Acórdão nº 3036/15.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Sul, 02-06-2022

Data de Julgamento02 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão3036/15.3BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
1. A…, com residência na Rua …., intentou no TAC de Lisboa uma acção administrativa contra o Fundo de Garantia Salarial, IP, pedindo a declaração de nulidade do despacho de indeferimento do Presidente do Conselho de Gestão do FGS, datado de 21-5-2015, e a sua condenação a pagar-lhe os créditos laborais no valor de € 53.504,10.
2. O TAC de Lisboa, por sentença datada de 8-7-2020, julgou a acção improcedente e absolveu o réu do pedido.
3. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação para este TCA Sul, tendo concluído a sua alegação nos seguintes termos:
I – O Tribunal “a quo” proferiu Sentença, absolvendo o réu, ora recorrido, do pedido de declaração de nulidade do despacho de indeferimento do Presidente do Conselho de Gestão do FGS de 21-5-2015 e da sua concomitante condenação no pagamento dos créditos laborais no valor de € 53.404,10 (cinquenta e três mil, quatrocentos e quatro euros e dez cêntimos);
II – A sustentar a sua fundamentação jurídica, o Tribunal “a quo” considerou que à data da prática do acto administrativo, o regime do FGS encontrava-se regulado pelos artigos 316º a 326º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29/7, todavia encontrando-se tais normas revogadas pelo artigo 4º, alínea a) do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21/4, aplicar-se-ia o novo regime unificado do FGS, entrado em vigor a 4-5-2015, mas somente para requerimentos apresentados para pagamentos de créditos laborais depois desta data, o que não sucede, segundo o Tribunal “a quo”, com os requerimentos do aqui recorrente;
III – E uma vez o FGS apenas garantir os créditos nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente e que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da acção de insolvência, e o facto de não estarem os referidos créditos requeridos pelo aqui recorrente abrangidos por esse período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da acção, é causa directa e necessária para o indeferimento pelo FGS;
IV – Concluindo o Tribunal “a quo” pelo indeferimento da pretensão do autor e aqui recorrente;
V – O recorrente não concorda com tal decisão porque entende que houve na apreciação da fundamentação do direito por parte do Tribunal “a quo”, manifesto erro na determinação da norma aplicável ao caso em concreto.
VI – Para o aqui recorrente, o Tribunal “a quo” apreciou erradamente as questões levantadas pelo aqui recorrente, sobre a existência de vício que fere de legalidade o despacho de Indeferimento do FGS, bem como do direito a que lhe sejam pagos os referidos créditos salariais pelo mesmo FGS;
VII – O Tribunal “a quo”, deveria ter apreciado a factualidade vertida nos autos ao abrigo não dos artigos 316º a 326º do RCT, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29/7, mas sim recorrendo ao Novo Regime do FGS, aprovado pelo DL nº 59/2015, de 21/4;
VIII – Isto porque nos termos do artigo 3º, nº 3, alínea b) do preâmbulo do DL nº 59/2015, de 21/4, ficam sujeitos ao novo regime do FGS, os requerimentos apresentados entre 1 de Setembro de 2012 e a data da entrada em vigor do presente Decreto-lei, por trabalhadores abrangidos por plano de insolvência, homologado por sentença, no âmbito do processo de insolvência, cuja apresentação pelo recorrente dos requerimentos (23-5-2012 e 19-11-2013), se enquadram no referido regime do Novo Regime do FGS;
IX – O Decreto-Lei que deveria ter sido aplicado à luz dos factos constantes carreados para os autos é o 59/2015, de 21/4, por força do disposto no artigo 3º, nº 3, alínea b) do preâmbulo do referido Diploma Legal;
X – Assim, e nos termos do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21/4, que aprovou o Novo Regime do FGS, no seu artigo 1º, alínea a) “o FGS assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja proferida sentença de declaração de insolvência do empregador”;
XI – Por sua vez, estipula o nº 8 do artigo 2º do referido Diploma que “o FGS só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”;
XII – O Tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão com base no incumprimento do requisito temporal previsto no artigo 319º da Lei nº 35/2004, de 29/7;
XIII – Sucede que a disposição em causa não devia ter sido tomada em consideração “in casu”, pois a legislação aplicável é a que vem expressa no Decreto-Lei nº 59/2015, de 21/4;
XIV – No caso em apreço, e conforme aos factos que foram dados como provados, o aqui recorrente de forma a declarar a ilicitude do despedimento e ser integrado na empresa “X…, SA”, intentou providência cautelar, a qual teve provimento, posteriormente confirmada através de acção declarativa, datada de 31-5-2011;
XV – No entanto, o seu contrato não se encontrava cessado, o que só aconteceu aquando da declaração de insolvência daquela sociedade em 30-11-2012;
XVI – Assim, e tendo em consideração que nos termos do disposto no artigo 2º, nº 8 do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21/4, o FGS só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”, facto é que isso sucedeu, ou seja, o recorrente apresentou a concomitante reclamação de créditos no prazo de trinta (30) dias após a declaração da insolvência da referida empresa, tendo o seu crédito sido reconhecido como privilegiado e no valor de € 53.404,10 (cinquenta e três mil, quatrocentos e quatro euros e dez cêntimos);
XVII – Pelo que no entendimento do aqui recorrente, o pagamento dos créditos salariais não se venceram fora do prazo constante do artigo 2º, nº 8 do referido Diploma Legal, pelo que os mesmos são efectivamente devidos.
XVIII – Acresce-se ainda que no caso de créditos salariais, embora emergentes da cessação de contrato de trabalho, que foram reconhecidos por sentença, aplica-se o prazo geral de prescrição de vinte anos, previsto no artigo 309º do Código Civil – Acórdão do Tribunal Administrativo Central do Norte, de 11-1-2019);
XIX – Sendo inconstitucional a norma contida no artigo 2º, nº 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei nº 59/2015, de 21/4, na interpretação segundo o qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insusceptível de qualquer interrupção ou suspensão – Acórdão do Tribunal Constitucional nº 328/2018, de 27-6-2018, no processo 555/2017 (rectificado pelo Acórdão nº 447/2018);
XX – Estando a nova prescrição sujeita a prazo de prescrição ordinária de 20 anos nos termos dos artigos 326º, nº 2, 311º, nº 1 e 309º do Código Civil (já que os direitos em causa foram reconhecidos por sentença transitada em julgado), é inequívoco que os créditos em questão não estavam prescritos;
XXI – À luz deste regime legal o requerimento apresentado pelo recorrente não pode deixar de ser considerado tempestivo (Ver Acórdão do TCA, de 28-4-2017 – Processo 00840/16.9, publicado em www.dgsi.pt);
XXII – Pelo que, entende o recorrente existir na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, razões de direito, que merecem ser apreciadas de forma distinta à decretada, pugnando o recorrente pela anulação de decisão que absolveu o ora recorrido FGS do pedido, devendo ser declarado nulo o despacho de indeferimento do Presidente do Conselho de Gestão do FGS, com a consequente condenação do FGS no pagamento dos créditos salariais peticionados, acrescido de juros até integral pagamento”.
4. O Fundo de Garantia Salarial apresentou contra-alegação, na qual concluiu nos seguintes termos:
A. O regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial regulado pela Lei nº 35/2004, de 29/7, nos artigos 317º a 326º, impõe determinado requisitos, de cumprimento cumulativo, para que o Fundo de Garantia Salarial possa assegurar a um trabalhador o pagamento dos créditos requeridos.
B. Desde logo, um desses requisitos, impostos pela citada lei no nº 1 do artigo 318º, é que o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente.
C. No presente caso, a acção de insolvência da entidade empregadora “X..., SA” foi intentada no dia 9-10-2012 e decretada por sentença datada de 30-11-2012.
D. Mas não são todos e quaisquer créditos que o Fundo de Garantia Salarial assegura, na medida em que o nº 1 do artigo 319º da citada lei impõe que apenas é assegurado o pagamento de créditos vencidos nos seis meses que antecedem a data da propositura da acção ou da entrada do requerimento do procedimento de conciliação, se for o caso.
E. Na presente situação, e de acordo com a legislação, o Fundo de Garantia Salarial assegura os créditos vencidos entre 9-4-2012 e 9-10-2012.
F. O contrato de trabalho do autor cessou em 28-10-2008.
G. Obteve sentença de condenação em 31-5-2011.
H. Portanto, tendo os créditos laborais vencido na data da cessação do contrato de trabalho (28-10-2008) e, no limite na data da sentença proferida (31-5-2011), os mesmos estão fora do período de referência.
I. Os créditos do autor aqui recorrente, são créditos laborais e que se vencem com a cessação do contrato de trabalho”.
5. O Digno Magistrado do Ministério Público juntos deste TCA Sul, notificado para os termos e efeitos do disposto no artigo 146º do CPTA, não emitiu parecer.
6. Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para julgamento.

II. OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
7. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, nos termos...

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