Acórdão nº 2849/22.4BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 23-03-2023

Data de Julgamento23 Março 2023
Ano2023
Número Acordão2849/22.4BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Foi no presente Processo Cautelar proferida Decisão singular pelo Relator em 10 de março de 2023, tendo a Autora vindo a apresentar Recurso jurisdicional para o STA logo em 12 de março de 2023.

Sem necessidade de contraditório, atenta a sua desnecessidade (Artº 3º nº 3 CPC), uma vez que da decisão singular não cabe Recurso para o STA, mas sim Reclamação para a Conferência, e mostrando-se em tempo a sua apresentação, convola-se o Recurso apresentado, em Reclamação para a Conferência, de cujo acórdão, sendo caso disso, caberá então, Recurso para o STA.
* * *
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito de Reclamação para a Conferência, de decisão singular:

I Relatório
M......, de nacionalidade Angolana, com os demais sinais nos autos, requereu contra o Ministério da Administração Interna – MAI, originariamente Intimação para a Defesa de Direitos, Liberdades e Garantias, tendente a que o intimado emitisse titulo de residência da Requerente com caráter urgente.

No seguimento de despacho nesse sentido, de 16 de setembro de 2022, veio a requerente, em 23 de setembro, a requerer a convolação da Intimação em Providencia Cautelar, com idêntico objeto.

Por Sentença do TAC de Lisboa, de 23 de dezembro de 2022 foi decidido julgar procedente a Providência Cautelar, mais se tendo intimado a Entidade Requerida/MAI a emitir a requerida autorização de residência provisória.

Inconformado com a referida decisão veio o Ministério da Administração Interna a Recorrer para esta instância em 2 de janeiro de 2023, concluindo:
“1. No caso concreto, evidencia-se que a cidadã efetuou manifestação de interesse com vista à concessão de autorização de residência temporária, com dispensa de visto de residência, para exercício de atividade profissional subordinada, ao abrigo do disposto no nº 2 do art.º 88º da Lei nº 23/2007, de 4/07, com as posteriores alterações;
2. A ora recorrida não é titular de um direito à legalização da sua permanência em território nacional, porquanto o cidadão nacional de um país terceiro que pretenda trabalhar em Portugal tem, em regra, de solicitar no país de origem (in casu junto das autoridades consulares portuguesas) o necessário visto de residência, que o habilita, uma vez entrado em território nacional, a requerer a Autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada;
3. A ora recorrida preteriu esse "incómodo" e, sem que fosse portador do referido visto, foi-lhe facultada a oportunidade de apresentar on line a designada "manifestação de interesse". visando a possibilidade da mesma ser analisada;
4. Todavia, ainda não foi efetuado o agendamento que é realizado diretamente pela ora requerente, não tendo o SEF interferência nessa iniciativa, embora reconheça que o reduzido número de vagas disponíveis condiciona a marcação;
5. Em síntese a Sentença a quo incorre em clara violação de lei, quer adjetiva quer substantiva;
6. A decisão de condenação a emissão de título de residência, seja ao abrigo de que norma for, terá, necessariamente, nos termos imperativamente fixados in legis, que alicerçar-se numa prévia decisão administrativa, e esta por sua vez de ter sustento legal, ora nenhuma das situações, in casu, se havia verificado;
7. Enfim, a douta Sentença partindo de pressupostos errados efetuou uma errada subsunção dos factos às normas de direito aplicáveis, padecendo, assim, de vício de ilegalidade:
8. Em homenagem ao Princípio da igualdade e ao Principio do conhecimento dos requerimentos concretos pela ordem da sua entrada, também as manifestações de interesse são avaliadas pela sua ordem de entrada;
9. Pois, se assim não fosse, o recurso ao tribunal transformar-se-ia numa espécie de instrumento de aceleração processual e num mecanismo perverso, através do qual o interessado procuraria ultrapassar os outros interessados com as mesmas pretensões, obrigando a Administração a proferir uma decisão do seu procedimento em primeiro lugar, com clara violação do Principio nuclear da igualdade de tratamento dos administrados perante a lei;
10. Com efeito, também a Sentença ao impor a emissão de um título de residência provisório que não se encontra contemplado pelo regime da lei de estrangeiros, é atentatória não só do referido Principio, mas outrossim, como infra se elucidará, do Princípio da separação de poderes;
11. Reitera-se, pois, que o elevado número de manifestações deste teor, apresentadas perante o recorrente, impossibilita que se proceda à sua apreciação e reapreciação com maior celeridade;
12. A verdade é que para ser proferida decisão no procedimento que o ora recorrido é interessado, é indispensável nos termos legalmente previstos, a realização da devida análise, para aferir do preenchimento dos requisitos legalmente previstos;
13. Ora, como bem assinalam, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, "A exigência de um registo cronologicamente ordenado dos requerimentos não é apenas sinal de uma Administração organizada, mas também garantia dos particulares."-,
14. Com efeito, explicitam os ilustres AA. que "Na verdade, (para além das facilidades probatórias daí derivadas), entende-se que a Administração não pode decidir sobre a pretensão de um particular sem ter ponderado e decidido sobre uma pretensão concorrente de outro particular, que haja sido primeiramente apresentada." (sublinhado nosso);
15. Ainda que num contexto diferente e concernente ao direito à informação procedimental, no processo n.º 3044/15.4BESNT do TAF de Sintra, e em homenagem ao principio da igualdade e ao princípio do conhecimento dos requerimentos concorrentes pela ordem da sua entrada igualmente se explicitou que "Se não fosse assim, o direito à informação transformar-se-ia numa espécie de instrumento de aceleração processual e num mecanismo perverso, através do qual o interessado procuraria ultrapassar os outros interessados com as mesmas pretensões, obrigando a Administração a proferir uma decisão do seu procedimento em primeiro lugar, com clara violação do principio nuclear da igualdade de tratamento dos administrados perante a lei";
16. A recorrida ousou, por decisão do Tribunal ultrapassar outros interessados, com as mesmas pretensões, obrigando a administração a dar execução urgente em termos de emissão do título provisório, que para além de não permitir concluir a indagação necessária sobre o pedido, viola ostensivamente o princípio da igualdade de tratamento dos administrados perante a lei, pudendo por em causa o princípio constitucional da separação de poderes;
17. Atento o disposto no n.º 2 do art.º 88.º, estamos perante um poder atribuído apenas à Administração, pelo que, atendendo ao princípio da separação e interdependência dos poderes constitucionalmente consagrado e também vertido no art.º 3.º do CPTA, não poderia o Tribunal a quo impor a "condenação à prática de ato devido consubstanciado em a Entidade Demandada conceder ao Autor o título de residência.";
18. "O sentido do artigo 3º é, claramente, de abrangência dos poderes dos tribunais administrativos. Mas precisamente por isso, o legislador tem o cuidado de abrir, no nº 1, com um preceito que coloca o acento tónico nos limites que se impõem ao exercício desses poderes. O Código confere aos tribunais administrativos todos os poderes que são próprios e naturais do exercício da função jurisdicional, fazendo com que estes tribunais sejam, como todos os outros, tribunais dotados de poderes de plena jurisdição. Mas, tal como nas restantes ordens jurisdicionais, também o campo de atuação dos tribunais administrativos se restringe à aplicação da lei e do Direito. Isto significa que os tribunais administrativos não se podem substituir aos particulares na formulação de valorações que pertencem—à respetiva autonomia privada, como também não se podem substituir às entidades públicas na formulação de valorações que, por já não terem caráter jurídico, mas envolverem a realização de juízos sobre a conveniência e oportunidade da sua atuação, se inscrevem no âmbito próprio da discricionariedade administrativa. São vários os preceitos que, ao longo do Código, concretizam o princípio do artigo 3º, nº 1, preservando dos poderes de condenação dos-tribunais administrativos os "espaços de valoração próprios do exercício da função administrativa": vejam-se, em particular, o artigo 71º, nºs 2 e 3, de importância nuclear no que se refere aos poderes de pronúncia no domínio da condenação à prática de atos administrativos, o artigo 95º, nº 5, para a hipótese em que tenha sido deduzido um pedido de condenação da Administração à adoção de atos jurídicos ou comportamentos, e o artigo...

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