Acórdão nº 31/19.7T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11-05-2023

Data de Julgamento11 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão31/19.7T8EVR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 31/19.7T8EVR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
A “Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.”[2] veio participar, nos termos do art. 90.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04-09, de um acidente de trabalho, ocorrido no dia 04-04-2018, pelas 07h30, em (…), de que foi vítima AA, com a profissão de assistente de venda de alimentos ao balcão, quando prestava serviço para “Brisa Areas Serviços, S.A.”, mediante a retribuição base mensal de €620,00, o subsídio de alimentação mensal de €52,52 e ainda outros no valor de €38,00, tendo o acidente consistido em ter assistido ao assassinato de um colega, à porta da unidade, tendo entrado em estado de choque.
Conforme boletim de avaliação de incapacidade, junto pela “Fidelidade, SA”, elaborado em 11-12-2018, e subscrito pelo Dr. (…), perito de avaliação de dano corporal, foi dada alta à sinistrada em 11-12-2018, e atribuídas as seguintes incapacidades:
TA com início em 05-04-2018 e fim em 20-11-2018;
TP 30,00% de 21-11-2018 a 11-12-2018;
sendo de atribuir uma IPP de 0,16000, de acordo com o Capítulo X, Grau III, da TNI.
Nesse relatório consta ter sido diagnosticado à sinistrada “Sindrome postraumatico com perturbações funcionais importantes com manifesta diminuição do nível de eficiencia pessoal”.
No relatório médico realizado em 28-02-2019, pelo perito médico Dr. (…), junto pela sinistrada, concluiu-se:
- Acidente de Trabalho ocorrido em 04.04.2018.
- Consolidação médico-legal das lesões fixável em 11.12.2018.
- Incapacidade temporária absoluta fixável entre 05.04.2018 e 11.12.2018.
- Incapacidade permanente parcial fixável em 45%, acrescida de IPATH.
- Dependência de ajudas: a Examinanda deverá manter acompanhamento regular em consultas de Psiquiatria, através da companhia seguradora.
Efetuado, em 12-03-2019, o relatório do exame médico à sinistrada[3], concluiu este que:
- A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 11/12/2018.
- Incapacidade temporária absoluta fixável num período total de 230 dias.
- Incapacidade temporária parcial fixável num período total de 21 dias.
- Incapacidade permanente parcial fixável em 45,0000%.
Em face das questões invocadas pela sinistrada, em 09-04-2019, foram prestados, pelo Coordenador do Gabinete, Dr. (…), assistente de Medicina Legal, os seguintes esclarecimentos:
Em resposta ao vosso ofício esclarecemos que, embora tenha sido considerada uma data de consolidação médico-legal, neste caso em particular atendendo à patologia em discussão – stress pós-traumático, as sequelas só deverão ser discutidas após um período de tratamento com pelo menos dois anos de duração.
Atendendo a que o acidente de trabalho foi a 04-04-2018 e que a data de fixação de IPP foi a 11/12/2019 não estão a ser cumpridas as normativas da TNI nem a leges artis de medicina legal.
Assim sendo recomenda-se que a sinistrada mantenha tratamento de psicoterapia e acompanhamento por psiquiatria até pelo menos dois anos após o acidente de Trabalho, para posterior fixação de IPP.
Em 07-05-2019, o Dr. (…) presta o seguinte aditamento:
Em resposta ao vosso ofício, informamos que tendo em conta o esclarecimento anterior, deverá a sinistrada manter IT (Incapacidade Temporária) até aos 2 anos após o acidente de trabalho.
Se houver melhoria do quadro clínico, poderá haver tentativa de regresso ao local de trabalho.
Sendo um processo evolutivo (para cura ou cronicidade) não posso pronunciar-me em relação ao tipo de incapacidade temporária, mas pelo descrito deverá ser absoluta (ITA).
Mostra-se junto pela Companhia de Seguros “Fidelidade, SA” relatório médico realizado em 05-07-2019 com as seguintes conclusões preliminares:
- Seguimento pela curativa da Fidelidade em consulta de Psiquiatria.
- Fica em ITP de 40% devendo ser avaliada pelo médico de trabalho da empresa e tentar retomar o trabalho habitual ou caso não seja possível readaptação do posto de trabalho.
A sinistrada, em 25-09-2019, veio solicitar a realização de exame de especialidade de psiquiatria e parecer do IEFP, a fim de se apurar da eventual possibilidade de atribuição de IPATH.
Por despacho de 27-09-2019 foi deferida a realização de exame de especialidade de psiquiatria.
De acordo com o parecer resultante do exame de especialidade de psiquiatria, subscrito pela Dra. (…), concluiu-se que:
De acordo com as avaliações clínico-psiquiátricas (e psiquiátrico-forenses) efetuadas e reunidos os elementos indispensáveis à apreciação do presente caso, quer em termos de História Pregressa (incluindo os relativos à personalidade pré-mórbida), quer os apurados pelo Exame Mental propriamente dito, podemos afirmar, de forma iniludível, que a examinada apresenta um quadro sindromático (grave), com predomínio de sintomas ansiosos e depressivos, estreitamente relacionado, cronologicamente e pelo seu conteúdo, com o acidente de trabalho ocorrido em 04 de abril de 2018, admitindo-se assim o nexo de causalidade entre o traumatismo e o dano atendendo a que existe adequação entre o traumatismo e o dano corporal resultante, existe continuidade sintomatológica e adequação temporal entre o traumatismo e o dano corporal resultante, o tipo de lesões é adequado a produzir este tipo de lesões, se exclui a existência de uma causa estranha relativamente ao traumatismo e se exclui pré-existência do dano corporal.
Um tal contexto psicopatológico, deverá ser entendível num contexto vital pós-traumático, tendo em conta o tempo (menos de 2 anos) decorrido desde a data do evento até à presente data (Perturbação de Adaptação com Reação Depressiva Prolongada (CID_10: F43.21 – da 10ª Revisão da Classificação Internacional das Doenças, da Organização Mundial de Saúde, CID-10) e em relação com ocorrência psicologicamente traumática, que a examinada vivenciou de forma particularmente perturbadora e para a qual contribuíram aspetos da sua personalidade.
Sem prejuízo das orientações terapêuticas que lhe vieram a ser feitas, atendendo a que, do ponto de vista médico-legal (e psiquiátrico – forense), a situação se encontra estabilizada, é-nos possível formular desde já, uma proposta de incapacidade permanente parcial com manifesta diminuição do nível de eficiência pessoal e profissional, prevista na TNI (0.16 a 0,30), propondo-se desde já uma desvalorização de 0,30 pela especialidade de Psiquiatria e para o qual não deixamos de levar em linha de conta a idade da examinada e os resultados esperados à luz do tratamento que lhe está recomendado e que tem indicação de cumprir; sugerindo-se a aplicação do fator de bonificação 1,5 tendo em conta a impossibilidade de reconversão do posto de trabalho.
As sequelas apresentadas são incompatíveis com o trabalho habitual, pelo que se considera existe Incapacidade Permanente e Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH).
No auto de tentativa de conciliação, realizado em 12-10-2020, a Companhia de Seguros “Fidelidade, SA” não aceitou a atribuição de uma IPP de 45% com IPATH, considerando a sinistrada apenas afetada de uma IPP de 16%.
Inconformada com o exame médico singular realizado à sinistrada, a “Fidelidade, SA” veio requerer a realização de junta médica, formulando os seguintes quesitos:
1. Quais as sequelas que a sinistrada apresenta que são consequência do evento participado?
2. Existindo perturbações funcionais com manifesta diminuição do nível de eficiência pessoal e tendo uma filha com 2 anos de idade aos seus cuidados, são essas sequelas impeditivas do exercício da sua profissão ou afins? Se sim, justifique.
3. Ou são essas sequelas, secundárias a uma síndrome pós traumática? Se sim, quantifique e justifique.
Por despacho judicial em 08-11-2020, foi alterado o quesito 2, passando o mesmo a ter a seguinte formulação.
2. Existindo perturbações funcionais com manifesta diminuição do nível de eficiência pessoal, são essas sequelas impeditivas do exercício da sua profissão ou afins? Se sim, justifique.
Em 21-12-2020 foram nomeados os seguintes peritos médicos:
Perito do Tribunal: Dr. (…)
Perito apresentado pela seguradora: Dr. (…)
Perito apresentado pela sinistrada: Dr. (…)
Na mesma data, foi realizado o exame por junta médica, tendo a mesma terminado com a seguinte conclusão:
A junta após observação e entrevista da sinistrada propõe uma junta médica da especialidade de psiquiatria para resposta aos quesitos já formulados, acrescidos de:
- As sequelas são compatíveis com a profissão habitual ou merecedoras de IPATH?
- E se as mesmas são ainda causa de IPA (Incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho)?
Por despacho judicial de 04-01-2021, foi deferida a realização de junta médica da especialidade de psiquiatria, tendo sido formulados os seguintes quesitos:
1º Quais são as sequelas que a sinistrada apresenta e que são consequência do evento participado?
2º Existindo perturbações funcionais com manifesta diminuição do nível de eficiência pessoal, são essas sequelas impeditivas do exercício da sua profissão ou afins? E se sim, porquê?
3º Ou são essas sequelas secundárias a uma síndrome pós-traumática? Se sim, quantifique e justifique.
4º As sequelas são compatíveis com a profissão habitual ou merecedoras de IPATH?
5º As sequelas são ainda causa de IPA (Incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho)?
Por requerimento de 20-10-2021, a “Fidelidade, SA” veio solicitar que não fosse nomeada a Dra. (…), por a mesma já ter tido intervenção na fase conciliatória do processo, devendo a respetiva junta médica realizar-se na Delegação de Lisboa do INMLCF.
A sinistrada, respondendo, em 20-10-2021, ao requerimento da “Fidelidade, SA”, pugnou pela manutenção da Dra. (…) na junta médica e na sua realização na delegação de Évora.
Por despacho de 20-10-2021, foram indeferidas as pretensões da requerente “Fidelidade, SA.”.
No dia 25-10-2021 procedeu-se à seguinte
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