Acórdão nº 4184/22.9T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-10-26

Ano2023
Número Acordão4184/22.9T8FAR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

I. RELATÓRIO

1. Partes Comuns do Aldeamento Aldeia do Mar - Zona Sul, representada pela Bolsa dos Condomínios Limitada intentou ação declarativa de condenação com forma de processo comum contra Sea Village, Empreendimentos Imobiliários, Lda peticionando o pagamento de 205.919,23 €, (duzentos e cinco mil euros, novecentos e dezanove euros e vinte e três cêntimos), correspondente às comparticipações do prédio sua propriedade para as despesas das partes comuns do aldeamento Aldeia do Mar – zona sul, referente aos anos de 2013 a 2021 inclusive, acrescidos de juros à taxa legal contados desde o vencimento das mesmas até integral pagamento.

Na sua contestação a Ré suscitou diversas excepções, dentre as quais a de autoridade de caso julgado referindo que os factos que constituem a causa de pedir na presente acção já foram objeto de “análise e decisão no âmbito da ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro - Juízo de Execução de Loulé – Juiz 2, sob o número n.º 148/14.4T8LLE.
Mais esclareceu que a Autora deu entrada, em 01.10.2014, contra a aqui Ré, a uma acção executiva tendo por título executivo a Ata de Assembleia de Condomínio n.º 3, de 26.04.2014, visando o pagamento coercivo de despesas comuns referentes aos mesmíssimos prédios que surgem enunciados na presente acção, sendo que na presente o valor é superior porque as despesas comuns reclamadas reportam-se ao período de 2013 até à presente data.
A ora Ré aí deduziu embargos que deram lugar ao processo n.º 148/14.4T8LLE – A. no qual foi proferida sentença, em 11.12.2021, transitada em julgado em 28.01.2022, na qual se decidiu julgar extinta a execução por se considerar que as áreas a que correspondem os prédios 9289/20050217 (piscinas), 9290/20050217 (parque infantil), 9291/20050217 (campo de jogos de Mini-golfe e zona circundante) e 9287/20050217 (campos de ténis e respectiva zona circundante), foram constituídas em lotes autónomos, com proprietários determinados, não assumindo a natureza de partes comuns do empreendimento, ainda que o destino desses lotes seja proporcionar serviços de interesse comum (cuja utilização, em principio, nem se poderá restringir aos proprietários dos prédios do loteamento).

Foi proferido despacho saneador-sentença no qual se decidiu que “ por violação da autoridade do caso julgado, não pode a presente ação vir a ser julgada procedente, na medida em que há uma decisão anterior que decidiu que não pode a Autora cobrar quotizações de condomínio à ré, por estarem em causa prédios autónomos e não partes comuns, não estando verificados os pressupostos exigidos no artigo 1438º-A do Código Civil, pelo que necessariamente se conclui que o pedido tem de ser julgado totalmente improcedente, mostrando-se prejudicada a análise de todas as restantes questões invocadas pelas partes (artigo 608º, n.º 2 do Código de Processo Civil).”.

2. É desta decisão que a Autora recorre formulando na sua apelação as seguintes conclusões:
A. O presente recurso tem por objecto o saneador-sentença proferido, em 14.06.2023, o qual decidiu julgar a acção improcedente e, em consequência, absolver a Recorrida do pedido deduzido pela Recorrente, com o qual a Recorrente não se conforma.
B. Contrariamente ao que defende o Tribunal ao quo, não se verifica a autoridade de caso julgado relativamente à sentença, já transitada em julgado, proferida no âmbito do apenso da oposição à execução que correu termos, sob o número 148/14.4T8LLE, no Juízo de Execução de Loulé – Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca de Faro. Com efeito,
C. Enquanto no processo executivo, a Recorrente reclamava o pagamento coercivo das comparticipações para as despesas comuns relativas ao ano de 2013, com origem nos prédios descritos sob os números 9289/20050217, 9290/20050217 e 9291/20050217.
D. No âmbito da presente acção, a Recorrente peticiona a condenação da Recorrida nas despesas das partes comuns do aldeamento Aldeia do Mar – zona sul, referente aos anos de 2013 a 2021. Por outro lado,
E. Enquanto no processo executivo, o Juízo de Execução de Loulé – Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca de Faro entendeu que o título dado à execução não dispunha de força executiva, por não ser aplicável às despesas reclamadas o regime previsto no artigo 1438.º-A do Código Civil, designadamente por se tratar de despesas com origem em prédios distintos e autónomos.
F. No âmbito da presente acção, a Recorrente pretende obter uma sentença (título executivo) que lhe permita, em caso de não pagamento voluntário, exigir da Recorrida o pagamento coercivo dos relativos às despesas das partes comuns do aldeamento Aldeia do Mar – zona sul. De facto,
G. A Recorrente apenas reclama – apenas e só! – o pagamento das comparticipações para as despesas comuns do Aldeamento, designadamente as resultantes da administração dos espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de natureza privada que serve o Aldeamento, incluindo, sem limitar, o prédio da Autora! Equivale isto a dizer que
H. Inexiste qualquer relação entre a causa de pedir e o pedido formulado no âmbito do processo executivo com a causa de pedir e o pedido formulado nos presentes autos. De facto, entre uns e outros não existe qualquer relação, seja de prejudicialidade ou instrumentalidade.
I. A questão sobre a qual o caso julgado se formou, mais concretamente no âmbito do processo 148/14.4T8LLE, não constitui questão fundamental ou mesmo de questão secundária ou instrumental no presente processo. Aliás, a questão ali em causa não é abordada, de todo, neste processo! Sem conceder,
J. A eventual verificação da autoridade do caso julgado não implicaria, por si só, a improcedência da acção movida pela Recorrente contra a Recorrida. Isto porque,
K. Não estando o Tribunal a quo vinculado não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, o mesmo poderia ter conhecido a acção, por exemplo, por via do instituto do enriquecimento sem causa.
L. Em face do exposto, ao decidir da forma como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 619.º e 621.º, ambos do Código de Processo Civil.
NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a sentença recorrida, substituindo-se por outra que ordene o prosseguimento dos autos, com a marcação de audiência prévia ou, no Tribunal a quo entenda dispensá-la, com a prolação do despacho a que se refere o artigo 503.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
Só assim decidindo farão V. Exas. a costumada e sã JUSTIÇA!”.


3. Contra-alegou a Ré defendendo a manutenção do decidido.


4. O objecto do recurso, delimitado pelas enunciadas conclusões (cfr.artºs 608º/2, 609º, 635º/4, 639º e 663º/2 todos do CPC) reconduz-se apenas à questão de saber se o decidido na sentença prolatada no processo de embargos de executado sob 148/14.4T8LLE-A se impõe na apreciação do presente processo.

II. FUNDAMENTAÇÃO

5.É a seguinte a factualidade inserta na decisão recorrida com relevância para a decisão da excepção:

1) A Autora Partes Comuns do Aldeamento Aldeia do Mar - Zona Sul, representada pela Bolsa dos Condomínios Limitada, intentou ação contra a Ré Sea Village, Empreendimentos Imobiliários Lda pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de 205.919,23 € correspondente às comparticipações do prédio sua propriedade para as despesas das partes comuns do aldeamento Aldeia do Mar – zona sul, referente aos anos de 2013 a 2021 inclusive, acrescidos de juros à taxa legal contados desde o vencimento das mesmas até integral pagamento.

2) Para tanto, a Autora invoca que:

a. na sequência de loteamento, foi constituído o Aldeamento Aldeia do Mar e esse empreendimento teve a sua origem nos prédios rústicos descritos na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob os números 36516, 35351, 35575, 35576, 35146, 35145 e 35144, o que inclui as áreas que constituem as atuais zonas verdes e ajardinadas, estacionamentos e arruamentos;

b. Conforme se alcança das certidões do registo predial, que se juntam dos citados prédios, foram desanexados vários outros prédios tendo-lhes sido atribuídos descrições autónomas e correspondentes inscrições na matriz;

c. Os prédios destacados e construídos foram posteriormente vendidos, alguns a pessoas singulares e outros a pessoas coletivas e assim sucessivamente;

d. Desde sempre que todas as infraestruturas acima enumeradas e existentes na zona sul foram sendo comparticipadas pelos proprietários, pagando a sua manutenção primeiro à Praia Longa SA;

e. Por termo de transação homologado por sentença já transitada nos autos do processo 433/2000 que correu termos no 3.º juízo cível do Tribunal de Loulé, conforme Doc. 12 que se junta em anexo e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, ficou consignado pela Autora “Praia Longa SA”, o reconhecimento como partes comuns das seguintes:

- A alínea b) corresponde aos campos de ténis, inscrição matricial 5785 e descrição predial 9287;

- A alínea d) corresponde a piscina lado sul, inscrição matricial 1969 e descrição predial 9289;

- A alínea e) corresponde a parque infantil, inscrição matricial 5784 e descrição predial 9290;

- A alínea f) corresponde ao minigolfe, inscrição matricial 5783 e descrição predial 9291;

- A alínea g) que corresponde a zonas verdes do aldeamento e infraestruturas que constituem a parte sobrante, sem artigo predial ou matricial destacado, conforme Docs. 13 a 16 que se juntam em anexo e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

f. Desde 1981 até ao presente, que os proprietários dos diversos prédios que constituem o Aldeamento Aldeia do Mar vêm participando nas Assembleias de Proprietários, e constituíram Associação de Proprietários, conforme Doc. 17 que se junta em anexo e aqui se dá por...

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