Acórdão nº 60697/20.2YIPRT.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-03-28

Ano2023
Número Acordão60697/20.2YIPRT.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
A intentou procedimento de injunção contra B, invocando a celebração de um contrato de empreitada entre ambos, e sustentando a falta de pagamento de uma fatura no valor de €27.490,64, a que acrescem juros de mora, sendo os vencidos no valor de €2.196,24.[1]
Em 22-09-2020 o requerido deduziu oposição, subscrita pelo Sr. Dr. VT, acompanhada de procuração forense com o seguinte teor:[2]
“PROCURAÇÃO
B , sito na Rua dos Eucaliptos, em Cascais, pessoa colectiva n.º … aqui representada pela empresa administradora eleita para o ano de 2020/2021, SC CSS, UNIPESSOAL, LDA, contribuinte n.º …, com sede na Rua das Caravelas, Cascais, neste acto representada por SC, portadora do cartão de cidadão n.º 12350688, valido até 13/05/2029, contribuinte fiscal n.º 214900223, constitui seu bastante procurador o Dr. VT, advogado portador da cédula profissional n.º 10988 L, com escritório na Avenida Casal Ribeiro, Lisboa, a quem, com a faculdade de substabelecer, uma ou mais vezes, no todo ou em parte, confere os mais amplos poderes gerais forenses em direito permitidos, e ainda os especiais para confessar qualquer acção, transigir sobre o seu objecto, desistir do pedido ou da instância.
Cascais, 21 de Setembro de 2020”
Esta procuração ostenta uma assinatura manuscrita com o nome “SC”, aposta por cima de um carimbo.[3]
Em consequência da apresentação da oposição, e tendo em conta o valor da causa, o processo passou a seguir os termos da ação declarativa com processo comum.
Na subsequente tramitação da causa, em 21-03-2022 veio a realizar-se a audiência final, na qual compareceram o legal representante da autora, Sr. JG, o seu Ilustre Mandatário, Dr. OR, as testemunhas RC, JR e VJ, bem como o Ilustre Mandatário do réu, Dr. VT.
No decurso desta audiência, os ilustres mandatários das partes declararam ter alcançado acordo nos seguintes termos:[4]
“1. O Autor reduz o pedido para a quantia de 18.500,00€, valor que a Ré aceita.
2. A referida quantia será efetuada através de cheque bancário que será remetido para o escritório do Ilustre Mandatário do Autor no prazo de 30 dias.
3. Com o cumprimento integral do presente acordo, Autora e Réu declaram mútua e reciprocamente que nada mais tem a exigir um dos outros seja a que titulo for.
4. A Autora prescinde de qualquer direito de ação judicial contra a ora Autora ou contra a empresa, SM Lda., em virtude da transação ora celebrada com respeito a realização da obra de reparação dos átrios do condomínio do Edifício “B”, sito na Rua dos Eucaliptos, nº 64.
5. Custas em partes iguais, prescindindo das Custas de Parte.”
Na sequência, o Mmº Juiz proferiu sentença com o seguinte teor:
“Na presente Ação de Processo Comum em que é Autor A e Réu B , sito na Rua dos Eucaliptos, atendendo a livre disponibilidade do objeto e a qualidade dos sujeitos intervenientes julgo válido e eficaz o acordo que antecede que homologo por Sentença condenando as partes a cumpri-lo nos seus precisos termos dando aqui por reproduzido o respetivo clausurado, (artigo 277º alínea d), 283º nº 2, 284º, 287º, 289º à contrario, 290º nº 1 todos do Código de Processo Civil e 1248º do Código Civil.
Custas conforme acordado pelas Partes (artigo 537º nº2 do Código de Processo Civil).
Registe e notifique.”
Em 24-03-2022 o Sr. Dr. VT apresentou um requerimento, no qual declarou renunciar à procuração que lhe havia sido outorgada pelo réu.[5]
Em 31-03-2022 o réu apresentou um requerimento subscrito pelo Sr. Dr. LL, acompanhado de procuração forense com o seguinte teor:[6]
“PROCURAÇÃO
B, sito na Rua dos Eucaliptos, em Cascais, pessoa coletiva …, aqui representada pela empresa administradora eleita para o ano de 2020/2021, SC CSS, UNIPESSOAL, LDA, contribuinte fiscal nº …, com sede na Rua das Caravelas, Cascais, neste ato representada por SC, portadora do Cartão de Cidadão n.º …, válido até 13/05/2029, contribuinte fiscal número …, constituí seu bastante procurador o Dr. LL, advogado, Cédula Profissional …, com escritório no largo da Estação, Cascais, a quem com os de substabelecer confere os mais amplos poderes forenses em direito permitidos.
Cascais, 24 de março de 2022”.
Esta procuração ostenta uma assinatura manuscrita com o nome “SC”, aposta por cima de um carimbo.
Em 02-05-2022 o réu, através do Sr. Dr. LL interpôs o presente recurso de apelação, cuja motivação resumiu nas seguintes conclusões:[7]
A- A presente ação inicia-se com um requerimento de Injunção em que a Requerente, ora Recorrida, A, requer o pagamento da quantia de €27.490,64 (vinte e sete mil, quatrocentos e noventa euros, sessenta e quatro cêntimos), que corresponderia a uma fatura elaborada pela Requerente em 6/8/2018.
B- Corresponderia a alguns trabalhos que a A. terá executado, relativamente a obra, adjudicada a sociedade SM, Lda. e que a Requerente, teria parcialmente executado no Condomínio do Edifício "B".
C- Seguiu a ação de processo comum a sua tramitação, até à Audiência de Julgamento, no passado dia 21 de março de 2022, conforme melhor consta da Ata de Audiência de Julgamento, a fls.., do processo,
D- Na tentativa de conciliação, entre as partes, sendo a R. representada pelo seu Ilustre Mandatário Dr. VT, os Ilustres Mandatários, demonstraram chegar a acordo, nos autos, ditando os termos da transação.
E- Na sentença homologatória, o Meritíssimo Juiz, ditou: " atendendo a livre disponibilidade do objeto e a qualidade dos sujeitos intervenientes julgo válido e eficaz o acordo que antecede que homologo por Sentença condenando as partes a cumpri-lo nos seus precisos termos..."
F- Efetivamente a Autora presente, deu o seu acordo à Transação, o R. não estava presente, mas representado pelo seu então bastante mandatário.
G- A representação, do R. manifestava-se por uma procuração, outorgada em 21 de setembro de 2020, ao referido Mandatário Dr. VT, em que SC, representante da SC CSS, UNIPESSOAL, LDA, sociedade esta eleita administradora do Condomínio do Edifício "B" para o ano de 2020/2021.
H- Efetivamente tal procuração conferia " os mais amplos poderes gerais forenses em direito permitidos, e ainda os especiais para confessar qualquer acção, transigir, sobre o seu objeto, desistir do pedido ou da instância “.
I- Em primeiro lugar, não se alcança, com exatidão, se tal disponibilidade incluía os poderes para acordar, nos termos processuais efetivados nos autos.
J- Por outro lado, tal procuração outorgada, pelo Mandatário do R. no Início do processo, e junta a apresentação da Oposição, no âmbito do Requerimento de Injunção, pressuponha uma confirmação de poderes forenses especiais, face ao desenvolvimento da ação judicial.
K- A subscritora de tal procuração, a representante da sociedade administradora do Condomínio do Edifício "B", não detinha poderes para outorgar uma procuração, com poderes mais latos que "os mais amplos poderes forenses em direito permitidos".
L- Tal situação resulta, em primeiro lugar das funções e competências do Administrador de Condomínio, que lhe são atribuídas pelo artigo 1436º do Código Civil e legitimidade do Administrador, no âmbito do artigo 1437º do Código Civil, ambos na redação em vigor, ao tempo, em momento anterior à publicação e entrada em vigor da Lei nº 8/2022 de 10 .1
M- Os poderes consignados na procuração emitida ao Dr. VT, e o Acordo que o Mandatário outorgou, não podem ser classificadas de despesas comuns, previstas no na alínea d) do número 1 do artigo 1436º do Código Civil, então vigente, que a Administradora pudesse determinar o seu pagamento.
N- Aliás é na Assembleia de Condóminos de realizada em 6 de novembro de 2018, Ata nº 33, que se junta e aqui se dá por reproduzida, (Documento nº 1) que relativa à fatura em causa, se determina a intenção e decisão relativa a tal fatura " Foi também decidido, caso os empreiteiros não compareçam para efetuar a reparação dos defeitos da obra, ser devolvida a fatura da A no valor de 27 490,64€".
O- E esta a decisão da Assembleia de Condóminos sobre o tema.
P- Não havendo, como não há qualquer outra decisão da Assembleia de Condóminos sobre o tema, manifestamente não será ao abrigo de tal decisão que a Administração poderá conferir poderes a Mandatário para Acordar seja o que for!
Q- Assim, manifestamente a procuração outorgada em 21 de Setembro de 2020, a favor do Dr. VT, continha poderes, que exorbitavam os poderes conferidos pela Assembleia de Condóminos à Administração do Condomínio.
R- Situação que, não foi verificada aquando da outorga da procuração, como deveria ter sido...
S- Como já se referiu, também posteriormente, à Assembleia de Condóminos de 6 de novembro de 2018, tal assunto não foi tema de nenhuma outra Assembleia de Condóminos, em termos de se terem estabelecido condições e valores para qualquer acordo ou transação, mandatando a Administradora para tal Acordo ou Transação.
T- Nestes termos a procuração, no seu texto, é irregular, os poderes consignados não permitiam o Acordo ou Transação celebrado.
U- A sociedade administradora do Condomínio do Edifício "B", não dispunha de poderes que lhe tivessem sido conferidos pelo Condomínio, através de deliberação em Assembleia de Condóminos, para outorgar, por si ou através de mandatário Judicial, aquele Acordo ou Transação, ou qualquer outro - exorbitou dos seus poderes.
V- Poderes aliás que aquando da outorga da procuração, não foram conferidos, como é legalmente previsto.
Rematou as suas conclusões nos seguintes termos:
“Assim, a Transação, celebrada no dia 21 de março de 2022, é inválida e de nenhum efeito, devendo ser anulada a homologação por sentença, prosseguindo os autos os seus ulteriores termos, (…).”
A apelada contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, e formulando as seguintes conclusões:[8]
A- A segurança do comércio jurídico não é compatível com argumentos como os alegados pela Ré no presente recurso;
B-
...

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