Acórdão nº 363/21.4BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 17-02-2022

Data de Julgamento17 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão363/21.4BEBJA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

O MUNICÍPIO DE NISA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, de 12.12.2021, que, em sede de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, o intimou a abster-se de retirar as faixas de propaganda afixadas ou a afixar pelo aqui Recorrido, SINDICATO DOS PROFESSORES DA ZONA SUL, no gradeamento do Agrupamento de Escolas de Nisa.

Nas alegações de recurso que apresentou, culminou com as seguintes conclusões – cfr. fls. 1454 e ss., ref. SITAF:

«(…)

1. O recorrido, nos seus artigos 18º e 19º da P. I., tinha alegado que: “Consequentemente, trata-se de situação que integra a previsão do artigo 109º do CPTA, na medida em que não existe outro meio processual suscetível de um mínimo de 6% à Educação, no âmbito de um Orçamento do Estado que se encontra em discussão na Assembleia da República e cuja aprovação deverá ocorrer a curto prazo”.

2. O próprio Tribunal refere do despacho em que admitiu a presente ação e ordenou a citação do Recorrente refere: “Justifica a utilização do presente meio processual, por entender estarem reunidos todos os requisitos previstos no artigo 109º do CPTA sendo esta a única via adequada para obter uma decisão de mérito, uma vez que uma das reivindicações plasmadas nas faixas removidas é a afetação de um mínimo de 6% à Educação, no âmbito de um Orçamento do Estado que se encontra presentemente em discussão na Assembleia da República (…).

De acordo com o calendário da Assembleia da República (acessível em https.//www.parlamento.pt/OrcamentoEstado/Documents/Calendario-OE2022.pdf) a votação na generalidade do Orçamento de Estado terá lugar a 27/10/2021 e a votação na especialidade, entre 19/11/2021 e 25/11/2021, embora as notícias recentes, de ampla repercussão social, apontem para a sua rejeição já na generalidade.

Não obstante, face à especial tramitação dos presentes autos de processo urgente, ao período de tempo em que a concreta faixa alusiva ao Orçamento de Estado de 2022, uma vez afixada, poderá ainda ter efeito útil, caso a proposta de Orçamento de Estado venha a ser aprovada na generalidade, cite a Entidade Demandada para, querendo, deduzir Oposição, no prazo de 3 (três) dias – artigo 110º nº 3 alínea a) do CPTA”.

3. Por isso dúvidas não podem subsistir – nem pode ser ignorado – que o recorrido pretendia utilizar este meio processual em tempo beneficiar de uma decisão favorável que o autorizasse a afixar as tarjas com propaganda sindical e, nessa medida, poder influenciar a votação do Orçamento do Estado para 2022.

4. O uso deste meio processual – ação de intimação – está limitado à possibilidade da parte poder obter a tutela provisória do seu direito em “tempo útil”, sendo certo que cabe ao autor na sua P. I. alegar factos idóneos a provar se a tutela requerida, uma vez decidida, o é em tempo útil de evitar a lesão do direito ameaçado.

5. Neste caso , com a não aprovação do Orçamento do Estado para o ano de 2022 e por ter sido este o objeto e âmbito definido pelo Autor, ora recorrido, na P. I., a presente decisão tomada depois da ocorrência de tal ato – a rejeição do Orçamento do Estado – é inútil e deveria ser motivo de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, uma vez que , face ao alegado pelo recorrente a este propósito, a afixação das tarjas com propaganda sindical não teriam qualquer utilidade no seu propósito de influenciar a votação do orçamento de estado para 2022.

6. O tribunal “a quo” subverteu a própria alegação do Autor e conseguiu descobrir uma utilidade no decretamento da medida requerida – mesmo depois da rejeição do Orçamento de Estado - que o próprio Autor, ora recorrido, não concebeu, nem a ela se vinculou.

7. Ora, o tribunal “a quo” ao admitir que as mensagens afixadas têm um conteúdo e uma relevância que extravasa o limite temporal da aprovação do Orçamento de Estado – limite esse que o próprio recorrido impôs como passível de lhe trazer utilidade na decisão - está, no nosso entendimento, a ignorar o limite imposto pelo art. 109º nº 1 do CPTA. É por esta razão que a especificidade deste procedimento impõe à parte a especifica alegação de até que momento é que tal pode ser alcançado como efeito útil à parte.

8. Parece-nos, salvo o devido respeito, que o tribunal “a quo” violou o art. 109º nº 1 do CPTA, uma vez que a não aprovação do Orçamento do Estado para 2022 implica que a decisão não tenha qualquer efeito útil na perspetiva do alegado pelo Autor e nessa medida haveria de ter sido decretada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

9. O tribunal “a quo” no despacho inicial referido na conclusão acabou por definir o evento em função do qual se teria de apurar o pressuposto processual referido no art. 109º nº 1 doCPTA na parte em que refere que esta ação de intimação está sujeita à possibilidade de se obter tutela em tempo útil face à pretensão do Autor.

10. Ficou claro para todas as partes que o resultado do presente processo só teria efeito útil caso a proposta do Orçamento do Estado para 2022 viesse a ser aprovada na generalidade, o que determina que, tal como aconteceu, se a proposta do Orçamento de Estado fosse rejeitada o Autor já não beneficiaria de qualquer efeito útil na decisão desta ação de intimação.

11. Parece-nos que, tendo tal questão sido decidida por despacho no processo e incidindo o mesmo sobre um concreto aspeto da relação processual, regulando-a e definindo-a, esse despacho à luz do art. 620º nº 1 do CPC, aqui aplicável ex vi do art. 1º do CPTA, criou um caso julgado formal que tem força obrigatória dentro do processo e que determinaria que o tribunal, em sede de sentença final, não pudesse ter decidido de outra forma, como aconteceu.

12. A verdade é que temos duas decisões proferidas dentro do mesmo processo que são diametralmente opostas (o despacho de admissibilidade da ação e a sentença final) e mesmo que relativamente a esta última ainda não haja trânsito em julgado, não nos repugna lançar mão do art. 625º nº 2 do CPC, onde se pode ler que: “É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual”.

13. Desta sorte parece-nos que a sentença recorrida violou o art. 620º nº 1 do CPC, o que impõe a sua revogação por violação do caso julgado formal.

14. De acordo com o sentido literal do art. 109º nº 1 do CPTA, as situações que são passiveis de ser tuteladas através da ação de intimação são aquelas que se destinem a assegurar o exercício do direito do interessado – requerente – o que não é o caso, já que nos termos do art. 465º do CT o direito a afixar propaganda sindical cabe ao delegado sindical e não ao sindicato. A decisão recorrida ao entender de modo diverso violou o art.465. CT.

15. O art. 465º do CT, que regula expressamente o direito de afixação e distribuição de informação sindical, refere no seu nº 1 que o delegado sindical tem o direito de afixar nas instalações da empresa e em local apropriado disponibilizado pelo empregador toda a informação que entenda útil à atividade sindical, à vida sindical e aos interesses sócio profissionais dos trabalhadores.

16. Ora, no caso concreto não se encontra provado – nem alegado foi - que o Recorrente se tenha negado a disponibilizar um local apropriado para a afixação da respetiva propaganda sindical. Do mesmo modo, não foi alegado que o recorrido tenha solicitado esse lugar e que lhe tivesse sido negado.

17. Assim e uma vez que o direito de afixação da propaganda sindical pelo delegado sindical tem de cumprir o previsto no art. 465º do CT e tal não tendo ocorrido, entendemos que o direito a afixar a propaganda sindical que o recorrido pretende acautelar pelo presente processo não foi legalmente exercido e, como tal, não merece a presente tutela, pelo que deverão revogar a decisão sobre censura, julgando a ação improcedente.

18. O Município – ora recorrente – é o legítimo titular do direito de propriedade dos edifícios que constituem o Agrupamento de Escolas de Nisa, podendo-se dizer, cremos sem dúvidas, que é o seu legitimo proprietário, direito que lhe é concedido pelo art.62 do Dec. Lei 21/2019 de 30-01.

19. Acontece que a Lei 97/88 de 17-08, alterada pela Lei 23/2000 de 23-08 e pelo Dec. Lei 48/2011 de 01-04, contém o regime que regula a Afixação e Inscrição de Mensagens de Publicidade e Propaganda onde no seu art. 3º, se pode ler: “1 – A afixação ou inscrição de mensagens de propaganda é garantida, na área de cada município, nos espaços e lugares públicos necessariamente disponibilizados para o efeito pelas câmaras municipais.

2 – A afixação ou inscrição de mensagens de propaganda nos lugares ou espaços de propriedade particular depende do consentimento do respetivo proprietário ou possuidor e deve respeitar as normas em vigor sobre proteção do património arquitetónico e do meio urbanístico, ambiental e paisagístico”.

20. Ora, no caso concreto o Recorrido Município de Nisa é proprietário do edifício onde se encontra instalado o Agrupamento de Escolas de Nisa e não tendo dado consentimento para colocar as mensagens de propaganda sindical fica precludido, nos termos do mencionado preceito, o exercício desse direito de afixar quando não exercido regularmente e em conformidade com a lei, como acontece no caso em apreço pelo que que o tribunal “a quo “ tendo decidido de forma diversa violou o art.3 da Lei 97/88 de 17-08, alterada pela Lei 23/2000 de 23-08 e pelo Dec. Lei 48/2011 de 01-04. (…)»


O RECORRIDO contra-alegou, tendo ali concluído como se segue - fls. 102 e ss. do SITAF:
«(…)
1ª - Nas suas alegações de recurso, o Réu começa por invocar a “inadmissibilidade da presente ação por falta de pressupostos processuais”, mas o que...

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