Acórdão nº 328/17.0T8PVZ.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-07-12

Data de Julgamento12 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão328/17.0T8PVZ.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 328/17.0T8PVZ.P1
Comarca do Porto
Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim (Juiz 2)

Acordam na 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
1. Configuração da acção
Em 23.06.2020, AA intentou no Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim a presente acção declarativa sob a forma de processo comum (distribuída ao Juiz 2) contra A... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.[1], peticionando a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 147.764,19, acrescida de juros de mora.
A indemnização peticionada visaria reparar danos patrimoniais e não patrimoniais que alega ter sofrido em consequência de um acidente de viação ocorrido no dia 30.05.2014, na EN ..., Km 14.200, em ..., Santo Tirso, no qual foram intervenientes: o veículo ligeiro de passageiros da marca “Ford”, modelo ..., com a matrícula ..-DJ-.. (de ora em diante, apenas “DJ”), pertencente a BB e por este conduzido, e o veículo pesado de mercadorias de matrícula ..-NG-.. (de ora em diante, apenas NG), propriedade de “B..., S.A.”, conduzido por CC, que o fazia por ordem e seguindo instruções da sociedade sua proprietária.
A responsabilidade civil decorrente dos danos provocados a terceiros pelo veículo “DJ” fora transferida para a ré “A...” por contrato de seguro titulado pela apólice n.º ..., ao passo que a proprietária do “NG” transferira esse tipo de responsabilidade para a “C...”, por contrato de seguro titulado pela apólice n.º ....
Descreve as circunstâncias do acidente e imputa a responsabilidade pela sua eclosão aos condutores de ambos os veículos.
Em consequência do acidente, sofreu múltiplas lesões (que concretiza), pois seguia como passageiro no veículo “DJ”, das quais resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais de que quer ser ressarcido.

2. Oposição
Citada, a ré A... – Companhia de Seguros, S.A. apresentou contestação, defendendo-se por excepção e por impugnação.
Na defesa por excepção, alega que, ao contrário do que afirma o autor, a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo “NG” nunca esteve transferida para a “A...” (ou a “C...”), mas sim para a “Companhia de Seguros D...” e, à data do acidente, era com esta que a proprietária tinha contrato de seguro; quanto ao veículo “DJ”, o seu proprietário (BB), à data do acidente, não beneficiava de seguro válido e eficaz, porquanto o contrato que celebrou (em 19.02.2014) foi anulado em 19.03.2014, por falta de pagamento do respectivo prémio.
Na defesa por impugnação, descreve as circunstâncias do acidente por forma a imputar a responsabilidade pela sua ocorrência também ao condutor do pesado NG.
Contesta, ainda, a extensão dos danos alegados pelo autor.

3. Intervenção de terceiros
Notificado da contestação, o autor veio, por requerimento apresentado em 11.05.2017, provocar a intervenção principal de:
a) “D... - Companhia de Seguros S.A.”, «por poder ser a companhia para quem o proprietário do veículo de matrícula ..-NG-.., tinha transferida a responsabilidade por danos causados a terceiros»;
b) “Fundo de Garantia Automóvel”, «por ser a entidade responsável pelo pagamento de danos provocados por veículos automóveis que não beneficiem de seguro válido e eficaz à data do acidente, como pode ser o caso do veículo de matrícula ..-DJ-..»;
c) BB, «por ser o proprietário do veículo de matrícula ..-DJ-.. e, nessa qualidade, poder ser responsável pelos danos reclamados pelo A.»; e
d) DD, «por ser o condutor do veículo de matrícula ..-DJ-.. e, nessa qualidade, poder ser responsável pelos danos reclamados pelo A.».

Por despacho de 18.09.2017, foi admitida a requerida intervenção.
Devidamente citados, todos os chamados apresentaram contestação.
Os intervenientes BB e DD defenderam-se por excepção, invocando a prescrição do direito à indemnização que o autor reclama e a ilegitimidade do primeiro (alegadamente por não ser o proprietário do veículo “DJ”) e por impugnação, fazendo uma descrição do acidente, no essencial, coincidente com a do autor (mas imputando a responsabilidade pelo embate entre os veículos, exclusivamente, ao condutor do “NG”).
O Fundo de Garantia Automóvel (FGA) impugnou, por desconhecimento (e não ter obrigação de conhecer), a factualidade relativa às circunstâncias do acidente e aos danos sofridos pelo autor.
Alegou que, à data do acidente, ambos os proprietários dos veículos intervenientes no acidente tinham transferido a responsabilidade civil emergente da circulação desses veículos para a “A...” e para a “D...”, pelo que nenhuma responsabilidade cabe ao FGA.
Por último, a chamada “D... - Companhia de Seguros S.A.” aceitou a existência de contrato de seguro relativo ao veículo “NG” e a sua vigência à data do sinistro, mas impugnou a generalidade dos factos alegados pelo autor, quer quanto à dinâmica do acidente (imputando ao condutor do “DJ” a culpa exclusiva na sua produção), quer quanto às suas consequências.
*
O autor foi convidado a exercer imediatamente o contraditório e respondeu à matéria das excepções, pronunciando-se pela sua total improcedência.

4. Saneamento e condensação
Em 05.02.2018, realizou-se a audiência prévia, na qual
- se fixou o valor da causa (em € 150.750,89);
- foi proferido despacho saneador em que se conheceu das excepções de ilegitimidade e da prescrição, ambas julgadas improcedentes;
- se conheceu tabelarmente dos demais pressupostos processuais;
- se fixou o objecto do processo e se enunciaram os temas de prova;
- se concedeu às partes o prazo de 10 dias para reajustarem os seus requerimentos probatórios, face aos temas de prova enunciados.
5. Audiência final e sentença
Em 20.05.2021, iniciou-se a audiência final, que teve quatro sessões, após o que, com data de 22.10.2022, foi proferida sentença[2] com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, decide-se julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência:
III.a) Condena-se a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. a pagar ao Autor a quantia de € 382,10 (trezentos e oitenta e dois euros e dez cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados desde a citação até integral pagamento; bem como a pagar ao Autor a quantia de € 18.000,00 (dezoito mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação desta sentença, até integral pagamento;
III.b) Condena-se a Interveniente Principal D..., S. A. a pagar ao Autor a quantia de € 382,10 (trezentos e oitenta e dois euros e dez cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados desde a citação até integral pagamento; bem como a pagar ao Autor a quantia de € 18.000,00 (dezoito mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação desta sentença, até integral pagamento;
III.c) Absolvem-se a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. e a Interveniente Principal D..., S. A. do demais que foi peticionado pelo Autor;
III.d) Absolvem-se os Intervenientes Principais Fundo de Garantia Automóvel, BB e DD do pedido.
III.e) Condena-se a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. a pagar ao Instituto da Segurança Social, I. P. a quantia de € 1.493,35 (mil, quatrocentos e noventa e três euros e trinta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados desde a data de notificação do pedido de reembolso até integral pagamento;
III.f) Absolve-se a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. quanto à parte restante do pedido de reembolso formulado pelo Instituto da Segurança Social, I. P..
Condenam-se Autor, a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. e a Interveniente Principal D..., S. A. a pagar as custas, quanto ao peticionado pelo Autor, na proporção do decaimento (art. 527.º do Código de Processo Civil).
Condenam-se a Ré A... - Companhia de Seguros, S. A. e o Instituto da Segurança Social, I. P. a pagar as custas, quanto ao pedido de reembolso formulado pelo Instituto da Segurança Social, I. P., na proporção do decaimento (art. 527.º do Código de Processo Civil).»

6. Impugnação da sentença
Inconformada com a sentença, a ré “A...” dela interpôs recurso de apelação, com os fundamentos explanados na respectiva alegação, que condensou nas seguintes conclusões:
1.
Face ao teor dos depoimentos gravados do interveniente DD e bem assim das testemunhas EE, FF e GG e ainda ao teor do auto de ocorrência policial (participação de acidente de viação junto com a petição inicial) e do documento junto a 10 de Janeiro de 2022,
2.
Nunca o Tribunal recorrido podia dar como provado o facto constante do nº 11 dos factos provados, tal como consta da douta sentença recorrida nos termos que da mesma constam.
3.
Nos termos das alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do CPC, entende e defende a Ré que o facto constante do nº 11 dos factos dados como provados e constantes da douta sentença recorrida deve ser dado como não provado, ou antes, deve ser dado como provado em termos opostos aos termos que constam da douta sentença recorrida, ou seja: “ O condutor do veículo de matrícula ..-DJ-.. parou imediatamente antes de entrar na EN ..., tendo entrado na EN ... após atentar ao trânsito que aí circulava”.
4.
Face ao teor dos depoimentos gravados do interveniente DD e bem assim das testemunhas EE, FF e GG e ainda ao teor do auto de ocorrência policial (participação de acidente de viação junto com a petição inicial) e do documento junto a 10 de Janeiro de 2022,
5.
Nunca o Tribunal recorrido podia dar como provado[3] os factos constante do nº III) e IV) dos factos não provados os factos III) e IV) parte final constantes dos factos não provados, tal como consta da douta sentença recorrida e nos termos que da mesma constam.
6.
Nos termos das alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do CPC, entende e defende a Ré que os factos constantes do nºs III) e IV) dos factos dados como não provados e constantes da douta sentença recorrida deve ser dado como provados.
7.
Face ao teor dos depoimentos gravados das testemunhas EE, FF, HH e II e ainda ao teor do auto de ocorrência
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