Acórdão nº 5908/22.0T8MAI.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-10-30

Ano2023
Número Acordão5908/22.0T8MAI.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação/Processo nº 5908/22.0T8MAI.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo do Trabalho da Maia, Juiz 1

Recorrente: “Banco 1..., SA”
Recorrido: AA


4ª Secção
Relatora: Germana Ferreira Lopes
1ª Adjunta: Eugénia Pedro
2ª Adjunta: Rita Romeira




Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - RELATÓRIO
AA (Autor) instaurou contra Banco 1..., S.A. (Ré) a presente ação, com processo comum, pedindo a condenação da sociedade Ré a:
a) reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 26,66%, correspondente aos 4 anos de descontos com densidade contributiva para a Segurança Social, enquanto trabalhador bancário, ou seja;
b) pagar ao Autor o valor de € 14.572,47 a título de pensão do CNP indevidamente retida e correspondente ao período de fevereiro de 2017, até à presente data, acrescido do montante de €1.699,96 a título de juros de mora vencidos, num valor total global de €16.272,43;
c) aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo Autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) pagar ao Autor todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença.
Em resumo, alega:
A Ré é uma instituição de crédito, e exerce a actividade bancária, tendo participado nas negociações e outorgado o ACT para o Sector Bancário, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 29, de 09/03/2021, pg. 736 e ss., instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte.
Por sua vez, o Autor encontra-se filiado no Sindicato dos Trabalhadores do Sector Financeiro de Portugal - SBN, onde figura como sócio n.º ....
Foi admitido ao serviço da Ré em 01-04-1981, tendo passado à situação de reforma a 31-12-2014, integrado no nível 10 do Grupo B do ACT para o Sector Bancário, com a contagem da respetiva antiguidade bancária de 33 anos, o que lhe foi comunicado por carta da Ré datada de 8-07-2014.
Em cumprimento da cláusula 94ª do ACT, o Autor solicitou, em novembro de 2016, ao Centro Nacional de Pensões da Segurança Social, a pensão de reforma a atribuir por esta entidade.
Por carta do Centro Nacional de Pensões (CNP), datada de 03/01/2017, o Autor foi informado que o seu requerimento de pensão foi deferido, sendo-lhe atribuída a pensão por velhice com início em 28-11-2016, no valor de €424,04, pagável a partir de 02/2017.
Teve uma carreira contributiva com 3 momentos distintos de descontos: de 10/1971 a 09/1974 e 11/1974 a 06/1981, efetuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividades dependentes remuneradas a entidades não bancárias; de 01/04/1981 a 31/12/2010 enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB) e para o Fundo de Pensões do Banco; de janeiro de 2011 o Autor, enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos para a Segurança Social, até passar à situação de reforma (31-12-2014).
A pensão atribuída ao Autor do CNP tem o valor atual de € 484,04, que corresponde a 15 anos de descontos com densidade contributiva para a Previdência, sendo que o período de 1-01-2011 a 31-12-2014 corresponde a quatro anos de antiguidade bancária.
Sustenta que a Ré tem direito a fazer seu o valor resultante da percentagem correspondente a quatro anos de descontos para a Segurança Social (dos 15 que totalizam a sua carreira contributiva) enquanto trabalhador bancário, ou seja 26,66%, “benefício da mesma natureza”(período coincidente entre o Regime da Segurança Social e o do Sistema Bancário) previsto na cláusula 94ª, n.º 1, do ACT. Sucede que a Ré deduz ao valor que recebe do Centro Nacional de Pensões uma quantia superior àquela que devia deduzir, entregando assim ao Autor valor inferior ao que devia.

Foi realizada a audiência de partes, não tendo sido possível a conciliação.
A Ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência da ação. Invocou a exceção perentória de prescrição, defendendo que se o Autor tivesse o direito que reclama – o que não concede – o direito referente a prestações anteriores a 18-11-2017 (contido na alínea b) do pedido) já estaria extinto por prescrição (a citação da Ré ocorreu em 18-11-2022), por força do disposto no artigo 310.º, alínea g), do Código Civil. Sem prejuízo dessa linha de defesa, sustentou, em substância, que, contrariamente ao pretendido pelo Autor, a redação da cláusula 136ª do ACT do sector bancário, presentemente 94ª, não autoriza a leitura de que o benefício a descontar pelo Banco seja apurado na base de um critério de proporcionalidade em “regra de três simples pura”. Pelo contrário, entende que tal “pensão de abate” é o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do Banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP. Argumenta que, considerar, como pretende o Autor, apenas o fator tempo (por via da “regra de três simples pura” ou “pro rata temporis”) é desaplicar as regras que o próprio sistema estabelece para o cálculo do benefício.

Foi exercido o contraditório quanto à exceção perentória de prescrição.

Refira-se que foram juntas aos autos cópias de sentenças e acórdãos (incluindo desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto) proferidos noutros processos, e a Ré procedeu à junção de Pareceres subscritos, um pelo Sr. Professor Doutor Bernardo da Gama Lobo Xavier datado de 22 de março de 2019, outro pela Sr.ª Professora Doutora Maria do Rosário Palma Ramalho datado de abril de 2020.

Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual as partes acordaram fixar a matéria de facto, para além da que já resultava por acordo em sede de articulados. Nessa diligência foi determinado que fosse aberta conclusão para proferir decisão de mérito por escrito.

Foi proferida sentença, concluída com a decisão seguinte:
«Na desinência do exposto, decide o Tribunal julgar a exceção perentória de prescrição procedente e, a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:
a) a reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor correspondente à percentagem de 26,66%, correspondente aos 4 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a declarar a prescrição das pensões anteriores a 18/11/2017;
c) a pagar ao Autor o valor a apurar em sede de liquidação de sentença a título de pensão do CNP indevidamente retida e correspondente ao período de 18 de novembro de 2017 até à interposição da ação, acrescido de juros de mora;
d) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo Autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
e) a pagar ao Autor todas as quantias que ilicitamente reteve e que venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em d), desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, a liquidar em execução de sentença.
Custas pelo Autor na proporção de 1/10 e pelo Réu na proporção de 9/10 - artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Valor da ação - €16.272,43 (artigo 297.º do Código de Processo Civil).».

Inconformada com esta decisão a Ré interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
“1. A interpretação das cláusulas regulativas de convenção coletiva de trabalho deve fazer-se de acordo com as regras de interpretação da lei, em particular de acordo com o disposto no artigo 9.º do Código Civil, como vem sendo entendimento da Jurisprudência, como recentemente foi defendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 55, de 19 de Março de 2019.
2. Na INTERPRETAÇÃO da cláusula 136.º do ACT do setor bancário deve, pois, atender-se aos seus elementos literal, sistemático, histórico e teleológico.
3.No que respeita ao elemento literal, a redação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (cláusula que veio a ser substituída pela Cláusula 94.ª do atual ACT do Setor Bancário) é clara nos dois aspetos que aqui relevam.
4. O primeiro, é que nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares – como sucede com o Recorrido, a partir de 1.1.2011, dado a sua integração no regime geral da segurança social por imposição do Decreto-Lei n.º 1- A/2011, de 3 de Janeiro – apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos no ACT – cfr. 2.ª parte do n.º 1 da clausula 136.ª.
5. O segundo, é o de determinar que o benefício a “abater” é o que decorre de contribuições feitas no período de serviço contado pelo Banco para o cálculo da pensão a pagar por este, pois como se refere no n.º 2 daquela cláusula estão em causa os benefícios decorrentes de contribuições.
6. A “pensão de abate” – assim a designamos por facilidade de exposição – é o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao
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