Acórdão nº 519/17.4BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-04-21

Data de Julgamento21 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão519/17.4BESNT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
A Caixa Geral de Aposentações, no âmbito da Ação Administrativa intentada por J....., com vista à anulação do despacho da Direção da Caixa Geral de Aposentações, de 6 de Fevereiro de 2017 (…) que indeferiu o pedido de pensão do autor, com o fundamento da doença de que este padece não ter sido caracterizada como Doença Profissional pelo Departamento de Proteção Contra os Riscos Profissionais e à condenação da ré à prática do ato administrativo devido, em substituição do ato cuja anulação se peticiona”, inconformada com a Sentença proferida em 12 de maio de 2020, que julgou a Ação totalmente procedente e, em consequência, anula-se o despacho da Direção da Caixa Geral de Aposentações, de 6-02-2017, que indeferiu o requerimento de atribuição de desvalorização por acidente/doença em serviço, condenando-se a Entidade Demandada, nos termos do n.º 2 do art.º 56.º do Decreto-Lei n.º 503/99, a aplicar ao pedido as disposições do Estatuto da Aposentação vigentes até à data da entrada em vigor daquele diploma”, veio interpor recurso jurisdicional do mesmo.

Formulou a aqui Recorrente/CGA nas suas alegações de recurso, apresentadas em 18 de maio de 2020, as seguintes conclusões:
“A - O Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, veio regular, de forma inovadora, a reparação de acidentes em serviço e doenças profissionais dos funcionários e agentes da administração pública.
B - Abrangendo, expressamente, por força do n.º 1 do artigo 55.º os militares das forças armadas, incluindo os do serviço militar obrigatório, como o Autor, aqui recorrido.
C – Tal regime é aplicável a todos os acidentes em serviço ocorridos ou a todas as doenças profissionais diagnosticadas depois de 1 de maio de 2000, como resulta dos artigos 56.º e 58.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.
D - O regime transitório previsto no artigo 56.º daquele diploma é muito claro quanto à aplicação quer do seu próprio regime quer do regime previsto no Estatuto de Aposentação aos acidentes em serviço e às doenças profissionais ocorridos ao serviço da administração pública antes e depois da sua entrada em vigor.
E - Assim, aos acidentes em serviço ocorridos após 1 de maio de 2000 e às doenças profissionais diagnosticadas após a mesma data, aplicam-se, respetivamente, por força das alíneas a) e b) do corpo do artigo 56.º, o regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.
F - Quanto aos acidentes ocorridos antes daquela data e às doenças profissionais diagnosticadas antes da mesma data, aplica-se, conforme determina a parte final do artigo 56.º, n.º 2, do mesmo diploma, o Estatuto de Aposentação.
G - Já que "As disposições do Estatuto de Aposentação revogadas ou alteradas mantêm-se em vigor em relação (...) a factos ocorridos antes da entrada em vigor do presente diploma".
H - Só que a expressão "factos ocorridos", no que se refere às doenças profissionais, não se refere à data em que aquela foi ou teria sido contraída, mas à data em que foi diagnosticada como tal.
I - Pois, quer se queira quer não, antes de uma doença profissional ter sido diagnosticada, não existe! Ora, no caso em apreço,
J - Por um lado, o diagnóstico efetuado pelas entidades militares decorreu muito para além da data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro - 1 de maio de 2000.
K - Por outro, no âmbito do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, a entidade competente para diagnosticar e caracterizar uma doença como profissional é, exclusivamente, a junta médica do CNPCRP.
L - A que também os militares, sejam do quadro permanente ou não, têm de sujeitar-se.
M - Sendo que, como vimos, o A./Recorrido foi avaliado presencialmente por dois médicos do Departamento de Proteção contra os Riscos Profissionais, do Instituto da Segurança Social em 2016-12-15 – que foram claros: “Não foram apurados fatores traumáticos relevantes, nem tão pouco uma doença clinicamente significativa.”
Termos em que, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogada a douta decisão recorrida, com as legais consequências.”

O aqui Recorrido/J..... não veio apresentar Contra-alegações de Recurso.

O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 6 de outubro de 2020, o qual, simultaneamente, sustenta a decisão proferida, “atentas as nulidades alegadamente invocadas no Recurso”, chegando-se a afirmar que a sentença recorrida não incorreu em qualquer das nulidades invocadas”.

Em qualquer caso, analisado atentamente o Recurso, não é no mesmo imputada qualquer nulidade à Sentença, lapso do Despacho, que, em qualquer caso, é inócuo.

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 21 de outubro de 2020, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas no Recurso, onde, em síntese, se refere que a sentença recorrida não interpreta corretamente as disposições legais aplicáveis ao A.”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade como provada:
A) O Autor nasceu em 9-02-1952. (Cfr. fls. 12 do Processo Administrativo -PA-)
B) Em 19-07-1973, o Autor foi incorporado no serviço militar, como recrutado, e cumpriu uma comissão de serviço na ex-Província Ultramarina de Moçambique entre 29-07-1974 e 23-06-1975, com a especialidade de atirador de artilharia. (Admitido: art.º 83.º, n.º 4 do CPTA e fls. 132 a 144 do PA)
C) Em 12-11-2009, Médico do Centro de Saúde da Amadora elaborou formulário de relatório médico, referente ao Autor, de “Admissão na Rede Nacional de apoio aos militares e ex-militares portugueses portadores de perturbação de pós-stress traumático”. (Cfr. fls. 156 do PA)
D) Em 25-05-2010, Médica da Associação dos Deficientes das Forças Armadas preencheu formulário modelo 2 de “Admissão na Rede Nacional de apoio aos militares e ex-militares portugueses portadores de perturbação psicológica resultante da exposição a fatores traumáticos de stresse durante a vida militar” referente ao Autor. (Cfr. fls. 159 a 167 do PA)
E) Em 4-06-2010, Psicóloga da Associação dos Deficientes das Forças Armadas elaborou exame psicológico referente ao Autor, do qual resulta, designadamente, o seguinte:
«(…) Tendo em conta os dados recolhidos, conclui-se que o doente apresenta sintomatologia compatível com PPST.
O doente encontra-se simultaneamente em acompanhamento psiquiátrico e psicológico (semanal), nos serviços clínicos da ADFA. Não havendo data prevista para o seu termino.» (Cfr. fls. 171 e 172 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas)
F) Por despacho da Direção da CGA de 6-09-2010, foi atribuída ao Autor pensão definitiva de aposentação, com redução por antecipação, no valor de € 2.523,82. (Cfr. fls. 81 e 82 do PA)
G) Em 23-06-2015, o Autor foi sujeito a Junta Médica Única no Hospital das Forças Armadas, do qual resultou o seguinte relatório:
«Entidade Nosológica: Neuroses e perturbações relacionadas com stress e somatização Capítulo V, art 78
Apresenta nexo de causalidade
Fundamentação da Junta Médica Única sobre nexo de causalidade:
Os acontecimentos traumáticos ocorridos na ex-PU Moçambique originam um quadro clínico crónico e incapacitante com limitações no funcionamento afetivo descrito.
Em conclusão, esta Junta Médica Única é de PARECER que Incapaz de todo o serviço Militar.
Apto parcialmente para o trabalho com a desvalorização de 25%.» (Cfr. fls. 145 e 146 do PA)
H) O relatório referido na alínea anterior foi homologado por despacho do Diretor do Hospital das Forças Armadas de 1-07-2015. (Cfr. fls. 154 do PA)
I) Em 12-04-2016, Jurista da Direção-Geral de Recursos Humanos da Defesa Nacional elaborou a informação/parecer n.º 515, a qual concluiu o seguinte:
«No seguimento do exposto, é nosso parecer que o ex-Alferes NIM 02….., J..... não deve ser qualificado como deficiente das Forças Armadas, porquanto não se encontram preenchidos todos os requisitos cumulativos exigidos para o efeito pelo n.º 2 do art.º 1.º e pela alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º, do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de janeiro.» (Cfr. fls. 132 a 144 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas)
J) Em 12-04-2016, o Diretor-Geral da Direção-Geral de Recursos Humanos da Defesa Nacional apôs o seguinte despacho na informação referida na alínea anterior:
«Tendo presentes os fundamentos de facto e de direito constantes no presente Parecer, não qualifico o Ex-Alferes NIM 02…. J..... como deficiente das Forças Armadas (…).» (Cfr. fls. 132 do PA)
K) Em 5-09-2016, o Chefe da Repartição de Pessoal Fora da Efetividade de Serviço do Exército Português dirigiu ofício à CGA com o seguinte teor:
«Assunto: EX-ALF 02….. J..... – ENVIO DE PROCESSO DE REFORMA POR INVALIDEZ DE EX-MILITAR NÃO QUALIFICADO DFA
Sobre o assunto em título, encarrega-me o Exmº Major-General Diretor da Direção de Administração de Recursos Humanos de:
1. Enviar o processo de invalidez, respeitante ao ex-militar em questão, julgado incapaz para o serviço militar com 25% desvalorização pela Junta Médica Única em sessão de 23Jun2015 e homologado em 01Jul2015.
(…)» (Cfr. fls. 120 do PA)
L) Em 27-09-2016, Coordenador da Unidade da CGA dirigiu o seguinte ofício à Direção Administração Recursos Humanos Exército:
«Assunto: Junta Médica.
Nome: J.....
Categoria: Alferes
Pelo presente informo V. Exa. de que nesta data foi remetido ao Departamento de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT