Acórdão nº 52/21.0T9ESP.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-21

Data de Julgamento21 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão52/21.0T9ESP.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 52/21.0T9ESP.P1
Tribunal de origem: Juízo de Competência Genérica de Espinho– Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
No âmbito do Processo Comum Singular n.º 52/21.0T9ESP a correr termos no Juízo de Competência Genérica de Espinho foi julgado e condenado o arguido AA na pena 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis Euros), pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo n.º 1 do art.º 360.º do Código Penal.

Desta decisão veio o arguido interpor o presente recurso, nos termos e com os fundamentos que constam dos autos, que agora aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos, terminando com a formulação das seguintes conclusões:
- O arguido aqui recorrente começou por faltar à verdade na fase de inquérito, quando ouvido como testemunha junto do órgão de polícia criminal, isto, pese embora o juramento legal então prestado.
- Quando inquirido na fase de julgamento, também sob juramento, acabou então por falar com verdade.
- Nos termos do disposto no art.º 362º/1 do Código Penal, a punição pelos artigos 359º, 360º e 361º, a), não tem lugar se o agente se retratar voluntariamente, a tempo de a retratação poder ser tomada em conta na decisão e antes que tenha resultado do depoimento, relatório, informação ou tradução, falsos, prejuízo para terceiro.
- Conforme dispõe o seu nº 2 essa retratação pode ser feita perante o tribunal, o Ministério Público ou o órgão de polícia criminal.
- Foi precisamente o que aconteceu.
- Tendo o arguido falado com verdade perante o tribunal, na fase de julgamento, a tempo de o seu depoimento ser relevado no acórdão que pôs termo ao processo 849/18.8PAESP, não compreende o arguido como não pode ser considera como válida a sua retratação e assim não haver lugar à punição.
- Não estamos assim perante a prática de um crime punível penalmente.
- Tal foi também a opinião da Exma. Sra. Juíza de Instrução que se opôs à suspensão provisória do processo, então proposta.
- A decisão ora posta em crise, viola o disposto nos artigos 1.º, nº. 1 do Código Penal.
- Nos termos do referido artigo “Só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática.”
- A decisão recorrida violou assim o artigo 1.º n.º 1, do Código Penal.
- Devendo o arguido ser absolvido do crime de que vem acusado.
Termina pedindo seja julgado provido o recurso apresentado, e em consequência, seja revogada a sentença recorrida e absolvido o arguido.

A este recurso respondeu o Ministério Público, conforme consta dos autos, nos seguintes termos sintético:
- Inconformado com tal decisão, o arguido interpôs recurso, invocando, em suma, erro notório na apreciação da prova, porquanto o arguido se retratou e, em consequência deveria ser absolvido.
- Analisada a motivação subjacente ao recurso, bem como em pormenor a sentença recorrida, afigura-se-nos, que não assiste razão ao ora recorrente e, assim sendo, deverá a mesma ser mantida.
- Da motivação claramente expressa na sentença, só uma conclusão se impõe: é ela completa e clara, não demonstra qualquer avaliação caprichosa ou arbitrária feita pelo julgador e não enferma de qualquer contradição.
- Apenas em sede de audiência e discussão e julgamento realizada no âmbito do processo n.º 849/18.8 PAESP é que o ora arguido declarou que o depoimento prestado em fase de inquérito não correspondia à verdade.
- Pese embora, tenha existido retratação do arguido, afigura-se-nos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que a mesma terá de ser inoperante, quanto à verificação do crime de falsidade de depoimento pelo qual o mesmo foi condenado nos presentes autos, uma vez que estamos em fases processuais distintas e já existiu uma decisão – in casu, o despacho final de inquérito – no qual se teve em consideração, para além do mais, as declarações prestadas pelo arguido.
- Porquanto se assim não fosse, estar-se-ia a criar um sentimento de impunidade na comunidade e um desvalor no juramento efetuado, aquando da tomada de declarações em sede processual, quer em sede de inquérito, quer em sede de audiência de discussão e julgamento.
- E, nesse sentido, entendemos que a sentença recorrida efetuou uma correta apreciação e subsunção jurídica da matéria de facto dada como provada, sendo equilibrada e justa na escolha e medida da pena.
- Aliás, in casu, afigura-se-nos que, o enquadramento jurídico-penal, tendo em conta os factos dados como provados, mostra-se correto e a pena aplicada revela-se bem doseada, atendendo ao ilícito penal em causa, aos bens jurídicos tutelados e às necessidades de prevenção que o caso reclama, afigurando-se que não existe qualquer desadequação e/ou desproporção na medida e pena aplicada.
Termina pedindo seja negado provimento ao recurso interposto pelo arguido e mantida a sentença recorrida.

Neste Tribunal de recurso o Digno Procurador-Geral Adjunto no parecer que emitiu, e que se encontra nos autos, pugnou pela rejeição do recurso.
Cumprido o preceituado no art.º 417.º, n.º 2 do Cód. Proc. Penal, nada veio a ser acrescentado de relevante no processo.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta ao conhecimento do mérito.

II- Fundamentação:
1.1. São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal de 1ª Instância:
1) No dia 13.10.2020, entre as 14 e as 15 horas, nas instalações da Esquadra de Investigação Criminal da PSP ..., o arguido prestou depoimento enquanto testemunha no âmbito do processo n.º 849/18.8PAESP.
2) No referido processo, assumiram a qualidade de arguidos, entre outros, BB (conhecido por “CC”) e DD (conhecido por “EE”).
3) No depoimento de 13.10.2020, depois de advertido do dever de responder com verdade às perguntas que lhe fossem dirigidas, perante o agente da PSP FF, o arguido disse ser utilizador do telemóvel n.º ...69, negou ser consumidor de estupefacientes e ter adquirido qualquer produto estupefaciente aos arguidos
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