Acórdão nº 309/19.0YUSTR-F.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 01-06-2022

Data de Julgamento01 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão309/19.0YUSTR-F.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

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I.– RELATÓRIO


A EDP–GESTÃO DA PRODUÇÃO DE ENERGIA, S.A., Recorrente nos autos de recurso judicial de decisão proferida pela AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA que lhe aplicou a coima de 48 milhões de euros apresentou recurso dos despachos proferidos pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão sob as referências n.ºs 321335 e 322448 sustentando, em tal sede:

Nestes termos e outros mais de direito que v. Exas. doutamente suprirão, a ora recorrente respeitosamente Requer que sejam revogadas as decisões do tribunal a quo de 13.10.2021 e 19.10.2021:
A)–na parte em que decidiu proceder à emissão de certidão Executiva para pagamento antecipado da coima, uma vez que, Àquela data, a edp produção não estava em situação de Incumprimento, em consequência da postergação do anterior Prazo de pagamento que foi determinada em despacho de 11.10.2021;
B)–na parte em que o tribunal a quo nega a possibilidade legal de modelação do pagamento da coima, por ilegal aplicação do regime inscrito no artigo 88.º, n.ºs 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, aplicável ex vi artigos 13.º, n.º 1, e 83.º da lei da concorrência , determinando-se a prolação de novo despacho que aprecie o impacto que o pagamento imediato da Coima implicaria à luz da situação financeira atual da EDP Produção e, consequentemente, conceda a possibilidade de diferimento do pagamento da coima ou o seu pagamento faseado.

Apresentou, nesse âmbito, as seguintes conclusões:

I.–Vem o presente Recurso interposto contra dois despachos proferidos pelo Tribunal a quo: o despacho datado de 13.10.2021, sob referência n.º 321335, que veio decidir promover a emissão de certidão executiva para execução antecipada e provisória da coima, antes de decorrido o prazo para pagamento da coima sem que a mesma tivesse sido liquidada; e o despacho datado de 19.10.2021, sob referência n.º 322448, que, abstendo-se de analisar a situação financeira da Visada e de aplicar juízos de prognose sobre o impacto do pagamento integral e imediato da coima, não só indeferiu a concessão do diferimento ou pagamento faseado da coima, como também negou a emissão de novas guias para pagamento, estando as anteriores já expiradas nessa data.
II.–Conforme oportunamente demonstrado, por despacho datado de 13.10.2021, o Tribunal recorrido decidiu extrair e remeter ao Ministério Público certidão executiva do pagamento antecipado e provisório da coima, sem que existisse um qualquer fundamento legal para o efeito.
III.–E assim é porque, naquela data, não estava verificada a condição indispensável para o desencadeamento da execução patrimonial, prevista nos artigos 89.º, n.º 1, do RGCO, e 491.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 89.º, n.º 2, do RGCO: ainda não tinha decorrido o prazo de pagamento da coima sem que a mesma tivesse sido liquidada, nem nada fazia indiciar que a EDP Produção não iria proceder a esse pagamento (bem pelo contrário).
IV.–E não se diga, como pretende o Tribunal a quo no seu despacho de 19.10.2021, que: “[c]om efeito, após a prolação do despacho sob referência 321335 e respetiva notificação (lida pelo Ilustre Mandatário a 14.10.2021), assim sobrevindo decisão sobre o efeito a atribuir ao recurso, devia a Arguida ter procedido ao pagamento da coima, o que poderia realizar através de depósito autónomo, ou, in limine, manifestando o propósito de o realizar.”.
V.–Desde logo porque, no dia 11.10.2021, em plena sessão da audiência de julgamento e conforme exarado em ata, o Tribunal recorrido determinou que: “[n]o que respeita ao Recurso apresentado pela Recorrente, fica a mesma advertida que não terá que proceder à liquidação da coima, até sobrevir a decisão sobre o efeito a atribuir ao mesmo”.
VI.–Esta decisão do Tribunal a quo foi, assim, espoletada pela EDP Produção que, ciente que naquela data terminava o prazo de pagamento de 20 (vinte) dias fixado no despacho de 21.09.2021, e estando já preparada para proceder a essa liquidação naquele dia 11.10.2021, manifestou, de forma clara e inequívoca, a sua preocupação e intenção de proceder ao pagamento da coima – questionando o Tribunal se deveria ou não avançar com essa liquidação em face da ausência de pronúncia desse mesmo Tribunal sobre o Recurso que havia sido interposto contra a determinação do pagamento antecipado da coima.
VII.–Com efeito, se o aludido despacho, a dar sem efeito o prazo da ordem de pagamento, vertido na ata da audiência de julgamento, não tivesse sido proferido pelo Tribunal a quo, naquela data, a EDP Produção teria procedido ao pagamento da coima.
VIII.–Através de despacho datado de 13.10.2021, o Tribunal recorrido veio a definir o efeito do recurso apresentado pela EDP Produção como meramente devolutivo.
IX.–Ou seja, só em 13.10.2021 o Tribunal recorrido tomou a decisão cuja pendência o levou a dar sem efeito o prazo de pagamento da coima pela EDP Produção.
X.–Nesse mesmo despacho, o Tribunal a quo, desconsiderando, em absoluto, o despacho por si proferido em 11.10.2021, determinou, antes de notificar a Visada e sem lhe dar a oportunidade de utilizar o prazo de pagamento que lhe havia sido conferido, a emissão de certidão para efeitos da instauração de ação executiva.
XI.Saliente-se que o Tribunal a quo ordenou a emissão de certidão executiva no mesmo despacho em que tomou a decisão que, nas suas próprias palavras, definiria se o pagamento seria devido no imediato ou só depois da decisão do Recurso interposto pela EDP Produção.
XII.–Aquilo que o Tribunal recorrido deveria ter feito, neste contexto, era conceder, nesse despacho, um novo prazo para pagamento da coima, acompanhado das respetivas guias, pois que só nessa data de 13.10.2021 tomou a sua decisão sobre o momento do pagamento da coima.
XIII.–Aliás, mesmo que, de alguma forma que não se concede, se viesse a entender que o prazo para pagamento fixado em 21.09.2021, dado sem efeito em 11.10.2021, retomou a sua contagem com o despacho de 13.10.2021, ainda assim, nunca poderia o Tribunal ter ordenado a extração de certidão.
XIV.–E isto porque, mesmo nesse (inadmissível e nunca comunicado) entendimento, importa clarificar que o despacho de 13.10.2021 foi notificado à Visada no dia 14.10.2021, pelo que, atendendo a que as notificações eletrónicas se presumem feitas no terceiro dia posterior ao do seu envio, sendo que tal presunção não pode ser usada contra quem dela beneficia, o prazo terminaria no dia 18.10.2021.
XV.–Pelo que, contrariamente ao afirmado pelo Tribunal recorrido, quando, no dia 14.10.2021, a ora Visada apresentou um requerimento, através do qual solicitou o diferimento do pagamento da coima pelo prazo de 1 (um) ano ou o seu pagamento a prestações, não se tinha ainda verificado o esgotamento do prazo para liquidação da coima.
XVI.–Ainda no dia 14.10.2021, a EDP Produção requereu que, caso não fosse dado provimento ao pedido de diferimento e ao pedido de pagamento faseado da coima, fosse emitida a guia para pagamento da coima num prazo de 20 (vinte) dias, tendo reforçado que “a EDP Produção não deixará de pagar a coima no prazo que lhe for concedido”.
XVII.–Assim, é falso aquilo que, no próprio dia 14.10.2021, a secretaria do Tribunal (por ordem do Tribunal ilegalmente constante do despacho de 13.10.2021) fez constar em certidão, i.e., que a EDP Produção, enquanto “responsável pelo pagamento da multa foi devidamente notificado em 16/09/2021, não tendo sido efectuado o pagamento devido, no prazo legal”.
XVIII.–O que é quanto basta para que se conclua que terá sido instaurada ação executiva pelo Ministério Público – que tem conhecimento de todos os factos ora relatados – com base numa certidão que sabia não corresponder à realidade.
XIX.–Por conseguinte, não se poderá, igualmente, aceitar o entendimento veiculado pelo Tribunal recorrido no seu despacho de 19.10.2021, na parte em que se conclui que “o Tribunal limitou-se a deferir a pretensão, legalmente admissível, do Ministério Público”,
XX.–Tanto mais que, quando o Ministério Público promoveu a extração de certidão pelo Tribunal recorrido, em 07.10.2021, ainda o Tribunal não tinha proferido o seu despacho de 11.10.2021 em que deu sem efeito a data para pagamento da coima.
XXI.–Confrontada com uma situação a todos os títulos inadmissível, e não obstante o inegável impacto resultante desta decisão, no dia 20.10.2021, a Visada procedeu ao pagamento da coima de € 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de euros), através de depósito autónomo.
XXII.–Por despacho datado de 19.10.2021, o Tribunal recorrido, fugindo às exigências de ponderação da situação económico-financeira atual da Visada, decidiu excluir a aplicação do regime legal previsto no artigo 88.º, n.os 4 e 5, do RGCO, aplicável subsidiariamente nos termos dos artigos 13.º, n.º 1, e 83.º da LdC, com fundamento na sua alegada extemporaneidade e inadmissibilidade legal.
XXIII.–Em primeiro lugar, não se vislumbra como se poderá concluir que o requerimento apresentado pela Visada no dia 14.10.2021 – através do qual esta, atento o inegável impacto que o pagamento integral e imediato da coima lhe causaria, solicitou a concessão do diferimento ou pagamento faseado da mesma – foi extemporâneo.
XXIV.–Desde logo porque (ainda que isso influenciasse a possibilidade de diferimento ou faseamento do pagamento da coima, o que nem sequer se verifica), na data de apresentação do mencionado requerimento em que a EDP Produção solicitou o diferimento ou pagamento faseado da coima, ainda nem sequer se tinha iniciado, muito menos terminado, um novo prazo para pagamento da coima (dado que o prazo inicial havia sido dado sem efeito pelo Tribunal recorrido).
XXV.–Sendo certo que, ainda que esse prazo já se tivesse esgotado, a modelação da forma de pagamento da coima é admitida mesmo na fase
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