Acórdão nº 451/04.1TJPRT-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-01-13

Ano2022
Número Acordão451/04.1TJPRT-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2021:451/04.1TJPRT-A.P1


Acordam no Tribunal da Relação do Porto
1. Relatório
Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa que o Banco AA…, S.A., com sede na Rua…, …, …. - … Porto instaurou contra BB…, residente na Rua…, …, …. - … Porto e CC…, residente na Travessa…, …, …. - … … vieram estes deduzir oposição à penhora da fracção “AG”, identificada no auto de penhora, onde concluíram pedindo o seu levantamento.
Alegam, em síntese, que o valor da quantia exequenda é de €11.684,62, sendo certo que encontram-se penhoradas quantias que ascendem a €9.635,05, bem como mantém-se a penhora do vencimento do executado, pelo que ascendendo o valor patrimonial do bem imóvel a €70.000,00 é manifesta a desproporcionalidade entre a quantia exequenda e o direito penhorado.
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Notificado, o exequente contestou alegando, em síntese, assistir-lhe o direito à satisfação do seu crédito, sendo certo que o direito à habitação constitucionalmente consagrado não se confunde com o direito a ter habitação própria.
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Entendendo-se que os autos permitiam o conhecimento imediato do mérito da oposição, sem necessidade de mais prova, foi proferida sentença na qual se decidiu julgar procedente a oposição à penhora e determinar o levantamento da penhora do bem imóvel.
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Não se conformando com a decisão proferida, a recorrente “ AA… - Sfac, S.A.” veio interpor o presente recurso de apelação em cujas alegações conclui da seguinte forma:
I) Nos termos do contrato de mútuo celebrado em 15 de maio de 2001, a quantia mutuada para a aquisição do veículo de marca …, modelo …, deveria ser liquidada pela Recorrida em 72 prestações.

II) Em face do incumprimento da Recorrida, a Apelante em 05.09.2003 resolveu o respectivo contrato de mútuo peticionando o pagamento do montante total de €10.429,89.

III) Na senda da ação executiva, proposta a 05.01.2004, encontra-se penhorado 1/3 do vencimento da Recorrida, a decorrer desde 21.03.2017. O valor penhorado não fez face a dívida exequenda!

IV) Mantendo-se o crédito do Recorrente e não existindo outros bens suscetíveis de penhora pertencentes à Recorrida, e de forma a ver satisfeito o seu crédito, o Recorrente procedeu à penhora do imóvel Fração autónoma designada pela letra "AG", tipologia/divisões T2, destinado a habitação. Composição - Terceiro andar direito sul, habitação, com entrada .., lugar de garagem n.º .., na sub-cave com entrada pelo n.º ... Sito na Travessa…, n.º .., …, ….-… …. Inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……, da freguesia de …, concelho de Gondomar, (correspondente ao antigo artigo ……, da freguesia de …, concelho de Gondomar), e descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar, sob o n.º …/……..-.., da freguesia de …, para satisfação do crédito na totalidade.

V) Veio a ora Recorrido opor-se à penhora do imóvel com o fundamento de que o valor em dívida não seria o referido pelo Recorrente, sendo que ao mesmo deveria ser subtraído o resultado da penhora salarial.

VI) Referiu ainda o Recorrido que a penhora se demonstrava excessiva e desproporcional sendo a habitação própria e permanente do Recorrido.

VII) O Recorrente apresentou contestação à oposição à penhora requerendo a improcedência da oposição à penhora, por não se verificarem os requisitos legais exigíveis para a impenhorabilidade do imóvel, por permanecer valor em dívida conforme nota discriminativa (já descontando o valor da penhora salarial).

VIII) O valor em dívida informado pelo Agente de Execução em 29 de janeiro de 2021 [€7.073,76] baseou-se na quantia exequenda após a dedução dos valores recuperados nos autos por meio da penhora salarial de 1/3 a decorrer sobre o vencimento e saldos bancários da Recorrida [€9.635,05].

IX) Destarte, o Tribunal a quo proferiu sentença na qual ordenou o cancelamento da penhora sobre o imóvel, tendo para tal sustentado que o valor em dívida era de €2.059,47 ao contrário do valor em divida indicado pelo M D Agente de Execução €7.073,76.

X) Considera o aqui Recorrente que andou mal o Tribunal a quo, na douta sentença, pois a penhora do imóvel não é desproporcional, tendo em conta que a Recorrida não dispõe de bens suscetíveis de penhora sem ser o imóvel, e que caso a mesma não se mantenha, o Recorrente ficaria privado de ver o seu crédito liquidado por mais 6 anos, mantendo-se apenas a penhora salarial.

XI) Nessa senda vem a ora Apelante recorrer da sentença do Tribunal a quo, requerendo a revogação da mesma na sua totalidade por considerar que grande parte do valor em divida ainda não foi recuperada pelo Recorrente, e que a manutenção da penhora do imóvel não é desproporcional.

XII) Ora tal deve ser admitido tendo em conta que o valor em divida indicado aos autos a 29.01.2021 já contempla a penhora sobre o vencimento da Recorrida, mantendo-se naquela data um crédito do Recorrente sobre a Recorrida de €7.073,76.

XIII) Não existe qualquer bem na esfera da Recorrente suscetível de penhora, sem ser o imóvel referido, pelo que não vendo o Recorrente possibilidade de fazer valer o seu crédito no prazo de 18 meses por meio da penhora de vencimento, a penhora do imóvel não se considera desproporcional face à inexistência de bens, ainda que o valor patrimonial do mesmo seja superior a dívida.

XIV) A penhora do imóvel também não se deverá considerar descabida, tendo em conta a existência de credor hipotecário, isto porque não se sabe se em caso de existência de venda, exista produto da mesma a ser ressarcido ao Recorrente.

XV) O certo é que o Recorrente, se não puder manter a penhora sobre o imóvel está sujeito a aguardar, pelo menos, 6 anos para que o seu crédito seja ressarcido, por meio da penhora salarial da Recorrida, o que claramente acarreta prejuízos para o mesmo.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
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2. Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar:
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões da recorrente, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões:
(i) Da nulidade da decisão;
(ii) Alteração/aditamento da matéria de facto; e
(iii) Reapreciação jurídica da causa, no sentido de saber se a penhora do bem imóvel deve ou não ser levantada.
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3. Factos
3.1 Factos Provados
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1. O exequente deu à execução como título executivo contrato de crédito não cumprido pelo valor de €9.635,05, sendo que a execução entrou
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