Acórdão nº 5924/21.9T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-07-12

Ano2023
Número Acordão5924/21.9T8VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 5924/21.9T8VNG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de V.N.Gaia - Juiz 1

Recorrente: AA
Recorrida: APPACDM de ...



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
A A., AA, residente na Rua ..., ... ..., Gondomar, intentou acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum contra APPACDM de ... – Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental, IPSS, Pessoa Colectiva de Utilidade Pública com sede na Rua ..., ... ..., pedindo que, “deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência:
A) Ser declarada a nulidade do despedimento da A., por ilícito, dada a ausência de processo disciplinar, dada a nulidade da estipulação do termo no seu contrato de trabalho, declarando-se que subsiste o vínculo laboral e condenando-se a Ré a reintegrá-la no seu posto e local de trabalho, com a categoria, antiguidade e retribuição que lhe caberia se não tivesse sido despedida, isto sem prejuízo de optar, em sua substituição e até à data da sentença que transite em julgado, pela indemnização de antiguidade prevista no artigo 391º do Código do Trabalho;
B) Ser a Ré condenada a reconhecer a ilicitude da sua actuação, e condenada a pagar à A. as quantias já vencidas e indicadas em 21º desta PI nos seus pontos I, II, III e IV, tudo acrescido de juros legais desde a data da citação até integral pagamento;
C) Ser a Ré condenada no pagamento da compensação por antiguidade indicada no art. 21º desta PI no seu ponto V, a qual deverá ser paga caso a trabalhadora não opte pela reintegração;
D) Ser a Ré condenada a uma justa indemnização por danos não patrimoniais, a fixar equitativamente pelo Tribunal, e no pagamento de todas as custas do processo e dos demais encargos legais.”.
Fundamenta o seu pedido alegando, em síntese, que trabalhou por conta da ré desde 21/03/2020, com a categoria profissional de Ajudante de Acção Directa de 3.ª e ao abrigo de um contrato de trabalho a termo certo, celebrado nos termos do art. 140º, nº 1, alínea b), do Código do Trabalho.
Mais, alega que, na fundamentação do contrato do termo consta que, “O presente contrato é celebrado ao abrigo do artigo 140º nº 1 alínea b) do Código do Trabalho, declarando o trabalhador se encontrar em situação de desemprego de muito longa duração” e que, tal estipulação de termo é nula, por manifesta falta de fundamento e justificação.
Alega, também, que a ré só lhe permitiu que assinasse o contrato de trabalho se antes assinasse um documento que se tratava do conhecimento da caducidade desse mesmo contrato de trabalho, sendo que ao longo da execução do contrato, os responsáveis da ré foram-lhe criando a expectativa de efectivar na empresa, pois iam-lhe dizendo que estavam satisfeitos com o seu desempenho profissional, dando-lhe a entender que o documento de cessação era mero documento “pró-forma”.
Alega, ainda que, como contrapartida da sua prestação de trabalho, auferia mensalmente o valor de € 665,00, acrescido de €3,50 diários, a título de subsídio de alimentação, encontrando-se obrigada à prestação de um período semanal de trabalho de 37 horas.
Por fim, alega que, de acordo com o Código do Trabalho, impor-se-ia uma verdadeira justificação do termo do contrato e não uma mera remissão para um dos seus artigos, sendo que foi despedida pela ré sem justa causa invocada e sem precedência de qualquer processo disciplinar, tendo-se limitado a empregadora a alegar aquando da outorga do contrato de trabalho a termo, a caducidade do mesmo com efeitos a 20/03/2021, opondo-se à sua renovação. Assim, não fundamentou a sua decisão de despedir a trabalhadora, o que se traduz em actuação ilícita, na medida em que não havia qualquer justificação do termo. E que, o despedimento lhe causou um sentimento de frustração, o qual foi vivenciado pelos restantes familiares e amigos, estando em constante ansiedade e tendo agora dificuldade em dormir e não tendo alegria em conviver com os amigos e familiares.
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Realizada a audiência de partes sem acordo, conforme consta da acta datada de 28.10.2021, foi a R. notificada para contestar, o que fez, alegando, em síntese, ser verdade que celebrou com a autora um contrato de trabalho a termo certo, em 21.03.2020, caducando no dia 20.03.2021, sendo também verdade que no mesmo dia da celebração do contrato comunicou à autora a sua intenção de o fazer caducar, na data prevista.
Alega que, na data da caducidade do contrato de trabalho a termo certo, emitiu uma declaração na qual constava o período em que a autora lhe prestou serviço, bem como a respectiva categoria profissional, sendo que a emissão e entrega do certificado de trabalho, nos termos que dele constam não cria qualquer “expectativa” na manutenção do contrato de trabalho, mas pelo contrário a certeza da sua caducidade. E que, comunicou à autora a sua vontade de não renovar o contrato para evitar a sua renovação automática, também no cumprimento de uma obrigação legal, podendo fazê-lo quando entender desde que cumpra o prazo mínimo estipulado por lei.
Mais, referiu que o contrato em causa foi celebrado ao abrigo de medida excepcional de incentivo à contratação de desempregados de muito longa duração, que não depende dos requisitos previstos no art. 140º. n.º 1 do Código do Trabalho, pelo que a exigência da suficiência da fundamentação do motivo justificativo é substancialmente reduzida, comparativamente com todas as outras situações, sendo que o motivo da celebração do contrato de trabalho a termo certo consta expressamente do contrato: a trabalhadora encontrava-se na situação de desempregada de muito longa duração.
Por fim, alega que não há qualquer fundamento legal para a pretendida ilicitude do despedimento da autora e impugna os créditos reclamados visto que o contrato de trabalho cessou em 20.03.2021 e a presente acção deu entrada em 29.07.2021, devendo ser deduzido o montante por ela recebido a título de subsídio de desemprego e atendendo, ainda, que a trabalhadora não prestou serviço no período peticionado, não lhe assiste o direito a receber o subsídio de turno e de refeição. Por outro lado, encontrando-se os proporcionais de férias correctamente calculados, ao valor em que eventualmente a ré fosse condenada a pagar à autora haveria que deduzir o montante por esta já recebido a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo certo, no montante de €399,00.
Conclui que, “Deve a presente acção ser julgada improcedente por não provada e, em consequência, ser a R. absolvida do pedido.”.
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Oportunamente, foi dispensada a convocação de audiência prévia e a enunciação dos temas da prova, atenta a simplicidade da matéria de facto em discussão, fixado o valor da acção em €6.347,64 e proferido saneador tabelar.
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Realizada a audiência de julgamento, nos termos documentados na acta de 28.03.2022, foi proferida sentença que terminou com a seguinte DECISÃO:
Pelo exposto, julgo improcedente e não provada, a presente acção, intentada por AA contra APPACDM de ... – Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental, IPSS, Pessoa Colectiva de Utilidade Pública e, em consequência, absolvo a ré dos pedidos contra a mesma deduzidos.
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Custas a cargo da autora, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que goza – art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código do Processo Civil ex vi art.º 1.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho.
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Registe e notifique.”.
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Inconformada com esta, a A. apresentou recurso, nos termos das alegações juntas, que finalizou com as seguintes “CONCLUSÕES
A) Com a decisão recorrida – a permanecer válida – sai a lei violada e contornada, por deturpação à sua finalidade, quer o disposto no art. 140º, nº 1, alínea b), do Código do Trabalho, quer o desiderato preconizado pelo Decreto-lei nº 72/2017, de 21 de junho, pois haveria cobertura de uma decisão judicial a uma empresa que contrata um trabalhador em situação de desemprego de muito longa duração e no mesmo dia lhe exige que assine a tomada de conhecimento da denúncia do mesmo;
B) Como se deixou exposto, a Ré actuou em manifesto abuso de direito e violação de normas por esse excesso;
C) Por seu turno, a decisão recorrida faz uma errada subsunção da situação de facto dos autos, naquilo que dispõe o artigo 140.º do Código do Trabalho, razão pela qual deverá ser revogada e ser declarada a nulidade da estipulação de termo aposto no contrato de trabalho celebrado com a A., pugnando-se pela existência de um contrato de trabalho sem termo, condenando-se a Ré no pedido, tudo com as legais consequências.
Termos em que, nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer total provimento e consequentemente revogada a sentença recorrida, condenando-se a ré no pedido, tudo com as legais consequências, como é de inteira e sã JUSTIÇA!
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A R., respondeu nos termos das contra-alegações juntas, que finalizou com as seguintes “CONCLUSÕES
I. Bem decidiu a Mma Juiz a quo, absolvendo a R. de todos os pedidos formulados pela A., ora Recorrente.
II. A A. foi admitida ao serviço da R. por contrato de trabalho a termo certo com o motivo/fundamento desta ser desempregada de muito longa duração, previsto no art. 140º, n.º 4, b) do Código do Trabalho;
III. A A. era desempregada de muito longa duração;
IV. O empregador pode comunicar a caducidade do contrato de trabalho a termo certo na data da sua celebração, designadamente quando o fundamento/motivo é a situação do trabalhador: desempregado de muito longa duração.
V. Assim, o contrato de trabalho a termo certo caducou na data constante da comunicação,
VI. Tendo sido entregues à A. todas as quantias de que era credora.
VII. O comportamento da R. não consubstancia qualquer abuso de direito.
Termos em que:
Negando-se provimento ao presente recurso e, em
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