Acórdão nº 2878/20.2T8CSC.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-03-06

Ano2024
Número Acordão2878/20.2T8CSC.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - Relatório.
Babcock Mission Critical Services Portugal, Unipessoal, Ld.ª intentou a presente acção declarativa com, processo comum, contra AA, pedindo que a acção fosse julgada procedente e, em consequência, este ser condenado a pagar-lhe uma indemnização por violação do pacto de permanência celebrado em 02-08-2018, por referência ao valor estipulado a título de cláusula penal ajustado pelo critério de proporcionalidade fixado pelas partes, que importa na quantia de € 36.570,64, correspondente a capital e juros de mora, bem como a juros vincendos até integral e efectivo pagamento sobre o capital de € 35.629,63.
Para o efeito alegou, em síntese, que na sequência de contrato de trabalho celebrado com o réu, proporcionou-lhe a formação e obtenção da qualificação tipo do helicóptero Agusta AW139, e, como contrapartida de o réu não ter que suportar qualquer quantia referente à formação e obtenção da qualificação tipo, celebraram um pacto de permanência, por um período de 3 anos, em que o ré se comprometeu a permanecer ao serviço da autora, mas que o réu decidiu denunciar o contrato de trabalho antes do termo do prazo previsto no pacto de permanência
Citado o réu, foi convocada e realizada audiência de partes, na qual as mesmas não quiseram acordar sobre o litígio que as divide.
Para tal notificado, o réu contestou, pedindo a sua absolvição dos pedidos formulados pela autora, e reconveio, pedindo a condenação da mesma a pagar-lhe:
i) € 16.653,26 a título de férias pagas, subsídio de férias e subsídio de Natal pelo trabalho prestado entre Abril e Dezembro de 2017;
ii) 27.329,02 euros a título de férias pagas, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos aos anos de 2018 e 2019;
iii) 6000 euros relativos a subsídio de voo por instrumentos;
iv) 8724 euros relativos à retribuição parcial nos dias de formação;
v) 2.450,60 euros relativos a trabalho prestado em dias feriados;
vi) 22.911,24 euros a título de trabalho nocturno não pago;
vii) 13.274,34 euros relativos a subsídio de férias e férias pagas vencidos em 1 de Janeiro de 2020 e proporcionais destes subsídios e do de Natal no ano da cessação do contrato de trabalho.
Alegou, em síntese, que trabalha efectivamente para Autora desde Abril de 2017 apesar de terem assinado contrato de prestação de serviços e emitir recibos verdes, que interpretou a frequência de formação da qualificação de AW139 como uma ordem e que não lhe foi dada oportunidade de analisar o conteúdo do pacto de permanência e que foi informado que teria de assinar para continuar na empresa, mais questionando os valores do pacto de permanência e a qualidade da formação e concluindo pela sua nulidade.
Mais alegou que nunca lhe foram integralmente pagas férias, subsídio de férias e de Natal, e que nas mesmas só foi tido em consideração a retribuição fixa e já não a variável da retribuição diária per diem e que não lhe foi pago o subsídio de voo por instrumentos, a retribuição diária per diem nos dias de formação, a remuneração com o acréscimo relativamente ao trabalho que prestou em dias feriados e em período nocturno nem os créditos laborais devidos pela cessação do contrato de trabalho.
A autora respondeu à contestação-reconvenção alegando, em síntese, que o contrato de prestação de serviços foi desejado pelo réu que recusou celebrar contrato de trabalho por ela proposto, que os valores que lhe foram pagos no âmbito do contrato de prestação de serviços são exactamente os mesmos que lhe caberiam pela tabela salarial aplicada aos pilotos com contrato de trabalho, o per diem corresponde a ajuda de custo e não retribuição variável, a ter-lhe sido pago o subsidio de voo por instrumentos, não ser devido per diem nos dias de formação e não ser devido o pagamento de trabalho nocturno e em dias feriados por se aplicar ao tempo de trabalho o Decreto-Lei n.º 139/2004 e não o Código do Trabalho.
Proferido despacho saneador, foi julgada a instância válida e regular, dispensada a fixação do objecto do processo e dos temas de prova, atribuído valor ao processo, admitidas as provas arroladas pelas partes e designada a data para realização da audiência de julgamento.
Realizada a audiência de julgamento, a Mm.ª Juíza proferiu a sentença, na qual julgou:
i. a acção parcialmente procedente e, em consequência, condeno o réu a pagar à autora a quantia de € 34.547,94, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde 23 de Fevereiro de 2020 e até integral pagamento e absolveu-a do demais peticionado;
ii. a reconvenção parcialmente procedente, reconhecendo a existência de um contrato de trabalho entre as partes desde 16 de Maio de 2017 e, em consequência:
a) condenou a ré-reconvinda a pagar ao autor-reconvinte:
• as quantias a liquidar correspondentes às diferenças na retribuição de férias e subsídio de férias pagas entre 16 de Maio de 2017 e 22 de Fevereiro de 2020, relativamente aos anos em que aquele tenha recebido durante onze meses remuneração a título per diem, pela inclusão em tal retribuição e subsídios da média dos valores pagos em cada um desses anos a este título;
• a quantia de € 2.982,47 a título de subsídio de Natal entre 17 de Maio de 2017 e 22 de Fevereiro de 2020;
b) absolveu-a do demais por ele peticionado.
Inconformado, o autor-reconvinte interpôs recurso, pedindo que a sentença proferida seja revogada e substituída por outra que venha a julgar a acção procedente e a ré condenada a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde 15-05-2015 e bem assim a indemnização por antiguidade, por que optou em detrimento da reintegração, culminando a alegação com as seguintes conclusões:
"A. O presente recurso circunscreve-se a matéria de direito.
B. Na fundamentação da sentença não foi considerado provado o valor suportado pela Autora por quaisquer custos com formação ou qualificação profissional do Réu, nem sequer que a Autora os tenha efectivamente pago.
C. Atendendo à liberdade de trabalho consagrada no artigo 47.º da Constituição da República Portuguesa, só deverão ser admitidas restrições a tal liberdade nos termos legalmente permitidos.
D. Uma das restrições à livre denúncia do contrato de trabalho pelo trabalhador vem prevista no artigo 137.º do Código do trabalho.
E. O sentido que se extrai desta norma é que por contrapartida de despesas avultadas realizadas pelo empregador o trabalhador renuncia temporariamente a declarar a denúncia do contrato – é o chamado pacto de permanência.
F. Ficou provado que a Autora estabeleceu o valor do pacto de permanência a partir de um 'preço' e não de 'despesas avultadas' que tenha suportado.
G. Admitindo a Autora no seu articulado que parte da formação foi assegurada com recursos internos.
H. Não apresentando a Autora qualquer pagamento efectuado a terceiros por recursos necessários à formação, referenciado ao Réu ou à data em que este recebeu formação.
I. Doutro modo, também a Autora não apresenta qualquer preço de formação que praticasse a terceiros pelo tipo de formação conferida ao Réu.
J. Com tal conteúdo, o pacto de permanência deverá ser considerado nulo por força dos artigos 81.º, n.º 1 e 294.º do Código Civil.
K. Invoca-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que admite o pagamento pelo trabalhador denunciante do contrato do valor das despesas suportadas pelo empregador, recusando a possibilidade de uma cláusula penal aleatória, que fixe uma sanção pecuniária desfasada do real dispêndio do empregador com a formação profissional ministrada (Ac. de 28 de Abril de 2010 - Processo 812/2007).
L. Em sentido convergente invocam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24 de Março de 2010 (Proc. 455/08) e do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Fevereiro de 2010 (Proc. 556/07) que afirmando a licitude do pacto de permanência sustentam que o seu montante constitui um limite máximo que não dispensa o empregador de comprovar o valor que foi efectivamente gasto, devendo aferir-se ainda da razoabilidade de tal cláusula para uma redução de acordo com a equidade, por se revelar manifestamente excessiva.
M. A sentença recorrida ao enunciar que ao contrário do pretendido pelo Réu não tem a Autora que fazer prova das despesas que tenha feito bastando que se demonstre que foram despesas significativas em formação que ultrapasse a formação corrente a que está obrigada', contraria esta jurisprudência e, com o devido respeito, a letra e espírito da lei.
N. Perante os factos assentes e o direito aplicável dúvidas não subsistem que a sentença recorrida violou os artigos 127.º, n.º 1, al. d), 131.º e 133.º do Código do Trabalho, e ainda os artigos 81.º e 294.º do Código Civil, sendo excessiva a condenação no valor de 34.547,94€ porquanto subentende a condenação na totalidade do valor pedido pela Autora descontando o tempo em que o Réu permaneceu na empresa.
O. Na condenação do pagamento de subsídio de Natal em falta a sentença recorrida violou o artigo 258.º, n.º 1, do código do trabalho.
P. No caso sub judice, o período normal de trabalho do Réu era remunerado com uma retribuição fixa e outra variável.
Q. Bastava o Réu ser 'escalado', ou seja, colocado numa escala de tempos de trabalho, com o dever de comparecer numa base operacional, para ter direito às componentes fixa e variável da sua retribuição (a dita 'per diem', 'diária', 'ajuda de custo' ou 'suplemento remuneratório').
R. Daí que a retribuição a que alude no n.º 1 do artigo 263.º do Código do Trabalho tenha de incluir ambas as componentes da retribuição – a certa e a variável.
S. Ao adoptar entendimento diferente – limitando o subsídio de Natal à retribuição fixa – a sentença proferida pelo Tribunal a Quo violou as normas legais citadas.
T. Especialmente depois de ter dado como provado (e julgado) que a retribuição do Réu é constituída por uma parte fixa e outra variável (cf. artigos 2.º, 6.º, 7.º, 8.º, 29.º,
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