Acórdão nº 384/21.7GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25-01-2022

Data de Julgamento25 Janeiro 2022
Ano2022
Número Acordão384/21.7GBABF.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I - RELATÓRIO

Nos autos de processo sumário nº 384/21.7GBABF, do Juízo Local Criminal de Albufeira (Juiz 1), e mediante pertinente sentença, a Exmª Juíza decidiu:

“i) Condenar o arguido FC pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de um ano e seis meses de prisão.

ii) Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 (uma) unidade de conta, reduzida a metade por via da confissão”.

*

Inconformado com a sentença condenatória, interpôs recurso o arguido, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões:

“1ª - O arguido foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do D.L. 02/98, de 03 de janeiro, por referência ao disposto no art. 75º, n.º 1, do Código Penal (CP), na pena de um ano e seis meses de prisão.

2ª - Não tendo sido suspensa a execução da pena de prisão e tendo sido ainda considerado como reincidente.

3ª - Mas, a confissão do arguido e a sua comprovada tentativa de obter licença de condução no estrangeiro revelam que o mesmo sentiu e procurou corrigir a causa da censura penal de que foi anteriormente alvo, pelo que foi violado o disposto nos arts. 50º a 54º do Código Penal, ao não ser suspensa a execução da pena de prisão.

4ª - Ao mesmo tempo, foi violado o requisito material da verificação da reincidência previsto no art. 75º, nº 1, in fine, do CP, uma vez que foi por causa das suas anteriores advertências penais que o arguido procurou reverter a falta de habilitação.

Termos em que, e nos mais de Direito, dando-se por provado e procedente o presente Recurso, deve ser proferido Acórdão que aplique ao Arguido uma pena de prisão não superior a um ano, e suspensa na sua execução, sem qualquer aplicação do regime de reincidência”.

*

A Exmª Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, e concluindo tal resposta nos seguintes termos (em transcrição):

“1º - Foi o arguido/recorrente condenado como reincidente, qualificativa que determinou o agravamento da moldura penal abstrata, nos termos do artigo 75º do Código Penal.

2º - Há que formular, seguramente, o inerente juízo de ineficácia das condenações anteriores, de modo a ter-se por preenchido o pressuposto material do artigo 75º, nº 1, do Código Penal.

3º - Na medida em que a sua atuação foi repetitiva (em confronto com os factos do processo 208/11.3GBABF), exibindo documentos e o requerimento de troca de carta, diligenciando dessa forma para justificar a conduta e iludir o tribunal - fls. 88 a 94.

4º - Pela segunda vez munido de uma carta não válida para conduzir em Portugal, ao invés de se entender que merece menos censura porque diligenciou por obter carta, o juízo a fazer é de mais intensa censura, porque revela obstinação na decisão de conduzir em Portugal apesar de não ter carta válida, e revela desinibição no propósito de delinquir (sentença, V. fls. 122).

5º - A suspensão da execução da pena de prisão não deve ter lugar, por não ser de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição.

6º - Os factos provados não consentem que se conclua que a socialização em liberdade é possível e, por isso, deve afastar-se o juízo de prognose favorável.

7º - Razões de prevenção geral opõem-se à suspensão da execução da pena.

8º - A execução da pena de prisão é necessária à satisfação da necessidade de prevenção especial.

9º - Não se verificam os pressupostos de que o artigo 50º, nº 1, do Código Penal, faz depender a suspensão da execução da pena de prisão.

10º - Só a prisão efetiva não substituída satisfará as necessidades de prevenção especial e geral.

Nestes termos, deve manter-se a decisão recorrida nos seus precisos termos”.

*

Neste Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, entendendo também que o recurso deve ser julgado improcedente.

Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi apresentada qualquer resposta.

Foram colhidos os vistos legais e foi realizada a conferência.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1 - Delimitação do objeto do recurso.

Duas questões, em breve síntese, são suscitadas no presente recurso, segundo o âmbito das correspondentes conclusões, as quais delimitam o objeto do recurso e definem os poderes cognitivos deste tribunal ad quem, nos termos do disposto no artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal:

1ª - A inexistência, in casu, de reincidência (por ausência do requisito material enunciado no artigo 75º, nº 1, in fine, do Código Penal), e, por via disso, devendo ser aplicada pena de prisão não superior a um ano.

2ª - A substituição da pena de prisão efetiva aplicada ao arguido por pena de prisão suspensa na respetiva execução.

2 - A decisão recorrida.

Na sentença revidenda foram dados como provados os seguintes factos:

“1) No dia 8 de abril de 2021, pelas 16h14, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula …, no …, em ….

2) Porém, o arguido circulava na via pública, conduzindo o referido veículo, sem estar devidamente habilitado para o efeito, com o necessário título de condução.

3) O arguido sabia que não podia conduzir sem a respetiva e imprescindível habilitação legal.

4) Sabia também que este seu comportamento era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir a referida viatura nas condições em que o fez.

5) O arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era punida por lei.

6) O arguido foi condenado pela prática de crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do D.L. 2/98, de 3 de janeiro, no âmbito de vários processos.

7) No Processo n.º 117/11.6JAPTM, que correu termos no extinto 1.º Juízo Criminal do Tribunal de Albufeira, por acórdão transitado em julgado a 12 de janeiro de 2012, pela prática em 2011 de um crime de tráfico de estupefacientes na pena de 4 anos e 6 meses de prisão e de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 6 meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 4 anos e 10 meses de prisão, cujos factos provados foram: “no dia 10.08.2011, o arguido, conduzindo o veículo de matrícula …, viajou de … com destino ao …, tendo sido intercetado na …, em …, tendo na sua posse sete bolotas de cocaína com o peso bruto de 81,20gr, correspondente ao peso líquido de 73,90gr, e a um grau de pureza de 26,9% e duas embalagens de fenacetina, substância habitualmente utilizada no corte de cocaína. No dia 10.08.2011, o arguido não era titular de qualquer carta de condução. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente de serem as suas...

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