercício das responsabilidades parentais.

Seguidamente foi proferida decisão liminar (datada de 12/12/2022), com o seguinte dispositivo:

“Face ao exposto, por manifestamente inútil, ao abrigo do disposto no artigo 590.º do Código de Processo Civil indefiro liminarmente o procedimento cautelar.”.

Inconformada, a Requerente/mãe recorre do assim decidido, apresentando alegação, onde formula as seguintes

Conclusões ([1]):

«1 – Que seja revogada a promoção do Ministério Público que se pronunciou pelo indeferimento liminar, e pela manutenção do regime provisório existente;

2 – Que seja o despacho de indeferimento liminar revogado, porquanto as medidas provisórias de exercício das responsabilidades parentais dos menores BB e CC atribuídas ao pai caducaram com a notificação da sentença;

3 – Que seja o despacho de indeferimento liminar revogado porque ilegal e substituído por outro que considere eficácia imediata à sentença porquanto o regime regra do efeito do recurso é o efeito devolutivo, nos termos do disposto nos artigos 4º, nº 1, 28º, nº 1 e 33º, nº 1, todos do RGPTC, assim como o artigo 4º, alíneas a), c) e e) da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, além de fazer uma interpretação e aplicação errada do artigo 704º, nº 1, do Código de Processo Civil;

4 – Que sejam os menores entregues à mãe, nos termos estabelecidos na sentença e que fizeram caducar as medidas provisórias existentes;

5 – Por todo o exposto deve o despacho do tribunal a quo ser anulado e em sua substituição ser emitido outro que considere a sentença com eficácia imediata, entregando os menores à mãe, podendo estes de imediato alterar a sua residência para Espanha.

Como é de inteira

JUSTIÇA».

Contra-alegou o M.º P.º, pugnando pela improcedência do recurso.

Este foi admitido pela 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, altura em que se ordenou a citação do Requerido/pai para os termos do recurso e da causa, sem que este tenha apresentado resposta.

Remetido o processo a este Tribunal ad quem, foi mantido o regime recursivo.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir quanto ao respetivo objeto.

II – Âmbito do recurso

Sendo o objeto dos recursos delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo respetivo – como é consabido, são as conclusões da parte recorrente que definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([2]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do NCPCiv. –, está em causa na presente apelação saber, somente, se há, ou não, fundamento válido para a proferida decisão de indeferimento liminar do «procedimento cautelar».

III – Fundamentação

A) Da factualidade apurada

O factualismo a considerar para decisão do recurso é o supra aludido, em sede de relatório, cujo teor aqui se dá por reproduzido, a que se adita, apenas, o seguinte ([3]):

1. - Por sentença, datada de 22/10/2022, proferida no âmbito dos autos principais, foi assim decidido:

«I - Regulo as responsabilidades parentais em relação aos menores BB e CC da seguinte forma:

1) As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida dos menores serão exercidas em comum pelos pais.

2) Os menores ficam entregues à mãe, ficando determinada a sua residência junto da mãe, em Espanha, que é quem exercerá a responsabilidade parental relativa aos atos da vida corrente dos filhos.

3) O convívio dos menores com o pai e com a família paterna far-se-á nos seguintes termos:

- Fins-de-semana alternados, deslocando-se o pai e/ou a família paterna a casa dos menores, em Espanha, para os recolher e entregar, e podendo permanecer com eles nos dias úteis que precedem e sucedem ao fim-de-semana, sem prejuízo dos períodos de descanso e escolares dos menores, devendo articular com a mãe os horários de recolha e entrega;

- 2/3 das férias escolares do Natal, Páscoa e verão, por referência ao calendário letivo fixado pelas autoridades de educação espanholas, devendo o pai informar a mãe do período concreto que pretende passar com os menores nas férias escolares, até ao final do mês de março de cada ano. Não informando, a escolha passará a pertencer à mãe, que deverá informar o pai no período de um mês;

- As deslocações dos menores entre Portugal e Espanha para gozo de férias deverão ser repartidas entre a família materna e paterna e os horários deverão ser ajustados entre ambas, sempre salvaguardando o interesse dos menores;

- A divisão do período das férias escolares do Natal deverá permitir aos menores celebrar o Natal com a família paterna e os Reis com a família materna;

- Os menores passarão com o pai e/ou com a família paterna o dia do pai e o dia de aniversário do pai e dos avós paternos, com pernoita para o dia seguinte ou desde a véspera, conforme pretender o pai e/ou a família paterna, devendo o pai e/ou a família paterna deslocar-se a Espanha para o efeito, caso se trate de período letivo.

4) Para além da residência, os menores convivem com a mãe e com a família materna no dia da mãe e no dia de aniversário da mãe e dos avós maternos, com pernoita para o dia seguinte ou desde a véspera, conforme pretender a mãe e/ou a família materna.

5) No dia do seu aniversário, os menores farão uma refeição com cada um dos progenitores cabendo a escolha da refeição à mãe nos anos pares e ao pai nos anos ímpares, tudo sem prejuízo dos períodos de descanso e escolares, devendo o pai e/ou a família paterna deslocar-se a Espanha para o efeito, caso se trate de período letivo, e a mãe a Portugal, caso o aniversariante esteja aos cuidados do pai ou da família paterna.

6) O pai e a mãe (ou os familiares por estes indicados) contactarão com o adulto aos cuidados de quem os menores se encontrarem (a informar por um progenitor ao outro), diariamente, preferencialmente...

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