Acórdão nº 5857/11.7TBMTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-09-27

Ano2022
Número Acordão5857/11.7TBMTS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 5857/11.7 TBMTS.P1
Comarca do Porto – Juízo do Comércio de Santo Tirso – Juiz 2
Apelação

Recorrente: AA

Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e João Ramos Lopes


Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
Por decisão proferida em 5.9.2011 foi declarada a insolvência de AA, casado no regime da comunhão de adquiridos com BB.
Por posterior despacho judicial de 22.2.2012 admitiu-se liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo insolvente, mais se determinando que sejam integralmente cedidos ao fiduciário durante os cinco anos posteriores à data de encerramento do processo de insolvência todos os rendimentos por ele auferidos que excedam o valor de 780,00€ por cada mês do calendário, atualizado em janeiro de cada ano pelo índice de inflação que se registe.
Deste despacho, em termos factuais, consta ainda que o insolvente:
- Vive com a sua mulher e aufere mensalmente um valor global de €2.573,85, a título de reforma e de pensão por incapacidade para o trabalho;
- Nasceu em .../.../1937, e até à situação de reforma em que se encontra desenvolveu atividade como empresário, desempenhando cargos de administração em várias sociedades.
A data do início do período de cessão foi fixada em 1.7.2017, por despacho de 17.12.2018.
Em 6.4.2022 foi apresentado relatório de fidúcia nos termos do art. 240º, nº 2 do Cód. da Insolvência e da Recuperação de Empresas [doravante CIRE], no qual se consignou o seguinte:
“(…)
5 - Pelos dados obtidos resulta haver lugar a entrega à fidúcia de 121 786,89Euros.
6 - Não foi entregue, até esta data, qualquer montante à conta da Massa Insolvente pelo Devedor. O anterior AJ informou os autos do valor das penhoras numa conta no Banco 1..., no montante de 5.564,13 Euros, conforme cópia que anexamos. Por indicação do AE, que se anexa, foram penhorados 16.440,48€, para o qual foi já pedida a entrega à fidúcia desse montante.
7 – Foi notificado o Insolvente deste relatório, indicando como pretende regularizar o montante em dívida. Será indicada aos autos, nos próximos 15 dias, a resposta obtida.
8 - Dado o insolvente não ter entregado todo o valor devido à fidúcia, encontra-se em incumprimento.
9 - Foram notificados todos os credores do conteúdo deste relatório.”
Notificado deste relatório, o insolvente, em 12.4.2022, apresentou o seguinte requerimento:
“À presente data está já em vigor a Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro, que procede a muito significativas alterações ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Dispõe o n.º 1 do artigo 10.º da referida lei que esta se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, como é o caso do presente.
O que significa que, com as atuais redações dos artigos 235.º, 237.º e 239.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o período de cessão de rendimentos para efeitos de exoneração do passivo restante passa a ser três anos, em lugar de cinco.
Três anos que, no momento presente, já decorreram.
Razão pela qual, salvo melhor entendimento, deverá ser dado cumprimento ao disposto no artigo 244.º do referido código, seguindo-se a ulterior tramitação com vista à exoneração do passivo restante do devedor.
Dito isto, e no que concerne ao relatório apresentado,
Conforme consta de forma expressa na douta sentença declaratória da insolvência, prolatada já no ano de 2011, o Insolvente é casado, no regime da comunhão de adquiridos, com BB.
O que significa que os rendimentos por si auferidos – e designadamente os rendimentos por si auferidos durante o período de cessão de rendimentos – são um bem comum do casal, nos termos do disposto no artigo 1.724.º do Código Civil.
Não obstante, o Exm.º Senhor Fiduciário, para o apuramento do rendimento disponível, considera a totalidade dos rendimentos auferidos pelo Insolvente quando, por força da norma referida no parágrafo anterior, apenas poderia considerar metade, a parte que compete ao Insolvente.
O que torna ilegal o apuramento de valores indicado no mesmo relatório, por abranger direitos da mulher do Insolvente, que não é aqui Insolvente, ilegalidade que aqui vai expressamente invocada, nos termos e para todos os legais efeitos, devendo o Exm.º Sr. Fiduciário ser notificado para corrigir o relatório em crise, reformulando-o em conformidade.
Por outro lado,
Conforme consta do mesmo relatório, subsistem desde há muito descontos na pensão de reforma do Insolvente, apesar de todas as diligências levadas a cabo no sentido da cessação dos mesmos após a declaração de insolvência, designadamente através do Exm.º Sr. Fiduciário que antecedeu o atual.
Uma vez que os valores referidos na documentação com que o Exm.º Sr. Fiduciário instrui o seu relatório são inconclusivos (e estranhamente reduzidos, considerando o lapso de tempo decorrido) quanto à penhora à ordem do processo n.º 604/09.6TBPBL, e sendo altamente provável que os valores que estarão indevidamente retidos à ordem deste processo seja suficiente para integral liquidação do valor que vier a ser apurado a título de rendimento disponível durante todo o período da cessão, requer a V.Ex.ª se digne ordenar seja notificado o Exm.º Sr. Agente de Execução CC no sentido de vir esclarecer os presentes autos, de forma discriminada, quais os valores penhorados ao Insolvente e em que data, para que sejam subsequentemente entregues ao Exm.º Sr. Fiduciário.”
O Sr. Fiduciário não exerceu o contraditório relativamente à reclamação apresentada pelo insolvente.
Em 2.6.2022 foi então proferido o seguinte despacho judicial:
“Requerimento com refª 41926509:
No que concerne à reclamação apresentada pelo insolvente no sentido de apenas poder ser considerado metade do seu rendimento mensal, por ser um bem comum, tal interpretação não tem tradução legal.
Com efeito, a exoneração do passivo restante é uma medida introduzida no ordenamento jurídico nacional pelo atual código da insolvência, aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de março.
No preâmbulo deste diploma o legislador referiu-se a esta medida nos seguintes termos:
“O Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a
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