Acórdão nº 501/19.7PAVNG-A.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 21-04-2022

Data de Julgamento21 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão501/19.7PAVNG-A.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, os Juízes na 9ª Secção Criminal da Relação de Lisboa:



I–RELATÓRIO


No âmbito do processo de inquérito nº 501/19.7 PAVNG, e na sequência de despacho de arquivamento, foi requerida pela denunciante AA a sua constituição como assistente, que foi admitida por despacho judicial de 21/06/2021.

Inconformado com citado despacho de admissão da constituição de assistente, de 21/06/2021, vem o arguido BB interpor recurso, em 07/09/2021, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição):
A.–O presente recurso tem por objecto o Despacho do Tribunal a quo de 21.06.2021, com referência 131559474, através do qual a Denunciante nos autos foi admitida como Assistente (“Despacho”);
B.–O Despacho em causa foi proferido depois de o Arguido ter sido especificamente notificado para se pronunciar quanto àquela pretensão (cf. Notificação de 31.05.2021, com referência 131159436);
C.–Em resposta a esta notificação, o arguido invocou a intempestividade da respectiva apresentação, por aplicação dos artigos 68º, nº 3, alínea b), 287º, nº 1 e 113º, nº 2, todos do Código de Processo Penal (cf. Requerimento do Arguido de 14.06.2021) e requereu a sua rejeição;
D.–Não obstante o arguido ter alertado o Tribunal a quo para este facto, a constituição da Denunciante como Assistente foi admitida, considerando o Tribunal a quo que (i) o pedido foi requerido em tempo, (ii) aquela tem legitimidade e (iii) se encontra representada por advogado e (iv) procedeu ao pagamento da taxa de justiça devida (cf. Despacho do Tribunal a quo de 21.06.2021, com referência 13559474);
E.–Enquanto acto decisório, o Despacho de que ora se recorre deve ser fundamentado, nos termos do nº 5 do artigo 97º do Código de Processo Penal – o que não sucedeu;
F.–Como bem se constata pela mera leitura do Despacho, dele não consta qualquer apreciação quanto à verificação do pressuposto processual de que depende a admissão do pedido de constituição como Assistente ou quanto ao pedido de rejeição formulado pelo Arguido;
G.–O Despacho de que ora se recorre é, por isso, irregular, nos termos conjugados do nº 5 do artigo 97º e artigo 123º, ambos do Código de Processo Penal – o que invocou em tempo (cf. Requerimento do Arguido de 25.06.2021) e que aqui se reitera, por cautela e dever de patrocínio e por não ter sido emitida qualquer decisão à data de interposição do presente recurso;
H.–Nestes termos, deve o Despacho de que ora se recorre ser revogado e substituído por Despacho que, decidindo sobre o pedido apresentado pelo Denunciante aprecie (i) a invocada extemporaneidade do pedido de constituição de assistente apresentado pela denunciante e (ii) a pretensão formulada pelo Arguido;
I.–Sem embargo, a invocação da apontada irregularidade não impede que, considerados os argumentos que se exporão de seguida, e constatada (como seguramente será) a existência de argumentos que impõem, de forma clara, uma decisão substancial de rejeição do pedido da Denunciante, seja essa a decisão final;
J.–Nos termos da alínea b) do nº 3 do artigo 68º do Código de Processo Penal, a intervenção como Assistente pode ser requerida no prazo para a prática dos autos aí mencionados – no caso, no prazo para requerer a abertura de instrução;
K.–O Despacho de arquivamento dos autos foi enviado para a Denunciante através da notificação postal com a referência CTT “RE…………..PT”, no passado dia 29.03.2021 (cf. Resultado de pesquisa de objectos, disponibilizada pelos CTT, junta como Documento 1 do Requerimento do Arguido de 14.06.2021) e foi enviado para a respectiva mandatária através de notificação postal com a referência CTT “RE……….PT”, no mesmo dia (cf. Resultado de pesquisa de objectos, disponibilizada pelos CTT do Requerimento do Arguido de 14.06.2021);
L.–Por aplicação da presunção estabelecida no nº 2 do artigo 113º do Código de Processo Penal, a Denunciante e respectiva mandatária presumem-se notificadas no dia 01.04.2021 (ou no dia 05.04.2021, caso se entenda aplicar a presunção estabelecida no nº 3 do artigo 113º do mesmo diploma);
M.–Assim, o prazo para requerer a abertura de instrução – e, consequentemente, requerer a constituição como Assistente nos termos da alínea b) do nº 3 do artigo 68º do Código de Processo Penal – terminou no dia 26.04.2021 (cf. nº 1 do artigo 287º do Código de Processo Penal e tendo em conta a suspensão de prazos judiciais operada pela Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março;
N.–Uma vez que o requerimento da Denunciante só foi submetido no dia 15.05.2021 (cf. e-mail enviado pela denunciante, em anexo à Notificação de 31.05.2021, com referência 131159436), a esta impunha-se que provasse que não foi notificada ou foi notificada em data posterior, por motivo que não lhe é imputável – o que não sucedeu;
O.–Mal andou, pois, o Tribunal a quo ao considerar tempestiva a apresentação do pedido em causa, violando, com a sua admissão, o prazo estabelecido por conjugação da alínea b) do nº 3 do artigo 68º do Código de Processo Penal com o nº 1 do artigo 287º e com o nº 2 do artigo 113º, todos do Código de Processo Penal;
P.–Nestes termos, caso V. Exas entendam estarem verificadas as condições para emissão de uma decisão de mérito, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a Decisão, ordenando-se o indeferimento da constituição como Assistente da Denunciante.
Nestes termos, deve o vício processual alegado ser julgado procedentes e, consequentemente, a Decisão ser declarada irregular, ordenando-se a respectiva fundamentação, nomeadamente através (i) da apreciação da invocada extemporaneidade do pedido de constituição de assistente apresentado pela Denunciante e (ii) da pretensão formulada pelo Arguido;
Caso V. Exas entendam estar verificadas as condições para a emissão de uma decisão de mérito, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a Decisão, ordenando-se o indeferimento da constituição como Assistente da Denunciante.
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O recurso foi admitido por despacho proferido a 03/11/2021, a subir de imediato, em separado e com efeito suspensivo.
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Pelo Ministério Público junto da 1ª instância foi apresentada resposta, através da qual, em síntese, sustenta que apesar de o despacho de arquivamento ter sido notificado à ofendida, por carta registada com aviso de recepção expedida em 23.03.2021 (recepcionada por terceiro em 13.04.2021), e ao respectivo mandatário, Dr. CC, por carta registada expedida no dia 24.03.2021, o mesmo através de emails demonstrou desconhecer o despacho de arquivamento, o que motivou que fosse novamente notificado no dia 27.04.2021, por email, após o que comunicou tal facto a DD que, por email solicitou a sua notificação [uma vez que, de acordo com a procuração apresentada, as notificações à ofendida deveriam ser efectuadas para o escritório de MC..... em Portugal], na sequência do que foi novamente notificada por carta registada remetida no dia 05.05.2021, pelo que perante as novas notificações, o ilustre mandatário se deve considerar notificado em 30.04.2021 e a ilustre mandatária em 10.05.2021, sendo por isso tempestivo o requerimento de constituição de assistente apresentado em 10.05.2021.
Conclui pela tempestividade do requerimento de constituição de assistente, pela inexistência da irregularidade do despacho invocada e pela improcedência do recurso.
Os arguidos EE e Plural Entertainment Portugal, S.A. responderam ao recurso, sustentando, em síntese, a argumentação constante do mesmo e a sua procedência.

Remetidos os autos a este Tribunal da Relação de Lisboa, pelo Exmº. Procurador-Geral Adjunto foi lavrado parecer, no qual, em súmula, declara aderir à argumentação expendida pelo Ministério Público em 1ª instância, e conclui pedindo a improcedência do recurso.

Cumprido o preceituado no nº 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, nada mais foi acrescentado.

Colhidos os vistos legais e realizada a conferência a que alude o artigo 419º do Código de Processo Penal, cumpre decidir.
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II–FUNDAMENTAÇÃO

É pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objeto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso (cf. art.º 412.º e 417.º do Cód. Proc. Penal e, entre outros, Acórdão do STJ de 29.01.2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB. S1, 5ª Secção).
Nas conclusões recursórias são suscitadas duas questões - irregularidade por falta de fundamentação do despacho de 21/06/2021 e inadmissibilidade, por extemporaneidade, do pedido de constituição de assistente, admitido pelo mesmo despacho - sendo que apenas relativamente à segunda, estão reunidos os pressupostos legais para a sua apreciação.
Delimitado o objecto do recurso, importa conhecer a factualidade que releva para apreciação da decisão impugnada.

A)–Factos com relevância para a decisão:
Dos elementos com que vem instruído o processo e da consulta electrónica dos autos (por insuficiência dos elementos certificados na certidão de instrução do recurso) e com relevância para a apreciação da
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