Acórdão nº 2865/22.6T8VIS-A. C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-04-2023

Data de Julgamento12 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão2865/22.6T8VIS-A. C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMÉRCIO DE VISEU DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU)

Apelação n.º 2865/22.6T8VIS-A. C1

Juízo de Comércio ... – Juiz ...

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Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]:

I-Relatório

AA (devedor) veio apresentar plano de pagamento aos credores nos termos e para os efeitos do art. 251.º do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, na sua redação atualizada (doravante a designar por CIRE).

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Na ausência de acordo da totalidade dos credores o devedor veio requerer o suprimento da aprovação dos credores que não aprovaram o plano (art. 258.º do CIRE).

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Por decisão de 14.12.2022 (ref. 91965225) o Sr. Juiz, com os fundamentos que aí constam, indeferiu o pedido de suprimento da aprovação dos credores, declarou não aprovado o plano de pagamentos e determinou a cessação da suspensão do processo de insolvência.

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Inconformado, o devedor interpôs recurso dessa decisão, fazendo constar nas alegações apresentadas as conclusões que se passam a transcrever:”
I) Veio o devedor solicitar o suprimento do consentimento dos votos dos credores que se opuseram ao plano apresentar plano de pagamentos apresentado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 251.º. do CIRE, por tal plano ter obtido voto favorável do credor BB, que detinha mais de 2/3 dos votos dos “créditos reclamados” (ref.ª 5556813 de 19-10-2022).
II) O credor Novo Banco, S.A. pugnou pelo não suprimento da aprovação dos credores, alegando, em síntese, que a sua posição é previsivelmente menos favorável do que a que ocorreria na ausência de qualquer plano e que o crédito de
III) BB que votou favoravelmente o plano, não poderia ser reconhecido, e nesse medida o seu Voto não poderia ser suprido.
IV) Apesar da resposta do devedor, referindo que o Novo Banco, S.A. não aduziu factos que sustentassem a posição mais desfavorável e que a “impugnação” do crédito do credor BB não tinha cabimento legal, a verdade é que veio o Tribunal decidir pela recusa do pedido de suprimento apresentado, decidindo no fundo, por invalidar o voto deste credor BB ali “impugnado”, e concluindo que o plano não se podia considerar aceite por créditos que representam mais de dois terços do valor total dos créditos.
DA NULIDADE PROCESSUAL
V) Contudo, fê-lo, ao abrigo do art 258 nº 1 al. C) do CIRE, sem que o credor detentor do crédito impugnado pelo Novo Banco AS, no requerimento de não suprimento, tivesse TIDO oportunidade de se pronunciar sobre o ali vertido (acerca da ali alegada simulação do seu crédito), violando-se assim -cabalmente- o princípio do contraditório daquele credor, em desrespeito pelo estatuído no art. 3º, nº 3, do NCPC, e art 32 nº 5 da CRP, verificando-se uma nulidade processual, nos termos do art. 195º, nº 1, do NCPC, já arguida nos autos pelo próprio credor afectado.
VI) Nesta senda, cremos que a al. C) do nº 1 do art. 258 do CIRE, deve ser declarada inconstitucional, na medida em que tal dispositivo permite que, apenas através de um requerimento (não notificado aos credores afectados para se pronunciarem e ali exercerem cabalmente o seu direito de defesa) seja suficiente para invalidar os créditos cuja veracidade ali se questiona.
Sem prescindir
DA NULIDADE DA SENTENÇA
VII) Transitando o PEAP para processo de insolvência e tendo sido apresentado plano de pagamentos pelo devedor, como no caso dos autos, valem para efeitos de votação do mesmo, os credores reconhecidos na lista definitiva em sede de PEAP.
VIII) Não pode, pois, o Tribunal recorrido servir-se do art 258 nº 1 al. C) do CIRE para, oficiosamente ou a pedido do Oponente ao suprimento, excluir ou invalidar créditos ali pré reconhecidos definitivamente.
IX) Assim, ao decidir-se pela exclusão/invalidada de um crédito já reconhecido na lista de credores do devedor (fora dos casos do art 222 D nº 3 e 4 e 130 do CIRE), o Tribunal viola os princípios do caso julgado relativamente à lista já existente e o PP da confiança jurídica dos credores que não viram o seu crédito impugnado no âmbito do PEAP, mas o veem posteriormente escrutinado e excluído.
X) Tomando o Tribunal recorrido conhecimento de questão de que já não podia conhecer, por já estar decidida (pronunciando-se sobre os pontos 2.1 a 6 e decidindo pela não validação do crédito do credor BB), é de assacar à sentença recorrida a nulidade prevista na segunda parte da al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC -Existindo, por isso, excesso de pronúncia (608º, nº 2, e 609º do CPC).
XI) A Sentença prejudicou assim -gravemente- o devedor, na medida em que vê indeferido o seu pedido de suprimento do consentimento, sem fundamento legal, sendo assim atirado sem mais para uma insolvência -O que não se concede.

Rematou pedindo a “revogação da sentença e de todos os atos posteriores ao requerimento do Novo Banco datado de 18/11/2022, refer. Nº 5616568” ou, se assim não se entender, “deve a sentença ser declarada nula por excesso de pronúncia, designadamente por violação do caso julgado, no que concerne à impossibilidade do Tribunal excluir através do art 258 nº 3 do CIRE qualquer crédito reconhecido definitivamente, nos termos do art 222 D nº 4 do CIRE, revogando-se a sentença, e substituindo-se por outra que, defira o suprimento do consentimento solicitado pelo devedor, e homologando-se o plano, com todas as consequências legais”.
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Respondeu o credor Novo Banco, S.A. defendendo a improcedência do recurso, invocando para tanto, em síntese, os seguintes fundamentos:

(…).

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No despacho que admitiu o recurso o Sr. Juiz pronunciou-se quanto à invocada nulidade da sentença nos seguintes termos: “não se verifica qualquer nulidade já que, por um lado, conforme já mencionámos no despacho de 01-02-2023, não ocorreu a omissão de formalidades legais, nem a violação do princípio do contraditório, por outro lado, a questão do caso julgado foi apreciada no despacho recorrido e constitui objeto do recurso.

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Dispensados os vistos, foi realizada conferência, e obtidos os votos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos.

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II-Objeto do recurso

Como é sabido, ressalvadas as matérias de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo e que não se encontrem cobertas pelo caso julgado, são as conclusões do recorrente que delimitam a esfera de atuação deste tribunal em sede do recurso (art. 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.ºs 1, 2 e 3 e 640.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPC).

No caso, perante as conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a decidir:

Saber se
a) O tribunal ao proferir decisão sem que o credor BB - detentor do crédito impugnado pelo Novo Banco, S.A. - tivesse tido oportunidade sobre a posição desta entidade, incorreu em nulidade processual.
b) É inconstitucional o art. 258.º, n.º 1, c) do CIRE ao permitir que apenas através de um requerimento (não notificado aos credores afetados para se pronunciarem e ali exercerem cabalmente o seu direito de defesa) seja...

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