Acórdão nº 403/23.2T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-12-07

Ano2023
Número Acordão403/23.2T8TMR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 403/23.2T8TMR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA[2] (Autor) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Banco Santander Totta, S.A.” (Réu), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência, seja o Réu condenado:
a. a reconhecer ao A. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 43,47%, correspondente a 10 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b. a pagar ao A. o valor de quantia de € 1.702,19 Euros, acrescido de juros de mora legais no montante de € 43,74 Euros, num valor total global de €1.745,93 Euros, correspondente ao valor excessiva e ilegalmente descontado, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal. acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em dívida.
c. a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo A. para a Segurança Social, enquanto trabalhador bancário;
d. a pagar ao A. todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença;
e. a suportar as custas processuais.
Alegou, em síntese, que o Autor foi admitido ao serviço do Réu em 11-12-1989 e passou à situação de reforma por limite de idade, com efeitos a 31-07-2020, tendo sido, posteriormente, deferido pelo Centro Nacional de Pensões o seu requerimento de pensão por velhice com início em 07-02-2022, a qual se fixou em €630,43.
Alegou, igualmente, quanto à reforma para o sector bancário, passou a auferir uma pensão no montante de €1.026,62, acrescida de diuturnidades no valor de €257,22.
Alegou, por fim, que, nos cálculos formulados pelo Réu a pagar ao Autor a título de pensão “extra-banco”, aquele apropriou-se indevidamente de 70,53% dessa pensão, quando apenas teria direito a 43,47%, nos termos da cláusula 94.ª, n.º 1, do ACT para o sector bancário, a qual determina a aplicação da regra pro rata temporis.
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.
O Réu veio apresentar contestação, pugnando, a final, que seja julgada a ação totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se o Réu dos pedidos formulados, ou, caso assim se não entenda, e se determine a aplicabilidade da regra pro rata temporis, deverá determinar-se que o Réu poderá reter 43,48% da pensão de reforma paga pela Segurança Social e não os 43,47% peticionados pelo Autor.
Para o efeito, em súmula, alegou que, mesmo na versão do Autor, sempre o Réu teria direito a deduzir 43,48% e não 43,47%, porém, quanto ao cálculo do remanescente a que o Autor tem direito, uma vez que a cláusula 94.ª, n.º 1, do ACT do sector bancário é totalmente omissa quanto a esta questão, existe uma lacuna nesse ACT, a qual terá de ser integrada, em face do disposto no art. 10.º do Código Civil, pelo critério constante do art. 28.º de DL n.º 187/2007, de 10-05, por se tratar de uma situação manifestamente análoga.
Mais alegou que, mesmo que não se considere estarmos perante uma lacuna, recorrendo-se à interpretação do referido artigo do ACT, nos termos do art. 9.º do Código Civil, chegar-se-ia à mesma conclusão, em face do seu elemento literal, teleológico e sistemático, sendo, igualmente, de aplicar o critério pro rata contributum.
O Autor veio apresentar resposta ao parecer junto pelo Réu.
Realizada audiência prévia, não foi possível obter acordo entre as partes, porém, foi obtido acordo quanto aos factos que deveriam ser dados como provados.
Em 11-07-2023 foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:
Pelos fundamentos de direito e de facto supra mencionados, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno o Réu Banco Santander Totta, S.A.:
1) a reconhecer ao A. AA o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 43,48%, correspondente a 10 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
2) a pagar ao A. AA o valor da quantia de 1.701,39, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;
3) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efectuados pelo A. AA para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
4) a pagar ao A. AA todas as quantias que venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em 3), desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos;
5) Absolver, no mais, o Réu Banco Santander Totta, S.A. dos pedidos contra o mesmo formulados pelo A. AA.
6) Condeno o Autor e o Réu no pagamento das custas na proporção do decaimento, cuja responsabilidade fixo em 1% a cargo do primeiro e 99% a cargo do segundo.
Registe e notifique.
Não se conformando com a sentença, veio o Réu “Banco Santander Totta, S.A.” interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem:
A. Tendo em conta a matéria de facto provada e salvo o devido respeito por opinião contrária, a Sentença recorrida não aplicou corretamente o direito à matéria de facto provada a matéria de facto provada, tendo a Sentença recorrida, salvo o devido respeito por opinião contrária, efetuado uma errada interpretação da cláusula 94ª do ACT do Setor Bancário, violando os artigos e 10º do Código Civil, os artigos 11º, 26º, 28º, 31º, 33º e 34º do Decreto-Lei n.º 187/2007 de 10/5, e os artigos 54º, 62º n.º 1, 63º n.º 5 e 67º n.º 1 da LBGSSS
B. A Sentença recorrida entende que o Recorrente deduz da pensão de reforma que é paga pela Segurança Social ao Recorrido um montante acima do que seria admissível face ao estabelecido na Cláusula 94ª do ACT do Setor Bancário publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego, 1ª Série, n.º 29 de 08.08.2016, determinando que para o cálculo do valor da pensão paga pela Segurança Social a reter pelo Recorrente deverá ter-se única e exclusivamente em consideração o tempo relevante para a formação da pensão, dividindo-se esta pelo critério pro rata temporis.
C. A questão que se coloca nos presentes autos é de saber como se determina, na pensão de velhice sujeita ao regime geral da Segurança Social (ou seja, a pensão correspondente ao período de serviço fora do setor bancário e ao período de serviço bancário já integrado na Segurança Social), o valor da parcela que o Recorrente pode deduzir ao Recorrido quando lhe seja paga essa pensão, para evitar a sobreposição do benefício pensão de velhice da Segurança Social e do benefício previdencial reforma de invalidez presumível (que, aliás, é proibida pela cláusula 94ª n.º 1 do ACT do Setor Bancário e pelo artigo 67º da Lei de Bases da Segurança Social).
D. A regra geral é a de que as instituições bancárias apenas se responsabilizam pela diferença entre os benefícios pensionísticos que o regime substitutivo garante e aqueles, da mesma natureza, que sejam pagos pela Segurança Social, sendo que a dúvida surge quando nem todo o valor dos benefícios da pensão de reforma paga pela Segurança Social decorrem do serviço prestado no setor bancário, caso em que as instituições bancárias apenas poderão fazer seu o valor que decorra do tempo de serviço prestado no setor.
E. Para as situações (como é o caso do Recorrido) em que os descontos efetuados para a Segurança Social não decorrem apenas de trabalho prestado no setor bancário, por aplicação da cláusula 94ª do ACT, deverão ser apuradas em separado a pensão que resultaria exclusivamente do serviço bancário e a pensão que resultaria do serviço prestado fora da Banca, partilhando-se de seguida, de acordo com a proporção entre essas pensões, a pensão real paga pela Segurança Social.
F. No âmbito do regime geral de segurança social há que considerar que o reconhecimento do direito à pensão de velhice depende do preenchimento das respetivas condições de acesso (definidas no D.L. n.º 187/2007 de 10.05), designadamente:
inscrição do beneficiário no sistema de segurança social e requerimento da pensão pelo beneficiário;
condição de idade inerente a esta eventualidade;
preenchimento do prazo de garantia de contribuições dos trabalhadores e respetivas entidades empregadoras.
G. Sendo um sistema contributivo, o sistema da segurança social tem por base os rendimentos do trabalho, pelo que no que respeita ao modo de cálculo da pensão (cfr. artigo 26º n.º 2 do D.L. n.º 187/2007) a lei atende ao número de anos de carreira contributiva e à média das remunerações anuais do trabalhador ao longo desses anos, aplicando a estes fatores uma taxa (a taxa de formação da pensão).
H. O sistema de segurança social rege-se por regras e princípios gerais previsto na Lei das Bases Gerais do Sistema da Segurança Social (LBGSSS), designadamente:
princípio da contributividade (existe uma relação sinalagmática direta entre a obrigação de contribuir e o direito às prestações) – artigo 54º LBGSSS;
princípio da não acumulação de benefícios sociais da mesma natureza – artigo 67º n.º 1 da LBGSSS;
o valor das remunerações registadas constitui a base de cálculo para a determinação do montante das prestações pecuniárias substitutivas dos rendimentos da atividade profissional – artigo 62º n.º 1 LBGSSS;
o cálculo das pensões de velhice e de
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