Acórdão nº 4118/22.0T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-06-07

Ano2023
Número Acordão4118/22.0T8VCT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:

I- RELATÓRIO

AA, residente na Rua ..., ..., instaurou, em .../.../2018, inventário notarial, por óbito de BB, falecida em .../.../1993, no estado de viúva de CC, sem testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, com último domicílio na Rua ..., ..., ..., ..., ..., indicando para o cargo de cabeça de casal DD, residente na Rua ..., ..., ....
Nomeada para o cargo de cabeça de casal a identificada DD, tomou-se compromisso de honra e declarações à mesma, que requereu prazo para a apresentação da relação de bens, o qual lhe foi concedido.
Em 24/04/2019, a cabeça de casal apresentou relação de bens, onde relacionou a quantia de 120.000$00 doada pela inventariada ao interessado EE, em data anterior a 21 de junho de 1993; um cordão em ouro doado pela inventariada ao mesmo interessado EE; um prédio urbano; diverso passivo da herança e, bem assim, um crédito desta sobre o interessado EE relativamente a dinheiro mutuado ao último.
Os interessados AA e EE apresentaram reclamação à relação de bens apresentada pela cabeça de casal requerendo a exclusão da quantia de 120.000$00 e do cordão em ouro relacionados como tendo sido doados pela inventariada ao interessado EE, negando a existência desses bens e que os mesmos tenham sido doados a esse interessado.

Impugnaram:
- o valor atribuído ao prédio urbano relacionado, alegando que o valor desse prédio ascende a quantia não inferior a 97.000,00 euros e requerendo que se cumprisse o disposto no art. 33º, n.º 2 do RJPI;
- o valor do passivo relacionado a título de benfeitorias realizadas pela cabeça de casal no identificado prédio, alegando reconhecerem que esta realizou benfeitorias nesse prédio, mas impugnando que se trate das concretas benfeitorias descritas na relação de bens e, bem assim, que o valor dessas benfeitorias seja o indicado na relação (75.000,00 euros), sustentando que o valor destas ascende a 15.000,00 euros;
- o valor do passivo relacionado a título de despesas com o funeral da inventariada, sustentando que o funeral foi pago com dinheiro deixado pela inventariada;
- o valor do passivo relacionado a título de despesas com fraldas, advogando desconhecerem se a inventariada necessitava ou não de fraldas, mas que, em todo o caso, esta dispunha de meios financeiros próprios para pagar essa despesa com fraldas caso efetivamente delas necessitasse; acresce que a cabeça de casal, na relação de bens apresentada, não discriminou quantas fraldas alegadamente pagou, o seu custo, durante quanto tempo e não juntou qualquer fatura relativa a essa pretensa despesa com aquisição de fraldas;
- o valor do passivo relacionado a título de prestação de serviços, alegando desconhecerem se a inventariada necessitou ou não da prestação de serviços de uma “senhora”, pessoa que a cabeça de casal nem identificou na relação de bens que apresentou e que, em todo o caso, a inventariada dispunha de meios financeiros para pagar esses pretensos serviços caso deles tivesse efetivamente necessitado e beneficiado; acresce que, a cabeça de casal, na relação de bens, não discriminou quantas dias ou horas, por semana ou mês em que esses alegados serviços foram prestados à inventariada, o custo por hora ou dia dos mesmos, durante quanto tempo, o horário que essa “senhora” praticou, etc.;
- o valor do passivo relacionado a título de alimentação e higiene, sustentando que a cabeça de casal não discriminou, na relação de bens que apresentou, que concretas despesas são essas, as quais não passam de efabulações, até porque a inventariada dispunha de meios financeiros para suportar essas pretensas despesas; e
- o crédito da herança sobre o interessado EE, negando que a inventariada tivesse emprestado ao último a quantia relacionada ou qualquer outra.

Notificada a cabeça de casal da reclamação à relação de bens apresentada, impugnou a reclamação, concluindo pela respetiva improcedência e manteve a relação de bens que apresentou nos seus precisos termos, concretizando apenas os factos que nela tinha explanados.
Seguiram-se vários requerimentos e contra requerimentos entre reclamantes e cabeça de casal a propósito da relação de bens apresentada, da reclamação a essa relação, da prova arrolada e requerida nesses requerimentos e contra requerimentos, o que deu lugar a várias decisões por parte da Senhora notária, das quais foram, inclusivamente, interpostos dois recursos para o Tribunal Judicial da Comarca ....
No âmbito da reclamação apresentada à relação de bens realizou-se perícia com vista à avaliação do prédio urbano relacionado e às benfeitorias nele realizadas pela cabeça de casal e relacionadas naquela relação como passivo da herança, cujo relatório pericial foi junto aos autos a 12/10/2020, do qual a cabeça de casal reclamou, tendo essa reclamação sido parcialmente atendida (cfr. despacho de 02/11/2020), na sequência do que, o perito prestou os esclarecimentos que juntou aos autos em 26/11/2020.
Em 09/10/2020 realizou-se a inquirição de testemunhas e a tomada de depoimento de parte aos interessados e à cabeça de casal no âmbito da reclamação à relação de bens apresentada pela cabeça de casal.
Enfatize-se que a reclamação apresentada pelos interessados AA e EE à relação de bens apresentada pela cabeça de casal permanece por decidir, uma vez que sobre a mesma permanece por proferir decisão.
Por requerimento de 25/03/2021, a cabeça de casal informou que, no dia .../.../2020, faleceu o interessado FF, requerendo que fosse designada data para a tomada de declarações complementares a si própria.
Por despacho de 26/04/2021 ordenou-se a notificação da cabeça de casal para indicar, por requerimento, os sucessores do falecido interessado AA.
Por requerimento de 10/05/2021, a cabeça de casal alegou não se encontrar “ainda em condições de apresentar todos os elementos exigidos, designadamente, os sucessores. Conforme alegou em requerimento anterior, a cabeça de casal teve informações que o seu irmão falecido tem um filho, encontrando-se a diligenciar no sentido de obter elementos sobre a sua identidade – cfr. documento que protesta juntar no prazo de 10 dias. Requerendo assim o prazo de 30 dias para indicar os sucessores de AA. Mais requerendo que os presentes autos sejam suspensos nos termos do disposto no art. 270º do Código de Processo Civil”.
Seguiu-se resposta do interessado EE, opondo-se ao requerido pela cabeça de casal.
Por despacho proferido em 19/05/2021, suspendeu-se o presente processo de inventário, nos termos do disposto no art. 270º, do CPC, decidindo-se, contudo, que essa suspensão não abrangeria o incidente de habilitação de herdeiros do falecido AA, e concedeu-se à cabeça de casal o prazo de 10 dias improrrogáveis para identificar os sucessores deste.
Por requerimento de .../.../2021, a cabeça de casal indicou como sucessores do falecido AA a própria, DD, e EE, enquanto irmãos germanos do falecido.
Por requerimento de 14/06/2021, o interessado EE impugnou a legitimidade dos sucessores do falecido AA indicados pela cabeça de casal, alegando que este interessado faleceu no estado de viúvo, sem descendentes ou ascendentes vivos e que, por testamento de 10/10/2019, institui como seus únicos e universais herdeiros o próprio reclamante, EE, e mulher, GG.
Notificados os interessados dessa impugnação, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 31º do RJPI, a cabeça de casal requereu que a reclamação apresentada pelo interessado EE fosse julgada improcedente, alegando ter impugnado o testamento outorgado pelo falecido AA, junto aos autos pelo impugnante, “porquanto, o testamento em questão padece de vícios e, portanto, a cabeça de casal intentará a ação própria de impugnação do testamento (anulação e nulidade)”. Mais alegou que “teve informação que o seu irmão falecido tem um filho, encontrando-se a diligenciar no sentido de obter elementos sobre a sua identidade” e, bem assim, encontrar-se ainda “a diligenciar no sentido de apurar a existência e paradeiro do filho do falecido AA, bem como a reunir elementos para apresentar em juízo ação de impugnação do testamento (anulação e nulidade)”.
Em 19/11/2021 a Senhora Notária conheceu do incidente de impugnação da legitimidade dos sucessores do falecido AA indicados pela cabeça de casal, proferindo despacho em que remeteu os interessados para os meios judiciais comuns quanto à eventual existência de outros herdeiros do falecido AA, bem como, quanto à validade do testamento por este outorgado, e suspendeu o processo de inventário, nos termos do art. 16º, n.º 1 do RJPI, até à decisão definitiva de tais questões, constando esse despacho do seguinte teor (transcreve-se ipsis verbis o teor do identificado despacho):
“1- O presente processo de inventário foi apresentado através do requerimento inicial a que coube o n.º 1245902, por óbito de BB, falecida em ....
2- Por documento a que coube o número 1474771, a cabeça de casal, DD, apresentou as declarações de cabeça de casal, onde declarou:
“Que no dia ..., na freguesia ..., concelho ..., faleceu BB…. Que a inventariada faleceu sem testamento ou qualquer outra disposição de última vontade e ficou representada:
Filhos:

DD, …;

AA, …; e

EE, … .
3- No documento a que coube o n.º 2286779, a cabeça de casal informou os autos do falecimento do indicado herdeiro AA e requereu marcação de dia e hora para serem prestadas “declarações complementares de cabeça de casal”, juntando certidão de óbito (doc. n.º ...80).
4- Posteriormente, o interessado EE, através do requerimento a que coube o n.º 2288525, veio “dar conhecimento nos autos, para a eventualidade de desconhecimento” que o mencionado AA deixou testamento lavrado no Cartório Notarial a cargo da Notária HH, em 10/10/2019, exarado a folhas 45 e 45 v. do livro trinta e três – A “no qual...

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