Acórdão nº 4/20.7GDMFR.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-02-20

Ano2024
Número Acordão4/20.7GDMFR.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
I- RELATÓRIO
I.1 No âmbito dos autos de instrução n.º 4/20.7GDMFR que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo de Instrução Criminal de Sintra – Juiz 2 foi proferido a 21.03.2023, o seguinte despacho [transcrição]:
“Nos presentes autos o Ministério Público deduziu acusação contra AA, a quem imputou a prática, em autoria material e sob a forma consumada, um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º do Cód. Penal (na pessoa do ofendido BB) e um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1 a) e n.º 2, com referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. e) parte final, todos do Código Penal (na pessoa do ofendido CC);
AA e DD, em coautoria material, sob a forma consumada e em concurso efetivo (quanto a AA), um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1 a) e n.º 2, com referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. e) parte final e h), primeira parte, todos do Código Penal (na pessoa do ofendido EE).
Previamente à dedução da acusação pública foi dado cumprimento ao disposto no artigo 285.º n.ºs 1 e 2 do CPP e, na sequência desta deduzida acusação particular por FF contra EE a quem imputou a prática de um crime de injúria, p e p pelo artigo 181.º do C. Penal, acusação que o Ministério Público veio a acompanhar.
Por não se conformar com a acusação contra si deduzida veio o arguido EE requerer a abertura da fase de instrução.
Cumpriria neste momento apreciar o requerimento de abertura da fase de instrução. Acontece, porém, que existe uma questão prévia que o tribunal irá conhecer de imediato a fim de evitar a prática de atos inúteis.
Da prescrição do procedimento criminal relativamente ao crime de injúria, p e p pelo artigo 181.º do C. Penal.
A factualidade que respeita ao crime imputado ao arguido EE ocorreu na noite de 28 para 29 de fevereiro de 2020.
Atenta a moldura penal que ao crime corresponde, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de dois anos (artigo 118º al. d) do Código Penal).
O prazo de prescrição corre desde o dia em que o facto se tiver consumado – artigo 119.º n.º 1 do C. Penal.
Nos termos do disposto no artigo 121º n.º 3 do Código Penal, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.
Inexistindo motivo de suspensão do procedimento, a prescrição terá lugar decorridos que sejam três anos sobre a prática dos factos.
Considerando que os factos foram praticados na noite de 28 de fevereiro de 2020, do mero confronto de datas resulta evidente que, não obstante a interrupção verificada com a constituição como arguido, em 14 de Setembro de 2021, mostram-se decorridos desde 28 de fevereiro de 2023, 3 anos sobre a data da prática dos factos, pelo que, à data em que os autos foram distribuídos para instrução já se encontrava prescrito o procedimento criminal.
Destarte declara-se extinto, por prescrição o procedimento criminal pelo crime de injúria imputado a EE - (artigos 118º al d), 119º n.º 1 e 121º n.º 3, todos do C.Penal).
Notifique e comunique superiormente.
Não é devida tributação.
Após trânsito, remeta os autos à distribuição para julgamento.”
*
I.2 Recurso da decisão
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o Mº Público, para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
“III. CONCLUSÕES
1. Por decisão proferida a 21.03.2023 decidiu a Mm.a JIC declarar extinto, por prescrição do procedimento criminal, o crime de injúria imputado a EE, apelando ao disposto nos arts. 118º al d), 119º n.º l e 121º n.º 3, todos do Código Penal.
2. A Mm.º Juiz de Instrução Criminal considerou, então, que “A factualidade que respeita ao crime imputado ao arguido EE ocorreu na noite de 28 para 29 de fevereiro de 2020. Atenta a moldura penal que ao crime corresponde, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de dois anos (artigo 118o al. d) do Código Penal). O prazo de prescrição corre desde o dia em que o facto se tiver consumado — artigo 119.º n.º 1 do C. Penal. Nos termos do disposto no artigo 121º n.º 3 do Código Penal, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade. Inexistindo motivo de suspensão do procedimento, a prescrição terá lugar decorridos que sejam três anos sobre a prática dos factos. Considerando que os factos foram praticados na noite de 28 de fevereiro de 2020, do mero confronto de datas resulta evidente que, não obstante a interrupção verificada com a constituição como arguido, em 14 de setembro de 2021, mostram-se decorridos desde 28 de fevereiro de 2023, 3 anos sobre a data da prática dos factos, pelo que, à data em que os autos foram distribuídos para instrução já se encontrava prescrito o procedimento criminal. Destarte declara-se extinto. por prescrição o procedimento criminal pelo crime de injúria imputado a EE - (artigos 118º al d), 119º n. 7 e 121ºn.º3, todos do C.Penal).”
3. Decisão da qual não podemos, de todo, concordar.
4. Analisados os autos vemos que, no âmbito do nuipc 392/20.5 T9MFR, ao presente incorporado, FF queixou-se de EE, alegando, entre mais, que este no dia 28.02.2020, pelas 23h00, junto ao restaurante “...” na ..., o terá insultado, chamando-o “filho da puta, cabrão”. Factos que, a provarem-se, são suscetíveis de configurar o crime de injúria, previsto no art.º 181.º do Cód. Penal e punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias.
5. No que à prescrição do procedimento criminal diz respeito, dispõe o art.º 118º, n.º 1, al. d) do C.P, que nos crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for inferior a 1 ano de prisão o procedimento criminal extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do crime, tiverem decorrido 2 anos.
6. Neste caso, é, pois, de 2 anos, o prazo de prescrição aplicável, correndo o mesmo desde o dia em que o facto se tiver consumado (art.º 119.º, n.º 1 do CP).
7. Acontece que, sobre tal prazo ocorreram não só causas de interrupção como causas de suspensão dessa prescrição do procedimento criminal.
8. A primeira das causas de interrupção ocorridas verificou-se aquando a constituição de arguido de EE, como tal, operada a 14.09.2021 - art.º 121.º/1 a) do CP. Depois desta interrupção começou a correr novo prazo de prescrição (n.º 2 do citado preceito), sendo que, por força do preceituado no n.º 3, aquela, teria sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tivesse decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade (no caso, 3 anos).
9. Assim, até aqui, caso nenhuma outra causa de suspensão ou interrupção tivesse ocorrido, a prescrição do procedimento criminal ocorreria a 28.02.2023.
10. Acontece que, ocorreu uma nova interrupção da prescrição do procedimento criminal (art.º 121.º/1 b) do CP), a qual também constitui também causa de suspensão (art.º 120.º/1 b) do C.P), a 08.02.2023. com a notificação da acusação particular deduzida pelo assistente FF e respetivo acompanhamento por parte do Ministério Público ao arguido EE.
11. Sabemos, pois, que na interrupção, o tempo decorrido antes da verificação da sua causa fica sem efeito, começando a correr novo prazo de prescrição depois de cada interrupção, enquanto que na suspensão, o tempo decorrido antes da verificação da sua causa conta para a prescrição, juntando-se com o tempo decorrido após a mesma ter desaparecido.
12. Dispõe, a al. b) do n.º 1 do art.º 120º do CP, este epigrafado de "Suspensão da prescrição", que: “A prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação ou, não tendo esta sido deduzida, a partir da notificação da decisão instrutória que pronunciar o arguido ou do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo”.
13. Referindo os n.ºs 2 e 3 de tal normativo que “No caso previsto na alínea b) do número anterior, a suspensão não pode ultrapassar 3 anos sendo que “A prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão”.
14. Ou seja, a prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão, não podendo, contudo, esta ultrapassar três anos quando respeitar à notificação da acusação.
15. Ora, desde o mencionado dia 28.02.2020 e, se não houvesse, como há, a causa de suspensão da prescrição, poder-se-ia defender uma eventual prescrição do procedimento criminal, tal como fez a Mm.ª JIC, porquanto, tendo em conta que desde o mencionado dia, já teria decorrido, em relação ao mesmo, o prazo normal de prescrição acrescido de metade (3 anos) - art.º 121.ºnº3, do C. Penal.
16. Porém, a Mm.º JIC não teve em consideração que a notificação da acusação efetuada ao arguido EE, ocorrida a 08.02.2023 constitui também causa de suspensão da prescrição, voltando esta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão, que no caso não pode ultrapassar três anos.
17. Com efeito, na contagem do prazo de prescrição há que considerar o mencionado período de três anos subsequente à notificação da acusação, conforme, aliás, defende a maioria da doutrina e jurisprudência.
18. Veja-se a titulo meramente exemplificativo o acórdão proferido pelo STJ, proc. n.º 263/06.8JFLSB.L1.S1TRG, de 20.01.2012 e um excerto do sumário do acórdão proferido pelo TRG, proc. n.º 570/09.8TAVNF-G.G1, de 29.04.2019, que se reproduz: “I) De acordo com a alínea b), do nº1, do art.º 120, a prescrição do procedimento criminal suspende-se durante o tempo em que o procedimento criminal estiver pendente a
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT