Acórdão nº 475/23.0T8CTB.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-12-30

Ano2023
Número Acordão475/23.0T8CTB.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE CASTELO BRANCO)

I – Relatório

1. Banco 1...), CRL, com sede em ..., intentou acção declarativa de condenação com processo comum, contra AA e BB, residentes em ..., peticionando:

a) a declaração da nulidade da descrição predial com o nº ...36 da freguesia ..., por constituir uma duplicação da descrição predial prioritariamente efectuada com o nº ...83, da mesma freguesia ...;

b) em consequência, que se ordene o cancelamento na Conservatória do Registo Predial ... daquela sobredita descrição predial aberta com o nº ...36;

c) que se ordene a rectificação na Conservatória do Registo Predial ... da área do prédio descrito com o nº ...83 e averbadas as construções ali existentes, do seguinte modo: Prédio Urbano com a área total de 985,000m2, área de implementação do edifício de 307,2200 m2, área bruta de construção de 562,300m2, área bruta dependente 349,0800 m2 e área privativa de 213,2200 m2, sito na Rua ..., Bairro ..., freguesia e concelho ..., que se compõe por edifício destinado a habitação de rés-do-chão e andar, com anexos e logradouro, a confrontar a norte e a nascente com a Rua, a sul com CC e a poente com DD, inscrito na Matriz Predial Urbana respectiva sob o artigo ...16 e Descrito na Conservatória do Registo Predial ... com o número ...83 da mesma freguesia ....

Para tanto alegou, e em síntese, que: a autora concedeu empréstimo aos réus e que estes, em garantia desse empréstimo, constituíram hipoteca voluntária sobre os prédios referidos no art. 5º da petição inicial (descrições nºs ...83 e outro); o imóvel com o nº ...83 encontrava-se registado a favor dos réus; a autora intentou acção executiva contra os réus, tendo logrado a penhora dos imóveis e respectivo registo; existe, ainda, o art. matricial 15.516º, inscrito na matriz predial a favor do réu, e aberta por via do modelo 1 de IMI, mas não descrito predialmente; a autora requereu a penhora desse último prédio, e a Sr.ª AE diligenciou pela abertura de nova descrição predial, nº 11.836, que decorreu por necessidade de registo da penhora efectuada através da AP. ...46 de 2015/01/09; veio-se a verificar que o prédio com o nº ...83 corresponde na íntegra ao prédio onde foi edificado o imóvel descrito na matriz sob o referido art. ...16º; por sentença transitada em julgado proferida em apenso da execução anteriormente referida, deu-se aí como provado que, devido a duplicação de inscrições matriciais, o prédio correspondente ao nº ...83 coincide e integra o prédio urbano relativo ao art. 15.516º; o réu requereu junto da Secção de Obras Particulares da Divisão de Obras Particulares do Departamento Técnico Operacional da Câmara Municipal do Concelho de ..., o licenciamento da construção edificada no prédio urbano descrito sob o nº ...83; a realidade da duplicação está evidenciada na caderneta predial actualizada do imóvel com o nº ...36 de cujo conteúdo se extrai que o prédio teve origem no prédio de raiz correspondente ao nº ...83; que a Câmara Municipal ..., também já reconheceu essa correspondência dos dois nºs de prédio e a designação toponímica das ruas; o executado deveria ter requerido a extinção do artigo matricial respectivo; as declarações exaradas na participação do IMI que determinou a inscrição matricial do art. 15.516º, correspondente ao nº ...36 são omissas e inexactas; que no caso vertente a duplicação registral efectuada por via da abertura da descrição com o nº ...36 configura uma situação de nulidade prevista nas alíneas b) e c) do art. 16º do Cód. Reg. Predial; por último, a autora alega, nos exactos termos decorrentes do levantamento topográfico, a actual composição do prédio descrito com o nº ...83, pelo que deverá ser ordenada a rectificação das áreas do imóvel em conformidade.

Os réus não apresentaram contestação, pelo que foram considerados confessados os factos constantes da petição inicial.

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Foi proferida decisão que:

- julgou verificada a excepção dilatória de erro na forma do processo, determinando-se a absolvição dos RR da instância quanto ao pedido vertido sob a alínea c).

- julgou a acção improcedente e, em consequência, decidiu absolver os RR do peticionado pela A.

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2. A A. apelou, concluindo que:

I. A presente Apelação é interposta da douta Sentença de proferida em 14 de agosto de 2023, que julgou improcedente a acção de processo comum instaurada pela Banco 1...), CRL, contra AA e BB, que absolveu os Réus do pedido de declaração de nulidade do registo que originou a duplicação de descrições prediais;

II. A abertura da descrição predial duplicada sob o número ...36, da freguesia ... e que representa a mesma realidade física já ínsita na descrição predial registada com o número ...83 da mesma freguesia ..., teve origem no processo executivo instaurado pela recorrente contra os Réus, ali na qualidade de executados, para registo de penhora do imóvel inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo ...16;

III. Para o efeito, a Senhora Agente de Execução procedeu à penhora do imóvel, exarando no pedido de registo as seguintes declarações: “EE, agente de execução com a cédula profissional nº ...45 e escritório na Rua ..., ..., em ..., agente de execução nomeada no processo executivo nº ...2..., que corre termos na Secção Cível – J1 – Inst. Central, Comarca e ..., vem requerer, ao abrigo do disposto no artigo 755º do CPC, que se proceda a penhora do prédio indicado no rosto desta requisição para garantia do pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução as quais se presumem, para o efeito da realização da penhora e sem prejuízo de ulterior liquidação, no valor de 5% da quanto exequenda, nos termos do nº 3 do artigo 735º do CPCivil. Exequente: Banco 1...), CRL, nif ...10, sede no Largo ..., .... Executados: AA, NIF ...30 e mulher BB, NIF ...94, casados sob o regime de comunhão de adquiridos, residentes na Rua ..., Bairro ..., .... Imóvel: Prédio Urbano destinado a habitação composto por dois pisos, com logradouro, sito na Rua ... em ..., a confrontar a norte e a poente com a rua pública e a sul e nascente com herdeiros de CC, com a área total de 937,00 m2 a que corresponde a superfície coberta de 205,62 m2, a superfície descoberta de 731,38m2, inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...16 e não ....

Desconhecem-se os antepossuidores por não ter elementos no processo nem o executado fornecer a identificação dos mesmos, bem como qualquer correspondência entre o actual artigo e quaisquer artigos matriciais. Mais declara que o prédio não é nem faz parte dos descritos sob os nºs ...98 e ...21 da freguesia .... Quantia Exequenda: 170.487,18”

IV. A factualidade supra transcrita encontra-se suportada em documento idóneo dado como provado na douta sentença recorrida;

V. De igual modo a douta sentença proferida consigna que as descrições prediais sob os números ...83 e ...36 se referem à mesma parcela de terreno e nessa conformidade existe uma duplicação de registos, dos prédios descritos com o número ...83 (correspondente a inscrição matricial ...20) e do prédio descrito com o número ...36 (correspondente ao artigo matricial ...16) provindo este último do registo de penhora efectuado através da AP. ...46 de 2015/01/09, que originou a abertura da descrição em duplicado;

VI. Para efectuar o registo da penhora e consequente abertura da descrição predial a Senhora Agente de Execução declarou que o prédio em causa se encontrava omisso na Conservatória do Registo Predial;

VII. Ora tal declaração é falsa, como se viria a apurar por decorrência da própria tramitação dos Autos, o que conduz à falsidade do título que deu causa à abertura da descrição predial efectuada em duplicado;

VIII. Tal declaração falsa é subsumível à falsidade prevista na alínea a) do artigo 16º do Código de Registo Predial, que elenca os registos nulos;

IX. De igual modo o título que serviu de base ao registo que culminou na duplicação da descrição registal duplicada carece de força probatória do facto a registar e enferma de inexactidão quanto ao objecto a que reporta o registo;

X. Encontram-se, assim, preenchidos os pressupostos ínsitos nas alíneas a),b) e c) do artigo 16º do Código de Registo Predial, de que depende a apreciação substantiva da declaração de nulidade do registo pelo Tribunal;

XI. Arredando-se em consequência a possibilidade de rectificação do registo nos termos dos artigos 120º e seguintes do Código de Registo Predial, por se estar perante uma situação inequívoca de nulidade do registo que por inerência não é susceptível de rectificação;

XII. O Meritíssimo Juiz “a quo” na douta sentença proferida entende que não se encontram preenchidos os pressupostos da declaração de nulidade do registo, por considerar que o pedido formulado pela autora não os consubstancia, designadamente no que concerne ao preceituado no artigo 16º, alínea a) do Código de Registo Predial;

XIII. Sobre o Juíz do processo impende o dever de convidar as partes a suprir eventuais irregularidades (artigo 590º, nº 3 do Código de Processo Civil);

XIV. No caso vertente foi proferido despacho pré-saneador e a Autora apenas foi convidada a pronunciar-se quanto à eventual verificação da excepção dilatória inominada de erro na forma do processo e incompetência material para conhecimento do pedido efectuado em c) da petição inicial;

XV. Quando aos demais pedidos verifica-se uma omissão desse dever de convite ao aperfeiçoamento, circunstância que consubstancia a violação do princípio da cooperação processual e do dever de gestão processual imposto pelos artigos e 590º, nº 2, e do Código de Processo Civil;

XVI. Tal omissão culminou na prolação da presente decisão recorrida que se reconduz a uma decisão surpresa;

XVII. Por outro lado a sobredita omissão constitui nulidade processual subsumível ao regime previsto nos artigos 195º, 197º, 199º, 200º e 201º todos do Código de Processo Civil, que ora se invoca;

XVIII. A...

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