Acórdão nº 28190/21.1T8LSB-J.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-10-13

Ano2022
Número Acordão28190/21.1T8LSB-J.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

Em 27/11/2021 Novo Banco, S.A., instaurou acção executiva para pagamento de quantia contra P., S.A., L V., V V. e M D., tendo em vista o pagamento da quantia de € 7.555.643,05, acrescida de juros de mora vencidos liquidados em € 6.624,13 e juros vincendos, e apresentando como título executivo livrança no valor de € 7.555.643,05, subscrita pela executada P., S.A. e avalizada pelos demais executados.
O executado M D. veio deduzir oposição à execução por embargos de executado, aí requerendo a suspensão da execução sem prestação de caução, ao abrigo do disposto no art.º 733º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil.
Na contestação que apresentou a embargada pronunciou-se sobre a requerida suspensão da execução, aí concluindo pelo indeferimento de tal pretensão.
Relativamente à requerida suspensão da execução sem prestação de caução, foi proferido o despacho de 30/5/2022, com o seguinte teor:
O Embargante requereu a suspensão da execução, de harmonia com o disposto no art. 733º, 1, al. c, do Código de Processo Civil, tendo-se oposto o exequente.
Estabelece a norma legal em referência que, o recebimento dos embargos só suspende o prosseguimento da execução se tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda e o juiz o considerar, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução.
É preciso ter redobradas cautelas na aplicação deste preceito. Em primeiro lugar, não poderemos perder de vista que o legislador pretendeu que a suspensão da execução, em consequência do recebimento dos embargos de executado, constituía uma situação excepcional e não a regra.
No que respeita à impugnação da exigibilidade, como refere José Lebre de Freitas (A Acção Executiva Depois da Reforma da Reforma, cit., p. 82-83), a prestação é exigível quando a obrigação se encontra vencida ou o seu vencimento depende, de acordo com estipulação expressa ou com a norma geral supletiva do art. 777º, nº 1, do CC, de simples interpelação do devedor. Não é exigível quando, não tendo ocorrido o vencimento, este não está dependente de mera interpelação, como é o caso da obrigação de prazo certo que ainda não decorreu (art. 779º CC), sendo o prazo incerto e a fixar pelo tribunal (art. 777º, nº 2 CC), quando a constituição da obrigação foi sujeita a condição suspensiva, que ainda não se verificou (arts. 270º CC e 715º) ou ainda, quando em caso de sinalagma, o credor não satisfez a contraprestação (art. 428º CC).
Por sua vez, no que concerne à impugnação da liquidação, afigura‑se-nos que a suspensão apenas deverá ter lugar nos casos em que a obrigação deva ser liquidada no processo executivo, nos termos do art. 716º, fora dos casos em que apenas depende de simples cálculo aritmético. Ou seja, deverá ter-se em consideração que a previsão da al. c) incide sobre a verificação de uma excepção dilatória (inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda) e não sobre uma excepção peremptória.
Logo daqui resulta que não deverá ser atendido o pedido de suspensão da execução sem prestação de caução com base na pretensa inexigibilidade da obrigação exequenda se o fundamento não respeitar aos pressupostos processuais da acção executiva, tendo antes natureza substantiva (p. exp., a alegação de que a quantia exequenda já está paga).
Pela referida razão, dado incidir sobre uma excepção dilatória, entendemos que poderá ser atendido o pedido de suspensão da execução sem prestação de caução, por exp., sendo a execução fundada em requerimento de injunção no qual foi aposta a fórmula executória, caso no mesmo tenha sido referida a existência de domicílio convencionado e a notificação efectuada no âmbito do procedimento de injunção tenha sido feita pela via simples por meio de depósito de carta simples no respectivo receptáculo postal, ao invés de carta registada com aviso de recepção e o executado nos respectivos embargos invoque a inexistência dessa convenção. Neste caso, se o exequente não demonstrar logo com a apresentação da contestação, através de documentação adequada, a existência de domicílio convencionado, o pedido de suspensão deverá ser deferido.
Sobre o caso que nos debruçamos, pronunciou-se o Ac. da RC de 05/05/2015, proc. 505/13.3 TBMMV-B.C1, in www.dgsi.pt., no qual se decidiu que “Deixando o art. 733º, nº 1, al. c) do CPC ao critério do juiz a consideração de entender ou não como justificado suspender a execução sem prestação de caução, em face da regra restritiva que é a de os embargos não suspenderem a execução, não bastará a impugnação da existência, validade, vencimento, liquidez ou exigibilidade da prestação exequenda para obter a suspensão sem caução, exigindo-se que dos termos da impugnação, confrontados com os elementos de apreciação, máxime o título executivo, nesse momento liminar do recebimento dos embargos, se revele algo importante e manifesto que dispense o imperativo de colocar o exequente a coberto dos riscos da demora no prosseguimento da acção executiva”. Também o Ac. da RP de 2/7/2015, proc. 602/14.8 TBSTS-B.P1, in www.dgsi.pt., se decidiu que “Para obter a suspensão da execução sem prestar caução não basta ao embargante impugnar a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda, sendo ainda necessário alegar circunstâncias em função das quais se possa concluir que se justifica excepcionalmente o afastamento da regra de a suspensão depender da prestação de caução.
No caso que nos ocupa, o vencimento da prestação resulta do título que serve de base à execução. Ou seja, a obrigação exequenda é exigível, por ter ocorrido o seu vencimento.
O que o embargante vem alegar são fundamentos de ordem substantiva.
Ora, conforme se decidiu na providência cautelar de arresto, que quanto ao montante de juros vencidos que ora se executa foi acordado que os mesmos seriam regularizados nos termos previstos no Acordo de Reconhecimento de Dívida a celebrar entre o Novo Banco a P., S.A. e os avalistas das operações, aqui embargantes.
Deste modo, a dívida encontra-se vencida, pelo que o exequente podia preencher a livrança, como fez.
Por outro lado, o facto de existir ou não interpelação não impede o facto da dívida estar vencida.
A consequência (para os que seguem tal entendimento), caso não tenha existido interpelação, é que o exequente só pode pedir os juros a partir da data da citação.
Finalmente, conforme vem sendo entendimento da Jurisprudência, o portador de livrança para accionar o subscritor e os avalistas não carece de fazer o protesto do título.
Por todo o exposto, decido indeferir o pedido de suspensão da execução.
Notifique”.
O embargante recorre desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
I - O presente recurso surge para impugnação do despacho de indeferimento do efeito suspensivo ao recebimento dos embargos de oposição à execução.
II - O despacho recorrido é proferida numa fase liminar do incidente em que se enquadra (no âmbito do qual ainda não houve lugar a despacho saneador), mas integra um acervo decisório que remonta à providência cautelar de arresto, que precedeu o processo executivo e na qual o Recorrente não foi parte.
III - Ocorre que, tanto aquele arresto, como esta instância, assim como o apenso de oposição à penhora, liminarmente indeferido e igualmente recorrido, estão a ser presididos e dirigidos pelo mesmo Juiz, que, inevitavelmente, traz para estes autos os ecos do que foi o seu julgamento anterior, mas que, em momentos processualmente prematuros, tece afirmações, categóricas e conclusivas, que antevêem o que virá a ser a decisão final.
IV - Compreende-se que um Juiz seja limitado pela sua condição humana e que as decisões que profere sejam, inevitavelmente, reflexo da sua experiência, da sua visão do mundo e da posição que já tomou quanto às matérias por si apreciadas, mas é-lhe exigido o esforço adicional a que consiga, nos diversos momentos e fases processuais, manter o distanciamento, a imparcialidade e o recato processual que a Lei impõe.
V - É difícil perscrutar, face ao que consta dos despachos já proferidos e recorridos, que a decisão de primeira instância não esteja já tomada.
VI - Ora, tal como tem sido entendido no âmbito da interpretação doutrinária e jurisprudencial do artigo 6.º da Convenção Europeia do Direitos do Homem, existe parcialidade subjectiva do julgador quando o mesmo, através de actos anteriores à decisão denuncia qual o sentido da mesma.
VII - Pelo que, a decisão proferida é, nessa medida, nula, ademais
VIII - O Recorrente requereu a concessão de efeito suspensivo aos embargos de oposição à execução que apresentou, nos termos e ao abrigo do disposto no Art. 733.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil.
IX - Essa pretensão foi deduzida após um extenso articulado, em que o Recorrente impugnou a exigibilidade e a liquidação da obrigação exequenda.
X - Nesse sentido, alegou, em síntese e entre outros aspectos, o preenchimento abusivo da livrança, a aplicação do disposto no Art. 782.º do Código Civil e a perda do direito de acção, a que aditou o facto da livrança preenchida e executada não titular a totalidade da obrigação exequenda já de si prescrita - e a impossibilidade de ser exigido o pagamento de juros após a data de vencimento do título cambiário.
XI - O Recorrente apresentou ainda prova documental demonstrativa que a obrigação em causa estará sempre garantida por hipotecas que o Recorrido detém sobre património de terceiro.
XII - Invocou, finalmente, que a prossecução dessa instância executiva produziu e produz danos efectivos sobre o seu património, bom nome, imagem e direito ao crédito, todos estes valores constitucionalmente consagrados.
XIII - Portanto, na ponderação de interesses que o Art. 733.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, impõe ao Julgador
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