Acórdão nº 4630/21.9T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-07-13

Ano2022
Número Acordão4630/21.9T8VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
APELAÇÃO Nº 4630/21.9T8VNG.P1

Sumário (elaborado pelo Relator- art. 663º, nº 7 do CPC):
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Comarca do Porto - Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia - Juiz 1
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Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.
I. RELATÓRIO.
Recorrente(s): - M..., SA.
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E..., S. A. intentou acção declarativa com processo comum contra M..., SA., alegando, em síntese, que houve adulteração do mecanismo de contagem de electricidade do contador que liga a rede de distribuição de energia eléctrica ao imóvel da ré e que esta beneficiou do abastecimento de energia eléctrica e de potência superiores à contratada, que não foram pagas à autora.
Termina, formulando os seguintes pedidos:
“Nestes termos, nos mais de Direito deverá a presente acção declarativa de condenação ser julgada procedente, por provada, e, consequentemente:
i. Deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de indemnização por factos ilícitos, a quantia de € 8.408,74 (oito mil quatrocentos e oito euros e setenta e quatro cêntimos) acrescida de juros vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em vigor, contados desde a data da citação da Ré até efectivo e integral pagamento,
Ou, se assim não se entender,
ii. Deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de restituição por enriquecimento sem causa, a quantia de € 8.336,64 (oito mil, trezentos e trinta e seis euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em vigor, contados desde a data da citação da Ré até efectivo e integral pagamento”.
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A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.
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Foi elaborado despacho saneador, com identificação do objecto do litigio e dos tremas da prova, que não mereceu reparo.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, como da respectiva acta emerge.
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De seguida, foi proferida a sentença, que constitui o objecto do presente Recurso, onde o Tribunal de 1ª Instância conclui com a seguinte decisão:
“…5. Decisão
Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, condenando a ré M..., SA, a pagar à autora E..., SA, a quantia de 8.349,28€, acrescida de juros, calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.…”.
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É justamente desta decisão que a Ré/Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“IV - DAS CONCLUSÕES:
I - DO OBJETO DO RECURSO
1.º A Recorrida intentou acção contra a ré, alegando, em síntese, que houve adulteração do mecanismo de contagem de electricidade do contador que liga a rede de distribuição de energia eléctrica ao imóvel da Recorrente.
2.º Aduziu também que a Recorrente beneficiou do abastecimento de energia eléctrica e de potência superiores à contratada, que não foram pagas à Recorrida.
3.º Procurando ressarcir-se, de forma enviesada, veio dizer ao Tribunal a quo que, havendo 3 fases e só tendo sido contabilizadas 2, teria direito a um valor proporcional àquela mesma 3.ª fase.
4.º Não alegou que a dita 3.ª fase tivesse sido sequer utilizada...
5.º Nem alegou que houvesse um equipamento que fosse “pendurado” nessa 3.ª fase...
6.º Porém, o tribunal a quo deu por provado que no dia 12.06.2018 os técnicos da Recorrida verificaram uma violação do contador, que implicou a execução de uma operação material, designadamente no contador e respectivos selos.
7.º Sem mais, concluiu dali o Tribunal que a dita violação “visou falsear a medição da energia eléctrica consumida.”
8.º Mais, entendeu que assim se “permitiu à ré consumir energia de forma ilimitada e sem qualquer controlo ao nível de potência.”
9.º Diz o Tribunal que a Recorrente beneficiou “de 8.277,18€, correspondente a 49.452 KWH de energia e potência, que não foram pagos à autora.”.
10.º Calculou que se por 2 fases foram gastos, por exemplo € 1.000,00, então, por uma 3.ª fase, seriam devidos € 500,00...
11.º Podemos dizer que, com argumentação desta, uma das partes poderia tinha que ter muita sorte no julgamento e a outra muito azar... pois, na verdade, tanto a Recorrente podia ter consumido 1000 vezes mais energia que a “presumida”, como podia não ter gasto 1 cêntimo que fosse e, em qualquer dos casos, seria condenada em “qualquer coisa”...
12.º Com o devido respeito, para assim se decidir, mais valia ter-se atirado uma moeda ao ar!
(… utilização de expressões desnecessárias e que não contendem com o objecto do recurso – cfr. art. 9º, nº 2 do CPC)
14.º Retomando: embora o Tribunal a quo se tenha referido a que a Recorrida, por impositivo legal, deveria verificar a eventual ocorrência de variações abruptas no perfil de consumo da instalação e a data da última deslocação à instalação, com acesso ao equipamento de medição, depois, como que se esqueceu de o equacionar... isto pelo facto de, pelo contrário, ter ficado muito claro que jamais houve variações significativas, muito menos, abruptas!
II - DO ERRO SOBRE A APRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
15.º Considera a Recorrente que o Tribunal de que se recorre não apreciou de forma correcta os factos nºs 11, 12, 13 e 14 dos factos provados: “(…)”
16.º Após o contrato com a X..., sucedeu a esta a Recorrida, sendo que, na presente data, aquele se mantém em vigor e cumprido, de forma escrupulosa, pela Recorrente.
17.º Foi a pedido da Recorrente que a Recorrida enviou uma equipa técnica à sede daquela a 12.06.2018.
18.º Tal decorre, nomeadamente, dos depoimentos das testemunhas AA e BB supra transcritos e para os quais se remete.
19.º E do depoimento da testemunha de BB (...) sob o registo n.º 20211209153524_15974588_2871620.wma, a 09.12.2021 com início às 15:35:25 e termo às 15:40:59, o seguinte (…)
20.º Nestes termos, não tem qualquer sentido que o Tribunal desse como provado que a Recorrente “visou falsear a medição da energia eléctrica consumida”,
21.º Não se demonstrando que a Recorrente tivesse conhecimento da irregularidade existente no contador,
22.º E, muito menos, que fosse a própria que o tivesse provocado.
23.º Por outro lado, que sentido faria a Recorrente querer aumentar a potência contratada se naquele momento já consumiria energia de forma ilimitada?
24.º Ao mesmo tempo, não se compreende como pode o Tribunal valorar o depoimento da testemunha CC (...): 00.03.26 “... (…) a 00.06.06
25.º Isto quando o próprio não consegue explicar ao Tribunal como é que pode ter sido cobrado à Recorrente antes e depois da correcção da irregularidade os mesmos valores.
26.º Justificando o seu desconhecimento com a inacessibilidade à facturação emitida pelo comercializador ao consumidor: 00.10.16 “...: a...” 00.11.36
27.º Não se compreende, assim, como pode o Tribunal considerar o depoimento prestado por CC como decisivo quando o mesmo apresenta tanto desconhecimento.
28.º Do depoimento da testemunha AA (CJ) resulta: 00.08.30 a (…) 00.13.10
29.º A testemunha deixa claro que apenas pode ser calculado o valor dos consumos reais durante o período anómalo, se – e apenas se – se partir do pressuposto de que existe um equilíbrio entre as várias fases e se o consumo real efectuado se mantiver inalterado nos meses seguintes ao do suprimento da irregularidade.
30.º Não existem nos autos quaisquer elementos que demonstrem que antes ou depois do suprimento da irregularidade a Recorrente tenha consumido mais.
31.º Ao mesmo tempo, o tribunal desconsidera o depoimento prestado pela testemunha DD (...) do qual resulta que não é possível definir em concreto o momento em que ocorreu a desselagem.
32.º A testemunha revela que a menos que o consumidor reduza o consumo de energia os consumos registados após a correcção da irregularidade os valores do consumo apresentados não poderão ser idênticos aos do período anómalo.
33.º O que não permite de nenhuma forma ao Tribunal concluir que a Recorrente tenha efectivamente tido um aproveitamento no consumo de energia no período anterior ao da correcção da irregularidade.
34.º A constância dos valores facturados resulta directamente do depoimento da testemunha BB (...): 00.02.07: “...: a ” 00.04.33
35.º Dos depoimentos das testemunhas AA, DD e BB resulta assim um erro de apreciação dos factos nºs 12, 13 e 14.
36.º Uma vez que da prova produzida não resulta que a Recorrente tenha consumido energia de forma ilimitada e sem qualquer controlo de potência,
37.º Nem se demonstra que efectivamente tenha a Recorrente beneficiado da energia e da potência que lhe são imputadas,
38.º Ou que a Recorrida tenha direito ao valor que peticiona.
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III - DO ERRO DE JULGAMENTO DO DIREITO
39.º No contrato de fornecimento de energia eléctrica impende sobre o comercializador de energia eléctrica o cumprimento do dever de informação ao utente, em concreto a obrigação de emissão de facturação detalhada.
40.º Nos termos da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais: “... 2 - A factura a que se refere o número anterior deve ter uma periodicidade mensal, devendo discriminar os serviços prestados e as correspondentes tarifas.
3 - No caso do serviço de comunicações electrónicas, e a pedido do interessado, a factura deve traduzir com o maior pormenor possível os serviços prestados, sem prejuízo do legalmente estabelecido em matéria de salvaguarda dos direitos à privacidade e ao sigilo das comunicações”
41.º Imposição reiterada no artigo 8.º da Lei n.º 5/2019, de 11 de Janeiro, que estabelece o regime de cumprimento do dever de informação do comercializador de energia ao consumidor, e que, nos termos dos nºs 2 a 4 do artigo 43.º do Regulamento das Relações Comerciais dos Sectores Eléctrico e do Gás, é realizada mediante leitura directa do equipamento de medição ou por ou por estimativa de valores de consumo.
42.º Como resulta dos depoimentos prestados pelas testemunhas BB e AA, as facturas recepcionadas ao
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