Acórdão nº 3642/20.4T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-03-16

Ano2023
Número Acordão3642/20.4T8VCT-A.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

PROCESSO 3642/20.4T8VCT-A.G1
Relatora: Raquel Rego
1ª Adjunta: AA Amália Santos
2º Adjunto: José Manuel Flores

I - RELATÓRIO

BB, mãe e em representação das crianças AA e CC, intentou a presente ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais contra o progenitor DD, com fundamento no facto de os pais não viverem juntos e não estarem de acordo quanto à forma de exercerem as responsabilidades parentais.

Realizou-se conferência de pais, tendo sido fixado um regime provisório, por inexistência de acordo.
Remetidos para a audição técnica especializada, foi gorada a conciliação total, pretendendo a mãe fixar a residência dos filhos consigo e o pai a residência alternada.
Na continuação da conferência de pais, persistindo o diferendo, foi mantido o regime provisório em vigor.

Apresentadas alegações pelos progenitores, pugnou a Requerente pela fixação da guarda partilhada com residência das crianças consigo, com regime de visitas ao pai e pagamento, por este, de pensão de alimentos no valor não inferior a €400. Já o Requerido bate-se pela reposição da guarda partilhada com residência alternada, já antes fixada provisoriamente e, entretanto, suspensa.

Os autos prosseguiram com vicissitudes várias e foi realizada audiência de discussão e julgamento.
O tribunal a quo entendeu não ouvir os menores, consignando que isso resultou do facto de terem 6 anos e não terem, por isso, maturidade e capacidade de discernimento quanto à matéria dos autos.

Veio, então, a fixar o regime de exercício das responsabilidades parentais nos seguintes termos:

«1. As crianças AA e CC residirão uma semana alternada com cada um dos progenitores, a quem incumbirá o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente das crianças durante o tempo que consigo permanecerem; os atos de particular importância na vida da criança serão exercidos em comum por ambos os progenitores.
a. As crianças efetuam mudança de residência ao sábado e as entregas e recolhas ocorrem às 11H00 na casa onde as crianças se encontrarem, pelo outro progenitor não residente.
2. Quanto a datas festivas e férias de verão:
1. As crianças passarão os dias 24 e 25 de dezembro, dia 31 de dezembro e 1 de janeiro, de forma alternada com cada um dos progenitores, sendo que quando passarem o dia 24 de dezembro com um progenitor, passarão o dia 1 de janeiro com o mesmo e passarão o dia 31 de dezembro com quem passar o dia 25 de dezembro, desde as 11 horas do dia festivo até às 11 horas do dia seguinte.
2. Na Páscoa, as crianças passarão o domingo e segunda feira de Páscoa com cada um dos progenitores de forma alternada;
3. As crianças passarão com a mãe o Dia da Mãe e o aniversário desta e com o pai o Dia do Pai e o aniversário deste;
4. No dia de aniversário das crianças estas têm direito a ter um das refeições principais com cada um dos progenitores; se calhar a um dia de semana, no fim de semana imediatamente seguinte cada um dos progenitores pode passar o Sábado ou Domingo com os filhos, desde as 10 horas às 21h30;
5. As entregas e recolhas ocorrem na casa onde as crianças se encontrarem, pelo outro progenitor não residente.
3. Nos períodos de férias escolares de Verão, cada progenitor poderá passar quinze dias seguidos de férias com as crianças, conforme acordo. Na falta de acordo quanto à distribuição das semanas e dias de férias, a mãe decidirá nos anos pares e o pai nos anos ímpares.
4. Atenta a residência alternada das crianças, não haverá lugar a pagamento de pensão de alimentos e cada progenitor suportará as despesas das crianças enquanto as mesmas estiverem à sua guarda.
5. As despesas médicas, medicamentosas e de educação (abrangendo estas as despesas com a aquisição de manuais e material escolar), serão suportadas por ambos os progenitores, na proporção de metade para cada um, pagas no prazo de 30 dias a contar da apresentação do respetivo recibo.
6. O cargo de encarregado de educação, no presente ano letivo 2022/2023, será exercido pela mãe, e nos anos letivos seguintes alternam entre ambos. Isto sem prejuízo de o progenitor que não exerça o cargo ter legitimidade para assistir a todas as reuniões de pais e poder conferenciar com o professor/diretor de turma dos filhos sempre que entender oportuno, e ter acesso às plataformas digitais escolares dos filhos mediante prévia comunicação dos códigos de acesso pelo progenitor que exerça o cargo, no primeiro dia de cada ano letivo».

Com ela não se conformando, veio a requerente interpor o presente recurso, onde conclui nos seguintes termos:

I. O artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil consagra o princípio da livre apreciação da prova, não se encontrando o julgador sujeito às regras rígidas da prova tarifada, o que não significa que a actividade de valoração da prova seja arbitrária, pois está vinculada à busca da verdade, sendo limitada pelas regras da experiência comum e por algumas restrições legais. Tal princípio concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, mas que deverá ser capaz de fundamentar de modo lógico e racional.
II. Porém, nessa tarefa de apreciação da prova, é manifesta a diferença entre a 1.ª instância e o tribunal de recurso, beneficiando aquela da imediação e da oralidade e estando este limitado à prova documental e ao registo de declarações e depoimentos.
III. A ausência de imediação determina que o tribunal de 2.ª instância, no recurso da matéria de facto, só possa alterar o decidido pela 1.ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida, como ocorre no caso dos presentes autos.
IV. De acordo com a redacção do n.º 6 do artigo 1906.º do Código Civil, nestes termos: «Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos» (a Lei 65/2020 em vigor no dia 1 de Dezembro de 2020).
V. Decorre que é precisamente a falta de ponderação de todas as circunstâncias relevantes e do superior interesse da criança, que determinou na sentença ora recorrida a fixação de uma regulação das responsabilidades parentais, com residência alternada, da qual ora se recorre por com a mesma, ora não se concordar.
VI. Mal andou o Douto Tribunal recorrido ao dar como provado os factos vertidos nos pontos 28 e 29 da matéria de facto provada.
VII. Designadamente ao considerar que foi provado que o aqui recorrido, Progenitor, vive com elevada intensidade a relação parental tendo uma vontade permanente de apoiar e acompanhar de todos os actos da vida dos filhos, bem como dispõe de tempo para se dedicar ao acompanhamento dos mesmo.
VIII. Quando tal factualidade veio a ser infirmada pela demais prova testemunhal produzida nos autos e pelo próprio comportamento do Progenitor, a confirmar tal circunstância, refere à testemunha EE, cujo depoimento foi prestado em 04.10.2022, e que se encontra gravado em suporte áudio, na plataforma habilus, assim como todos os demais que se indicarem, registado pelas 10:01:29 às 11:01:45min.
IX. As declarações pela testemunha FF cujo depoimento parece ter sido desatendido pelo Tribunal recorrido, que foi prestado no dia 17.10.2022, registado ao min. 12:06:47 ao min. 12:25:57, em particular as passagens do min. 00:10:58 ao min. 00:11:57, evidenciam que a relação entre as crianças/menores e o pai é triangulada pela avó paterna, que é a pessoa que está muito presente nas descrições dos miúdos.
X. No que tange à prestação de cuidados do Progenitor aos menores a testemunha EE é clara ao responder à pergunta efectuada pela Meritíssima Juiz, “Desde que as crianças nasceram o que é que aconteceu?, (cfr. registo Das passagens 00:02:01 a 00:02:44), em que a mesma responde ao min: 00:02:03 ao min. 00:02:43) “Pronto desde que os meninos nasceram ele inicialmente não apoiava assim muito, tudo bem que são duas crianças, mas quando a minha irmã começou a trabalhar ele não dava a retaguarda que devia dar, então tinha que ser eu e a minha mãe... e quando a minha mãe não estava, porque quando tinha que trabalhar, e a minha irmã quando tinha que trabalhar, porque ela trabalha por turnos, tinha que ser sempre eu dar o almoço e o jantar e o banho, porque ele não fazia sozinho, e pronto eu fazia, adoro os meus sobrinhos, e pronto ele não dava retaguarda”.
XI. E ainda para melhor concretizar a fraca capacidade do aqui Progenitor em entender as necessidades dos menores, e em demonstrar empatia com as suas vontades ou exigências, veja-se o que a testemunha responde à seguinte pergunta colocada ao min. 00:08.42 pela Mandatária da Progenitora: “Diga-me uma coisa e ele já demonstrava ter paciência para as crianças, ele gostava de fazer esse trabalho, não se importava de fazer esse trabalho?
XII. Ao que a testemunha EE responde: “Ele não tinha muita paciência, até porque a questão de ter que se insistir mais um bocado para comer, para dar a comida, ele não tinha muita paciência”. (passagem 00:08:50 a 00:09:00).
XIII. Mandatária da Progenitora pergunta ao min 00:09:52 : “O que é que é não ter paciência?” Testemunha EE, ao min. 00:09:56 ao min. 00:10:05, responde: “É dizer: não queres mais?; é limpar a boca, estás todo sujo, não queres comer não comes mais, não comes.” Mandatária da Progenitora, ao min. 00:10:06 ao min. 00:10:10, pergunta: “E isso manteve-se assim de não assumir, ou seja, os cuidados sozinho até quanto tempo? Resposta da testemunha EE, ao min. 00:10:11 ao min. 00:10:27: “Eu ia lá até aos dezoito meses, dois anos, manteve-se assim até virem para a escola, a minha irmã trazia-os para ficar em minha casa, nos dias em que os dois iam trabalhar.” . Devendo, assim, evidenciar-se ainda a...

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