Acórdão nº 593/14.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-04-07

Data de Julgamento07 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão593/14.5BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

Vem a AT-Autoridade Tributária e Aduaneira interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição à execução deduzida por F..... contra a decisão de reversão proferida no processo de execução fiscal nº 157…… e apensos, instaurado originariamente contra a sociedade “P....., Lda.,”, por dívidas tributárias de IMI, IRS (retenções na fonte) e IVA do exercício de 2012 no montante total de € 3.030,03.

A Recorrente apresenta recurso contra a decisão proferida pelo tribunal a quo, tendo nas suas alegações formulado conclusões nos seguintes termos:

“I) Com a ressalva da devida vénia e também por melhor entendimento, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto, considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito; errando o douto Tribunal a quo quanto à aplicação do disposto nos art.°s 23° e 24, todos da LGT; bem como quanto ao disposto no art.º 204° do CPPT; art. 153° do CPPT, 64.º, 259º e 260.° todos do CSC.

II) Decidiu a douta Sentença a quo pela procedência da oposição por considerar que a AT não cumpriu o ónus da prova que o artigo 24° da LGT lhe impõe, ao não carrear para os autos elementos de prova suficientes para concluir pelo exercício da gerência efetiva da devedora originária por banda da Oponente.

III) No entanto, resulta dos autos que:
· “A Opoente assinou, enquanto representante da sociedade referida em l, em 27/10/2008, escritura pública através da qual foi constituída hipoteca de um prédio da sociedade referida em 1. para garantia de dívidas desta última— cfr. doc. junto a fls. 137 a 142 dos presentes autos.
· A Opoente assinou, enquanto representante da sociedade referida em l, em 28/09/2012, escritura pública através da qual foi celebrado contrato de dação em cumprimento de prédios da sociedade referida em 1. para pagamento de dívidas desta última— cfr. doc. junto a fls. 144 a 154 dos presentes autos.
· A Opoente assinou, enquanto representante da sociedade referida em 1, contratos de abertura de contas bancárias em nome desta última— cfr. doc. junto a fls. 155 e 156 dos presentes autos.
· A Opoente assinou, enquanto representante da sociedade referida em I, em 30/12/1998, escritura pública através da qual foi constituída propriedade horizontal num prédio da sociedade referida em 1. — cfr. doc. junto a fis. 157 a 165 dos presentes autos.”

IV) Tudo conforme se mostra expresso nos pontos 25 a 28 do probatório.

V) O artigo 24° da LGT exige a gerência de facto para que possa operar-se a reversão, e, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que aquela gerência de facto não se presume pela gerência de direito, sendo que, como a Lei não define no que consiste a gerência, têm a doutrina e a jurisprudência referido que, como tal, se deve considerar aquela em que os gerentes/administradores praticam atos de disposição ou de administração, de acordo com o objeto social da sociedade, em nome e em representação desta, vinculando-a perante terceiros, atento os contornos normativos que dela é feita nos artigos 252°, 259°, 260°, 408° e 409° do CSC [veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo 06732/13 de 31-10-2013].

VI) Assim, é gerente/administrador aquele(s) que exterioriza a vontade das sociedades nos seus negócios jurídicos, através dos quais se manifesta a sua capacidade de exercício de direitos, praticando atos que traduzem tarefas de fiscalização, aprovação de contratos, pagamentos, assinaturas de diversos documentos que vinculem a sociedade, perante clientes, fornecedores, bancos, Estado, trabalhadores.

VII) Perante o quadro factual resultante do probatório, não pode a Fazenda Pública concordar com a desconsideração de tais funções percorrida na sentença em mérito, pois provando-se que a Oponente foi nomeada gerente e que no período temporal a que se reportam as dívidas exequendas assinou documentos necessários ao giro comercial da sociedade, vinculando-a perante terceiros, tem-se por verificada a gerência de facto.

VIII) Assim e salvo o devido respeito, a prova ínsita nos autos e, as consequências necessárias que dali se aferem sustentam a posição da Fazenda Pública, enquanto titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, devendo ser considerada legítima a reversão contra a Oponente.

IX) Nesta conformidade, fez a douta Sentença errada interpretação da prova e dos factos, e errada subsunção dos factos ao direito, pelo que deverá a mesma ser anulada e proferido acórdão que considere improcedente a presente oposição.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta Decisão recorrida com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”.
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, a questão controvertida consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito ao considerar a Oponente como parte ilegítima da execução fiscal por dívidas de IMI, IRS e IVA do ano de 2012.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1) O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, dão-se como provados os seguintes factos:
1. Em 22/10/2012 foi instaurado sobre a sociedade P....., Lda. o processo de execução fiscal n.º 157……. onde se encontra em cobrança dívida de IMI referente ao exercício de 2012 – cfr. fls. 1 a 3 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

2. Ao processo de execução fiscal foram apensos os seguintes processos de execução fiscal:
a. N.º 157……, no qual se encontram em cobrança coerciva dívidas de IRS – retenção na fonte referente ao exercício de 2012, no valor de 293,25€;
b. N.º 157….., no qual se encontram em cobrança coerciva dívidas de IVA referentes ao exercício de 2012, no valor de 161,00€;
c. N.º 157….., no qual se encontram em cobrança coerciva dívidas de IVA referentes ao exercício de 2012, no valor de 543,15€;
d. N.º 157…., no qual se encontram em cobrança coerciva dívidas de IVA referentes ao exercício de 2012, no valor de 333,50€;
e. N.º 157….., no qual se encontram em cobrança coerciva dívidas relativas a coimas, no valor de 126,85€;
- cfr. fls. não numeradas do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

3. Após a apensação referida em 2. encontravam-se em cobrança coerciva no processo de execução fiscal referido em 1. dívidas no valor global de 3.156,88€ - cfr. fls. 6 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

4. Em 21/08/2013 foi elaborado pelo órgão da execução fiscal “Projecto de Reversão” com o seguinte conteúdo: “…Em face das diligências que antecedem, verifica-se a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis à Executada, P....., Lda.… Não havendo bens da devedora originária, ora executada que respondam pelo pagamento da dívida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos do n.º 2 do art.º 153º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento de constituição de responsabilidade, revertendo assim contra estes a execução. 1.Relativamente ao facto tributário. Verifica-se que o facto tributário ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea a) do n.º 1 do seu art.º 24º, os gerentes e administradores serão subsidiariamente responsáveis pelas dividas da sociedade, mediante prova de culpa a efectivar pela Administração Tributária. Como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova, não é possível efectivar a responsabilidade latente. 2. Relativamente à obrigação de pagamento: Verifica-se que a obrigação de pagamento ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea b) do n. 1 do seu art.º 24º os gerentes e administradores que exerçam, ainda que somente de fado, funções de gestão em pessoas colectivas ou equiparadas, serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. Assim, em face da informação que antecede e considerando os momentos de constituição da responsabilidade subsidiária, ao conjugar estes com a legislação então vigente temos que é (são) (solidariamente) responsável (eis) pelo pagamento das seguintes importâncias por dívidas de IMI, IRS – Ret. Fonte, IVA e Coima: … F..... responde pelo pagamento e € 3.030,03 , relativo ao seu período de gerência. Face ao disposto no n° 4 do art.º 23º e do art.º 60º da Lei Geral Tributária (LGT), proceda-se à notificação do(s) interessado(s), para efeitos do exercido do direito de audição prévia, fixando-se c praza de 15 dias a contar ou notificação, devendo aquela ser exercida por escrito…” – cfr. fls. 13 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

5. Na sequência de 4., pelo órgão da execução fiscal, com data de 21/08/2013 foi remetido à Opoente...

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