Acórdão nº 3544/10.2TBVNG-B.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-02-09

Ano2023
Número Acordão3544/10.2TBVNG-B.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. nº 3544/10.2TBVNG-B.P1 – 3ª Secção (apelação)
Comarca do Porto - Juízos de Execução

Relator: Filipe Caroço
Adjuntos: Desemb. Judite Pires
Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida



Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
A exequente inicial Banco 1..., S.A. (entretanto substituída pela A..., SARL) deduziu execução para pagamento de quantia certa contra:
1. AA;
2. BB e
3. CC, todos melhor identificado no processo de execução (processo principal).
Como título executivo, a exequente apresentou dois contratos de mútuo outorgados por escritura pública, nos quais o 1º executado figura como mutuário e os 2º e 3º executados figuram como fiadores.
Alegou a exequente que concedeu os referidos empréstimos, tendo o mutuário deixado de os pagar, razão pela qual a credora considerou antecipadamente vencido o capital vincendo.
A exequente peticionou a cobrança coerciva da quantia de € 64.221,99 de capital, acrescida de juros de mora, desde o incumprimento/vencimento, ocorrido em 2007, bem como despesas.
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Entretanto:
- Os imóveis hipotecados em garantia dos créditos exequendos foram vendidos na execução;
- Em virtude do falecimento da 3ª executada, a exequente desistiu da instância contra a mesma.
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O executado BB (após procedência da arguida nulidade da sua citação) veio, por apenso à execução, deduzir embargos de executado, requerendo a extinção da execução contra si, alegando essencialmente:
1º - A ilegitimidade do embargante para a execução, porquanto foi penhorada a casa de morada de família, não podendo o embargante estar em Juízo desacompanhado do seu cônjuge, sob pena de preterição de litisconsórcio necessário, e a verdade é que a exequente desistiu da execução contra o cônjuge do embargante;
2º - A inexigibilidade da obrigação exequenda ao embargante, enquanto mero fiador dos contratos de mútuo, uma vez que não ocorreu a perda do benefício do prazo relativamente ao mesmo, o qual não foi interpelado para pagar as prestações em atraso e nem foi notificado do vencimento antecipado;
3º - O direito de libertação do credor, uma vez que a exequente não deu a possibilidade ao fiador de pagar a dívida e exercer o direito de sub-rogação; e
4º - O abuso de direito da exequente, ao reclamar do fiador o pagamento ao fim de 12 anos da interposição da execução, para além de o embargante, se soubesse que lhe poderia ser penhorada a sua casa, nunca teria prestado fiança, tendo-lhe sido dito que a fiança seria um “pró-forma”.
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A exequente contestou, basicamente para contrariar, de Direito, a alegação/pretensão do embargante, referindo, no essencial e de relevante que:
- Não existe situação de litisconsórcio necessário;
- A dívida é exigível, porque a prestação venceu-se e não foi paga;
- O embargante teve oportunidade de pagar a dívida e não o fez, sendo dilatória a alegação de não ter podido beneficiar da sub-rogação;
- Não existe abuso de direito, tendo todas as partes ficado cientes das obrigações
assumidas na outorga das escrituras.
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O tribunal recorrido entendeu que o estado dos autos permitia já, sem necessidade de mais provas, conhecer do mérito da ação e, dispensando a realização da audiência prévia e nova discussão sobre a matéria controvertida, que seria de considerar inútil, por ter sido suficientemente discutida nos articulados, proferiu despacho saneador-sentença que, depois de ter julgado improcedente a exceção dilatória do litisconsórcio necessário ativo, suscitada pelo embargante, culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:
«Em face do exposto, vistos os princípios expostos e as indicadas normas jurídicas, julgo procedentes os embargos de executado e, em conformidade, determino a extinção da execução quanto ao executado/embargante BB, com o inerente levantamento de penhora de bens deste.
Custas pela exequente.»
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Inconformada, apelou a exequente embargante formulando as seguintes CONCLUSÕES:
«1. O Tribunal a quo considerou a verificação da execeção inexigibilidade da quantia exequenda;
2. Acontece que o Tribunal a quo construiu o seu argumentário numa errónea apreciação da matéria de facto como da matéria de direito;
3. O Executado/Embargante, aqui Apelado, enquanto fiador no âmbito daqueles contratos, se constitui principal pagador e que se obriga ao cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo mutuário, com expressa renúncia da excussão prévia;
4. O mesmo é dizer que a fiança ora constituída manter-se-á plenamente em vigor enquanto subsistir qualquer dívida de capital, juros ou despesas, contraída por qualquer forma imputável ao mutuário (Cfr. Artigo 627.º, n.º 1 do Código Civil);
5. No caso sub judice ocorreu somente a extinção parcial da dívida afiançada, não sendo esta uma das causas da liberação da fiança;
6. Em 23 de fevereiro de 2012, após decisão de adjudicação dos imóveis hipotecados e penhorados nos autos principais ao Banco 1..., S.A., a Sra. Agente de Execução decide prosseguir com a execução para pagamento do remanescente da quantia exequenda no montante de 46.258,22€;
7. Segundo nota discriminativa provisória emitida pela Sra. Agente de Execução, datada de 24/10/2022, o valor atualmente em dívida contabiliza-se em 89.687,08€;
8. Pelo que, não é verdade que a dívida exequenda esteja liquidada;
9. Perante situação de incumprimento, todas as restantes prestações venceram-se, por força do citado artigo 781.º do Código de Processo Civil;
10. Muito menos, se observa necessidade alguma numa convolação do requerimento executivo;
11. Atendendo que os títulos executivos que serviram de base à presente execução são os mesmos, isto é, respeita aos mesmos contratos de empréstimo que foram referidos e juntos com o Requerimento Executivo, não se verificando qualquer modificação do objeto no caso sub judice;
12. Posto isto, entende a Apelante que é inequívoco que estamos perante uma prestação exigível ao Executado/Embargante, ora Apelado;
13. Pelo que, deverá revogar-se a douta decisão impugnada, determinando-se improcedente os Embargos apresentados e, consequentemente, a prossecução da execução que corre termos nos autos principais.
A decisão sob censura violou, entre outros, os seguintes preceitos legais:
Artigo 627.º, n.º 1 do Código Civil
Artigo 628.º, n.º 1 do Código Civil
Artigo 651.º do Código Civil
Artigo 781.º do Código de Processo Civil» (sic)
Deste modo, visa a recorrente que a decisão recorrida seja revogada e substituída por acórdão que julgue os embargos de executado improcedentes, determinando a prossecução da execução.
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A embargante apresentou contra-alegações defendendo a confirmação da decisão recorrida.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II.
O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação da exequente/embargada, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do ato recorrido e não sobre matéria nova, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do Código de Processo Civil).
Está para apreciar e decidir se o valor do mútuo atualmente em dívida é exigível ao executado fiador.
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III.
A 1ª instância deu como assentes, com base no acordo das partes decorrente do articulado e dos documento com força probatória plena, os seguintes factos:[1]
1. A exequente deduziu execução hipotecária, em 08.04.2010, contra (1º) AA, (2º) BB e (3º) CC,
2. Alegando o que consta do requerimento executivo, que aqui se dá por reproduzido.
3. A exequente apresentou, como primeiro título executivo, a escritura pública de “compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança” junta com o requerimento executivo, cujo teor aqui se dá por reproduzido, outorgada em 25.06.1999, na qual o 1º executado AA figura como segundo outorgante e mutuário, a “antecessora” da exequente figura como terceira outorgante e mutuante, e os 2º e 3º executados, BB e CC, figuram como quartos outorgantes e fiadores, contendo as cláusulas constantes de tal documento, com o respetivo documento complementar associado, entre as quais as seguintes:
“(…)
Que, pela presente escritura e pelo preço global de TREZE MIL CONTOS, já recebido, vendem ao segundo outorgante, o
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