Acórdão nº 4090/20.1T8LRA-D.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 24-10-2023

Data de Julgamento24 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão4090/20.1T8LRA-D.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMÉRCIO DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA)

Apelação n.º 4090/20.1T8LRA-D.C1

Juízo de Comércio de Leiria – Juiz 2

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Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]:

I-Relatório

M..., S.A., com sede na Rua ..., ..., ... ...

veio, por apenso aos autos de insolvência respeitantes a AA

intentar contra

A Massa Insolvente de AA

Restantes Credores de AA

e

AA

a verificação (ulterior) do crédito a que se arroga, no montante de € 9.700,80, titulado por livrança subscrita pelo agora insolvente, montante acrescido de juros de mora que liquidou (€ 7.53,68 à data de complemento da sentença de declaração de insolvência) e do imposto de selo respetivo (de € 282,15).

*

A Massa Insolvente (e apenas esta) contestou impugnando os factos invocados e excecionando a prescrição da livrança e dos juros.

*

Realizada a audiência de partes, no despacho que se lhe seguiu, foi saneado o processo (ao demais, julgando improcedente a exceção da prescrição), identificado o objeto do processo e enunciado o tema da prova.

*

Em 11.06.2023 foi proferida sentença, contendo o seguinte dispositivo “julgo a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, não reconheço qualquer crédito à A.”.

*

A A. interpôs recurso dessa decisão, fazendo constar nas alegações apresentadas as conclusões que se passam a transcrever:”

1º Não se conforma, a Recorrente, com a sentença recorrida;

2º Não existe correspondência entre os factos e documentos constantes dos autos e a decisão adotada, nem se aplicou, corretamente, a lei ao caso concreto;

3º Não pode a Autora aceitar, nem concordar com a decisão adotada na sentença recorrida face aos factos documentados nos autos;

4º Ficou amplamente provado a tempestividade da ação, a celebração do contrato de aluguer, a assinatura da livrança pelo punho do Insolvente e que a Recorrente era legítima portadora da livrança;

5º No entanto, e contrariamente ao esperado, atentos aos factos considerados provados, entendeu o Tribunal a quo não reconhecer o crédito reclamado pela Recorrente;

6º Ora, com interesse para a boa decisão da causa, provaram-se os seguintes factos: (…[2])

7º Posto isto, não consegue a Recorrente cogitar como é que atentos aos factos considerados como provados (contrato, rendas, assinatura da livrança, ação executiva), o Tribunal tenha concluído por improceder o petitório da Autora;

8º Ademais, diga-se que, apenas foi apresentada contestação pela Massa Insolvente, tendo o Réu Insolvente remetido ao silêncio;

9º Acresce que, nenhum dos factos alegados pela Massa Insolvente é passível de contrariar a matéria vertida na petição inicial apresentada pela Recorrente, não tendo a mesma arrolada qualquer testemunha que contrariasse a força probatória do título de crédito e do montante reclamado pelo credor, conforme lhe competia nos termos e para os efeitos do disposto no art. 342º do Código Civil;

10º Ora, a Massa Insolvente limitou-se a fundamentar a sua pretensão na invocação da prescrição da livrança, não tendo, inclusivamente requerido a perícia à letra aposta na livrança, nem impugnado o contrato junto ou exercido o direito ao contraditório, nomeadamente impugnando a genuinidade do documento nos termos e para os efeitos do art. 444º do Código de Processo Civil;

11º Ademais diga-se que também, não logrou ilidir a autenticidade ou a força probatória do documento nos termos do art. 446º do mesmo diploma no prazo que tinha para o efeito, ou seja 10 dias, como bem salientado na sentença;

12º Pelo que muito se estranha que ainda assim, o Tribunal a quo aceda aos apanágios não alegados pela Massa Insolvente e decidindo pela improcedência do pedido formulado pela Autora;

13º São, pois, latentes as contradições presentes na sentença ora recorrida, violando flagrantemente os normativos legais.

14º Pelo que padece a aludida decisão de nulidade ao abrigo dos artigos 607º nº 4, nº5 e 615º c) do Código de Processo Civil;

15º Prosseguindo no elenco das contradições expressas na sentença recorrida, é referida daquela decisão que é usual as letras e livranças serem entregues às instituições bancárias já assinadas como caução e para garantia do bom pagamento de todas as obrigações e/ou responsabilidades decorrentes dos contratos e são preenchidas, aquando do incumprimento dos contratos, pelos portadores do título;

16º São as chamadas livranças em branco;

17º Posto isto, sendo, pois, assente e do conhecimento geral que as livranças são assinadas e entregues em branco aos credores, lógico é que os demais campos são preenchidos apenas e quando ocorre o incumprimento de tal obrigação;

18º Pois que, evidentemente, caso o contrato seja cabalmente cumprido, não haverá lugar ao preenchimento da livrança;

19º Assim, perante o incumprimento, está o credor legitimado a preencher o seu montante designadamente no que se refere às datas de emissão e vencimento, pelo valor correspondente aos créditosdeque emcada momentoo credor sejatitularporforça dopresente contrato oude encargos e despesas dele decorrentes”;

20º Tal como resulta do contrato (cláusula 16ª das condições gerais), considerado celebrado, com a resolução do contrato a L... teria o direito de retomar o veículo, reter as importâncias pagas pelo locatário e de exigir as vencidas e não pagas atá a data da resolução, bem como ser ressarcida pelos prejuízos resultantes da resolução do contrato;

21º Ora, tendo ocorrido o incumprimento das obrigações assumidas pelo Insolvente, a Credora procedeu ao preenchimento pelo valor de 9.700,80 € motivo pelo qual instaurou a respetiva ação executiva.;

22º Tendo a Recorrente referido na petição inicial que, não obstante as diligências promovidas, nenhum montante foi passível de ser recuperado;

23º Posto isto, não pode a Recorrente deixar de evidenciar que discordando o Réu ou a Massa Insolvente do valor inscrito no título cambiário, caber-lhe-á o ónus de alegação de factos concretos (constitutivos da exceção) que sustentam a sua não concordância com o valor ali descrito;

24º Ademais diga-se que, em nenhum momento, a Massa Insolvente excecionou pelo pagamento, nem tão pouco atacou a veracidade da assinatura aposta na livrança ou o contrato celebrado.

25º Assim, com o devido respeito por opinião diversa, não lograram os Réus impugnar o concreto valor descrito e devidamente titulado na livrança, limitando-se unicamente a alegar pela prescrição do aludido título, exceção essa que se verificou como improcedente ainda no despacho de saneador.

26º Posto isto, cumpre referir que os cheques, letras e livranças, enquanto títulos de crédito, mantêm as suas características fundamentais (incorporação, literalidade, autonomia e abstração), encontrando-se o portador do título dispensado de invocar ou demonstrar qualquer relação extracartular ou a causa da emissão do título “o simples exame do título (…) deve revelar o direito cambiário, fazendo transparecer a sua natureza apenas pelo teor da sua redação” cfr. José Maria Pires in O Cheque Editora Rei dos Livros Lisboa 1999, pp.37 e seguintes.

27º Por outro lado, e ainda que meros quirógrafos, a jurisprudência não deixou de reconhecer em tais documentos uma especial força probatória.

28º A este propósito cumpre chamar à colação do disposto no art. 458º do Código Civil, nos termos do qual, os documentos escritos de que conste a promessa de cumprimento de uma obrigação ou o reconhecimento de uma dívida, ainda que omitam a respetiva causa, dispensam o credor de provar a relação fundamental.

29º Na verdade, desde cedo «[a] experiência judiciária [demonstrou] que, em grande maioria, as ações declarativas cuja causa de pedir se reconduz a uma obrigação cartular não são contestadas». Prescindindo-se, inicialmente, do reconhecimento notarial da assinatura do devedor apenas em títulos de crédito cujo valor fosse inferior à alçada da Relação (cfr. o n.º 1 do artigo 51.º do Código Civil, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 533/77), passou a atribuir-se força executiva a todos os títulos de crédito, independentemente do respetivo valor(cfr. a redação do mesmo preceito, dada pelo Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de julho).

30º Assim, reitera-se que nenhum dos factos alegados pela Massa insolvente foi passível de contrariar a matéria vertida na petição inicial apresentada pela Recorrente, não tendo o mesmo arrolado qualquer testemunha que contrariassea força probatória do título de crédito e do montante reclamado pela Credora, conforme lhe competia nos termos e para os efeitos do disposto no art. 342º do Código Civil.

31º Assim, considerando os...

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