Sentença ou Acórdão nº 0000 de Tribunal da Relação, 01 de Janeiro de 2023 (caso Acórdão nº 2873/19.4T8MAI.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-09-28)

Data da Resolução01 de Janeiro de 2023
Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2023:2873/19.4T8MAI.P1


Acordam no Tribunal da Relação do Porto


1. Relatório
AA e mulher, BB, residentes na Rua ..., ..., na freguesia ..., na Maia, instauraram acção declarativa, sob a forma de processo comum contra CC, casado, residente na Rua ..., em ..., Vila do Conde, onde concluiram pedindo que o réu seja condenado (como sucessor jurídico das obrigações e do passivo da sociedade A..., Ldª., de que foi único sócio e liquidatário) a pagar aos Autores a quantia de €31.646,86, acrescida de juros legais, desde a data da citação até integral pagamento.
Fundamentam a sua pretensão, num contrato de compra e venda de um bem imóvel que celebraram com a sociedade A..., Lda., sendo o réu, o seu sócio gerente.
Alegam para tanto e, em síntese, que o referido bem imóvel, padece de vários defeitos de construção, defeitos esses que, alegadamente desvalorizam o valor do imóvel e prejudicam ou impedem a sua normal utilização como habitação própria e permanente do agregado familiar.
Mais alegam, que o referido bem imóvel foi-lhes vendido pela sociedade A..., Lda., sociedade, na qual era único sócio e gerente o aqui réu, e relativamente à qual, foi efectuada a respectiva liquidação, tendo tido como único beneficiário o aqui réu, e a sua consequente extinção.
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Citado, o réu CC apresentou oposição, pugnando pela improcedência da acção.
Invoca, desde logo, a excepção peremptória de caducidade, alegando, em síntese, que quando os autores instauraram a acção, já tinha caducado o alegado direito dos autores de reparação e/ou de indemnização dos invocados defeitos do bem imóvel, que lhes foi alienado.
Invoca, ainda, o disposto nos artigos 1220º a 1222º do Código Civil, sustentando que os direitos plasmados nos citados preceitos legais são sequenciais, pelo que não podiam os autores pedir como único e principal pedido a condenação do réu no pagamento de indemnização, sem que primeiro tivessem pedido a reparação dos alegados defeitos.
Sustenta, igualmente, que o réu nada recebeu da sociedade aquando da sua dissolução ou, em qualquer outra altura, pelo que de harmonia com o disposto no artigo 163º, do Código das Sociedades Comerciais, não pode ser responsável pelo pagamento de qualquer indemnização.
Impugna, por fim, a factualidade alegada em sede de articulado de petição inicial.
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Notificados, os autores responderam, pugnando pela improcedência das excepções invocadas pelos réus, bem como pela sua condenação no pedido.
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Foi realizada audiência prévia, tendo sido fixados o objecto do litígio e os temas de prova.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância das formalidades legais.
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Após a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou o réu a pagar aos autores a quantia de €37.545,05, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento.
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Não se conformando com a decisão proferida, o recorrente CC, veio interpor recurso de apelação, em cujas alegações conclui da seguinte forma:
I. A factualidade da causa de pedir numa acção respeitante a defeitos de construção tem de ser invocada especificadamente na PI..

II. Só assim é possível ao R. contestar essa factualidade.

III. Não pode a PI. relegar para um "relatório pericial particular" os defeitos de construção que possam existir num imóvel.

IV. O relatório pericial pode ser um meio de prova, mas não é o da descrição dos factos que se pretendem ver discutidos, pelo que é evidente a falta da causa de pedir e dos fundamentos fácticos que estribam uma Petição inicial.

V. Pelo que sem factos na causa de pedir está votado ao insucesso qualquer pedido.

VI. Não pode ser dado como provado o item 13, pois só consta dum documento e não foi invocado na PI..

VII. Também não pode ser provado o item 14 pois não especifica os trabalhos que têm de ser feitos, pois remete para o doc. 7 da peritagem de fls. 20-26 desse relatório que, mais uma vez, não constava da PI..

VIII. Tal qual se passa com os itens 15, 16 e 17 dos factos provados - não estavam vertidos na PI..

IX. O item 19 é conclusivo.

X. Os itens 22 e 23 dos factos provados, não constam dos factos invocados na PI., pelo que não podem ser dados como provados.

XI. Mais uma vez a M.ª Juiz "a quo" não dá como provados quaisquer danos que tenham sido especificados na PI. e os do item 34, remete novamente para o documento relatório.

XII. A crise no imobiliário em 2008 não foi dado como provado, mas é um facto notório, pelo que tem de ser levado aos factos provados.

XIII. Na motivação da Sentença, e no que tange à sociedade extinta, dá-se como provado a acta, os balancetes analíticos, o Modelo 22 do IRC, contrato promessa, depósito na conta da sociedade, mas não tira daí qualquer consequência, pelo que falta motivação à Sentença.

XIV. Do depoimento do A. AA, há confissão que logo após um mês da ocupação da casa detectou defeitos - 6,18; 6,24 e 6,36 minutos da gravação e que os primeiros foram um mês após a compra - 10,11 m.

XV. Porém, a carta de denúncia só foi enviada em 3/9/2018, ou seja, muito mais de 1 ano após o seu conhecimento.

XVI. Pelo que existe caducidade do direito que o A. pretende fazer valer.

XVII. No item 31º a M.ª Juiz remete para o Relatório enviado ao R. e no item 32º dá como provado que "Solicitando do mesmo a respectiva reparação imediata".

XVIII. Mas, do Relatório enviado não existe qualquer exigência de reparação imediata até porque dá um prazo de 15 dias para promover o início dos trabalhos.

XIX. Logo por falta de fundamentação, deve o item 32º ser levado aos factos não provados.

XX. Não pode o depoimento do A. ser admitido ou fazer prova sobre os factos não favoráveis - só pode depor e terá a relevância que se apurar ajustada aos factos que provem ser considerados desfavoráveis, pois para isso serve o depoimento de parte que não se confunde com as declarações de parte.

XXI. No depoimento das testemunhas do A., os técnicos que terão tido parte activa no Relatório Pericial Particular, nenhum deles depôs sobre os valores necessários para a reparação dos defeitos que detectaram.

XXII. A única testemunha que depôs sobre valores e reparações foi o DD, tudo conforme os pontos que se reproduzem do seu depoimento.

XXIII. Reparou as bases do chuveiro e colocou a bomba mas, por muito que se lhe questionasse não dá um único valor concreto e, diz que passou recibo, mas nunca apareceu nos autos.

XXIV. Mas, dos depoimentos não aparece qualquer valor indicando que tenha sido suportado ou seja necessário à reparação dos defeitos.

XXV. Tudo é remetido para os documentos juntos com a PI..

XXVI. Mas os documentos servem como meios de prova mas não suprem a invocação de factos que devem constar da PI..

XXVII. Para além disso o Réu impugnou todos os documentos da PI..

XXVIII. Destarte, por manifesta falta de prova, devem ser eliminados e levados aos factos não provados os dos itens 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 21º, 27º e 29º.

XXIX. Tendo os AA. feito Relatório Pericial Particular, nunca poderia o R. ser condenado a pagar esses valores, porque extravasa a sua responsabilidade.

XXX. Com base no depoimento da Técnica de contabilidade da sociedade do R., que explicitou os documentos contabilísticos juntos aos autos, resulta claro que a construção custou à empresa 276.951,43€ e só recuperou 180.000,00€ com a venda e teve um prejuízo de 96.951,43€.

XXXI. E que o cheque foi depositado na conta da empresa e não na do R..

XXXII. Pelo seu depoimento transcrito e do que consta, principalmente aos minutos 2,41; 3,07; 3,59, 4,33; 4,53; 5,03; 5,14; 5,17; supra invocados e transcritos se apura com verdade o valor da construção, o valor da venda e o prejuízo apurado na contabilidade da empresa.

XXXIII. Pelo que tem de ser levado à matéria provada e retirado da matéria não provada, o valor da venda de 180.000,00€, o custo da construção de 276.951,43€, o prejuízo resultante da venda de 96.951,43 €.
Que quando foi dissolvida a sociedade, como houve prejuízo na sua actividade nada recebeu da mesma.
A causa de força maior da inundação, que como o imóvel estava construído há mais de 5 anos não podia responsabilizar os empreiteiros contrutores - facto notório e que os AA. aceitaram o imóvel tal qual ele se encontrava e, aquando da entrega não havia nada danificado.

XXXIV. Sob pena de caducidade, os defeitos devem ser denunciados pelo comprador ao vendedor, dentro de 1 ano após o seu conhecimento.

XXXV. Tendo os AA. verificado e conhecido os defeitos logo após a compra do imóvel em 21/04/2017, já tinha caducado o seu direito, quando denunciam os defeitos por carta de 3/9/2018.

XXXVI. O comprador do imóvel que detecta defeitos de construção não pode peticionar em acção ao construtor/vendedor que este seja condenado a pagar-lhe uma quantia que, supostamente, necessita para reparar o imóvel.

XXXVII. Os direitos do comprador são em primeiro lugar de exigir a sua reparação, a sua substituição, a redução adequada do preço ou a resolução do contrato.

XXXVIII. Os meios jurídicos facultados ao comprador encontram-se escalonados de forma sequencial e não podem ser exercidos de forma aleatória ou discricionária.

XXXIX. Logo, tem de soçobrar e ser julgada improcedente a acção em que o comprador, sem mais, exige um valor para reparar os defeitos.

XL. O sócio da sociedade extinta e dissolvida só responde pelo passivo social até ao limite do que recebeu aquando da dissolução e partilha dos bens do activo da sociedade.

XLI. Se a sociedade não tiver activo mas sim um passivo decorrente da sua actividade de construção e compra e venda de imóvel único e da qual não recuperou o valor da sua construção, não se pode dizer que houve partilha de património aquando da sua dissolução.

XLII. Um passivo não se partilha, não é um activo da sociedade.

XLIII. O sócio que suportou
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