Acórdão nº 55/21.4 BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão55/21.4 BCLSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL – SUBSECÇÃO SOCIAL

I. RELATÓRIO
1. A S………, SAD, inconformada com o acórdão de 9 de Dezembro de 2020, proferido pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, no âmbito do processo disciplinar nº …..-2019/20), que lhe aplicou a sanção de interdição do recinto desportivo por dois jogos, e também, uma sanção de multa no valor de € 13.388,00 (treze mil, trezentos e oitenta e oito euros), pelo alegado apoio reiterado a grupos organizados de adeptos não legalizados em diversos jogos nos quais a SAD arguida foi promotora, em violação do artigo 118º do "Regulamento Disciplinar da Competições Organizadas pela Liga Portugal", impugnou tal decisão junto do Tribunal Arbitral do Desporto (TAD).
2. O TAD, por acórdão datado de 30-3-2021, decidiu julgar procedente a impugnação e anulou e revogou o acórdão recorrido e as sanções aplicadas pela demandada à demandante em sede disciplinar.
3. Inconformada, a Federação Portuguesa de Futebol interpôs recurso de apelação para este TCA Sul, no qual formulou as seguintes conclusões:
1. O presente recurso é interposto da decisão proferida pelo Colégio Arbitral no âmbito do processo de acção arbitral necessária nº …./2020, que declarou procedente a acção interposta pela ora recorrida e determinou a revogação do acórdão de 9 de Dezembro de 2020 proferido pelo Pleno do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol – Secção Profissional, através do qual se decidiu aplicar à ora recorrida sanção de interdição do recinto desportivo por 2 jogos e multa no valor de 13.388,00€ por aplicação do artigo 118º do RD da LPFP.
2. Em concreto, a recorrida havia sido punida pelo Conselho de Disciplina por, sinteticamente, dar apoio a grupos organizados de adeptos que não se encontram em cumprimento dos requisitos legais e regulamentares aplicáveis, colocando em causa a boa imagem da competição bem como a segurança dos demais intervenientes no jogo.
3. A decisão que ora se impugna é passível de censura, porquanto existem vários erros graves de julgamento na interpretação e aplicação do Direito, para além de se verificar o vício de falta de fundamentação, devendo por isso ser anulado, conforme se passa a demonstrar.
4. O Acórdão proferido pelo Colégio Arbitral é, nos seus diversos segmentos, contraditório entre si e, por essa via, de impossível compreensão, porquanto dá como provados factos que inequivocamente levariam a que a resolução do litígio fosse distinta, pelo que é nulo por via da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
5. Atendendo à matéria de facto considerada provada pelo Tribunal a quo, que, sublinhe-se, é maioritariamente idêntica à factualidade considerada provada pelo Conselho de Disciplina da recorrente, resultou demonstrado que a recorrida apoiou GOA's ilegais, bem como que de tal apoio resultou uma situação de perigo para os bens jurídicos da segurança e tranquilidade públicas, e de lesão do bem jurídico da imagem e bom nome das competições desportivas organizadas pela Liga Portugal, em que a recorrida participa.
6. A conduta que a recorrida levou a cabo, e como de resto considerou o Colégio Arbitral, também, provado, no sentido de permitir a introdução e utilização no recinto desportivo de um “bombo" e das referidas bandeiras gigantes pelos GOA não legalizados, denominados R………e B……………..cuja exibição durante os sete jogos por esses GOA não legalizados afectos à recorrida, foi permanente, permite concluir que esta, efectivamente, apoiou, nesses jogos, GOA's que não estão legalizados.
7. Este apoio é também manifesto quando avaliamos as fotografias constantes dos autos juntas, designadamente, a fls. 213 (PD nº …… – 2019/2020), 48,156 a 159 do PD nº .... – 2019/2020. E, recorde- se, estamos a falar de bandeiras e tarjas de dimensões aproximadas de 5 a 7 metros!
8. E se o OLA da recorrida facilitou aos GOA não legalizados, a entrada "de um bombo, bandeiras e tarjas" visíveis nas fotos constantes dos autos do processo administrativo, e bem assim nos pontos 19.3 e 20.3 dos factos provados – por referência ao "bombo" –, como certamente muitos outros verão, sem necessidade de elucubrações conceituais ou semânticas, então a recorrida cai no âmbito regulamentar de acordo com o qual autoriza aos grupos organizados a, excepcionalmente, utilizar o tal "bombo" e as tais bandeiras gigantes e tarjas (artigo 11º, nº 2, alíneas a) e b) do Regulamento da Prevenção da Violência – anexo VI ao Regulamento de Competições).
9. Se a recorrida incita, promove, autoriza ou permite a entrada desses materiais ou artigos em recinto desportivo, para além de se conformar com isso, reconhecendo os seus adeptos enquanto grupo organizado, concede-lhes ao mesmo tempo apoio, o que é ilegal.
10. Ademais, ficou provado que que a recorrida permite a afectação de zonas especificas para os GOA não legalizados R…………e B…………………..e no que interessa para os presentes autos, promove que os referidos GOA não legalizados, se façam acompanhar de adereços só permitidos a GOA legalizados. Logo, ao contrário do que afirma, está a actuar tal e qual como a lei determina relativamente aos GOA legalizados, donde é fácil concluir que esta actuação não é mais do que reconhecer e agir com aqueles – grupos de adeptos – como GOA que na verdade material o são.
11. Por isso, ainda que se entenda que existem algumas diferenças de tratamento (muitíssimo residuais) entre GOA's legalizados e não legalizados, a verdade é que os GOA's não registados recebem, por parte da recorrida, um tratamento que eterniza aquela situação de ilicitude e que não cria constrangimentos a que aqueles grupos desenvolvam, com normalidade, as suas actividades de desrespeito pela ética desportiva.
12. Atento o exposto, e sabendo-se, como infra melhor se explanará, que um grupo organizado de adeptos não pode ser reconhecido e apoiado externamente enquanto tal até que esteja constituído e registado nos termos do disposto nos artigos 14º e 15º da Lei nº 39/2009, de 30 de Julho, com a redacção dada pela Lei nº 53/2013, de 25 de Julho, ao prestar apoio, a recorrida infringe a Lei e as normas Regulamentares que proíbem liminarmente qualquer apoio a grupos organizados de adeptos, em violação dos princípios e regras definidos na Lei nº 39/2009, de 30 de Julho, com a redacção dada pela Lei nº 52/2013, de 25 de Julho (artigo 6º, nº 1, alínea i) do Regulamento de Prevenção da Violência, Anexo VI ao Regulamento de Competições).
13. Andou mal, portanto, o Colégio Arbitrai ao afirmar que atendendo à matéria de facto considerada provada, em concreto aos factos provados 18, 19, 20, 21, 22, 27 a 29, que não existe qualquer apoio a GOA’s ilegais.
14. Não se percebe, nem o Colégio Arbitral explicita, como poderá considerar-se não provado que "1. A recorrida agiu de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que o seu comportamento, de permitir a introdução no recinto desportivo de bandeiras de grandes dimensões por parte de adeptos não integrantes dos seus GOA legalizados, inclusivamente por parte de GOA não legalizados mas cuja existência e localização no recinto desportivo a arguida não ignora, consubstancia uma violação dos deveres legais e regulamentares que sobre si impendem, em especial o dever de não apoiar, sob qualquer forma, GOA não legalizados, criando uma imagem exterior de insegurança, intranquilidade em prejuízo da imagem e bom nome das competições. 2. A recorrida assim agiu e omitiu, de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que os seus comportamentos consubstanciavam condutas previstas e punidas pelo ordenamento jus-disciplinar desportivo, não se abstendo, porém, de as realizar".
15. É que a recorrida não ignorava, nem podia, sem censura, ignorar que, ao tratar os GOA não legalizados como "adeptos normais" e ao viabilizar a sua entrada e permanência no recinto desportivo com materiais reservados a GOA legalizados, estava a violar o dever que sobre ela impende, enquanto promotora do espectáculo desportivo, de não apoiar, sob qualquer forma, GOA não legalizados. O que se assaca à recorrida é, sobretudo, uma atitude de alheamento relativamente aos deveres jurídicos que sobre ela impendem e a sua conformação com um resultado em que, a pretexto da narrativa dos "adeptos comuns", os GOA não legalizados continuam a desenvolver actividades de apoio ao clube que são ilícitas sob o ponto de vista da ética desportiva e do ordenamento jus disciplinar.
16. Não obstante o acima exposto, a verdade é que o facto de o Colégio Arbitral ter considerado não provados os factos acima mencionados em nada belisca a decisão de condenação da ora recorrida. Estamos perante um "chavão" da praxis, que, em bom rigor, não necessitava de aí constar para que a imputação a título subjectivo se verificasse. Como é evidente, mesmo sem esta parte, a matéria de facto dada como provada nos autos sustenta, igualmente, a punição da recorrida no âmbito do processo disciplinar, pelo que a decisão não sai minimamente prejudicada.
17. Em suma, atendendo a todo o supra exposto, resulta claro de toda a prova carreada para os autos que a recorrida, não só apoiou grupo(s) organizado(s) de adeptos não registado(s) junto da APCVD, como que bem sabia e não podia ignorar que o seu comportamento consubstanciava uma violação dos deveres legais e regulamentares que sobre si impendiam.
18. Sendo certo que a recorrida apoiou grupo(s) organizado(s) de adeptos não registado(s) junto da APCVD vejamos agora se, com tal facto, de forma intencional ou não, criou uma situação de perigo para a segurança dos agentes desportivos ou dos espectadores de um jogo oficial; uma situação de risco para a tranquilidade e a segurança públicas; ou grave prejuízo para a imagem e o bom nome das competições de futebol.
19. Salvo o devido respeito, o problema subjacente ao...

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