Acórdão nº 58327/21.4YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-05-25

Ano2023
Número Acordão58327/21.4YIPRT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO

F..., Lda instaurou acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, contra AA, pedindo a sua condenação no pagamento do valor de € 41.602,38 acrescido de juros de mora, por conta do não pagamento de uns produtos por si vendidos.

O requerido deduziu oposição defendendo que apenas deve uma quantia menor, cerca de € 3256,04.

Foi realizada audiência de discussão e julgamento e proferida sentença que julgou procedente a ação e em consequência condenou o réu AA a pagar à autora F..., Lda., a quantia de € 41.602,38 (quarenta e um mil euros seiscentos e dois euros e trinta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa dos juros comerciais, vencidos desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Inconformado veio o réu recorrer da decisão apresentando as seguintes conclusões:

1) O Réu está a ser vítima de uma enorme injustiça resultante de um astucioso plano arquitetado pela Autora para lhe exigir o que bem sabe não ser devido.
2) Salvo o devido respeito, e que é muito, entende o Réu que a douta sentença recorrida enferma de nulidade, por excesso de pronúncia, uma vez que tomou em consideração factos que não foram alegados pelas partes e que o tribunal não podia conhecer.
3) Analisados os articulados, verifica-se que causa de pedir da presente ação é unicamente constituída pelas relações comerciais entre a Autora e ora apelante tituladas pelas faturas descritas no requerimento de injunção.
4) Pese embora o exposto, analisados os pontos nº 4, 5 e 6 dos Factos Provados, o Mmo. Juiz a quo considerou que o valor em débito por parte do apelante à Autora emerge não só do não pagamento de faturas, mas também de encargos com letras não pagas e sucessivas reformas.
5) Tendo em atenção o disposto nos arts. 5.º, nº 1, 260.º, 265.º, nº 1, e 611.º, nº 1, do CPC, entende o apelante que o tribunal a quo não podia ter tomado conhecimento daquela factualidade e, com base na mesma, ter condenado aquele no pagamento à Autora da quantia de €41.602,38.
6) Contrariamente ao que consta da douta decisão recorrida, a referida factualidade não é meramente instrumental. Discutindo-se relações comerciais entre dois comerciantes, saber se determinada quantia em débito resulta do não pagamento de faturas que titulam a compra e venda de artigos ou do não pagamento de “encargos com letras não pagas e sucessivas reformas” constitui factualidade essencial.
7) Ao ter decidido que o débito do apelante está sustentado em encargos havidos pela Autora com letras, o tribunal a quo conheceu questão que lhe estava vedada, nos termos do art. 608.º, nº 2, do CPC, indo além da causa de pedir alegada.
8) Deste modo, a douta sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no art. 615.º, nº 1, al. d), do CPC, pelo que deve revogada e deve ser proferido acórdão que absolva o apelante do pedido.
9) Ainda que assim não se considerasse, o que apenas se concebe por mera hipótese de raciocínio, entende o apelante que nunca podiam ter sido considerados provados alguns dos factos constantes da douta sentença recorrida.
10) Na douta sentença recorrida, e com interesse para esta parte do presente recurso, consideraram-se os seguintes factos provados:
4. Em face do não pagamento das faturas respeitantes aos artigos fornecidos pela Requerente, todas elas já vencidas, encontra-se, neste momento, em dívida o valor global de € 41.602,38 (quarenta e um mil seiscentos e dois euros e trinta e oito cêntimos), titulado pelas seguintes faturas:
- FT ...83, no valor de € 9.859,37;
- FT ...84, no valor de € 3.691,71;
- FT ...11, no valor de € 2.730,45;
- FT ...02, no valor de € 1.693,52;
- FT ...03, no valor de € 4.099,93;
- FT ...86, no valor de € 2.864,05;
- FT ...87, no valor de € 7.893,99;
- FT ...27, no valor de € 925,65;
- FT ...29, no valor de € 2.078,30;
- ..., no valor de € 901.45;
- FT ...93, no valor de € 1.331,00;
- FT ...94, no valor de € 786,50;
- FT ...57, no valor de € 744,72;
- FT ...99, no valor de € 2.581,06;
- FT ...76, no valor de € 460,80;
- FT ...77, no valor de € 370,50;
- FT ...98, no valor de € 3.256,04.
5. Das faturas vindas de relacionar, o requerido pagou parcialmente algumas delas, pelo que se encontra em dívida o valor de € 41.602,38 (quarenta e um mil, seiscentos e dois euros e trinta e oito cêntimos).
6. Parte do valor em dívida diz respeito aos encargos com letras não pagas e sucessivas reformas nos termos constantes do extracto de conta corrente junto a fls. 43 verso e seguintes dos autos – facto aditado ao abrigo do artigo 5º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil.
7. Apesar de interpelado, por diversas vezes, para proceder à liquidação do remanescente de tais faturas, o requerido tem vindo a protelar indefinidamente o seu pagamento, não o tendo, até ao presente momento, concretizado.
9. A autora interpelou o réu para pagamento, diversas vezes ao longo do tempo, mas a quantia não foi paga.”
11) Para considerar provada a factualidade referida, o tribunal a quo levou em consideração as declarações do representante legal da Autora, BB, os depoimentos das testemunhas CC, DD e EE, bem como os recibos e o extrato de conta corrente constantes dos autos.
12) A respeito das declarações do representante legal da Autora, BB, e do depoimento da testemunha CC importa frisar que ambos, pela sua qualidade de gerente e sócio da Autora, respetivamente, têm um manifesto interesse direto na causa, pelo que é temerário sustentar nessas declarações e depoimento o destino de uma ação em que se discutem relações comerciais e recebimentos da entidade que representam e que detêm o que deles resulta.
13) Além disso, das declarações do gerente da Autora e do depoimento das referidas testemunhas não resultou indubitável e claro qual o valor em débito por parte do Autor, por referência às faturas invocadas no requerimento de injunção.
14) Por outro lado, do depoimento da testemunha DD resulta que era esta a responsável pela gestão da ourivesaria do Réu, sendo o valor em débito pelo Réu à Autora muito inferior ao valor pedido nos presentes autos.
15) Os recibos de pagamento emitidos pela Autora a favor do Réu foram juntos por este por requerimento de 11.02.2022 e em momento algum foram impugnados ou o seu conteúdo ou instruções foram negados pela Autora, nos termos e no prazo previsto no art. 444.º, nº 1, do CPC, pelo que têm integral valor probatório.
16) Analisando esses recibos e os valores deles contantes, verifica-se que o Réu pagou à Autora o montante de €13.530,75 respeitante às faturas invocadas no requerimento de injunção e o montante de €10.006,91 respeitante a notas de débito.
17) Verifica-se ainda que esses recibos respeitam todos à fatura nº ...03 e seguintes, o que apenas pode significar que as faturas anteriores, nomeadamente as nº ...83, ...84, ...11 e ...02 invocadas no requerimento de injunção, se encontram totalmente pagas.
18) No que respeita às interpelações do Réu para pagar, nenhuma prova convincente foi realizada a esse respeito, quer testemunhal quer documental.
19) Assim, deve alterar-se a decisão relativa aos mencionados pontos Factos Provados, passando os mesmos a ter o seguinte teor:
4. Em face do não pagamento das faturas respeitantes aos artigos fornecidos pela Requerente, todas elas já vencidas, encontra-se, neste momento, em dívida o valor global de €14.763,24 (catorze mil setecentos e sessenta e três euros e vinte e quatro cêntimos), titulado pelas seguintes faturas:
- FT ...03, no valor de €4.099,93;
- FT ...87, no valor de €7.893,99;
- FT ...93, no valor de €1.331,00;
- FT ...94, no valor de €786,50;
- FT ...29, no valor de €2.078,30;
- FT ...57, no valor de € 744,72;
- FT ...99, no valor de € 2.581,06;
- FT ...76, no valor de € 460,80;
- FT ...77, no valor de € 370,50;
- FT ...98, no valor de € 3.256,04.
5. Das faturas vindas de relacionar, o requerido pagou parcialmente algumas delas, pelo que se encontra em dívida o valor de € €14.763,24 (quarenta e um mil, seiscentos e dois euros e trinta e oito cêntimos).
6. Retirado
7. Retirado
9. Retirado
20) Atendendo à alteração da decisão de facto decorrente da parte anterior do presente recurso, verifica-se que, pelo incumprimento da obrigação de pagar o preço, nos termos do disposto no art. 879.º, al. c), do C. Civil, apenas pode o Réu ser condenado a pagar à Autora o montante de €14.763,24.
21) Deste modo, deve ser revogada a douta sentença recorrida e proferido acórdão que condene o Réu no pagamento à Autora do montante de €14.763,24.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e proferido acórdão nos termos atrás descritos, como é de JUSTIÇA.

Veio a Autora contra alegar e recorrer subordinadamente apresentando as seguintes conclusões:

1. Em primeiro lugar propugna-se pela inadmissibilidade do presente recurso, em virtude de o Recorrente não ter respeitado, na sua apresentação, os prazos legalmente previstos.
2. Como decorre da ata de audiência de julgamento, com a referência ...16, datada de 17 de Maio de 2022, finda a produção de prova e concluídas as alegações das mandatárias, foi proferida a douta sentença em crise, de forma oral, tendo todos os presentes ficado imediatamente notificados do seu teor.
3. Dispõe o nº 3 do artigo 638º do CPC que “ tratando-se de despachos ou sentenças orais, reproduzidos no processo - como será, indiscutivelmente, o caso – o prazo corre do dia em que foram proferidos, se a parte esteve presente ou foi notificada para assistir ao ato.
4. Encontrando-se o Réu presente durante toda a audiência de julgamento, foi imediatamente notificado da decisão.
5. Isto posto, o prazo para a interposição de recurso da sentença, proferida em 17 de Maio, iniciou-se no dia imediatamente seguinte.
6. Tratando-se de um prazo de 30 (trinta dias), acrescido de...

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