Acórdão nº 4704/21.6T8MAI-B.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 18-09-2023

Data de Julgamento18 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão4704/21.6T8MAI-B.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
APELAÇÃO n.º 4704/21.6T8MAI-B.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO
I.1 AA, BB, CC, DD, EE e FF, intentaram contraA..., Ldaa presente acção declarativa com processo comum, emergente de contrato de trabalho, pedindo que julgada procedente seja:
1. Reconhecida a existência de justa causa para a rescisão do contrato por parte dos AA;
2. A R. condenada a pagar aos autores o vencimento do mês de Junho, diuturnidades, férias, subsídio de férias, horas de formação e indemnização devida pela antiguidade, nos termos do n.º 1 e 2, al. a) do art.º 394.º e 395.º do Código do Trabalho, que importam:
- ao autor AA a quantia global de € 3 384,60;
- à autora CC a quantia global de € 18 807,30;
- à autora DD a quantia global de € 20 826,00;
- à autora EE a quantia global de € 22 603,30;
- à autora BB a quantia global de € 22 831,40;
- ao autor FF a quantia global de € 26 034,80.
3. Tudo acrescido de juros vincendos, desde a citação até efectivo e integral pagamento;
Alegam, em síntese, que a Ré é uma sociedade comercial que tem por objecto o comércio por grosso de produtos químicos, tendo-os admitido ao seu serviço, para lhes prestarem trabalho sobre as suas ordens, autoridade e direcção, respectivamente, em 2006, 1990, 1994, 1992, 1990 e 1998.
A Ré, desde Abril de 2020, deixou de lhes pagar os salários no último dia de cada mês, passando a pagá-los no mês seguinte, nunca antes de dia 15 de cada mês, sem que lhes desse qualquer explicação. Acrescentam, que desde Abril de 2021, a situação agravou-se, passando a requerida a pagar os vencimentos às prestações.
Essa situação, que se prolongou desde Abril de 2020, causou complicações quer no que respeita ao cumprimento das obrigações mensais dos Autores, quer ao nível pessoal e familiar, reflectindo-se negativamente nos seus agregados familiares e até no bem estar e saúde dos autores.
Por esse motivo, por cartas de 0-06-2021, comunicaram à Ré, nos termos dos n.ºs e 2, al. a) do art.º 394.º e 395.º do CT, a rescisão imediata dos seus contratos de trabalho com justa causa. Na referida comunicação reclamaram o pagamento de créditos laborais devidos.
Com esses fundamentos concluem deduzindo os pedidos acima transcritos.
Designado dia para a audiência de partes, procedeu-se a este acto, tendo sido obtida a transação parcial quanto ao objecto do litígio, nomeadamente, o acordo quando a créditos devidos relativamente a cada um dos autores, termos de pagamento e garantias de cumprimento.
Foi determinado o prosseguimento da acção para apreciação das questões ainda controvertidas, relativas aos créditos de formação e indemnização pela cessação dos contratos de trabalho por resolução com invocação de justa causa.
A Ré contestou no prazo legal. Arguiu a nulidade por ineptidão da petição inicial, alegando, em síntese, que a carta enviada pelos trabalhadores autores refere o não pagamento pontual das retribuições não culposo –art.º 394.º n.º3, al. c), do CT -, não podendo aqueles agora invocarem ou alterarem os fundamentos nela mencionados. A rescisão pelo trabalhador com justa causa, mas sem justa causa subjectiva (falta de pagamento pontual não culposa) não confere direito a indemnização. Mais alegou, que apesar dos atrasos nos pagamentos das retribuições, nunca ficou sem lhes pagar e, muito menos, por 60 dias. Os AA resolveram os contratos de trabalho por motivos pessoais e não pelo fundamento que invocaram.
Responderam os autores, contrapondo que a R. contestou interpretando convenientemente a PI e os seus pedidos, pelo que deverá ser julgada improcedente a excepção.
Findos os articulados, o tribunal a quo proferiu despacho designado dia para a realização de audiência prévia. Nesse acto, as partes requereram a suspensão da instância pelo prazo de 5 dias, no termo do qual não obtiveram a auto composição do litígio.
Tendo as partes prescindido da continuação da audiência prévia, o Tribunal a quo proferiu novo despacho comunicando-lhes o propósito de conhecer parcialmente do mérito da causa quanto à questão do reconhecimento da justa causa invocada para a resolução dos contratos de trabalho e consequente indemnização pedida, concedendo-lhes o prazo de dez dias para, querendo-o, se pronunciarem.
Notificados, a Ré veio dizer nada ter a opor e os autores nada vieram dizer.
I.2 Subsequentemente foi proferido despacho saneador e fixado o valor da acção em € 1 487,00.
Foi apreciada a arguida ineptidão da petição inicial, tendo sido julgada improcedente.
Em seguida foi proferida decisão parcial sobre o mérito da causa, com fixação e dos factos e aplicação do direito, concluída nos termos seguintes:
«[..]
[..]».
I.3 Inconformados com esta decisão, os AA interpuseram recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes:














Conclui pedindo a procedência do recurso, revogando-se a decisão sob censura e decidindo-se nos moldes a pontados.
I.4 A Ré apresentou contra alegações, mas não as sintetizou em conclusões.
Acompanha a decisão recorrida, que na sua perspectiva julgou correctamente a causa e alega, no essencial, que os AA. não indicam os concretos meios de prova que impunham uma decisão diversa dos pontos que alegadamente se encontrem incorrectamente julgados, pretendendo um novo julgamento, possibilidade que não vem contemplada na lei.
Dos factos provados não se retira fundamento para alterar a decisão recorrida, que deve ser mantida.
I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, tendo emitido parecer referindo, no essencial, o seguinte:
-“[..]
5. Está em causa neste caso saber se os factos invocados pelos AA., são ou não motivo para resolução dos contratos de trabalho por sua iniciativa.
Prevê o art.º 394º do CT, sob a epigrafe “justa causa de resolução”, que “ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato – n.º 1.
E que constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador (n.º 2):
a) Falta culposa de pagamento pontual da retribuição;
c. Falta não culposa de pagamento pontual da retribuição; (n.º 3, al, c).
Além disso considera-se culposa a falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongue por período de 60 dias, ou quando o empregador, a pedido do trabalhador, declare por escrito a previsão de não pagamento da retribuição em falta, até ao termo daquele prazo – n.º 5 do art.º 394º do CT.
6. No presente caso os AA. na carta endereçada à Ré/Recorrida, alegam a falta não culposa de pagamento pontual da retribuição, e citam o art.º 394º, n.º 3, al. c), do CT para justificar a resolução do contrato, por sua iniciativa, e na p. i. vêm depois alegar factos a que se refere a al. a) do n.º 2 do art.º 394º do CT.
A douta decisão em recurso, analisa a hipótese de falta culposa de pagamento pontual da retribuição, a que se refere a al. a) do n.º 2 do art.º 394º do CT.
Entende-se que com os factos dados como provados e previsão legal citada, deveria julgar-se reconhecida a existência de justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte dos AA/trabalhadores, nos termos da disposição legal citada na carta referida.
Na verdade deu-se como provado (i)o teor da carta enviada pelos AA à Ré, onde são alegados os atrasos no pagamento das retribuições, e que 9)- Verificaram-se atrasos no pagamento das retribuições dos AA.
Com base nestes factos e atento o disposto no art.º 394º, n.º 3, al. c), do CT, então deveria, salvo melhor opinião, reconhecer-se que existe justa causa de resolução do contrato de trabalho por iniciativa dos trabalhadores/recorrentes.
7. Mas, para além disso na petição inicial, nomeadamente nos artigos 10º a 16º, vem alegados factos que poderão indiciar ou integrar a previsão do disposto na al. a) do n.º 2 do art.º 394º do CT.
Em relação a alguns vêm indicados elementos de prova documental, mas não em relação a outros.
Quanto a estes deveria realizar-se julgamento, produzir-se prova, nomeadamente testemunhal, e a final decidir.
Entende-se, assim, que não havia ainda elementos bastantes para proferir decisão.
Deveria, por isso, revogar-se a decisão e realizar-se julgamento para apuramento destes factos e subsequente decisão.
[..]”.
I.5.1 Respondeu a recorrida, mas encimando o respectivo articulado como segue:
AA e outro´s, recorrente, devidamente identificado nos autos à margem referenciados, notificado do Parecer do Ministério Público e do Recorrida, vem apresentar a sua RESPOSTA».
No mais, reitera a posição defendida nas contra-alegações, reproduzindo literalmente os argumentos que aí usou.
I.5.2 Notificados dessa resposta ao parecer emitido pelo Ministério Público, os AA vieram apresentar requerimento referindo que o cabeçalho nos termos acima referidos “[..] terá de entender-se como um manifesto lapso, tanto mais grave pois que a subscritora não é mandatária dos Recorrentes, nem o requerimento apresentado traduz a posição dos aqui Recorrentes”, pugnando para que fosse determinado o seu desentranhamento.
Pelo relator foi proferido despacho indeferindo o requerido desentranhamento e determinando que se anotasse no requerimento “tratar-se de resposta da Ré A..., Lda., e não, como erradamente foi feito constar por lapso manifesto da ilustre mandatária daquela, pelo “AA e outro´s recorrente”, nessa parte considerando-se o cabeçalho não escrito”.
I.6 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento.
I.9 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso, as questões colocadas para apreciação pelos recorrentes consistem em saber o seguinte:
- Se a decisão proferida no despacho saneador
...

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