Acórdão nº 291/19.3GAPRD.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-21

Data de Julgamento21 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão291/19.3GAPRD.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 291/19.3GAPRD.P1

Acordam em Conferência na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
Nos autos nº 291/19.3GAPRD que correu os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este- Juízo Central Criminal de Penafiel-Juiz6, foi proferida decisão que dispôs:
“Julgar o arguido AA autor material, na forma consumada e em concurso real, de:
a-) dois crimes de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137º, n.º 2 do Código Penal e consequentemente condenar o mesmo nas penas de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão por cada um deles;
b-) um crime de condução perigosa de veículo rodoviário agravado pelo resultado ofensa à integridade física grave, p. e p. pelo artigo 291º, n.º 1, 294º, n.º 3 e 285º do C.Penal e, consequentemente, condenar o mesmo na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão.
c) Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas em A) e B), condenar o arguido na pena única de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de prisão.
d) Suspender a execução da pena de prisão aplicada em d) pelo período de 4 anos e 7 meses, suspensão essa subordinada à obrigação do arguido frequentar o curso de prevenção de sinistralidade rodoviária e de proceder ao pagamento da quantia de € 5000.00 (cinco mil euros) à A... – artigos 50º, n.º 2 e 51º, n.º 1, c) do Código Penal -, contribuição que deverá comprovar os autos.
d) Julgar o arguido incurso em três penas acessórias previstas no artigo 69º, n.º 1, al. a) do C.Penal e, consequentemente, condenar o arguido na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 8 (oito) meses por cada uma delas.
e) Em cúmulo jurídico das penas acessórias parcelares aplicadas em d), condenar o arguido na pena única acessória de proibição de conduzir pelo período de 16 (dezasseis) meses.
f) Absolver o arguido das contra-odenações de que vinha acusado. “
*
Inconformado veio o M.P. interpor recurso, tendo concluído nos seguintes termos:
“1. O arguido AA foi condenado:
- Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas em A) e B), condenar o arguido na pena única de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de prisão; a qual foi suspensa na sua execução pelo período de 4 anos e 7 meses, suspensão essa subordinada à obrigação do arguido frequentar o curso de prevenção de sinistralidade rodoviária e de proceder ao pagamento da quantia de € 5000.00 (cinco mil euros) à A... – artigos 50º, n.º 2 e 51º, n.º 1, c) do Código Penal -, contribuição que deverá comprovar os autos.
2. De notar que o arguido foi condenado pela prática de - dois crimes de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137º, n.º 2 do Código Penal; e
- um crime de condução perigosa de veículo rodoviário agravado pelo resultado ofensa à integridade física grave, p. e p. pelo artigo 291º, n.º 1, 294º, n.º 3 e 285º do Código Penal.
3. De notar que o grau de ilicitude é alto, pois o excesso de velocidade objectivamente considerado é elevado, em mais do dobro do máximo legalmente permitido e a taxa de álcool no sangue apurada excede em triplo a punição pelo comportamento contra-ordenacional, preenchendo, quanto ao crime de condução perigosa, as duas alíneas de condutas tipicamente previstas.
4. De sublinhar ainda que as exigências de prevenção geral, reputam-se de elevadas (necessidade comunitária da punição do caso concreto e consequentemente da realização das finalidades da pena).
5. Com efeito, a condução perigosa de veículo rodoviário agravado pelo resultado, e os homicídios negligentes (com negligência grosseira) consequência dessa condição, relevam as exigências de prevenção geral que são muito acentuadas.
6. De facto, a segurança rodoviária e consequentemente a vida e a integridade física de um número indeterminado de pessoas causam alarme social e a mobilização da opinião pública.
7. A crescente frequência e a gravidade dos acidentes de viação arrasta consigo a necessidade de restabelecimento da confiança e expectativas comunitárias na validade da norma infringida.
8. Pelo que, impõe-se a aplicação de uma pena de prisão efectiva e a cumprir no Estabelecimento Prisional, o que se requer.
9. Pelas razões expostas, entendemos que deve ser aplicada a pena de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de prisão efectiva”
*
A assistente BB também interpôs recurso concluindo:

“A. Por douto acórdão proferido nos presentes autos o Arguido foi condenado como autor material, na forma consumada e em concurso real pela prática de dois crimes de homicídio por negligência grosseira e um crime de condução perigoso de veículo agravado pelo resultado ofensa à integridade física grave,
B. Nas penas parcelares de 2,5 anos por cada homicídio e 1 ano e 1 ano e 10 meses pelo crime de condução perigosa de veículo agravada, em cúmulo jurídico na pena única de 4 anos e 7 meses de prisão;
C. Ainda no âmbito do referido acórdão foi determinado pelo Tribunal a quo a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão (Art.º 50º do C.Penal), suspendendo a execução de tal pena de prisão (4 anos e 7 meses) por igual período ainda que sujeita ao cumprimento de obrigações;
D. Entende a Recorrente que na referida decisão se verifica uma errada aplicação do instituto da suspensão provisória do processo (Art.º 50º C. Penal);
E. Dos factos provados resulta que o Arguido conduzindo veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de 1.68 g/l e a pelo menos 102km/h, em localidade, invadiu a faixa de rodagem contrária, “atropelando” 3 motociclistas que seguiam viagem cumprindo todas as normas estradais;
F. Em consequência de tal “atropelo”, dois dos motociclistas vieram a falecer no local e o único motociclista sobrevivente ficou graves e sequelas permanentes;
G. O Acidente ocorreu por culpa exclusiva do Arguido que conhecia bem a via onde o mesmo ocorreu, sendo que tal via não possuía qualquer anomalia e verificavam-se boas condições de visibilidade (21 de abril de 2019 pelas 17h.30m – Domingo de Páscoa);
H. A aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão não se coaduna com a gravidade dos ilícitos em questão e com as consequências que resultaram do cometimento dos mesmos pelo Arguido;
I. A elevada sinistralidade rodoviária existente no nosso país impõe que a instituições jurídico-penais transmitam para a sociedade a certeza que este tipo de comportamento (condução com 1.68 g/ls e a 102 km/h em zona de 50 km/h), com as consequências verificadas (2 mortos e 1 ferido grave) são inadmissíveis e, por conseguinte, severamente punidas;
J. A conduta do Arguido apresenta-se no limite superior da negligência (Grosseira), pois o grau de culpa é elevadíssimo;
K. Foi intenção do Arguido iniciar a condução de veículo automóvel bem sabendo não se encontrar em condições de o fazer,
L. Assumindo como possível, em face de tal estado alcoolizado, a possibilidade de poder provocar um acidente com vítimas mortais e feridos (Dolo eventual);
M. Risco que ainda potenciou através da impressão ao veículo de uma velocidade de 102 km/h em zona limitada 50km/h, limite que conhecia bem pois passava diariamente no local;
N. O resultado da conduta foi catastrófico, várias famílias destruídas, a ora Recorrente, à data com 10 anos, perdeu o seu pai,
O. Mas pais também perderam filhos, algo completamente contranatura;
P. Todas as circunstâncias e consequências do evento, aliadas à consciência geral da necessidade imperiosa de fazer frente à sinistralidade rodoviária no nosso País, impõem a eficácia da utilização da prevenção geral - de contrário em causa se colocariam, quer a crença na comunidade da validade da norma, quer a confiança dos cidadãos nas Instituições jurídico-penais,
Q. E porque assim não sucedeu no douto Acórdão de que ora se recorre, onde foi decidido libertar alguém que grosseiramente matou duas pessoas e apenas não matou uma terceira por mero acaso, abalou-se a crença nas instituições jurídico-penais como garantes da ordem jurídica e do cumprimento das normas mais basilares da vida em sociedade, bem como do bem mais precioso, - a Vida humana,
R. O que foi potenciado, no presente processo pelo acompanhamento do mesmo pelos órgãos de comunicação social,
S. Abalo, na confiança e credibilidade que a sociedade deposita nas Instituições Jurídico-Penais que defendem a ordem social e protegem a vida, que urge reparar;
T. Tal reparação apenas será possível demonstrando-se que condutas como a do Arguido não são admissíveis ou toleradas,
U. O que se pretende pelo presente recurso através da condenação do Arguido na pena de 4 anos e 7 meses de prisão efetiva;
V. Pretensão suportada por entendimento doutrinaria e jurisprudencialmente aceite e promovido,
W. Segundo o qual, contrariamente ao decido pelo Tribunal a quo, a finalidade de prevenção geral positiva da pena sobrepõe-se a qualquer juízo de prognose positivo a respeito da das finalidades de prevenção especial ou ressocialização;
X. O que determina a inaplicabilidade do instituto da suspensão da execução da pena de prisão nos presentes autos.”

Igualmente o fez a assistente CC, concluindo:
“A. O acórdão proferido nos presentes autos o Arguido foi condenado como autor material, na forma consumada e em concurso real pela prá2ca de dois crimes de homicídio por negligência grosseira e um crime de condução perigoso de veículo agravado pelo resultado ofenso à integridade física grave,
B. Nas penas de 2,5 anos por cada homicídio e 1 ano e 10 meses pelo crime de condução perigosa de veículo agravada, em cúmulo jurídico na pena única de 4 anos e 7 meses de prisão;
C. Ainda no âmbito do referido acórdão foi determinado pelo Tribunal a quo a aplicação do ins2tuto da suspensão da execução da pena de prisão (Art.º 50º do C.Penal), suspendendo a execução de tal pena de prisão (4 anos e 7 meses) por igual período ainda que sujeita ao cumprimento de obrigações;
D. Entende a Recorrente que na referida decisão se verifica uma errada aplicação do
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