Acórdão nº 353/23.2 BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 23-11-2023

Data de Julgamento23 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão353/23.2 BELLE
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em conferência na Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
L… G… C… T…, encarregada de educação de J…. R… G… T…., identificada como requerente nos autos de outros processos cautelares, instaurados contra o Ministério da Educação, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 4.7.2023 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a excepção dilatória da ilegitimidade processual activa da Requerente, absolvendo da instância a Entidade Requerida.
Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«1. O presente recurso tem como objeto a sentença que julgou procedente a exceção dilatória da ilegitimidade processual ativa da Recorrente, absolvendo a Entidade Recorrida da instância.
2. A Recorrente é mãe, encarregada de educação e responsável educativa do ensino doméstico do menor J… R… G… T…;
3. O menor frequentou o Ensino Básico Geral no Regime de Ensino Doméstico, na Escola Básica 2, 3 São Vicente, Vila do Bispo nos anos letivos 2019/2020, 2020/2021 e 2021/2022;
4. No ano letivo de 2022/2023, o menor também frequentou o ensino doméstico;
5. A Recorrente sempre assinou, desacompanhada do pai do menor, os protocolos de colaboração do ensino doméstico.
6. A Recorrente ficou bastante surpresa quando, o novo Diretor do Agrupamento Escolar, veio solicitar novamente os certificados de habilitação da Recorrente, alegando que os mesmos não eram válidos;
7. O referido Diretor do Agrupamento Escolar resolveu cancelar a matrícula do menor J… R… G… T…, no regime de Ensino Doméstico.
8. Informou que o menor, se encontrava matriculado na Turma G, na Escola Básica de Vila do Bispo, ficando sujeito ao sistema de avaliação presencial.
9. Nos termos da alínea a) do nº1 do artigo 120º do CPTA, estabelece que as providências cautelares são adotadas «quando for evidente que a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de ato manifestamente ilegal, de ato de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de ato idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente».
10. Considera a Recorrente que, o Diretor do Agrupamento da Escola de Vila do Bispo tomou uma decisão ilegal e prejudicial, na medida que o cancelamento da matrícula de Ensino Doméstico, quase no final do ano letivo, é totalmente ineficiente, no sentido que o aluno não irá ter aproveitamento escolar nem no ensino doméstico, nem no ensino presencial.
11. Tal decisão deveu-se ao facto do Diretor do Agrupamento da Escola de Vila do Bispo, considerar que as habilitações literárias da Recorrente, já não eram válidas, não obstante, durante os 1.º, 2.º e 3.º anos do 1.º Ciclo, os documentos apresentados e as habilitações literárias da Recorrente foram consideradas como válidas.
12. Existia a necessidade urgente de salvaguardar o interesse superior do menor, que necessita urgentemente de uma decisão judicial que revertesse a decisão do Diretor do Agrupamento Escolar, em o manter no regime do ensino doméstico.
13. Assim, perante um ato administrativo passível de lesar ou afetar direitos ou interesses legítimos dos particulares, deve ser requerida a adoção da providência cautelar de suspensão da eficácia de um ato administrativo prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 112º, com vista a operar a proibição automática da sua execução nos termos do disposto no artigo 128º, com o objetivo de neutralizar a projeção dos efeitos daquele ato administrativo na esfera jurídica do interessado.
14. Ora, veio o tribunal a quo declarar a ilegitimidade processual da Recorrente, considerando procedente a exceção dilatória alegada pela Recorrida, pelo que obstou ao conhecimento pelo mesmo Tribunal a quo do mérito da providência cautelar requerida, gerando a absolvição da instância da Entidade Requerida/Recorrida.
15. Constitui legitimidade o critério que permite escolher os sujeitos que podem ser admitidos a intervir no processo e esses deverão ser os titulares da esfera jurídica afetada pela procedência ou improcedência da ação, isto é, titulares de algum direito ou dever que constituem a relação objeto do processo.
16. A legitimidade processual é aferida pela relação jurídica controvertida, tal como é configurada pela Recorrente, sendo que para efeito da legitimidade ativa, é indiferente saber se o direito efetivamente existe na titularidade de quem o invoca ou contra quem é feito valer, conforme decorre dos artigos 9.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 30.º do Código do Processo Civil.
17. Quer isto significar que, a legitimidade da Recorrente resulta da relação que a mesma mantém com o objeto do processo, tal como este é descrito na petição inicial.
18. O que é certo é que a decisão recorrida, não apreciou e decidiu a questão da legitimidade, tal como foi configurado pela Recorrente, não tendo apreciado decorre dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Processo Civil e 9.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e, desde logo, salvo melhor opinião, o tribunal a quo errou no julgamento que fez.
19. Neste sentido, a legitimidade processual ativa define-se em função a titularidade da relação material controvertida. E tal critério de legitimidade não sofre quaisquer restrições, na medida que, a esfera jurídica do particular se encontre sempre definida no contexto de uma posição jurídica substantiva e se verifique uma lesão dessa posição, o interessado é considerado parte legítima do processo tendente a remover os efeitos dessa lesão.
20. Nos termos em que a Recorrente delineou e estruturou a sua ação (ou mais concretamente a sua providência cautelar), a mesma Recorrente, sempre seria titular da relação material controvertida, pois ela é a verdadeira parte na relação jurídica que se discute, que pretende ver discutida nos autos ou dito de outro modo, a Recorrente dispõe de legitimidade ativa para estar em juízo no presente procedimento cautelar.
21. A Recorrente não invocou na sua petição, que estava em representação do menor J… R… G… T…, pelo contrário, a Recorrente dirigiu toda a sua petição como parte da relação material controvertida e como sendo parte na relação jurídica em causa no procedimento cautelar.
22. Aliás, conforme também resulta do artigo 30.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito de legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurado pelo autor (sublinhado nosso).
23. A Recorrente configurou a sua petição inicial de procedimento cautelar, como único sujeito principal da relação material controvertida, pelo que tem legitimidade processual ativa, uma vez que foi sempre a Recorrente a assinar os protocolos de ensino doméstico sozinha, além de encarregada de educação.
24. De salientar que, aquando do despacho liminar, o douto tribunal a quo não se pronunciou pela ilegitimidade da Recorrente, conforme resulta do artigo 116.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo nos Tribunais...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT