Acórdão nº 2708/20.5T8GDM.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-03-24

Ano2022
Número Acordão2708/20.5T8GDM.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. nº 2708/20.5T8GDM.P1 (apelação)
Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Gondomar – J 2

Relator Filipe Caroço
Adj. Desemb. Judite Pires
Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
AA, com o NIF ..., residente na Rua ... ..., Gondomar, intentou a presente ação declarativa que segue a forma de processo comum contra Banco ..., S.A.[1], com o NIF ..., com sede na Rua ... Lisboa, com fundamento em comunicação indevida de dados sobre incumprimento contratual à Central de Responsabilidade de Crédito do Banco de Portugal[2], sobre a sua capacidade financeira e de uma sociedade unipessoal de que é sócio, que obstou a que fosse concedido crédito bancário à A..., Unipessoal, Lda. de que também é (o único) sócio.
A falta desse crédito, para além de ter dado origem a dificuldades na vida comercial daquela segunda sociedade, originou um conjunto de danos não patrimoniais ao A., desde logo pela diminuição do prestígio de que o mesmo beneficiava junto das entidades bancárias, e pela necessidade que teve de suportar custos, no valor de € 300,00 para resolver o problema despoletado pela R.
Deduziu o seguinte pedido:
«Deve a presente ação ser julgada procedente por provada e, em consequência, deve a R. ser condenada:
a) A pagar ao A. a quantia de €10.000,00 (dez mil euros), a título de danos não patrimoniais;
b) A pagar ao A. a quantia de €300,00 (trezentos euros), a título de danos patrimoniais.»
Citada, a R. deduziu contestação, onde se opôs a grande parte dos factos alegados na petição inicial, descrevendo a sua versão do relacionamento bancário em causa na defesa da improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.
Teve lugar a audiência prévia, onde se dispensou a fixação do objeto do litígio e dos temas de prova e, após pronúncia do tribunal sobre a admissibilidade dos meios de prova, foi designada data para a realização da audiência final.
Concluída aquela audiência, foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:
«Julga-se a presente ação parcialmente procedente condenando-se a R. a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais, quantia de €10.000,00 acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento, absolvendo-se do restante pedido.
Custas na proporção do decaimento.
(…).»
*
Inconformada, a R. recorreu da sentença, produzindo alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
………………………………
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………………………………
Assim, entende a apelante que, face à ponderação casuística da individualidade do caso em apreço, não se reúnem os pressupostos para a sua condenação, a título de responsabilidade civil por facto ilícito, na indemnização nos termos constantes da douta sentença do Tribunal a quo, tendo, assim, a douta sentença recorrida feito uma incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 483.º, n.º 1, 562.º, e 566.º do Código Civil.
Pelo que não poderia a Banco ... ter sido condenada, nos termos em que o foi.» (sic)
Manifestou assim a sua pretensão de que seja revogada a sentença recorrida.
*
O A. respondeu em contra-alegações que sintetizou assim:
«a) Dado que os factos dados como provados e os factos dados como não provados não merecem qualquer censura e
b) E que inexiste erro na aplicação do direito, conforme supra se explanou, deve manter-se a douta sentença proferida pelo tribunal “a quo”;» (sic)
Pugnou, deste modo, pela confirmação da sentença.
*
Foram colhidos os vistos legais.
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II.
O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do ato recorrido, delas retirando as devidas consequências, e não sobre matéria nova, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º, do novo Código de Processo Civil).

Estão para apreciar e decidir as seguintes questões:
1. Erro de julgamento na decisão proferida em matéria de facto;
2. Verificação dos pressupostos da responsabilidade civil da R.
*
III.
É a seguinte a matéria de facto considerada provada na 1ª instância:[3]
1. A R. intentou uma execução contra a sociedade “C..., LDA.” e o A., seu sócio e fiador, a qual correu termos sob o n.º 1734/14.8T8MAI, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Execução da Maia – Juiz 2.
2. A execução extinguiu-se por pagamento em 08/09/2017.
3. Em 10/10/2017, a sociedade “A..., Unipessoal, Lda.” (NIPC ...), da qual o A. é sócio, deu entrada de um pedido de linha de crédito para microempresas junto da Banco 1... no valor de €10.000,00 pelo prazo de 72 meses.
4. Após análise da entidade bancária, o A. foi surpreendido com a recusa da concessão do crédito pelo facto de existir no Banco de Portugal um registo de crédito vencido do aqui A., o qual assumiria a posição de fiador.
5. Nesse seguimento, o A. acedeu ao seu mapa de responsabilidades de crédito e constatou a informação prestada pela Banco 1... e apresentou uma reclamação ao Banco de Portugal.
6. E, por outro lado, foi ao Balcão do Banco ... no qual lhe entregaram em mão uma carta que, alegadamente, foi enviada para a sede da empresa em novembro de 2017, a comunicar a cessão de crédito.
7. Em 02/02/2018, a aqui R. envia ao A. uma carta afirmando na qual faz referência à reclamação junto do Banco de Portugal e reconhece que “ (…) conforme V. Ex.a referiu a quantia exequenda foi paga e o processo executivo foi, consequentemente, extinto, em setembro de 2017.
As comunicações efetuadas à Central de Responsabilidade de Crédito do Banco de Portugal, a partir da centralização de 30/09/2017, inclusive, foram indevidas, à semelhança da cessão de crédito, comunicada a V. Ex.ª, através de carta datada de 02.11.2017, cuja cópia juntamos.
Nesse sentido, a Banco ... (Banco ...) procedeu, entretanto, à anulação das comunicações que efetuou, relativas às centralizações de 30.09.2017 e 31.10.2017, a título de crédito vencido em litígio judicial.
Quanto às centralizações seguintes, a Banco ... obteve confirmação da cessionária em como procedeu de igual forma”.
8. O A. não tinha liquidez para atividade comercial da sociedade “A..., UNIPESSOAL, LDA” que geria.
9. Tendo-lhe sido negado a linha de crédito pela Banco 1... em face da sua inscrição na Central de Responsabilidades de Crédito, viu-se impedido de fazer compras que lhe permitissem satisfazer as necessidades da clientela, e de gerar rendimentos para a mesma e para si.
10. Todo este processo originou desgaste e incómodos ao A..
11. E diminuiu a imagem que o A. possuía junta das entidades bancárias, nomeadamente junto da Banco 1..., e a confiança na capacidade para cumprir as suas obrigações.
12. O A. sentiu-se humilhado quando se dirigiu ao balcão da Banco 1... e a funcionária que estava a tratar da linha de crédito o informou da situação.
13. O A. é pessoa educada e sensível, tendo esta situação provocado desgaste emocional, stress e ansiedade até ver a sua situação resolvida.
14. Por cessão de créditos realizada no dia 02/11/2017, foram cedidas as responsabilidades tituladas pela sociedade “C..., LDA.” e do A. à H..., S.A...
15. A H..., S.A.. fez comunicação da divida a CRC do Banco de Portugal aos 31-12-2017.
16. Quando em Janeiro de 2018, na sequência da reclamação do A., a R. teve conhecimento da extinção da instância executiva, contactou com a cessionária no sentido de a informar que já recebera os valores da execução, procedeu, no dia 02-02-2018- à anulação das comunicações efetuadas à CRC a partir da data de notificação do AE, e solicitou à cessionária que procedesse do mesmo modo a partir da data da cessão.
*
O tribunal deu como não provada a seguinte matéria:[4]
a) O A. teve de suportar despesas de deslocações, telefonemas, envio de cartas e outras despesas em valor nunca inferior a €300,00.
b) Os mandatários das cessionárias tenham sido substabelecidos na identificada execução em Agosto de 2017.
c) Tendo a partir dessa data todas as notificações sido remetidas àqueles, incluindo a extinção da execução.
E acrescentou: «Inexistem outros factos provados ou não provados com relevância para os presentes autos sendo o demais alegado de teor conclusivo e/ou juízos de direito».
*
1. Erro de julgamento da decisão proferida em matéria de facto
A recorrente impugna os seguintes pontos da decisão em matéria de facto dada como provada:
6. E, por outro lado, foi ao Balcão do Banco ... no qual lhe entregaram em mão uma carta que, alegadamente, foi enviada para a sede da empresa em novembro de 2017, a comunicar a cessão de crédito.
8. O A. não tinha liquidez para atividade comercial da sociedade “A..., UNIPESSOAL, LDA” que geria.
9. Tendo-lhe sido negado a linha de crédito pela Banco 1... em face da sua inscrição na Central de Responsabilidades de Crédito, viu-se impedido de fazer compras que lhe permitissem satisfazer as necessidades da clientela, e de gerar rendimentos para a mesma e para si.
11. E diminuiu a imagem que o A. possuía junta das entidades bancárias, nomeadamente junto da Banco 1..., e a confiança na capacidade para cumprir as suas obrigações.
Defende a exclusão desta materialidade do âmbito dos factos provados.

A R. impugna também as al.s b) e c) da matéria que o tribunal a quo deu como não provada.
Entende que tal matéria deve dada como provada, nos seguintes termos:
- Os mandatários das cessionárias foram substabelecidos na identificada execução em Agosto de 2017.(b)
- A partir de agosto de 2017, todas as notificações foram remetidas aos mandatários das cessionárias, incluindo a extinção da execução.(c)
Para além da indicação de documentos, ponto por ponto, a apelante reporta-se também aos meios probatórios oralmente produzidos e constantes da gravação, com indicação das passagens mais marcantes e que considera relevantes para as alterações propugnadas, sendo eles as declarações de parte do A. e os depoimentos testemunhais de BB, de CC e de DD,
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