Acórdão nº 419/16.5T8LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07-03-2024

Data de Julgamento07 Março 2024
Número Acordão419/16.5T8LAG.E1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
I – Relatório
1. AA intentou acção especial para prestação de contas contra BB, pedindo a citação da R. para, no prazo de trinta dias, apresentar as contas da sua administração/gestão respeitante ao período de Agosto de 2012 até 2016, “nomeadamente até à data em que terminar o prazo para a respectiva apresentação”, ou contestar a acção, sob as cominações legais.

2. Para tanto, alegou, sem síntese, que foi casado com a R., que o casamento foi dissolvido por divórcio através de sentença proferida em 12 de Novembro de 2014, que do património comum do casal fazem parte dois imóveis que a requerida passou a administrar a partir de Agosto de 2012, dando-os de arrendamento para fins de ocupação turística e percebendo os respectivos rendimentos, não tendo apresentado contas de tal gestão ao requerente, não obstante ter sido instada para o efeito.
Juntou quatro documentos.

3. Citada para apresentar contas ou contestar a acção, veio a R. apresentar contestação, alegando que um dos imóveis indicados pelo requerente não integra o acervo patrimonial comum do dissolvido casal, sendo seu bem próprio, sendo certo que tal qualidade foi posta em causa pelo requerente do âmbito de acção que o mesmo intentou e corre termos sob o n.º 84/14.4TBLGS da Instância Central de Portimão, não havendo ainda decisão definitiva, pelo que deveria a decisão sobre a obrigação de prestação de contas aguardar o desfecho do aludido processo.
Mais alegou que o restante imóvel é e sempre foi a casa de morada de família, onde vive e reside, tendo-lhe sido atribuída no âmbito do processo de divórcio a utilização até à partilha, nunca tendo procedido à sua exploração turística por oposição do requerente e havendo sido nomeada depositária do imóvel, em 18 de Setembro de 2013, no âmbito dos autos de arrolamento que correram termos sob o n.º 2862/13.2TBPTM da Comarca de Faro, pelo que não tem obrigação de prestar quaisquer contas.
Por fim, alegou que entre 2008 e 2012 foi o requerente quem fez a gestão em exclusivo de arrendamentos em tais propriedades, estando obrigado a prestar contas de tal gestão, e, em reconvenção pediu que o mesmo lhe preste contas da sua gestão desde 2008, até Agosto de 2012.
Juntou documentos, e “contas” dos anos de 2012 a 2016 referentes à casa que constitui a morada de família, não pedindo qualquer diligência de prova.

4. Em resposta, alegou o A. que até ao final do mês de Julho de 2012, não obstante a sua separação de facto, a administração dos bens do casal foi feita conjuntamente com a R., situação que apenas cessou em Agosto de 2012, pelo que não tem qualquer obrigação de prestar contas.
Mais alegou que o expediente documental junto pela requerida não reúne os requisitos legais para que se deva considerar prestada a informação, de modo suficiente, acerca das contas do imóvel que constituía a casa de morada de família, tanto mais que não se mostram juntos os documentos que justifiquem ou demonstrem os valores apresentados, não a desobrigando a circunstância de tal imóvel constituir a casa de morada de família, pois que o seu valor locativo deve ser considerado receita, ante a posse exclusiva.
Por fim, reconhecendo inexistir ainda decisão final no que concerne à titularidade do imóvel cuja natureza própria ou comum foi posta em crise em sede de acção judicial, reputa que a mesma em nada bule com a obrigação de prestação de contas, pois que os rendimentos obtidos através da sua exploração constituem bem comum do casal.
Para o caso de se entender já prestadas as contas por banda da requerida, no que concerne ao imóvel que constitui a casa de morada de família, pediu o A. a realização de prova pericial, para determinação do seu valor locativo.

5. Foi proferido despacho julgando inadmissível o pedido reconvencional apresentado pela R. e julgado que a mesma está obrigada a prestar contas da sua administração dos prédios desde a data da propositura da acção de divórcio, até à data de trinta dias, volvidos desde a citação para o processo, ou seja, “entre 19 de Outubro de 2013 e 7 de Novembro de 2016”.
Apresentou a R. extracto de conta corrente e suporte documental da sua gestão, com um balanço de sete mil, trezentos e sete euros e setenta e cinco cêntimos negativos. As contas foram consideradas não contestadas (cf. ref.ª 115853154), tendo a R. sido notificada para os efeitos do n.º 3 do artigo 945º do Código de Processo Civil, mas não ofereceu prova.
Porém, entendeu o Tribunal ser essencial para apreciação das contas apresentadas a realização de perícia contabilística/financeira, o que determinou ao abrigo do n.º 5 do artigo 945º do Código de Processo Civil, constando o respectivo relatório (original) e anexos de fls. 1110 a 1142.
O A. pediu esclarecimentos e requereu a notificação da R. para juntar documentos.
Por despacho ref.ª 120537764 foi determinado que o Sr. Perito prestasse os esclarecimentos solicitados, o que este cumpriu, apresentando a resposta que consta de fls. 1163 a 1175.

6. Nesta sequência veio o requerente pedir a realização de perícia para avaliação da casa de morada de família, “Casa …”, para determinação do seu valor locativo, o que foi determinado, constando o relatório de avaliação de fls. 1201 a 1206.

7. Em face dos elementos constantes dos autos, entendeu-se oportuno a realização de tentativa de conciliação das partes, a qual se veio a revelar infrutífera.
Após veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu:
i condenar a Requerida no pagamento ao Requerente, do valor de trinta e um mil, trezentos e oitenta e dois euros e quarenta e um cêntimos;
ii absolver a Requerida do demais peticionado.

8. Inconformado recorreu o requerente, nos termos e com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso, com a numeração corrigida]:
I - No âmbito da acção de divórcio que deu origem ao processo n.º 3790/13.7TBPTM, da Secção de Família e Menores da Instância Central de Portimão foi acordado que a utilização da casa de morada de família, designada “Casa …”, sita na Rua …, Lagos, ficava atribuída ao cônjuge mulher, ora Recorrida, até à partilha de bens.
II - A “Casa …” tem um valor locatário mensal de três mil e seiscentos euros e anual de quarenta e três mil e duzentos euros – cfr. relatório pericial.”
III - Por sentença proferida em 30/4/2019 foi decretada a obrigação da Recorrida BB prestar contas da sua administração em relação ao prédio urbano designado por “Casa …”, sito na Rua …, Concelho de Lagos, e, bem assim, relativamente prédio urbano designado por …, sito em …, concelho de Lagos, ambos devidamente identificados nos autos, desde a data da propositura da acção de divórcio, até à data de trinta dias, volvidos desde a citação para o presente processo, ou seja, entre 19 de Outubro de 2013 e 7 de Novembro de 2016.
IV - Consequentemente, veio a Recorrida apresentar extracto de conta corrente e suporte documental da sua gestão, com um balanço de sete mil, trezentos e sete euros e setenta e cinco cêntimos negativos.
V - Ao abrigo do disposto no art. 945º, n.º 5 do CPC, foi proferido o douto despacho de fls. de 2 de Outubro de 2020, através do qual, o Tribunal, atentos os concretos contornos de apreciação das contas apresentadas – revelador da ausência de rigor e da forma pouco criteriosa e tendenciosa das mesmas – determinou a realização de perícia contabilística/financeira – cfr. fls. 782 v
VI - Da perícia às contas apresentadas, resultou um resultado de exploração de sessenta e dois mil, setecentos e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos – cfr- relatório pericial.
VII - Foram pelo A. pedidos esclarecimentos ao Senhor Perito e, requerida ao Tribunal notificação da Ré para, ao abrigo do princípio da colaboração, juntar aos autos a documentação que não chegou a ser disponibilizada ao Senhor Perito, nomeadamente, a que vem referida a fls.2 do respectivo Relatório Pericial, a saber:
i) Documentação contabilística, incluindo documentos de despesa e receita dos exercícios de 2013 e 2014;
ii) Recibos de arrendamento emitidos nos exercícios de 2013 e 2014;
iii) Declarações do IRS de BB dos exercícios de 2013 e 2014.
VIII - Em resposta aos esclarecimentos que lhe foram solicitados, veio o Senhor Perito informar que “a análise efectuada versou sobre as receitas e despesas inerentes à actividade de exploração dos imóveis identificados como pertencentes ao acervo patrimonial comum do casal, incluindo os imóveis identificados como “Casa …” e “…” e que “os documentos de despesa e de receita não referem, na sua grande maioria, o imóvel ao qual respeitam, motivo que incapacita a distinção entre os custos e rendimentos relativos aos imóveis “…” e “Casa …” e a consideração de despesas apenas relativas ao primeiro.”
IX - Para depois concluir que, ainda assim, “(…) considerando que do acervo patrimonial comum do casal constam 7 imóveis e que, de acordo com a informação recentemente transmitida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro em 8 de Junho de 2021, 6 dos mesmos respeitam a imóveis destinados à exploração através de alojamento local e 1 dos mesmos trata-se da residência familiar da Ré – BB – poder-se-ia inferir que no máximo 14% das despesas apresentadas, respeitaria à Casa ….”
X - Não faz qualquer sentido a inclusão – no apuramento dos resultados – de quaisquer despesas relacionadas com a “Casa …”, onde apenas a Apelada mantém a sua residência exclusiva.
XI - Neste conspecto, atenta a manifesta impossibilidade que se verificou, no contexto da perícia, quanto à distinção entre os custos e rendimentos relativos aos imóveis “…” e “Casa …” e a consideração de despesas apenas relativas ao primeiro, mal andou o Tribunal recorrido ao não ter decidido - como, aliás, seria avisado e prudente – de acordo com a conclusão vertida nos esclarecimentos prestados no âmbito da perícia dos autos.
XII - Tendo sido
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