Acórdão nº 3715/21.6T8MTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-12-19

Ano2023
Número Acordão3715/21.6T8MTS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 3715/21.6T8MTS.P1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
AA, residente na Rua ..., ... ..., patrocinado pelos serviços jurídicos do sindicato, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra A..., S.A., com sede na Rua ..., Maia.
Pedidos: “ser a condenada a:
a) A pagar ao A. uma retribuição mensal igual à que é paga ao colega BB;
b) A pagar ao A. a quantia de 9.880,05€ a título de diferenças salariais devidas e invocadas resultantes da descriminação;
c) A pagar os juros vencidos à taxa legal desde o vencimento de cada prestação até efetivo e integral reembolso.”
Alega em síntese: foi admitido, em 17 de junho de 2013, ao serviço da ré; tem desde julho de 2017 a categoria profissional atribuída pela ré de “operador de laboratório e ensaios mecânicos + 1 ano”; BB é trabalhador da ré, classificado também como “operador de laboratório e ensaios mecânicos + 1 ano”; o autor auferiu: a) De julho de 2017 a fevereiro de 2018 o salário base de 1030,00€ e um subsídio de turno de 360,00€; b) De março de 2018 a março de 2021 o salário base de 1080,00€ e um subsídio de turno de 378,00€; c) De abril de 2021 a junho de 2021 o salário base de 1150,00€ e um subsídio de turno de 402,50€ 11; e o trabalhador BB auferiu: a) De julho de 2017 a fevereiro de 2018 o salário base de 1161,00€ e um subsídio de turno de 406,35€; b) De março de 2018 a março de 2021 o salário base de 1211,00€ e um subsídio de turno de 423,85€ c) De abril de 2021 a junho de 2021 o salário base de 1271,00€ e um subsídio de turno de 444,85€.
Citada a ré, procedeu-se a audiência das partes, resultando infrutífera a tentativa de conciliação.
A ré veio contestar, impugnando o alegado pelo autor, referindo que o trabalhador em causa tem uma maior antiguidade e desempenha outras tarefas diversas das do autor.
Fixou-se à acção o valor de € 9.880,05.
Foi proferido despacho saneador, que transitou em julgado, e dispensada a convocação de audiência prévia, bem como a identificação do objeto do processo e dos temas da prova.
Realizou-se audiência de julgamento com gravação da prova pessoal produzida.
Foi proferida sentença, na qual se decidiu a final: “julgo improcedente o pedido formulado nos autos, pelo que dele absolvo a ré.”
Inconformado interpôs o autor o presente recurso de apelação, concluindo:
1. A presente apelação tem por objeto a sentença proferida nos autos, que julgou a presente ação improcedente, por não provada, absolvendo a R. do pedido contra si formulado.
2. A apelação visa a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e a impugnação da decisão de direito.
a. Da impugnação da decisão da matéria de facto
3. O apelante entende que o Tribunal a quo cometeu erros na apreciação e valoração da prova produzida em Audiência de Julgamento.
4. E por isso, coloca em crise a decisão da matéria de facto, no tocante ao nº 8, dos factos dados como provados.
5. Analisado os depoimentos, a testemunha CC, colega de trabalho do ora apelante, a testemunha BB, colega de trabalho que é referido como prestando o mesmo tipo de serviço, em igual quantidade e qualidade do ora apelante, e a testemunha Eng. DD, superior hierárquico de todos eles, afirmam taxativamente que o ora apelante e o colega de trabalho, BB, prestam o mesmo serviço, em qualidade e quantidade, rigorosamente iguais.
6. Como tal, entende o ora apelante que o nº 8 da decisão da matéria de facto, deverá ter a sua redação alterada.
7. O apelante apresenta e propõe a seguinte redação para o nº 8, da decisão da matéria de facto: 8. O trabalhador da ré, BB, tem a mesma categoria do autor e desempenha as mesmas funções referidas em 5.
b. Da impugnação da decisão de Direito
8. A questão central nos presentes autos é a de apreciar tudo o que nele consta à luz do princípio constitucional de igualdade no campo da paridade retributiva, e à luz do princípio de “para trabalho igual, salário igual”, fixado no art. 270º, do CT.
9. Resultou do depoimento das testemunhas CC, BB e Eng. DD, que o ora apelante e o seu colega de trabalho, BB (por sinal uma das testemunhas), prestam o mesmo serviço, em qualidade e quantidade rigorosamente iguais.
10. Por isso, no fundamento de facto ou de direito, existe para tratamento diferenciado pela entidade empregadora, em relação a esses dois trabalhadores, no que a nível retributivo diz respeito.
11. Nem sequer o argumento invocado pela apelada de terem antiguidades diferenciadas pode proceder.
12. Como ficou provado, outros trabalhadores, com igualdade semelhante à do ora apelante, e com funções semelhantes, auferem valores retributivos superiores ao ora apelante.
13. Assim sendo, nenhuma razão subsiste para violação do princípio de “para trabalho igual, salário igual”.
14. Impõe-se, por isso, a revogação da sentença proferida nos autos, substituindo-a por decisão que considere a presente ação procedente, por provada, e, em consequência, condene a apelada nos pedidos contra ela formulados pelo ora apelante.
15. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o princípio de igualdade, fixada no art. 13º, da CRP; a norma fixada no art. 270º do CT, conjugado com os arts. 23º e 25º do mesmo Código.
A ré veio alegar e ampliar o objecto do recurso, concluindo:
A. DA INAPLICABILIDADE AO CASO “SUB JUDICE” DA INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA PREVISTA NO ARTIGO 25º Nº 5 DO CÓDIGO DO TRABALHO, CONFORME FOI CORRETAMENTE DECIDIDO PELO TRIBUNAL “A QUO” NA SENTENÇA RECORRIDA, A QUAL NÃO FOI IMPUGNADA, NESSA PARTE, PELO DEMANDANTE
1. No caso “sub judice”, o demandante não alegou, na sua petição inicial, um único fator de discriminação, designadamente um dos fatores referidos no nº 1 do artigo 24º do Código do Trabalho.
2. Não podendo, nessa medida, beneficiar da inversão do ónus da prova prevista no artigo 25º nº 5 do Código do Trabalho, conforme foi decidido (e bem) pela sentença recorrida, a exemplo da linha de orientação seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça de que constituem exemplos os acórdãos indicados em 4.4. supra das presentes contra- alegações que se dão aqui por integralmente reproduzidos.
3. O que, aliás, não foi colocado em causa pelo demandante nas suas alegações de recurso que não impugnou, nessa parte, a sentença recorrida.
B. ENUNCIAÇÃO DOS MOTIVOS QUE DEMONSTRAM A FALTA DE FUNDAMENTO DA PRETENSÃO DO DEMANDANTE PARA A REQUERIDA ALTERAÇÃO DA RESPOSTA AO FACTO PROVADO Nº 8 E A FALTA DE CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS PRESTADOS PELAS TESTEMUNHAS CC E BB
4. Por não beneficiar do disposto no nº 5 do artigo 25º do Código do Trabalho, o autor tentou alicerçar a sua prova, única e exclusivamente, no depoimento de duas testemunhas: CC e BB, trabalhadores do setor do laboratório e membros da Comissão de Trabalhadores da demandada.
5. O conhecimento que as testemunhas CC e BB revelaram ter dos factos é indireto, uma vez que não partilham, habitualmente, o mesmo turno do demandante, como os próprios acabaram por reconhecer nos seus depoimentos:
- cfr. depoimento da testemunha CC, ouvida na sessão de 6 de dezembro de 2022 (00h00m00s a 00h34m34s), em particular as passagens que constam a partir do registo 00h08m33s, que foram transcritas na nota de rodapé nº 3 supra e que aqui se dão por integralmente reproduzidas; e
- cfr. depoimento da testemunha BB, ouvida na sessão de 6 de dezembro de 2022 (00h00m00s a 00h27m13s), em particular as passagens que constam a partir do registo 00h05m58s, que foram transcritas na nota de rodapé nº 4 supra e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
6. A testemunha CC chegou a estar fora da empresa, entre maio de 2007 até 2018, a exercer funções de delegado sindical no B..., pelo que não acompanhou uma parte significativa do tempo de serviço do autor na demandada – cfr. depoimento da testemunha CC, ouvida na sessão de 6 de dezembro de 2022 (00h00m00s a 00h34m34s), em particular as passagens que constam a partir do registo 00h11m28s, que foram transcritas na nota de rodapé nº 5 supra e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
7. O setor do laboratório está dividido por 5 (cinco) postos de trabalho distintos, ocupados por igual número de pessoas em cada turno – cfr. depoimento da testemunha CC, (ouvida na sessão de 6 de dezembro de 2022 (00h00m00s a 00h34m34s), em particular as passagens que constam a partir do registo 00h03m27s, que foram transcritas na nota de rodapé nº 7 supra e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
8. O setor do laboratório é supervisionado pela testemunha DD, engenheiro de formação, e superior hierárquico do autor e dos depoentes CC e BB, e bem ainda pelo trabalhador da demandada, EE, quando o primeiro (DD) se encontra noutra unidade da demandada, sita na Trofa – cfr. depoimento da testemunha DD, ouvida na sessão de 6 de dezembro de 2022 (00h00m00s a 00h13m09s), em particular as passagens que constam a partir do registo 00h00m10s, que foram transcritas na nota de rodapé nº 8 supra e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
9. O laboratório encontra-se dividido em duas grandes áreas: operadores de laboratório químico e operadores de laboratório metalúrgico.
10. Ainda que partilhem todos o mesmo espaço físico, as funções que estão adstritas a uns e a outros são completamente distintas.
11. O autor está alocado, desde que foi contratado, à área metalúrgica, que inclui as funções de transporte e corte de peças, de ensaio de matérias-primas e receção das mesmas e da análise de amostras metalúrgicas no microscópio.
12. E o trabalhador BB à área química, o que pressupõe que o mesmo execute as funções de ensaios de espectrometria e ensaios de moldação de areia verde.
13. Pontualmente, nomeadamente em casos de absentismo não planeados, é que qualquer trabalhador da área química, nomeadamente a testemunha BB, podia ser chamado, num turno específico, a prestar serviço na área metalúrgica e os trabalhadores da área metalúrgica, incluindo o
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